Ponto de vista do Scott
Quando conversei mais cedo com a tal professora, ela parecia até uma pessoa legal. Confesso que ajudou muito ouvir sobre as diferentes condições neurológicas e entender que não são propriamente uma deficiência, mas apenas uma forma diferente de enxergar o mundo. Mas, no final da aula, quando tentei me aproximar, ela foi tão… petulante. Pra quê aquilo? Eu estava sendo simpático. E ela, grosseira. De novo.
Ô mulherzinha complicada… vai acabar me tirando do sério. E o pior: não posso discutir com ela, porque a Hope a idolatra. Ficou claro quando disse “minhas duas pessoas preferidas no mundo” ao nos ver conversando em frente à escola. Ela, e eu. Inacreditável.
Depois da aula, levei a Hope para casa e segui para a reunião com a banda. Precisávamos alinhar a surpresa para a noite de talentos de sábado. A ideia de aparecer no meio da coreografia da Hope deixou todos animados — pais entendem esse tipo de coisa. E eu também me peguei ansioso, como um moleque prestes a subir no palco da escola.
Mais tarde, decidi levar a Hope comer pizza. Fomos a uma pizzaria de estilo nova-iorquino, para relembrar nossos velhos passeios em Nova York. Sempre que eu recebia um prêmio por lá, levava-a comigo. Pizza, Central Park, risadas… lembranças boas que quero reacender. Quero que ela veja o pai divertido, não o homem quebrado que tenho sido ultimamente.
— Estou pronta, pai — Hope anunciou, descendo as escadas.
Parei, sem fôlego. Nove anos, mas já com trejeitos de mocinha. Vestido rosa-claro, mangas rendadas, sapatilhas delicadas. Fez uma trança sozinha, passou até brilho nos lábios. Meu Deus… ela está crescendo rápido demais.
— Você está linda, querida — falei, recebendo-a no pé da escada. Ela corou.
— Onde vamos? — perguntou, tentando disfarçar o entusiasmo.
— Comer pizza de Nova York… em Miami.
Ela riu, e seguimos.
Mas, claro… de todas as pessoas do mundo, adivinha quem encontramos lá? Exatamente: a professora.
E eu juro que não estava reparando… mas foi impossível “desver”. Vestido vinho, frente única, costas à mostra. A cor realçava a pele levemente bronzeada. Parecia feito para ela. Perfeito demais. Um golpe baixo. Respirei fundo. Não, Scott, não. Ela é só uma garota irritante que adora te provocar. Ponto.
Hope correu até ela sem nem pedir licença. Eu deveria ter impedido, mas parte de mim gostou da ideia de estragar o possível encontro dela. Vingança boba, mas vingança. Só que a professora não pareceu se importar. Abraçou a Hope com sinceridade, o sorriso iluminando tudo ao redor… até me ver. Aí, sim, juraria que ela me mediu de cima a baixo antes de fechar a cara. Não, não é coisa da minha cabeça.
— Boa noite. Desculpe a Hope atrapalhar seu jantar. Quando vi, ela já estava indo até você — falei, deixando escapar um sorriso carregado de ironia.
— Está tudo bem — ela respondeu, com elegância fria. — Este é o Sr. Jones, está cuidando da minha situação com o visto americano.
— Prazer — cumprimentei o homem. — Com licença, nossa mesa já está pronta.
E saí, puxando a Hope pela mão.
— Até amanhã, Hope — a professora se despediu. De mim, nada. Ignorado. Mais uma vez.
Sério, o que essa mulher tem contra mim? Agora fiquei incomodado de verdade. Não é normal. Está na hora de investigar essa professora.
Enquanto Hope mergulhava no cardápio, peguei o celular e enviei uma mensagem ao meu assistente com o nome dela. Pedi uma investigação completa, alegando que era por causa do apego da Hope. Mas, no fundo, era birra. Birra e… algo mais que eu não queria admitir.
Nosso jantar foi agradável. Melhor ainda quando a professora deixou o local. Então pude relaxar e aproveitar minha filha. Rimos, lembramos de Nova York, passeamos pela orla. E, quando voltamos para casa, Hope adormeceu rápido.
Eu, porém, fiquei preso nos meus pensamentos… e nos meus fantasmas.
E, de novo, aquele sonho. Só que desta vez não eram apenas Lilly e Mia. A professora também estava lá. E a simples presença dela me deixava… confuso. Irritado demais para ser apenas irritação.