Cristina sempre foi o orgulho da família. Desde pequena, todos percebiam que havia algo diferente nela: enquanto as outras crianças brincavam de boneca, ela preferia empilhar caixas de papelão e transformá-las em casas, castelos ou pequenas cidades imaginárias. No quintal, rabiscava plantas baixas com giz, dando forma aos sonhos que já cresciam dentro dela.
Seus pais, Augusto e Sofia, trabalhavam duro para sustentar Cristina e sua irmã, Núbia. O esforço deles nunca passou despercebido: Cristina tinha consciência de que precisava retribuir cada noite mal dormida, cada hora extra de trabalho, cada renúncia feita pelos pais. Foi assim que ela decidiu, ainda criança, que seria arquiteta. Não apenas por paixão, mas também por amor à família. Determinada, foi a melhor aluna da escola, conquistou uma bolsa integral para cursar Arquitetura e, com noites em claro, trabalhos impecáveis e uma disciplina que impressionava até os professores, se formou com louvor. Na formatura, ao lado da família, parecia ter tudo o que sempre quis: o diploma, a admiração das pessoas e um futuro brilhante pela frente. Mas Cristina guardava um segredo a sete chaves. Um acontecimento que havia marcado sua vida na adolescência — algo tão profundo e doloroso que moldou a mulher forte que todos conheciam. Esse segredo foi o marco que a fez erguer muralhas ao redor do coração, impedindo que qualquer pessoa se aproximasse demais. Ela aprendeu a sorrir para o mundo, mas nunca mais se permitiu amar de verdade. E assim, Cristina seguiu em frente: uma arquiteta brilhante, respeitada, admirada e aparentemente plena. Mas no fundo, havia uma ferida escondida, e a qualquer momento, a vida poderia colocá-la frente a frente com esse passado que ela tanto tentou enterrar. Na época da faculdade, Cristina vivia mergulhada nos livros, nos projetos e nos sonhos de se tornar uma grande arquiteta. Quase nunca aceitava convites para festas — não por arrogância, mas porque sentia que precisava focar toda sua energia no futuro. Mas naquela noite, seus colegas insistiram. Diziam que seria diferente, que o rapaz por quem ela nutria sentimentos em segredo estaria lá. Ela pensou que talvez fosse divertido. Talvez, quem sabe, uma chance de finalmente conversar com ele, de mostrar que existia mais do que a menina sempre focada nos estudos. Respirou fundo, se arrumou e foi. No início, a festa parecia inofensiva: risadas, música alta, colegas dançando e conversando. Cristina se deixou levar pelo momento, tomou algumas doses para relaxar — mais do que estava acostumada. A cada gole, a timidez parecia sumir, mas junto com ela também iam embora seus limites. Foi então que tudo aconteceu. O garoto que ela gostava se aproximou, mas não da forma que Cristina imaginava. Ela, já vulnerável pela bebida, não conseguiu impor barreiras. Ele aproveitou daquela fragilidade, da confiança que ela depositava nele, e fez o que queria sem se importar com o fato de que ela não estava em condições de decidir nada. Na manhã seguinte, Cristina acordou confusa, atordoada. O coração acelerado não era de felicidade, mas de dor e vergonha. Procurou nele um olhar, uma palavra, qualquer sinal de carinho ou arrependimento. Mas tudo o que recebeu foi indiferença. Ele fingiu que nada havia acontecido. Para ele, era apenas mais uma noite. Para ela, foi o início de uma ferida que jamais cicatrizada por completo. Cristina nunca contou a ninguém. Guardou esse segredo a sete chaves. O que era amor em silêncio se transformou em dor e desconfiança. Naquele dia, algo dentro dela mudou para sempre. Decidiu erguer muralhas em torno do coração e nunca mais permitir que alguém tivesse poder sobre seus sentimentos. O tempo passou, e com ele vieram as conquistas. Cristina se tornou a arquiteta brilhante que todos admiravam. Aprendeu a lidar com a dor escondida por trás do sorriso, a se fortalecer na profissão, a transformar cada traço e projeto em uma forma de recomeço. Mas no fundo, em noites silenciosas, ainda carregava a lembrança amarga daquela festa que lhe roubou a inocência e a crença no amor.