Gemima havia deixado o escritório, a porta fechada atrás dela, e o silêncio que restou parecia um peso.
Todos ficaram alguns segundos em suspense, até que Jano se inclinou para frente, apoiando os cotovelos sobre os joelhos, e falou em tom grave: — Amanhã, vocês pedem a anulação desse casamento, não tem jeito para se remediar, todos viram a cena. — fez uma pausa, encarando o irmão com frieza. — Vamos esperar a resposta da Gemima. Se ela aceitar, eu cumpro a parte do acordo, com ressalvas, claro. Os olhos de Juno se arregalaram, como se não acreditasse no que ouvia. — Agora você quer cumprir, antes recusou, e agora quer consertar o estrago? Depois de tudo, que houve, não creio que ela aceite! Jano o atravessou com o olhar, firme. — Irmão, era só você ter segurado o pau dentro das calças. Mas não, você não se aguentou. — cuspiu as palavras como lâminas. — E eu não quis me casar com ela justamente por isso: porque eu sabia que não iria trair, mas não iria amar também, sabia que, se aceitasse, teria que respeitá-la, mas a que preço? Os pais prenderam a respiração. E Juno tentou se defender: — Você fala como se fosse fácil, eu namorava a Luna a três anos, e ia pedir a mão dela quando veio essa maldita proposta. — Fácil? — Jano ironizou, rindo sem humor. — Você namora a Luna há anos, todos sabíamos, e por quê só agora você ia pedir a mão dela? Ela também sabia e aceitou, você tinha escolha Juno. Eu não, não quis atrapalhar a vida dela. Eu olhei para aquela menina e vi que era só isso uma menina: você tem nove anos a mais que ela, e eu tenho muito mais. Tenho outra visão de vida, mais responsabilidades, tenho vícios e relacionamentos passageiros, sim, mas não finjo que são compromissos. E ainda assim, se for para salvar as empresas, eu assumo esse contrato agora. O pai de Jano se mexeu inquieto na poltrona. O ar estava tenso. — Se ela aceitar casar comigo, eu compro o contrato por dois anos, depois ela pode seguir a vida dela— Jano virou-se para o advogado, os olhos de aço. — Anulando esse casamento desastroso, é possível refazer o contrato? O advogado trocou olhares com o juiz de paz. — Tecnicamente, sim, só que, neste momento, o problema não é jurídico, é moral. Não se trata apenas de redigir o adendos ou ajustar cláusulas. Trata-se de convencê-la. O juiz de paz, até então calado, ergueu a voz, grave: — Não é o caso de convencê-la, esse é o caso de que muitas vidas dependem da decisão dessa jovem. Mas, senhores, sejam francos : se tivessem falado a verdade desde o início, se tivessem preparado Gemima, talvez ela tivesse aceitado com dignidade. O que aconteceu foi uma silada. Vocês esconderam o contrato dela até o último momento, a jogaram nesse casamento como se ela fosse mercadoria. O silêncio se quebrou em olhares constrangidos. O pai de Gemima respirou fundo, passando a mão pela testa. — Não tivemos escolha, o contrato precisava se cumprir. — Não tinha ou não se importaram? — o juiz rebateu, firme. — Tinham sim! Sempre há uma solução , mas preferiram o silêncio. Preferiram preservar as aparências. Agora, o escândalo está em todos os jornais, e quem vai carregar a responsabilidade é ela, não vocês. Jano cruzou os braços, a expressão endurecida. — E por isso mesmo eu disse: a culpa não é dela. A culpa é de vocês. — apontou para os pais. — Vocês criaram essa bomba-relógio. E agora esperam que Gemima aceite ser a salvação de todos. Pois saibam: ela não é marionete. Se ela quiser, eu assumo . Mas só se ela concordar. O advogado suspirou, folheando novamente o contrato. — Então a questão é clara. Ou ela aceita assinar um novo acordo com Jano, ou tudo desmorona. As últimas palavras ecoaram como sentença, pairando sobre todos naquela biblioteca sufocante.