Capítulo 4
No exato instante em que os tiros ecoaram, eu vi o instinto verdadeiro de Marco.

Ele não se moveu em minha direção.

Ele se jogou sobre Isabella, protegendo-a com o corpo, pronto para receber qualquer bala destinada a ela.

Não hesitou.

Empurrou-me contra a pesada estante de carvalho.

Bati com força na madeira, e uma chuva de livros despencou sobre mim.

O canto afiado de um deles rasgou meu braço.

O sangue floresceu na minha manga de seda branca, uma flor escura e feia.

A dor atravessou meu corpo, mas nada se comparava à sensação do meu coração sendo dilacerado.

Quando os disparos cessaram, Marco não veio ver como eu estava.

Ele verificou Isabella, que tremia em seus braços.

— Amor, você está bem? Está ferida? — A voz dele era uma mistura crua de pânico e devoção.

— N-não… — Soluçou Isabella. — Marco, eu estava tão assustada…

— Não fique. Eu estou aqui. — Ele beijou sua testa. — Nunca vou deixar ninguém te machucar.

Nunca vou deixar ninguém te machucar.

Esse foi o golpe final. A última fagulha de esperança que eu ainda guardava morreu ali.

Deitada no chão, vi os dois agarrados um ao outro.

O sangue escorria do meu braço, manchando o tapete persa de vermelho escuro.

Marco sequer tinha me olhado.

Todo o mundo dele era Isabella.

— Marco… — Chamei, com a voz fraca.

Ele finalmente me notou.

Um lampejo de incômodo atravessou seu rosto.

— Só um minuto, Samara. Isabella está em choque.

Ela estava em choque.

Eu estava sangrando.

Fechei os olhos, afogada por um desespero tão total que parecia estar me arrastando para o fundo.

Vinte anos.

Toda a minha vida, eu acreditei que, um dia, Marco finalmente me enxergaria.

Agora eu sabia.

No coração dele, eu jamais, em momento algum, importaria mais do que Isabella.

Nem diante da morte.

Os seguranças da família correram para o escritório, garantindo a segurança do cômodo.

— Chefe, foi a família Torrino. — Relatou Antonio, seu braço direito. — Eles recuaram.

Marco assentiu, ainda segurando Isabella.

— Dobrem a segurança da mansão. — Ordenou. — E coloquem uma equipe exclusiva para Isabella. Em tempo integral.

Os olhos de Antonio caíram sobre mim.

— Chefe, a senhorita Romano está ferida.

Só então Marco se deu ao trabalho de olhar para mim, os olhos vazios de qualquer preocupação.

— Chamem o médico para cuidar disso. — Disse, com o tom de quem mandava consertar uma cadeira quebrada.

Depois, ergueu Isabella nos braços e a levou para a suíte de hóspedes no andar de cima.

— Você precisa descansar. — Murmurou, a voz tão suave que me deu náusea.

Fiquei sozinha no chão do escritório, encarando o teto ornamentado.

O sangue não parava de fluir.

A dor me deixava tonta.

Mas minha mente nunca estivera tão clara.

Esse era o "amor" de Marco por mim.

Quando o perigo chegou, eu não valia nem um olhar.

Duas horas depois, eu estava na clínica privada da família Corvini.

O ferimento não era profundo, mas a perda de sangue me deixou pálida, frágil.

Enquanto o médico costurava meu braço, eu esperei por Marco.

Esperei três horas.

Nada.

— Senhorita Romano. — Entrou uma enfermeira. — O senhor Corvini pediu que eu lhe desse um recado. A senhorita Falcone ficou muito abalada. Ela precisa dele. Ele virá vê-la mais tarde.

Mais tarde.

Eu quase tinha morrido, e ele viria me ver depois.

Deitada na maca, encarei as lâmpadas frias do teto.

Lágrimas silenciosas escorreram pelas laterais do meu rosto.

A porta finalmente se abriu naquela noite.

Não era Marco.

Era sua mãe, Letizia Corvini.

Uma mulher elegante, fria, que se importava apenas com uma coisa: poder.

— Samara, minha filha. — Sentou-se ao lado da cama. — Como está se sentindo?

— Viva. — Murmurei.

As sobrancelhas perfeitamente arqueadas dela se uniram.

— Não seja dramática. Você é a futura senhora Corvini.

— Sou mesmo? — Uma risada seca escapou dos meus lábios. — Seu filho parece ter outra candidata em mente.

Um olhar complexo passou pelo rosto dela.

— Marco é jovem. Facilmente distraído por um rosto bonito. — Disse. — Mas o pacto de sangue está assinado. Você é a dama da casa Corvini agora.

Eu a encarei, lembrando do nome que escrevi naquele pacto.

— Letizia, se eu lhe contasse um segredo, você me ajudaria?

Os olhos dela se estreitaram.

— Que tipo de segredo?

— O nome da noiva no pacto de sangue… não é Samara Romano.

A cor sumiu de seu rosto.

— O que está dizendo?

— É Isabella Falcone. — Fitei seus olhos. — Eu mudei antes de assinar.

Letizia prendeu a respiração, entendendo na mesma hora.

Minha família, os Romanos, tinha as chaves da alta sociedade e dos negócios legítimos: os portos, as licenças, as amizades políticas.

Mas os Falcones… eles eram os iguais dos Corvini nas sombras. Uma potência verdadeira.

Uma aliança entre eles não era só uma conquista.

Era a fusão de dois titãs. Um super-império capaz de dominar toda Chicago.

Para uma mulher como Letizia, essa tentação era muito maior do que dilacerar os restos da família Romano, cujo Don acabara de ser enterrado.

— Você… Por que faria isso? — A voz dela tremia.

Mas o brilho nos olhos não era de raiva. Era de ambição.

— Porque eu quero ser livre. — Respondi com clareza. — E você quer mais poder.

Letizia ficou em silêncio por um longo tempo.

Eu quase podia ouvir as engrenagens girando em sua mente, calculando os lucros dessa nova possibilidade.

— Minha filha… — Sua voz caiu para um sussurro conspiratório. — Talvez isso seja destino. Você prestou um grande serviço à família Corvini. Eu vou ajudá-la a desaparecer.

Vendo o olhar triunfante dela, eu tive vontade de rir.

Então lembrei do irmão implacável de Isabella, o verdadeiro herdeiro da fortuna Falcone.

Ele tinha os ativos da família firmemente sob controle.

Na minha vida passada, Isabella passou vinte anos como nada além de um troféu.

A única razão pela qual desejava Marco era o dinheiro dele — sua passagem para compras sem fim.

E Letizia achava que esse casamento lhe daria acesso aos negócios dos Falcone?

Uma fantasia.

Mas nada disso era mais problema meu.

No dia seguinte, sob as ordens de Letizia, deixei a clínica.

Ela providenciou um jato particular e uma mala cheia de dinheiro.

— Para onde vai? — Perguntou.

— Los Angeles. — Respondi. — Vou abrir uma galeria de arte.

Letizia assentiu.

— Bom. Arte é um negócio limpo.

Antes de partir, voltei à propriedade dos Romano pela última vez.

Marco não estava lá. Tinha levado Isabella para algum evento da alta sociedade.

Entrei em seu quarto e coloquei uma cópia do pacto de sangue em sua mesa de cabeceira.

Ao lado, deixei a passagem só de ida para a Sicília.

Em cima do pacto, um bilhete.

Curto e afiado, como a lâmina que ele havia enterrado nas minhas costas.

Marco,

Você conseguiu a noiva que sempre quis. Agora viva com ela.

Quanto a mim, estou livre.

— E.
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