O escritório de Victor Blackwood parecia menor sob a luz do fim da tarde, as sombras alongadas das cortinas cortando o chão de mármore como lâminas silenciosas. Elena Carter segurava a carta de Elias entre os dedos, o papel novo contrastando com a tinta áspera e tortuosa, o peso daquelas palavras “Seu medo é minha vitória” queimando na palma da mão. O ar estava carregado, denso com o cheiro de papel velho e o eco da invasão da noite anterior, mas agora havia algo mais: uma urgência que pulsava entre os três, tão real quanto o brilho intermitente do medalhão no peito de Victor.Ela levantou os olhos verdes, fixando-os em Victor, que estava parado perto da janela, o corpo rígido contra o vidro, os cabelos pretos caindo sobre a testa enquanto encarava a cidade lá embaixo. O silêncio entre eles era uma corda esticada, pronta para romper, e Elena deu um passo à frente, a voz saindo firme mas carregada de uma emoção que não conseguia esconder:— Victor, para de olhar pra fora e fala comig
O carro sacolejava pela estrada tortuosa, o motor tossindo contra o silêncio que pesava como uma névoa dentro do veículo. Elena Carter agarrava o cinto de segurança, os olhos verdes grudados na paisagem que deslizava lá fora, colinas cobertas de capim seco, árvores tortas que pareciam agarrar o céu cinzento com galhos esqueléticos. Victor Blackwood segurava o volante com mãos tensas, os dedos longos cravados no couro rachado, os olhos cinza fixos na estrada enquanto o medalhão balançava contra o peito, pulsando com uma energia que parecia puxá-lo como um ímã. No banco de trás, Damien folheava uma pilha de papéis amarelados, o barulho das páginas virando misturado ao som abafado do vento contra as janelas, os olhos azuis semicerrados enquanto resmungava algo sobre anotações do pai.O medalhão tinha virado o guia desde aquele sussurro no escritório, quente, brilhante, quase vivo contra a pele de Victor, como se soubesse o caminho. Depois de horas remexendo nos cadernos de Damien, encont
— Então foi um erro que virou eterno. Meu pai escreveu sobre isso, um ritual que rachou o mundo. Você ficou preso, e o Elias... ele achou outro jeito de ficar. Essas ruínas são onde tudo começou.Os três avançaram pelas ruínas, o som dos passos ecoando nas pedras quebradas, o ar úmido grudando na pele enquanto o crepúsculo dava lugar à escuridão. O medalhão guiava Victor, o brilho dourado ficando mais forte à medida que chegavam ao centro da igreja – um círculo de colunas tombadas, as sombras dançando como se tivessem vida. Elena parou ao lado dele, os olhos verdes fixos nas marcas escuras no chão, um tom que podia ser sujeira antiga ou algo mais profundo, mais vivo. O lugar parecia pulsar, um eco que batia no peito dela como nos sonhos.Um estalo seco quebrou o silêncio, um galho partindo sob um peso que não era deles. Elena virou a cabeça, os olhos verdes arregalando-se enquanto uma sombra se movia entre as colunas, lenta, deliberada. Victor deu um passo à frente, o medalhão brilhan
Elena Carter nunca acreditou em primeiras impressões. Para ela, eram uma mistura de chute preguiçoso e otimismo ingênuo – alguém olhava para um terno amarrotado ou um sorriso forçado e achava que podia decifrar uma pessoa inteira. Na melhor das hipóteses, uma aposta; na pior, uma cilada para quem lia capas de revista como se fossem evangelho. Mas ali, enquanto o elevador subia lentamente rumo ao trigésimo andar da Blackwood Enterprises, ela sentiu que estava formando uma opinião antes mesmo de pisar no carpete caro. O ar dentro do cubículo metálico cheirava a limpeza obsessiva – álcool, desinfetante e um toque de arrogância corporativa. O silêncio era denso, quebrado apenas pelo zumbido do motor e pelo tamborilar dos dedos dela contra a alça da bolsa, um hábito nervoso que ela nunca conseguira largar. O elevador era uma caixa de aço reluzente, com botões alinhados em uma fileira precisa e um painel digital que piscava os números dos andares com uma lentidão quase provocadora. Elena a
O resto da manhã passou num borrão de tarefas básicas que pareciam desenhadas para testar sua paciência. Configurar o e-mail corporativo foi um exercício de frustração – a senha temporária que Margaret lhe dera ("Blackwood123", criativo demais) exigiu três tentativas até funcionar, e o sistema travou duas vezes antes de carregar. Organizar a agenda de Victor significou decifrar uma série de anotações enviadas por e-mail, algumas com instruções tão vagas que pareciam charadas – "Reunião com R&D, confirmar horário" ou "Ligar para J. Klein, urgente". Responder mensagens foi ainda pior; Margaret jogara uma pilha de papéis e um pendrive em sua mesa com um grunhido que dizia "não me pergunte nada", e Elena passou uma hora separando solicitações banais (como "preciso de mais grampeadores no terceiro andar") de e-mails crípticos que mencionavam Victor com uma reverência quase assustadora – "O Sr. Blackwood saberá o que fazer" ou "Ele já viu isso antes".Por volta das onze, ela já estava com os
Elena acordou na manhã seguinte com o som insistente do despertador, um barulho que parecia mais um grito de guerra do que um convite gentil para começar o dia. A luz cinzenta de março se infiltrava pelas cortinas finas do seu apartamento, projetando sombras tortas nas paredes descascadas. Ela rolou na cama, esticando a mão para silenciar o aparelho, e ficou deitada por um momento, encarando o teto manchado de infiltração. O primeiro dia na Blackwood Enterprises ainda pesava em sua mente como uma névoa densa – Victor Blackwood com seus olhos de aço, Damien Leclerc com seu sorriso provocador, e aquele murmúrio quase inaudível que ela jurava ter ouvido: "Não outra vez." Era ridículo, claro. Provavelmente só cansaço e imaginação demais. Mas, enquanto se levantava e arrastava os pés até o banheiro minúsculo, não conseguia sacudir a sensação de que algo estava fora de lugar. O apartamento era um reflexo da vida dela – pequeno, funcional, mas à beira do caos. A pia da cozinha estava cheia d
— Isso é coincidência ou ele tem um radar pra nos encontrar? — perguntou Elena, forçando um tom leve, mas o coração batendo mais rápido. — Com o Victor, nunca é só coincidência — respondeu Damien, terminando o café com um gole rápido. — Vamos, a reunião é em cinco minutos. Não queremos o chefe eterno bravo com a gente. --- A reunião com a NovaTech foi um teste de resistência. A sala de conferências era uma caixa de vidro e aço no vigésimo andar, com uma mesa longa cercada por cadeiras de couro e uma tela que exibia gráficos coloridos que Elena mal entendia. Victor presidia a mesa, os olhos cinza fixos nos representantes da NovaTech – dois homens de ternos caros e uma mulher de tailleur azul que falava rápido demais sobre "sinergias" e "metas de crescimento". Elena entregou o café preto a Victor, sentindo os dedos dele roçarem os dela por um instante – frios, quase gelados –, e sentou-se ao lado dele, o caderno aberto para anotar tudo. Damien estava do outro lado da mesa, liderando
Elena acordou com o eco do sonho ainda reverberando em sua mente, os olhos cinza da figura sombria fixos nela como se pudessem atravessar o véu entre o sono e a vigília. O quarto estava escuro, o relógio marcando 5h43, e a chuva da noite anterior reduzira-se a um gotejar intermitente contra a janela. Ela ficou deitada por alguns minutos, encarando o teto manchado, tentando convencer-se de que era só um pesadelo – o resultado de um dia longo, fotos antigas e a imaginação que sempre fora seu pior inimigo. Mas o peso no peito não cedia, e o sussurro do seu nome naquela voz grave continuava a ecoar, como se tivesse deixado uma marca invisível. Arrastou-se da cama, os pés tocando o chão frio com um estremecimento, e caminhou até o banheiro, o espelho refletindo uma versão dela que parecia mais pálida do que o normal. Os cabelos castanhos estavam emaranhados, os olhos verdes opacos com o cansaço, e as olheiras mais pronunciadas do que no dia anterior. "Você está ótima, campeã," murmurou par