Maitê Moreli
Edward me proibiu de ir até o meu bairro, mas não falou nada sobre o fato de chamar minha amiga para vir até o hotel onde eu estava. Não foi só a Léa que chamei, também chamei minha madrinha. As duas chegaram juntas e juro que queria me controlar, contar a elas com cautela o que aconteceu comigo nas últimas semanas, no entanto, assim que abri a porta do quarto e elas entraram, abracei minha madrinha, desaguando toda minha angústia em lágrimas. — Calma, filha! O que está havendo? Não me diga que aconteceu o pior com a Norma… — Não conseguia falar, apenas balancei a cabeça em negativo. — Como eu pensei, toda aquela proposta, aquele homem lindo e perfeito, tinha algo errado. Tráfico de mulheres e prostituição. — minha amiga discorreu, convicta. — Acertei? — Não. — respondi assim que tirei a cabeça de cima do ombro da minha madrinha. — Mas você estava certa, Léa, era tudo bom demais, perfeito demais para ser verdade. Caí em uma armadilha. — Está me deixando com medo, filha. Onde está Norma? — a preocupação da minha madrinha era notada em cada palavra dita. — Sendo tratada em um dos melhores hospitais do mundo. Lá foi bem mais fácil encontrar doador e, apesar de eu não estar ao lado dela nesse momento, minha mãe está bem. — Então, o que deu errado? — ela perguntou, olhando nos meus olhos, com o cenho franzido. O quarto era modesto, além da cama, havia apenas uma poltrona de canto. Eu sentei no assento único, enquanto Márcia minha madrinha, e Léa minha amiga, sentaram à beira da cama. — Edward está me chantageando, me envolveu em uma história sórdida e criminosa. — Está bem. Mas o que ele fez? — Léa perguntou, impaciente. — A família Knoefel é bilionária, dona de redes hospitalares espalhadas por toda América, mas, principalmente, nos Estados Unidos. O dono mesmo de todo esse império está em coma há mais de um ano, e é irmão do Edward. — Em coma? Que triste! — minha madrinha se sentiu visivelmente penalizada. — Jovem, riquíssimo, tão ou mais bonito que o Edward, e um vegetal. — eu disse, soltando um longo suspiro. — Mas em que essa história te afeta? Já que disse que a tia está no melhor hospital, e Edward é de fato rico… — Edward é um canalha, Léa. Ele nos deu casa, dinheiro e pôs a minha mãe no melhor hospital, me fazendo assinar uma dívida astronômica como uma idiota. Então, quando apareceu um doador compatível, ele disse que a dívida deveria ser paga. Ele disse saber que eu não tinha dinheiro, então deveria fazer tudo o que ele mandasse. Era isso ou cadeia. Prontamente, eu disse: “me mande para a cadeia, mas não entrarei no seu jogo sujo”. — Do que estamos falando, filha? Em qual jogo sujo ele quis te envolver? — Ele não só quis, ele me envolveu! Estou casada há dois anos com o Hunter Knoefel. Edward subornou o notário de algum cartório de Guadalajara para fazer esse casamento com data retroativa, e em uma época que eu nem conhecia o Edward, muito menos esse tal Hunter. — Mas o que ele quer, te casando com um homem em coma? — minha madrinha perguntou. — Ah, tia Márcia, a senhora não se tocou? — Léa respondeu na minha frente. — É óbvio que ele quer ficar com a fortuna do moribundo através da Maitê. — Mas se ele é tão inescrupuloso, era melhor desligar os aparelhos do irmão. — minha madrinha corroborou. — Pelo que eu entendi, no testamento do Hunter está escrito que, se ele não deixar esposa e filhos, toda a sua fortuna vai para a caridade, em prol da ciência e da medicina. — Você aceitou fazer parte dessa farsa para não ir para a cadeia… é compreensível. — mesmo dizendo compreender, Márcia disse com os olhos arregalados. — Claro que não, madrinha. Assim que minha mãe estiver livre de perigo, irei me entregar à justiça mexicana. Eu participei porque ele ameaçou a vida da minha mãe, estava tudo certo para ela ser transplantada; ou eu assinava ou ele mandava parar o procedimento. — Que barra, amiga. — Léa disse com pesar. — Você estava caidinha por ele. Lindo, rico e cavalheiro. — Lindo ele é, rico ele é, mas é um monstro, e qualquer sentimento positivo que eu tive por Edward Knoefel, se transformou em raiva! — falei entredentes. — Vamos até o consulado, à polícia federal, contar tudo e pedir ajuda. Tem que se livrar disso e tirar Norma das garras desse infeliz. — disse Márcia. — Não posso, madrinha. Se eu fizer isso, minha mãe morre. Assim que ela estiver recuperada e em terras mexicanas, me entregarei à polícia. — As autoridades hão de tomar uma atitude! — esbravejou sua inocência — Algum direito havemos de ter, não é possível! — Tia, mesmo que a PF nos dê a devida atenção, acha mesmo que os EUA daria? — Léa, como sempre, bancou a realista. — Estamos falando de um homem bilionário e poderoso. Para eles, somos imigrantes, e já totalmente errados. — O que fazemos, então? — perguntou Márcia. — Vou seguir meu plano, madrinha, salvar minha mãe, e na primeira oportunidade, fujo com ela para o México, ou vou até o consulado e me entrego à polícia. — Como irei ficar aqui, sem saber se vocês estão bem? — minha madrinha balbuciou em um fio de voz, elevando as mãos até a cabeça, demonstrando o seu total desespero. — Tia, é angustiante, mas a May está certa. Além do mais, pelo que entendi, ela ficará no controle do dinheiro desse homem, não é isso? — Léa falou, olhando para Márcia, depois para mim. — Legalmente, sim. — respondi. — Então, isso é uma carta de sobrevivência para a May e a tia Norma. — Não te chamei aqui para preocupar a senhora. Mas entendo que é quase impossível não ferver a cabeça com essa situação. Vai ficar tudo bem. — eu tentava consolá-la, quando nem eu mesma podia me consolar. Tentando diminuir o impacto de tudo o que contei a elas, mostrei as fotos do local onde minha mãe estava sendo atendida, ao menos isso animou um pouco a madrinha. Todo o sacrifício teria uma compensação, se a salvasse dessa maldita doença. (...) Quando elas foram embora, tive vontade de ter outra crise de choro, contudo, me segurei. Não queria aumentar ainda mais a preocupação da minha madrinha. Não deveria ter falado nada disso a ela. No entanto, se não dividisse esse peso com alguém, eu facilmente explodiria. À noite, passando um pouco das 21h, o demônio que habitava a minha vida chegou, ceifando qualquer tipo de paz que eu tivesse obtido com a presença da minha madrinha e da Léa. Assim que entrou no quarto, mal fechei a porta e Edward colocou uma de suas mãos em meu pescoço, pressionando meu corpo contra a parede. — O que falou para sua madrinha e a outra mulher que veio aqui? — suas palavras foram cuspidas com ódio, contra minha face. Como ele sabia disso? Essa era a pergunta na minha cabeça. Edward tinha algum cúmplice no México e o mandou me seguir, seria a explicação mais óbvia. — Na… nada, não disse nada. — gaguejei. — Só quis abraçar a minha madrinha e conversar com minha amiga. A mão que não prendia o meu pescoço, tinha o dedo em riste em direção à minha face. — Não mente para mim, May, não tente me pregar uma peça, ou sua adorável mamãe que vai sofrer as consequências. — Para de me ameaçar usando a minha mãe! — empurrei a mão que ele já afrouxava do meu pescoço e o enfrentei cara a cara. — Eu amo minha mãe, e você o dinheiro, se algo acontecer a ela, também acontecerá com a herança que tanto almeja. — NUNCA MAIS ME AMEACE! — gritou, erguendo a mão e, mesmo tentando desviar rápido demais para me defender, sabia o que Edward faria. A bofetada foi com as costas da mão, senti meu rosto inchar assim que caí no chão com o impacto da pancada e o que me deu mais raiva foi que chorei. Meu choro não era pela dor do impacto do golpe e, sim, pela humilhação da situação em que me encontrava. Com a voz amável, ele se agachou ao meu lado, onde eu estava caída. — Desculpa, amor. Está vendo o que me fez fazer? Quero que você tenha uma vida de rainha, poder dar o melhor a você e a Norma. — tentou acariciar meu rosto, mas fugi do seu toque. — Não quero nada disso! A única coisas que quero é que, quando você conseguir esse dinheiro, me deixe em paz. — Porquê, se nos amamos? — ele iniciou pequenos beijos pelo meu ombro e foi subindo pela curva do meu pescoço, me causando náuseas. — Não sabe o que é esse sentimento generoso. Não ama ninguém além de si mesmo e já lhe disse. O sentimento que um dia tive por você, se transformou em asco! — o olhei com raiva. — Asco, é? Eu imagino. — discorreu, presunçoso, enquanto tentava me beijar, mesmo eu estando com a boca fechada. Me desvencilhei e levantei do chão. — Quero voltar logo para os EUA, minha mãe precisa de mim. — Voltaremos em poucos dias, me empresta seu telefone? O meu aparelho achou de dar problema no caminho para cá. Com ódio daquele homem, joguei o aparelho em seu colo. — Agora, por favor, sai do meu quarto! — gritei. — Eu achei que hoje seria o nosso dia, finalmente nossa lua de mel. — disse com malícia. — Já te disse: sexo comigo só por amor, e depois do casamento. Não te amo e não me casei com você para ter lua de mel contigo. Me casei com Hunter Knoefel. Eu sabia que ele ficaria com ainda mais raiva ao ouvir aquilo. E era essa a minha intenção. Só queria distância desse homem asqueroso.