AIYANA
—Eu vou com eles.— disse, observando Max conversar com minha vó,eles estão na margem do rio e minha vó parece irritada. Icarus me encarou e arqueou uma sobrancelha, ele estava silencioso desde que me encontrou com Maxim mais cedo, ele também parecia irritado e estava com um péssimo humor. —O quê?
— Pare de ficar atrás dele como um maldito cachorrinho. — ele rosnou, jogando pedaços de madeira que pegamos na floresta no chão, bem próximo dos meus pés. O que, é claro,me fez pular e gritar.
—Ei! — retruquei, me afastando um passo. — Qual o seu problema?
Icarus se aproximou, os olhos queimando em âmbar, como se uma tempestade estivesse por trás deles. Ele parecia prestes a explodir, e por um segundo, achei qu
AIYANAO céu já começava a perder a cor, tingido por um dourado opaco que logo se dissolveria no azul escuro da noite. As sombras se arrastavam pelas árvores, e o som distante do rio ajudava a manter meu foco enquanto eu deslizava a lâmina da faca pela pedra de amolar, com movimentos lentos e cuidadosos.Uma das três. A de caça. As outras duas já estavam no lugar, uma presa no interior da minha bota esquerda, a outra, no cós da calça, na parte de trás.Senti o olhar dele antes mesmo de ouvir a voz.— Você não devia ir com ele.Icarus estava de pé a poucos passos, os braços cruzados sobre o peito e aquele cenho franzido que ele achava que escondia o que sentia. Não escondia.Levantei o
AIYANAMordi o lábio inferior, encarando o cenário à frente.— Precisamos entrar nas casas. Ver se tem algo que conseguimos usar. Comida, água, roupas limpas e armas. — falei, soltando seu braço devagar.Max assentiu, firme, mas não se mexeu de imediato. Ele olhou mais uma vez para o espaço vazio onde o corpo do pai estivera. Eu podia sentir a pergunta queimando nele: o que eles fizeram com ele?Eu também queria saber.Mas agora… agora era sobreviver primeiro.— Vamos. — murmurei, começando a andar em direção à antiga casa dos Roffman.
AIYANAMeus dedos tremeram quando a puxei para fora.Dentro, havia apenas duas coisas.Uma foto, minha mãe sorrindo com uma linda barriga de grávida, os olhos tão vivos que pareciam me seguir e o colar que ela deixou para mim. Um pingente em formato de lua crescente, pequeno, mas meu maior tesouro.Peguei a foto com cuidado, como se o papel antigo pudesse desmanchar sob meus dedos. Por um instante, tudo ao meu redor sumiu. Eu só via ela. O brilho nos olhos, o cabelo solto dançando ao vento. Ela parecia tão viva naquela imagem que meu peito doeu.Depois, peguei o colar e o coloquei no pescoço com um cuidado quase cerimonial. Quando ele repousou sobre minha pele, algo dentro de m
AIYANAA floresta parecia suspeita à medida que nos aproximávamos do refúgio. O ar estava carregado com algo que eu não conseguia definir, como se a própria terra estivesse segurando a respiração, esperando por algo.Maxim andava ao meu lado, os passos ritmados, mas com a expressão tensa, e o silêncio entre nós parecia ainda mais desconfortável do que as palavras que não trocamos antes. A noite, agora completamente escura, engolia tudo ao redor, e apenas a luz da lua filtrava-se pelas copas das árvores, como um farol que nos guiava para o desconhecido.A tensão estava alta. A perda de Azz ainda pairava sobre nós, deixamos seu pequeno corpo no santuário. Alyssa, embora tentando se manter firme, estava quebrada por dentro. Seu olhar se perdia, sua mão tremia enquanto segurava a do irmão de Azz. Eu sabia o quanto ela se apegara aos dois meninos, e a dor estava estampada em seu rosto. A tristeza não era algo que poderia ser escondido.Chegamos a clareira, onde as árvores se abriam, forma
AIYANASaímos antes do amanhecer. A neblina ainda beijava o asfalto quando o refúgio ficou para trás, engolido pela escuridão cinzenta da floresta. Três carros, mas com um mesmo destino: a aldeia dos Sámi. Ou, como os mais antigos ainda sussurram, os selvagens.— Nervosa? — ele perguntou sem tirar os olhos da estrada.Dei-lhe meu melhor olhar de cadela relaxada, mas tenho certeza que pareceu mais com um cachorro carente.— Você não está? — murmurei, encostando a cabeça no vidro gelado.No banco de trás, Alyssa cochilava, o garotinho dormia encolhido como um filhote.Max, Isabela, Birguit e o adolescente, Caleb, esse &eac
AIYANAA caminhada até a aldeia não foi longa, mas cada passo parecia mais difícil ignorar a sensação no meu peito. As árvores se tornavam mais densas, o ar mais frio, e não era só o clima. Era como se estivéssemos atravessando uma membrana invisível.Quando chegamos, percebi de imediato que não era como nenhuma aldeia que eu já tinha visto.As casas eram pequenas, feitas de madeira bruta e barro endurecido, mas tudo ali parecia... vivo. Amuletos de osso pendiam das portas. Tiras de couro trançado balançavam ao vento, adornadas com penas, pedras e dentes de animais. Cada detalhe tinha significado. As roupas dos Sámi não eram como as nossas, eles usavam túnicas compridas, tingidas de azul, vermelho, branco e amarelo. As bordas eram bordadas à mão com símbolos antigos que eu não reconhecia.Eles nos separaram. Fui trancada com minha avó, Max e Icarus em uma sala estreita, sem janelas. As paredes cheiravam a terra e fumaça. Eu tentei argumentar, explicar que estávamos ali em paz, mas eles
AIYANAO cheiro da carne assada misturava-se ao aroma forte e adocicado do charuto de Tuuri, preenchendo o interior da cabana com uma névoa que deixava o ar reconfortante.Sentados ao redor de uma velha mesa de madeira marcada pelo tempo, eu, Max, Icarus e vovó Aldrich dividíamos a refeição como velhos camaradas... ou, pelo menos, tentávamos.Tuuri nos observava do outro lado da fumaça, com aquele olhar brilhante e insano de quem sabia mais do que dizia. Se este lugar fosse uma versão do País das Maravilhas, Tuuri seria uma mistura caótica do Chapeleiro Maluco com a Lagarta. A diferença é que aqui ninguém oferecia chá. Enquanto mastigava um pedaço suculento de carne, notei Kamari, a segunda filha mais velha de Tuuri se movendo pelo pequeno espaço. Ela parecia mais deslizar do que andar, tão silenciosa quanto a fumaça que dançava acima da cabeça de Tuuri. Os cabelos negros dela desciam até a cintura como uma cascata escura, a pele morena brilhava, e os olhos, grandes e arredondados, p
AIYANAO cheiro de musgo queimado e ervas secas impregnava o ar dentro da tenda de Tuuri.O calor das brasas nos aquecia, mas não era suficiente para afastar o calafrio que corria pela minha espinha.— Vocês... são companheiros.Pisquei, esperando que ele estivesse se referindo a algo simbólico como aliados, sobreviventes, qualquer coisa. Mas quando vi os ombros tensos de Maxim e o jeito como Icarus desviou o olhar, soube que era aquilo mesmo.— Relaxem, filhotes — Tuuri continuou, com um sorriso enviesado. — Dá pra ver a corda puxando vocês pra ela...Ele apontou para mim com dois dedos pesados, como se aquilo fosse a coisa mais óbvia do mundo. E talvez fo