Os dias se passaram, e Matthew cercava cada vez mais Julia, aproveitando-se de cada oportunidade.
Era sutil quando havia plateia, mas, a sós, avançava feito uma raposa — astuto, cauteloso, frio. Quem percebia suas ações acabava enganado por ele. Era muito bom de lábia.— Matthew, não acha que está avançando demais? Julia não está bem, tá claro como água, e você não desgruda, vive em cima. — disse Allan, certa vez.— E você prefere que ela fique sozinha, mergulhada em culpa e pensamentos ruins? — respondeu Matthew. — Olha, cara, eu gosto dela. Nunca passei por algo assim. Eu também gostava da Lin... eu não sei lidar com isso, e juntos esquecemos um pouco de tudo.— Mas não é o que parece. Você age como se quisesse ela só pra você. Parece que quer afastá-la de todo mundo. Isso também não é bom. A Julia tem várias pessoas que a amam e querem o bem dela.— Allan, eu sei o quanto você se preocupa com ela. Mas ela me procura. Se ela não está buscandDe pazes feitas, tudo foi voltando ao normal.O ano letivo já estava acabando, as provas finais haviam sido feitas, e agora restava apenas aguardar o resultado — todos ansiosos. Matthew já ia se formar, enquanto Otto, Julia e Allan teriam que esperar mais um ano.— Você vai me acompanhar na minha formatura, né? — perguntou Matthew a Julia.— Claro! — respondeu animada. — Até porque alguém tem que fazer companhia ao Otto — apontou para ele, rindo.— Bom saber que lhe causo compaixão — respondeu Otto, com um leve sorriso sarcástico.Julia e Otto continuaram se alfinetando, enquanto Matthew os observava de cara fechada."Sempre o Otto."Pensamentos amargos surgiam, mas foram quebrados pelo abraço inesperado que Julia lhe deu.— Desamarra essa cara, você sabe que passou — disse, achando que a preocupação era com as notas.— Desculpe... eu realmente estou preocupado — mentiu ele.— Vamos dar uma volta? Você precisa relaxar — sugeriu ela.— Boa ideia. Você vem, Otto?— Não, não. Mas valeu —
Grace saiu da casa com passos firmes. Logo atrás vinha Otto, que conseguiu ultrapassá-la, chegando ao carro e abrindo a porta para que ela entrasse.Julia ainda chorava, e Patrícia, assustada, não sabia mais o que fazer. Melhor mesmo era colocar a menina no carro e seguirem para casa.O trajeto foi marcado por um silêncio que gritava melancolia e ira.Já passava das 20h quando chegaram à residência dos Evans. Ao descerem do carro, Matthew os viu da janela. Olhou para o relógio — já havia passado da hora do encontro — e se enfureceu.— Nem mesmo uma ligação ela fez... — murmurou, irritado.Continuou observando da janela até que todos sumissem de vista. Em seguida, saiu do quarto e foi para a sala beber alguma coisa enquanto tentava organizar os pensamentos.O grupo entrou na casa e seguiu direto para a cozinha, onde Otto foi preparar um chá. As três mulheres se sentaram em silêncio.— Ok, vocês agora estão em um ambiente tranquilo
O dia seguinte chegou rápido. Otto se levantou, se arrumou e foi até o quarto de Julia. Bateu na porta, esperou alguns segundos e entrou, abrindo-a com cuidado. Sentou-se na ponta da cama, puxou um pouco o lençol e afastou os cabelos que cobriam o rosto dela — inchado de tanto chorar.Otto respirou com pesar. Fez um carinho em seu ombro, tentando acordá-la. Foi um pouco difícil, mas ela finalmente abriu os olhos e o fitou, revelando todo o tormento que a consumia.Otto podia sentir os sentimentos dela, cada vez mais intensos. Sentia-se envolto por uma nuvem de infortúnio, revelada naquele olhar pesado. Colocou a mão em seu rosto — um gesto de carinho que fez uma lágrima escorrer. Julia respirou profundamente, como se cada parte do corpo doesse. Virou-se para o lado e soluçou.— Vou pegar nossos resultados, não se preocupe.Subiu o lençol até a altura em que estava antes de tocá-la e saiu do quarto em silêncio.Foi para a faculdade a pé. E
Julia comeu mais do que Otto esperava. "Com certeza é ansiedade"Pensou, enquanto a observava comer.— Acho que comi demais — confessou.— Tu jura?! — riu Otto. — Vai, me dá isso aqui.Otto tomou das mãos de Julia o prato com o sanduíche que ainda restava, além do que ela segurava na outra mão. Ela estava totalmente saciada. Deitou-se na cama e ficou ali, olhando para o teto.— Que foi? — perguntou Otto.— Não consigo tirar o que ela falou da cabeça.— Sai dessa — interrompeu.— E se ela tiver certa?— Olha, eu sei que toda essa situação é uma merda, ninguém sabe o que fazer, mas te acusar passa de todos os limites, independente da dor dela.— Mas, Otto...— Julia, por favor, não entra nessa, por favor.Ele se levantou, colocou tudo sobre a penteadeira e voltou para a cama.— Culpa de quê você teria nessa história toda, hã?— Mas... — as respostas não vinham.— Me diz, estou esperando.— Ela acha que sou culpada porque a Lin me levou para sair. Ela planejou isso desde que cheguei, qu
Grace, Daniel e Patrícia decidiram fazer um churrasco no quintal de casa. Foram ao mercado e, em seguida, arrumaram a mesa no jardim. Queriam algo simples, apenas para os mais próximos, então chamaram Matthew e o pai dele. Tudo o que desejavam era um momento familiar e leve.Seus filhos haviam passado para o último ano da faculdade. Julia e Grace estavam sendo acolhidas com carinho pela família, e a sensação era de que, finalmente, tudo caminhava para o lugar certo.Por volta das 19 horas, Matthew e o pai chegaram. A mesa no quintal ainda estava sendo finalizada, então eles se ofereceram para ajudar.No quarto, Julia acordou antes de Otto e começou a se arrumar. Após o banho, vestiu roupas leves: shorts jeans, camiseta e chinelo compunham o visual. De frente ao espelho da penteadeira, observou o próprio rosto. Os olhos marcados por olheiras pesavam suas feições.“Essa não sou eu.”O pensamento veio como um sussurro amargo, e ela se entristeceu.Pegou a escova e começou a pentear os ca
Conversas leves e risos fizeram parte da noite.Otto e Matthew ainda estavam distantes, mas mantinham a cordialidade. Julia se sentou entre a mãe e o pai de Otto, que ficaram o tempo todo a fazendo rir.A comida estava boa, a conversa também, mas havia algo a ser dito. Aquilo não era somente uma reunião para comemorar Matthew ter finalizado a faculdade, ou Otto e Julia estarem no último ano. Tinha algo a mais.— Meninos, precisamos contar algo — começou Edward, pai de Matthew. — O julgamento foi marcado e é necessário que vocês testemunhem.Fez-se um silêncio. Os três se olharam, surpresos. Ninguém esperava por tal notícia. O clima ficou tenso; eles não sabiam o que dizer.— Eu sei que é difícil — continuou Edward —, Mas precisamos de toda a ajuda possível para que o desgraçado continue na cadeia.— O que eu tenho que fazer? — perguntou Julia, decidida.— Julia... — Otto e Matthew falaram ao mesmo tempo, com a mesma tonalidad
A semana passou tranquila. Matthew e o pai foram visitar Nancy, que ainda iria passar um bom tempo longe de casa. A visita animou bastante ela — Matthew estava simpático, mostrava preocupação e até mesmo carinho. Apesar de tudo, realmente amava sua mãe, mesmo que fosse de uma forma um tanto distorcida.Edward mostrou apoio, mas estava com os papéis do divórcio em mãos. Nancy não esboçou nenhuma reação, já esperava por isso. Matthew se levantou ao ver a cena e se afastou um pouco, deixando os dois a sós. Foi algo rápido e amigável: os dois concordaram que seria melhor a separação. Nancy ficaria ali por mais alguns dias e depois viajaria para visitar as irmãs.Edward a fez lembrar de quão distante da família estava, de quantos amigos tinha por aí. Dinheiro não seria problema — garantiu que Matthew estaria bem e que já era adulto, não havia motivo para se preocupar. Assinaram os papéis e se abraçaram. A paz estava selada.Levantaram e foram em direção a Matthew, que estava sentado em um
Foi um ano longo, marcado por inúmeras situações complicadas. A perda de Lin, o apartamento que simplesmente empacou na venda, as brigas familiares, as acusações, o emprego perdido, a saída de casa em meio ao caos. Tudo isso em apenas um ano. Foi uma jornada dura, em que algumas vitórias fizeram toda a diferença.A amizade entre as Green e os Evans trouxe uma luz no fim do túnel. As Green tiveram forças renovadas e puderam catar os caquinhos. Já os Evans ganharam duas grandes amigas — pessoas de confiança, que trouxeram algo novo para a família.Grace, que havia perdido o emprego no supermercado, agora trabalhava na clínica como atendente. Após uma briga com a cunhada, Ivone, saiu da casa dela e cortou totalmente o contato. Desde então, ela e a filha moravam na residência dos Evans. Mesmo tendo uma casa aos fundos destinada a hóspedes, eles insistiram que ficassem na casa principal. Tornaram-se, de fato, membros da família Evans.Patrícia sempre foi uma mulher comunicativa, com facili