Após defender sua mãe de um padrasto abusivo, Sophia Martins é expulsa de casa e se vê dançando em um clube de striptease para sobreviver. Dois anos depois, ela anseia por uma vida melhor e, com a ajuda de amigos, consegue um emprego como babá na casa do devastado viúvo Philippo Constantinova. Entre conquistar o amor das crianças e enfrentar uma noiva interesseira, Sophia e Philippo começam a se aproximar. No entanto, o passado de Sofia ameaça destruir o futuro que ela sonha construir.
Ler maisSophia Martins / Maria Laura Santos
Sempre soube que o inferno existia. Desde criança, sentia sua presença. A cada passo que meu padrasto dava pela casa, cada vez que ele elevava a voz, sabia que estava lá, à espreita, pronto para me engolir. Era como se o ar ficasse mais denso, mais difícil de respirar. Não havia fuga, não havia como escapar. O inferno estava em cada cômodo, em cada sombra, no olhar ameaçador dele. Tinha doze anos quando minha mãe se casou com ele. No início, ele parecia ser um homem bom, trabalhador e amoroso. Mas logo, a máscara caiu. O álcool começou a fluir em nossa casa como água, e com ele, a violência. Era sempre a mesma coisa: ele chegava em casa tarde, bêbado, procurando uma desculpa para descontar sua frustração. Minha mãe se tornava seu saco de pancadas, e eu, impotente, assistia tudo escondida atrás da porta do meu quarto. Certa noite, as coisas pioraram. Estava na sala, fazendo minha lição de casa, quando ouvi os gritos. Minha mãe implorava para que ele parasse, mas os sons dos golpes só aumentavam. Corri até o quarto deles e o vi, de pé sobre ela, levantando o punho para mais um golpe. Sem pensar, me atirei sobre ele, tentando empurrá-lo para longe. Ele me olhou com olhos vermelhos de ódio e, sem hesitar, me deu um tapa tão forte que vi estrelas. — Não se meta, sua vadiazinha — ele gritou, e o som da sua voz ecoou pelos corredores da casa. Depois daquela noite, eu sabia que precisava proteger minha mãe, mesmo que isso significasse me colocar em perigo. Mas a cada intervenção, as coisas só pioravam. Ele passou a me odiar tanto quanto odiava minha mãe. As surras que ele dava nela se tornaram rotina para mim também. E cada marca, cada hematoma, me lembrava da minha impotência. Foi numa noite de inverno que tudo mudou. O frio era cortante, mas dentro de casa, o calor do ódio dele queimava mais. Estava na cozinha, preparando um chá para minha mãe, quando ouvi o som familiar da porta sendo arrombada. Ele estava mais bêbado do que nunca. Tropeçou até a sala, gritando por minha mãe. Quando ele a encontrou, puxou-a pelo cabelo, arrastando-a pelo chão. Corri até eles, tentando intervir mais uma vez. — Solte-a! — Gritei, minha voz trêmula, mas cheia de determinação. Ele se virou, seus olhos cheios de uma raiva incontrolável. — Você não aprende, não é? — ele rosnou, avançando para mim. Sabia que não tinha chance contra ele, mas não podia ficar parada. Ele levantou a mão para me bater, e foi nesse momento que eu peguei a faca que estava no balcão da cozinha. — Pare! — Gritei novamente, segurando a faca entre nós. — Se você tocar nela de novo, eu juro que vou te matar. Ele riu. Uma risada que reverberou nas paredes da casa, cheia de desprezo. — Você? Uma garotinha? Você não tem coragem. Mas naquele momento, eu tinha. Não sei de onde veio a força, talvez do desespero, talvez do amor incondicional que sentia por minha mãe. Mas quando ele avançou novamente, eu fechei os olhos e golpeei. Senti a faca penetrar sua carne, um som úmido e horrível. Quando abri os olhos, ele estava parado, olhando para mim com surpresa. Depois, ele caiu no chão, gemendo de dor. Minha mãe gritou, não de dor, mas de medo. Ela correu até ele, tentando estancar o sangue com as mãos trêmulas. — O que você fez, Sofia? — ela chorava, mas eu não conseguia responder. Tudo parecia um borrão. A polícia chegou pouco depois, chamados pelos vizinhos que ouviram os gritos. Fui levada para a delegacia, interrogada por horas. Minha mãe tentou explicar que foi em legítima defesa, mas as autoridades não estavam convencidas, e no final ela acabou ficando ao lado do meu padrasto como sempre acontece nesses casos. Foi uma batalha longa, mas no final, fui liberada com a condição de ficar longe da minha mãe até que tudo fosse resolvido. E foi assim que comecei a vagar sem rumo, procurando um lugar onde pudesse reconstruir minha vida. Acabei em São Paulo, uma cidade grande onde pensei que poderia me esconder do passado. Mas a vida não foi fácil. Sem dinheiro, sem família, sem ninguém para me apoiar, encontrei refúgio em um clube de striptease. No início, parecia uma saída rápida e fácil. Dinheiro fácil, sem perguntas, sem julgamentos. Mas logo percebi que estava trocando um inferno por outro. Os homens que vinham ao clube eram diferentes do meu padrasto, mas os olhares eram os mesmos. Cheios de desejo, de posse, como se eu fosse um objeto a ser usado e descartado. E mais uma vez, me vi presa, lutando para sobreviver, para encontrar uma maneira de escapar. Foi lá que conheci Letícia, uma das dançarinas. Ela se tornou minha melhor amiga, minha confidente. Foi ela quem viu em mim algo mais do que uma simples stripper. — Você merece mais, Sophia — ela me dizia constantemente. — Você é forte, inteligente. Pode ter uma vida melhor. Com sua ajuda e a do João, o ex-namorado hacker dela, falsifiquei meus documentos para conseguir um emprego decente. E foi assim que acabei na mansão de Philippo Constantinova, um homem quebrado pela perda da esposa, que precisava de alguém para cuidar de suas filhas. Acabei mudando meu nome, meu cabelo, minha personalidade e minhas vestimentas, tudo para poder se encaixar naquele mundo que claramente não era o meu. Eles precisavam urgentemente de uma babá e eu precisava desesperadamente de um recomeço, juntar uma boa grana e pagar Mauro o dono da “casa de show”, que estava doido para me fazer vender o meu corpo, uma das coisas que sempre jurei não fazer, hoje era o dia da seletiva, então aqui estou na porta da mansão encarando uma fila gigantesca e torcendo para que tudo dê certo.Sophia Martins ConstantinovaDez anos se passaram desde aquele dia inesquecível no hospital, e nossa vida tomou rumos que eu mal podia imaginar. Me formei em medicina e, com muito esforço e dedicação, consegui abrir minha própria clínica pediátrica. Sempre quis trabalhar com crianças, e ajudar os pequenos a se manterem saudáveis e felizes era uma das minhas maiores realizações. Estava no meu escritório, finalizando alguns relatórios, quando ouvi o som familiar de risadas e passos apressados vindo do corredor.Olhei para a porta e vi Phillippo entrando com as meninas. Era sempre uma alegria vê-los, e não importava quantos anos passassem, meu coração sempre se enchia de amor ao vê-los juntos. Maria Alice e Rosamaria, como de costume, estavam discutindo sobre alguma coisa trivial, provavelmente algo que fizeram na escola ou espaço no sofá, enquanto Beatriz estava animada, falando sem parar sobre sua viagem pela Europa com o namorado, o que não estava deixando Phillippo nada feliz. Lara,
Phillippo ConstantinovaAssim que o médico saiu da sala de parto, senti meu coração disparar. Levantei-me de imediato, indo em sua direção, ainda com o pavor estampado no rosto. Ele parecia calmo, mas eu precisava de respostas. O que aconteceu lá dentro? Como estavam Sophia e o bebê? A angústia me consumia, e tudo o que eu conseguia pensar era em como minha vida poderia mudar completamente dependendo das palavras que ele diria a seguir.— Doutor, o que aconteceu? — Perguntei, tentando manter a calma, mas com a voz trêmula. — Como estão Sophia e o bebê?O médico olhou para mim com um sorriso sereno e reconfortante. — Ambas estão muito bem, senhor Constantinova. — Disse ele, com um tom tranquilizador. — O cordão umbilical estava enrolado no pescoço do bebê, mas conseguimos resolver a situação sem complicações. Sua esposa foi incrível, e sua filha está saudável.As palavras dele foram como uma onda de alívio que me inundou. Senti meu corpo relaxar, a tensão que se acumulava nos meus omb
A sala de parto estava iluminada, cada detalhe nítido demais para os meus olhos nervosos. O som dos monitores e a respiração rápida de Sophia preenchiam o ambiente. Eu estava ao seu lado, segurando sua mão com força, sentindo o suor frio escorrer pelas minhas costas. Tentei manter minha voz calma e encorajadora, mas meu coração estava disparado.— Você está indo muito bem, amor. — Murmurei, tentando sorrir.Ela me olhou com uma mistura de dor e determinação, apertando minha mão com mais força enquanto uma nova contração a atingia. O médico e as enfermeiras estavam concentrados em seu trabalho, dando instruções a Sophia.— Continue, Sophia, você está indo muito bem. — Disse o médico, sua voz calma, mas firme.Então, de repente, a expressão do médico mudou. Ele franziu a testa, olhando atentamente para o monitor e depois para Sophia. O ambiente, que já estava tenso, ficou ainda mais carregado.— Pare de fazer força, Sophia. — Disse o médico, sua voz agora mais urgente. — O cordão umbili
Sophia Constantinova Os meses se passaram na velocidade da luz, e minha gestação já estava bem avançada. Na verdade, a qualquer momento poderia dar à luz. Phillippo estava louco, não me deixando fazer nada além de cuidar das nossas pequenas. Às vezes, sua preocupação excessiva me estressava e isso me irritava profundamente. Meus hormônios estavam uma loucura, mas, para sua defesa, ele estava sendo muito paciente.Hoje demorou até conseguir uma boa posição para dormir, comecei a sentir uma leve dor na parte inferior das costas. Tentei ignorar, achando que era apenas mais um desconforto normal da gravidez. Mas à medida que os minutos passavam, a dor começou a se intensificar e a se espalhar para a barriga. Olhei para Phillippo, que já estava dormindo e decidi que não podia mais ignorar.— Phillippo... — Chamei, tentando manter a calma. — Acho que está na hora.Ele abriu os olhos imediatamente, seu semblante passando de sonolento a alerta em questão de segundos.— O quê? Agora? — Ele pe
Phillippo Constantinova Me sentei na beira da cama, observando Sophia dormir tranquilamente. Sua respiração era suave e regular, um som que sempre me acalmou. Ela estava tão bonita, tão em paz. Meu coração estava cheio de amor e, ao mesmo tempo, um medo profundo me invadia.Me levantei devagar, tentando não fazer barulho para não acordá-la, e fui para a varanda. O ar fresco da noite me envolveu, e me sentei em uma das cadeiras, olhando para o céu estrelado. A felicidade que senti ao descobrir que seríamos pais novamente foi rapidamente sobreposta por uma onda de preocupação.Meu olhar se perdeu nas estrelas, e comecei a refletir sobre tudo o que tínhamos passado. Sophia havia sido minha rocha, meu porto seguro. Ela trouxe luz para minha vida de uma forma que nunca imaginei ser possível. Mas a ideia de ter outro filho também trouxe à tona um medo que eu nunca admitiria em voz alta: a possibilidade de perdê-la.Não conseguia evitar lembrar dos relatos sobre complicações na gravidez e d
A noite de natal foi bem animada e no final da noite estávamos exaustos mais felizes, minha amiga bebeu bastante e disse que iria dormir levando João consigo, as meninas estavam a todo vapor e eu sabia que elas não iriam dormir nem tão cedo.— Essas meninas não vão dormir? — Phillippo perguntou sentando ao meu lado com o semblante exausto. — Pelo visto não mesmo, a única que em breve deve dormir é Beatriz que está agindo como uma boa pré-adolescente. Olhei para que mexia em seu celular com cara de tédio e brigava com as irmãs. — Em breve ela vai fazer 14 anos, não estou preparado para isso. — Phih olhou para a filha mais velha com carinho. — Você não pode desejar que ela fique pequena para sempre. Se está assim agora, imagina quando ela começar a namorar? — Ele logo fechou a cara e me encarou. — Não fala isso nem brincando. Minha filha ainda é pequena para pensar nisso. — Olhei para ele e prendi o riso, mal sabe ele que a sua princesinha já deu o primeiro beijo e não foi agora.
Último capítulo