####CAPÍTULO 5

Ele releu o bilhete uma última vez, como se as palavras pudessem mudar se ele insistisse.

“As gêmeas são suas…

…não posso ter meu nome ligado a elas…

…cuide das SUAS FILHAS.”

A caligrafia de Sabina queimava como ferro quente.

Ele fechou os olhos por um segundo, respirou fundo e soltou o papel devagar, sentindo o peso da criança nos braços ganhar outro significado.

Quando ergueu o olhar, encontrou a jovem parada à sua frente, ainda ofegante, ainda tensa, ainda segurando a outra bebê como se o mundo pudesse roubá-la a qualquer momento.

Damian a encarou com mais atenção.

— É a segunda vez que eu me encontro com você — disse, a voz rouca. — E nas duas… em momentos nada agradáveis.

Os olhos de Yasmin se arregalaram, confusa, até que o reconhecimento surgiu.

— O senhor… é o homem do carro — murmurou, corando. — O que eu ofereci rosas no semáforo.

Ele assentiu, sem desviar o olhar.

— Me diga o seu nome.

Ela ajeitou melhor a bebê nos braços antes de responder:

— Yasmin, senhor. Yasmin Whitfield.

Antes que ele pudesse dizer qualquer coisa, a menina que ele segurava começou a choramingar mais alto. A que estava com Yasmin a acompanhou, como se as duas fossem sincronizadas até na angústia. O som cortou o saguão da empresa, desviando olhares curiosos, mas ninguém ousou se aproximar.

Damian se enrijeceu.

— Por que estão chorando? — perguntou, em pânico mais do que irritado. — O que eu faço?

Yasmin olhou para as duas, avaliando rapidamente.

— Provavelmente estão com fome, senhor — respondeu, com naturalidade. — Recém-nascidos não aguentam muito tempo sem mamar.

Ele franziu o cenho, como se ela estivesse falando uma língua estrangeira.

— E o que se faz para… resolver isso?

— Tem que alimentá-las — disse, com delicadeza. — Talvez tenham deixado mamadeiras junto com as coisas delas. Essas pessoas pareciam organizadas.

Ela respirou fundo. — O senhor me permite olhar?

Damian fez um gesto para a recepcionista pegar a bolsa que havia sido deixada com as mantas. Yasmin, com o cuidado de quem já tinha feito aquilo antes, apoiou a bebê num dos braços e procurou com a mão livre até puxar uma bolsa térmica discreta.

— Aqui… — disse, abrindo o zíper. — Tem duas mamadeiras, já prontas. Ainda estão mornas.

Ela ergueu o olhar para ele.

— Eu vou lhe entregar uma, e o senhor alimenta essa que está no seu colo. Eu cuido da outra. Pode ser?

Damian engoliu em seco.

— Eu… nunca fiz isso — admitiu, num sussurro quase constrangido.

Yasmin não riu. Não julgou. Apenas buscou uma cadeira vazia e indicou outra para ele.

— Sente-se, por favor — pediu. — Vai ser mais fácil para o senhor e mais seguro para ela.

Ele obedeceu, ainda rígido, mas atento. Quando se sentou, ela puxou uma fraldinha de pano entre as coisas das bebês e colocou sobre o peito dele, protegendo o terno.

— Segure a cabecinha dela um pouco mais alta — orientou, ajustando com cuidado os braços dele em volta da menina. — Isso. Assim ela não engasga.

Damian sentiu o corpinho quente se ajeitar contra o peito. A sensação era estranha, íntima demais para alguém acostumado a segurar apenas canetas, contratos e taças de cristal.

Yasmin sentou na cadeira ao lado, fez o mesmo com a outra bebê, colocou uma fraldinha sobre o próprio peito e pegou a segunda mamadeira.

Depois, entregou a primeira a ele.

— Agora, o senhor só precisa aproximar a mamadeira devagar da boquinha dela — explicou. — Ela vai saber o que fazer. Os bebês têm reflexo de sucção.

Ela sorriu de leve. — Só não incline demais para não vir muito leite de uma vez.

Damian aproximou o bico da mamadeira dos lábios minúsculos da criança, tenso, como se estivesse manuseando algo explosivo. Por um segundo, nada aconteceu. Então, a bebê buscou o bico com a boquinha e começou a sugar.

Ele prendeu a respiração.

Era um gesto simples, mas o efeito foi devastador.

O chorinho parou.

Os olhinhos se fecharam um pouco.

A expressão do rostinho relaxou.

Damian sentiu algo dentro dele se partir e, ao mesmo tempo, se alinhar.

— Como você sabe fazer isso com tanta segurança? — perguntou, sem tirar os olhos da filha.

Yasmin ajeitou melhor o bebê no colo, a própria mamadeira apoiada com prática.

— Porque eu fui criada em orfanato, senhor — respondeu, sem vitimismo, apenas com um fato. — Quando fiquei mais velha, ajudava as cuidadoras com os bebês.

Ela acariciou de leve o pezinho da menina. — Passei noites em claro embalando crianças que não tinham ninguém. Aprendi na prática. Cuidei de muitos bebês antes delas.

Damian desviou o olhar das gêmeas para ela, pela primeira vez prestando atenção em mais do que o cenário absurdo. Ele reparou nas olheiras discretas, nas mãos calejadas, na postura de quem era acostumada a fazer muito com pouco.

— E o que você faz agora? Além de resgatar crianças largadas na porta da minha empresa — perguntou, tentando recuperar um mínimo de controle.

Ela soltou um meio sorriso, cansado.

— Eu planto e vendo flores, senhor. Em vasos, na rua, onde me deixam. Hoje de manhã eu estava no sinal em que o senhor me viu… e aqui, na porta da sua empresa… é onde as pessoas com mais dinheiro passam. Às vezes alguém compra.

— Você tem algum emprego fixo? — ele insistiu.

— Não, senhor. Se tivesse, não estaria vendendo flores na rua — respondeu, com sinceridade limpa. — Faço bicos quando aparece, mas nada registrado.

Damian ficou em silêncio por alguns segundos. O som das duas mamando preenchia o espaço entre eles.

Uma decisão começou a se formar na mente dele. Era impulsiva, perigosa, mas estranhamente lógica dentro do caos em que ele estava.

Ele ergueu o olhar e foi direto:

— Você quer ser a babá das minhas filhas?

Yasmin parou o movimento por um instante.

— O senhor está falando sério? — perguntou, desconfiada.

— Completamente sério — respondeu, sem vacilar. — Você sabe cuidar de bebês, sabe mais do que qualquer pessoa que eu conheça. Eu não tenho ideia do que estou fazendo. E, a partir de agora, tenho duas crianças que dependem de mim.

Ele respirou fundo e acrescentou, com uma franqueza que ele mesmo não esperava usar:

— No bilhete, a mãe delas disse que não pode ter o nome ligado às meninas. Eu não vou deixar que elas sejam registradas como se tivessem vindo do nada.

Ele olhou para a menina no próprio colo. — Elas vão ter um pai. E…

Voltou o olhar para Yasmin. — Vão ter uma mãe.

Ela arqueou as sobrancelhas.

— O senhor está dizendo que… vai me colocar como mãe delas?

— Vou registrá-las como minhas filhas… e suas — confirmou. — Como se fossem frutos de nós dois. Não por mentira romântica… mas porque alguém precisa assumir esse papel ao lado delas. E porque você já começou a cuidar delas antes mesmo de saber quem eu era.

Yasmin se recostou na cadeira, atordoada.

— O senhor está ficando louco — disse, num sussurro. — O senhor nem me conhece.

— Não conheço — concordou. — Mas já vi gente com sobrenome importante fazer menos por uma criança do que você fez em meia hora.

Ele inclinou levemente a cabeça. — E isso me diz muito mais sobre você do que um currículo arrumado.

Ela abaixou os olhos para o bebê que segurava, pensativa.

— Nós nem somos casados — murmurou.

Damian deu um meio sorriso, cansado.

— Para ser pai e mãe no papel, não é obrigatório ser casal. O que é obrigatório é responsabilidade. E eu sei que não consigo fazer isso sozinho.

Fez uma pausa. — Você aceita?

Yasmin ficou em silêncio por alguns instantes. As gêmeas mamavam com calma, alheias à decisão que poderia mudar tudo.

Por fim, ela ergueu o olhar, firme:

— Eu aceito cuidar delas — disse, com convicção. — Sei fazer isso. Vou cuidar como se fossem minhas.

Ela respirou fundo antes de continuar:

— Mas se o senhor for me colocar como mãe no registro, eu vou ter direitos sobre elas. Direitos de verdade. Isso não é um favor. É uma responsabilidade legal.

Os olhos dela se estreitaram ligeiramente. — Pense bem nisso, senhor Ashford.

Damian sustentou o olhar dela, sentindo o peso exato do que estava fazendo.

— Eu já pensei — respondeu. — Agora, pela primeira vez em muito tempo… eu só estou fazendo o que é certo.

E, pela primeira vez em sete meses, ele não se sentiu pequeno.

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