O motorista abriu a porta traseira do carro preto, que aguardava parado diante da escadaria como um animal pronto para devorar sua presa. Clara respirou fundo antes de dar o primeiro passo. O salto fino ecoou contra o mármore e, por um instante, pareceu mais alto do que deveria. O vestido vermelho colava-se ao seu corpo como uma segunda pele, e a cada movimento a fenda lateral revelava flashes da coxa clara, como se o tecido a traísse de propósito.Ela hesitou, mas entrou. O interior do carro estava mergulhado em uma penumbra elegante: couro negro, aroma discreto de couro polido misturado ao leve resquício amadeirado do perfume de Lucca. Sentou-se à direita, colando os joelhos e segurando o vestido contra as pernas, como se pudesse esconder a ousadia imposta pela mãe.Quando a porta se fechou atrás

 Clara respirava com dificuldade, ainda sentia o coração acelerado pelo beijo roubado. O gosto de Lucca permanecia em sua boca como uma marca invisível, e o toque dele em sua cintura não tinha desaparecido. Tentava recompor o sorriso, mas cada músculo do rosto parecia prestes a trair a dor e o desejo que carregava por dentro.Lucca, em contrapartida, retomou a postura fria de sempre. Ao lado dela, mantinha-se ereto, altivo, como se nada tivesse acontecido, como se os lábios dele não tivessem devorado os dela minutos antes. Era a máscara perfeita de um marido seguro de si e de sua esposa.Foi nesse instante que três mulheres se aproximaram. O perfume doce e marcante delas chegou antes mesmo das vozes. Todas usavam vestidos luxuosos, traziam sorrisos calculados e olhares que examinavam Cla

 Clara VasconcelosDepois daquele beijo inesperado, e da nossa pequena discursão, senti como se o tempo tivesse parado. Os olhares demoraram a se desviar de mim e de Lucca. Cada segundo parecia se arrastar em câmera lenta, como se o salão inteiro tivesse prendido a respiração. Murmúrios começaram a percorrer o ambiente, passando de um grupo a outro como ondas rápidas, e eu pude ouvir o tilintar de taças, gargalhadas abafadas, e sorrisos maliciosos se espalhando como fogo em palha seca.A mensagem havia sido entregue com força: para todos ali, não havia dúvidas de que Lucca Ferraro tinha uma esposa provocante, segura de si, e que aquele território tinha dono. O gesto dele não foi apenas um beijo, mas uma declaração silenciosa de autoridade.<

 Clara VasconcelosA música do piano se mistura às vozes, mas para mim era um ruído distante, abafado, como se alguém tivesse mergulhado o salão inteiro debaixo d’água. O som chega aos meus ouvidos deformado, mas ainda assim latejante. Sinto como se o ar estivesse mais pesado, como se cada respiração fosse roubada à força.Meu sorriso, congelado, é uma máscara. Cada olhar que sustento, cada palavra que lanço com ousadia, não é meu. São frases que eu imagino na boca de Isadora, não na minha. Quanto mais tempo permaneço encarnando a minha irmã, mais sinto que estou me despedaçando por dentro, como se parte de mim fosse engolida a cada segundo.A taça de champanhe, que bebi em um único gole só para disfarçar o nervosismo, queima dentro de mim. É como se o líquido tivesse virado fogo, e corroesse meu estômago pela ansie

 Lucca FerraroO carro cruza os portões da mansão, e tudo parece mergulhar em silêncio. Do lado de fora, a noite repousa fria, cortada apenas pelo brilho duro da lua que reflete sobre o gramado úmido. Do lado de dentro, o motor preenche o vazio com sua monotonia, quebrado apenas pelo som suave da respiração de Clara, aninhada contra o meu peito.Não a deixei se afastar. Nem quando o motorista, constrangido, sugeriu ajudá-la a sair. Recusei com um gesto brusco, quase agressivo, porque não suportava a ideia de outra pessoa tocá-la. A verdade é que eu precisava tê-la nos braços. Era a única forma aceitável de atravessar a madrugada.Quando a porta da frente se abre, percebo os olhares. Criados interrompem movimentos,