Dona Isadora chegou cedo ao hospital. Estava cansada, mas mantinha a postura impecável. Desde que Pedro fora internado, os revezamentos entre os filhos e Clara haviam se tornado rotina. Pela manhã, ela mesma fazia questão de estar presente. No período da tarde, Clara assumia os cuidados. À noite, um dos filhos revezava a vigília ao lado do pai. Naquela tarde, porém, algo fora do script lhe chamou a atenção. Passava pouco das duas da tarde quando a porta do quarto se abriu. Dona Isadora esperava ver apenas Clara, mas para sua surpresa, Henrique entrou junto com ela. Notou que antes de entrar, eles haviam dito algo um ao outro que ela não ouviu e tinham um estranho ar de cumplicidade. Um outro detalhe quase imperceptível que acendeu o alerta em Isadora, foi quando estavam falando sobre o dia e no meio da conversa, Henrique tocou de leve o braço de Clara. Um gesto suave, natural e que provavelmente nem ele nem ela perceberam, mas não era nem um pouco profissional. Ela não disse nada. A

Dizem que os sonhos podem ser expressões do nosso subconsciente, traumas reprimidos, por vezes até premonições ou avisos. Mas Clara era um tanto cética quanto a essas duas últimas opções. Por isso, acordou tentando racionalizar um sonho curioso que teve. No sonho, ela estava casada com Henrique. Eles moravam na casa do doutor Pedro e de dona Isadora, mas a casa parecia vazia. Quando entrou no escritório e chamou por Henrique, viu-o sentado na cadeira em que o doutor Pedro costumava se sentar. Porém, ao olhar bem, o rosto não era de Henrique, mas sim de Kleber, seu ex-marido. Isso a fez acordar angustiada e reflexiva. Mesmo assim, o dia seguia independente de seu estado de espírito e Clara precisava ir ao hospital. Provavelmente, o doutor Pedro teria alta naquele dia, então queria chegar cedo para organizar as coisas dele com calma. Chegou ao hospital e cumprimentou o corpo de enfermagem, com o qual já havia feito amizade. Dirigiu-se ao quarto e encontrou dona Isadora já

No sábado, Clara colocou duas xícaras sobre a mesa para receber Pietra com um café e um abraço. — Ai, que saudade de tomar um café de verdade — brincou Pietra, se sentando. — Me fala: como você está? — Hoje já estou melhor. — Me conta como foi. O que a dona Isadora te falou? — Ela descobriu. — Ai, amiga… Ela foi bem cruel, né? Conhecendo a insuportável — quer dizer, aquela distinta senhora… As duas riram da piada. — Ela sabe bem onde machuca. Disse que o Henrique já fez isso antes, que esteve com muitas mulheres… inclusive estagiárias. — Isso é verdade. Mas em defesa do meu cliente, eu alego que ele não é exatamente um caçador. O que acontecia com muita frequência é que a carne sempre caía no prato dele... e como ele não é vegano… — Clara riu. — Mas é sério, ele teve seu momento mulherengo e nem as estagiárias escapavam. Mas faz um bom tempo que ele deu uma sossegada. Deve ser a idade. Ele tem 37, né? Não é mais um garoto. — E quando vocês eram casados? Se você quise

Henrique chegou ao hospital o mais rápido que conseguiu. Sua mãe estava na sala de espera ao lado de Igor. O motorista havia subido com ela, pois ela estava muito nervosa. Então Henrique esperou ao seu lado por notícias. Algum tempo depois, recebeu uma ligação de Clara e saiu para atender. – Henrique, não consigo falar com seu irmão. Me fala a delegacia onde ele está, que eu vou até lá. Ele passou o endereço e voltou para junto da mãe. A espera parecia não ter fim. Clara seguiu até a base onde Maurício trabalhava e perguntou por ele, avisando que era uma emergência. Levou alguns longos minutos até que Maurício apareceu. Estava uniformizado, parecia ter saído de algum treinamento. – Clara? O que aconteceu? – Eu ainda não sei direito, mas seu pai passou mal novamente. Ele está no hospital. Sua mãe e seu irmão já estão lá. – Então vamos. Ele dirigia tão rápido que dava até medo. Mas chegaram super-rápido ao hospital. Maurício não chegou a trocar o uniforme, quando entrou na sala

Passaram-se dois dias desde a internação do Dr. Pedro quando, finalmente, o médico trouxe uma boa notícia. — Ele está reagindo bem. Conseguimos retirar o suporte respiratório, e ele já consegue falar um pouco. Mas seu estado ainda inspira cuidados, por isso continua na UTI. A família se olhou aliviada. Foi um momento de frescor em meio à ebulição dos últimos dias. Isadora foi a primeira a entrar. Quando ela e o marido se viram, ambos sorriram. Ele estava mais pálido e magro, mas, ainda assim, sorridente. — Que bom que você acordou, dorminhoco. — Que bom que acordei pra ver você. Ficaram algum tempo de mãos dadas. Ela observava as marcas do tempo no rosto dele e se lembrava de como eram quando se conheceram. Os grandes olhos azuis ainda estavam lá, assim como sua personalidade envolvente. — Lembra do nosso casamento? Deu tudo errado! — ela riu, ao lembrar. — Pra mim, deu tudo certo. Eu levei você pra casa depois. Saí ganhando. — Eu falo dos detalhes. O bolo atrasou, as m