POV NiyatiEra fim de tarde quando cheguei em casa dias depois. A luz do sol entrava pela janela da cozinha, dourando tudo, inclusive o rosto cansado da minha mãe. Ela estava cortando legumes para o jantar, com o rádio baixo tocando uma música antiga. Era algo que ela fazia desde que me lembro, cozinhar como forma de se acalmar, de colocar o mundo em ordem.— Oi, mamadi — falei, pendurando a bolsa na cadeira.Ela me olhou, sorriu de leve, mas o sorriso vacilou quando percebeu a forma como eu me joguei na cadeira, como se o mundo tivesse pousado nos meus ombros.— Como foi o plantão? — perguntou, já sabendo a resposta antes que eu dissesse qualquer coisa.— Difícil. — suspirei com toda a força que pude — Uma paciente, a Laura... piorou. Ela está com muita dor. E mesmo com toda a medicação que estamos usando, ela ainda sente essa maldita dor. E eu fiquei lá, segurando a mão dela, sorrindo, dizendo que ia ficar tudo bem, quando nem eu sei se vai.Minha mãe parou de cortar. Se virou deva

POV NiyatiEu nunca vou esquecer o dia em que perdi Lucas.Ele era tão pequeno, tão cheio de vida antes da doença tomar conta dele. Os olhos brilhantes que olhavam para mim com tanta esperança, mesmo quando eu sabia que as chances estavam se esgotando. Naquele dia, entrei no quarto dele com a rotina automática: verificar sinais, ajustar medicações, tentar encontrar alguma faísca de melhora. Mas o que encontrei foi o silêncio.O monitor que antes disparava alarmes agora estava quieto, imóvel. O ar parecia pesado demais, como se o próprio quarto estivesse segurando a respiração. Me ajoelhei ao lado da cama, segurei sua mão tão frágil e quente. Quis dizer tantas coisas, quis fazer milagres com palavras. Quis que ele soubesse que não estava sozinho, mesmo quando a dor era insuportável.— Lucas... você foi muito forte — sussurrei, com a voz embargada, tentando conter as lágrimas que teimavam em cair. — Eu sinto muito que não deu pra salvar você.Fiquei ali, imóvel, enquanto o silêncio do q

POV NiyatiEra um daqueles domingos perfeitos em que o sol entrava pela janela da nossa casa com uma luz dourada que fazia tudo parecer mais leve, mais simples, mais feliz. Acordei com o cheiro do café que minha mãe preparava na cozinha, aquele aroma familiar e reconfortante que sempre me enchia o peito de conforto, mesmo nos dias mais difíceis. Era um cheiro que trazia aconchego e segurança, como se o mundo lá fora pudesse esperar enquanto estávamos ali, protegidos. Lá embaixo, eu já podia ouvir a voz animada do meu irmão menor, brincando alto com nosso baldi e tia Saniya, e aquela mistura de risadas e gritos infantis me dava uma sensação gostosa de pertencimento.Desci as escadas devagar, querendo aproveitar cada segundo daquele momento tão simples, mas que eu sabia que ficaria guardado para sempre na memória. Quando cheguei na cozinha, vi mamãe sorrindo para Rafael, que mexia a massa de panqueca com cuidado, como se fosse a coisa mais importante do mundo. Os olhos dela brilhavam da

POV NiyatiCaminhamos juntos na chuva, rindo do nosso próprio absurdo, do quanto aquilo era inesperado e, ao mesmo tempo, perfeito. A água escorria pelas nossas roupas, misturando-se com o calor dos nossos corpos, e eu sentia uma leveza que não sentia há muito tempo, como se a chuva lavasse junto o peso das minhas inseguranças. O som dos nossos passos misturava-se ao ritmo suave da chuva, e a cada gargalhada, meu coração parecia se abrir um pouco mais.Chegando na minha porta, ele parou, tirando o guarda-chuva do meu rosto molhado, e me olhou com uma ternura que quase doía.— Sei que você precisa de tempo e eu respeito isso. Mas quero que saiba que pode confiar em mim. Quando estiver pronta, eu estarei aqui — disse, com a voz baixa, quase um sussurro que parecia envolver tudo ao redor em calma.Eu encarei seus olhos, sentindo o calor daquela promessa, um abrigo silencioso para minhas dúvidas.— Talvez eu esteja começando a acreditar nisso, Vikram. Talvez eu queira tentar — falei, com

POV NiyatiNaquela semana, as conversas entre mim e Vikram ficaram mais frequentes, mais leves também. Ele parecia sempre encontrar uma forma de me puxar para rir, para sonhar com coisas simples, aquelas que a gente esquece na correria do dia a dia. Eu sentia que estava me abrindo, mesmo com o medo ali, rondando como uma sombra silenciosa e insistente.Ele tinha um jeito delicado de perceber quando eu precisava de espaço ou quando queria companhia, e isso me fazia sentir segura de um jeito que eu não esperava. Em meio a livros, aulas e aquelas horas intermináveis de estudo, ele surgia como um alívio, uma pausa necessária. Lembro que, num desses dias, ele apareceu na minha sala com dois cafés e um sorriso tão sincero que meu peito até doeu.— Achei que isso poderia ajudar — disse, entregando um café quente para mim — Vi que você anda meio cansada.— Obrigada, Vikram — respondi, surpresa. — Você não precisava.— Eu quero. Você merece um pouco de cuidado — falou ele, olhando nos meus olh