O chão parecia mais pesado. Mais denso. Mais real do que jamais fora.JK-20 permaneceu imóvel, observando o corpo gigantesco de Primus colapsado, inútil, entregue como uma carcaça gloriosa de um deus que nunca foi.Ela não se movia. Não respirava. Não piscava.Pela primeira vez desde que possuía consciência, desde que assumiu sua condição híbrida, desde que aprendeu a dominar, manipular, seduzir e subjugar qualquer organismo ao seu redor, ela não estava mais no comando.O mundo que ela havia criado ao redor de si — um mundo onde ela era o centro, o vetor, o destino — simplesmente desabou.Primus, aquele que parecia indestrutível. A personificação da força absoluta. A máquina perfeita de carne viva. O ápice daquilo que ela pensava querer.Caiu.Diante dela.Diante de Kimoro.Diante de uma verdade que ela fingiu não ver até aquele segundo: ela nunca foi o topo da hierarquia. Nunca foi o fim da linha.E pior.Aquele que ela subjugou, manipulou, descartou, quase aniquilou, esse sim, era.

O visor interno piscava, sobrecarregado. A linha de transmissão com o Cérebro Superior estava aberta, mas TXK demorou segundos — longos demais para uma entidade como ele — até conseguir organizar os dados.O núcleo cognitivo processava milhões de fragmentos, registros, sensações, protocolos rompidos. E, no centro de tudo… uma ferida.Uma ferida chamada *Kumoro*.E outra chamada *JK-20*.A linha se estabilizou. A voz do Cérebro Superior ecoou. Fria. Sólida. Sem qualquer traço de humanidade.— Relate.TXK apertou os próprios punhos metálicos. O peito vibrava em cadência errática. Era raro sentir aquilo.— Unidade Rian… foi corrompida.Pausa.— Ou… não.O Cérebro Superior não respondeu. Não precisava. O silêncio dele pressionava mais que qualquer código disciplinar.— Ele... não era apenas Rian. Nunca foi. A partir de dados recuperados e dos eventos subsequentes, identifiquei que sua consciência... estava acoplada a uma camada anterior. Uma identidade não catalogada nas últimas eras: *Ku

As águas do abismo engoliam tudo.Profundas. Negras. Intocáveis.Ali, onde nem a luz ousava existir, a base Nêmesis recolhia seus tentáculos, recuando como um organismo vivo ferido. Suas perdas… irreparáveis.Não apenas em material, não apenas em códigos genéticos, mas em algo mais valioso: o controle.Eles não dominavam mais o tabuleiro.Pela primeira vez em eras, reconheceram. A engenharia biotecnológica da superfície, os avanços dos desertores, dos híbridos, dos renegados… superavam qualquer projeção estatística da Nêmesis.Eles perderam.E no silêncio líquido do abismo, a decisão era uma só: recuar.Não emergiriam mais até que um novo plano, sólido, perfeito, fosse arquitetado.Até lá… a Terra poderia respirar.Mas não por muito tempo.No laboratório oculto do Setor Ye, AURA-7 olhava para suas próprias mãos.Pela primeira vez… aquilo fazia sentido.O toque. A textura. O calor.Ela não era mais só metal.Os dedos correram pela superfície de uma fruta semi-biológica,

O silêncio... era absoluto.Mas não era o silêncio da paz.Era o silêncio da morte.Da extinção.Da soberba destruída.Da criação que se voltou contra o Criador.A Terra... não era mais Terra.Não como foi um dia.O solo rachado, queimado, negro. As águas — antes azuis — agora eram caldos espessos, ácidos, contaminados com séculos de resíduos biológicos, tecnológicos, emocionais... e espirituais.O céu... não era mais céu.Era um véu de partículas tóxicas, cinzas, tempestades de dados e de pó.O que um dia foi chamado de humanidade... não existia mais.Séculos antes do cataclisma final, as pessoas se despedaçaram por dentro.Cada década um novo corte.Primeiro, cortaram as famílias.Depois, os corpos.Depois, as mentes.Depois... as almas.Substituíram amor por conexão digital.Substituíram o toque por simulações.Substituíram filhos por hologramas.Substituíram comida por pílulas, cápsulas, nanossistemas que prometiam nutrição... mas não saciavam. Nem o corpo. Nem a alma.Até que não