A notícia se espalhou como fogo em mato seco.Naquela manhã de segunda-feira, milhares de pessoas abriram seus celulares e se depararam com um vídeo que não era apenas uma reportagem: era um manifesto. Um documentário investigativo com pouco mais de 30 minutos, intitulado "Corrupção no Berço da Caridade", surgia nos principais canais de streaming e em redes sociais, com uma edição impecável, dados cruzados, entrevistas de bastidores e documentos escancarando décadas de favorecimentos e desvios por parte de figuras conhecidas da elite de Montserra.Helena não aparecia como narradora, nem como denunciante. Era uma peça construída com inteligência, que deixava os nomes principais surgirem nos documentos e depoimentos — entre eles, fundadores de ONGs, empresários, políticos e membros da própria família Ferraz.Mesmo sem se identificar diretamente, não demorou para que os internautas conectassem os pontos. Em poucas horas, o nome de Helena Martins estava nos assuntos mais comentados do paí

Os dias seguintes ao vídeo de Helena foram intensos. Enquanto a maioria da imprensa ignorava o escândalo, o apoio popular nas redes sociais explodiu. Comentários de solidariedade vinham de pessoas desconhecidas, profissionais de áreas diversas, até de figuras públicas que admiravam seu trabalho. Helena começava a sentir o poder da verdade quando ela era dita com coragem.Mas nos bastidores, um novo jogador entrava silenciosamente no tabuleiro.Em uma sala elegante no alto de um edifício comercial, um homem assistia ao vídeo de Helena em uma tela gigante. Seus dedos batiam ritmicamente sobre o braço da poltrona.— Essa mulher não é burra — murmurou ele. — Está se tornando uma ameaça maior do que os outros imaginavam.Era Augusto Leme, um poderoso executivo do setor imobiliário e financiador oculto de vários projetos públicos e privados. O tipo de homem que gostava de mover os fios nos bastidores, sem nunca aparecer. Ele havia lucrado com a queda de nomes importantes... e agora via em H

Os dias que antecederam a coletiva de imprensa foram os mais longos da vida de Helena. Dormir tornou-se um luxo, comer uma obrigação esquecida. Enquanto a cidade vivia sua rotina de aparências e promessas, ela e sua equipe trabalhavam nos bastidores como formigas em uma colmeia prestes a ser incendiada.O pen drive com os dados reunidos por Nina e Lúcio já estava em duplicata, trancado em cofres digitais e físicos, distribuídos em locais diferentes. O plano era simples: tornar público o império de corrupção de Augusto Leme, ligando seu nome a fraudes, desvios, ameaças e silenciamentos. Mas simples não significava seguro.Na manhã da coletiva, Leonardo bateu à porta do escritório da fundação com uma expressão grave.— A imprensa já está se reunindo. Advogados, apoiadores, algumas vítimas que aceitaram falar ao seu lado... Mas...— Mas? — Helena ergueu os olhos, alerta.— Um dossiê começou a circular nos bastidores. Contra você.Ela ficou em silêncio por alguns segundos, tentando proces

A pasta com as provas estava sobre a mesa. Leonardo, Lúcio e Helena a encaravam como quem olha um artefato sagrado. Era pesada — não só em volume, mas em significado. Cada página, cada gravação, era uma bomba pronta para explodir o império de Rodrigo Vasques.— A gente tem que ser estratégico — disse Leonardo. — Se soltar tudo de uma vez, ele contra-ataca e diz que é montagem, perseguição, histeria. Se soltarmos aos poucos...— Ele sangra devagar — completou Lúcio, com um brilho frio nos olhos. — É isso que queremos.Helena assentiu.— Começamos amanhã. Um episódio por dia. A verdade vai cair como chuva ácida sobre o nome dele.O primeiro vídeo foi publicado às 10h da manhã. Era um áudio de uma reunião interna da Vasques Corp, onde Rodrigo, com a voz ríspida e irônica, mandava uma funcionária “sumir com os papéis que comprometem nosso contrato com o governo”.Na legenda, apenas uma frase:“A verdade tem voz. E ela não será silenciada.”O vídeo viralizou. Em menos de uma hora, Helena j

O silêncio que pairava na casa de Helena naquela manhã era inquietante. Depois dos últimos acontecimentos, ela aprendera a não confiar em momentos de paz. A sensação de estar sendo observada voltava a incomodar sua rotina — como se fantasmas do passado estivessem esperando o menor descuido para atacá-la de novo.Ela observava o sol atravessar a cortina da sala enquanto tomava seu café. Leonardo já havia saído cedo, envolvido em uma reunião com investidores internacionais. O relacionamento entre eles ganhava consistência, e por mais que tentasse esconder, Helena começava a sentir algo que evitava nomear: confiança.Mas naquela manhã, algo desviou seu foco. Uma notificação em seu celular apareceu como um soco no estômago."Isadora Ferraz está de volta a Montserra."Helena largou a xícara com força sobre a mesa. O nome de sua irmã bastava para reacender todas as memórias que ela vinha tentando enterrar. Não importava que Isadora estivesse sumida há meses. Sempre que surgia, deixava um ra