Ônix - Prelúdios Lúdicos - Volume 4
Ônix - Prelúdios Lúdicos - Volume 4
Por: William Morais
O livro proibido

(Uma aventura pirata completa em 1 capítulo!)

Prelúdio

- Entrevista –

Nada termina em nada. Às vezes algo pode aparentar perda de tempo, mas se olharmos bem, não há desperdício se encararmos tudo como exercício.

  Era uma entrevista para um blog de literatura. Uma entrevista que nunca foi publicada lá. O blog nem existe mais. Estava começando e não foi além. Mas guardei a conversa com a intenção de publicar parte dela um dia.

– Não acha complicado misturar ficção com realidade? – A blogueira perguntou.

– Não quando o principal está na mensagem a ser passada – respondi. – Não importa o que é verdade ou não, se a mensagem importar mais. Minha maior intenção está na mensagem.  

– Mas você anda por aí vestido como um pirata e sua história é sobre isso. Não fica preocupado com a possibilidade das pessoas pensarem que você não sabe separar realidade de fantasia?

Nunca concordei que eu ando por aí vestido de pirata, porque a única coisa que visto, que pode ser relacionado a um vestimenta pirata, é a bandana preta de sempre. Seja como for,  respondi pacientemente, pois uma bandana num cara de cavanhaque e cabelos longos realmente remetem a um pirata mais do que o suficiente par quem está acostumado ao padrão:

– Me preocupo mais sobre o que as pessoas não sabem sobre elas mesmas, do que podem, ou não, pensar sobre o quanto eu sei sobre mim.

– Então você não se importa? – A blogueira perguntou.

– Me importo. Tanto que as mensagens que passo em minhas aventuras podem ajudá-las nisso. – Respondi, de forma mais ampla. – E este é um ótimo motivo para eu caprichar na minha escrita. Ou melhor: dois motivos. A aventura precisa ser interessante por si só, a ponto de baixar a guarda de quem lê, para as mensagens serem entregues como presentes. Mas sei que poucas pessoas querem saber mais sobre si mesma e, no caso da mensagem falhar como mensagem, ela tem que funcionar como aventura; o entretenimento em si. Até que um dia, as pessoas comecem a enxergar as mensagens que sempre estiveram lá.

– O que está dizendo, então, é que sua escrita então tem a a intenção de ser mais do que mero entretenimento, mas funciona como isso também? – A entrevistadora resumiu bem, a ponto de me fazer bufar um riso, mas, para deixar bem claro, eu respondi:

– Exato. Não tenho nada contra a proposta de distração, e de preferência com algo interessante. Acho importante essa distração. Mudarmos nosso foco para além de nós mesmos, de vez em quando. Mais cedo ou mais tarde, no entanto, acabamos entendendo que tudo serve como um espelho e que mesmo sem percebermos, somos afetados de alguma forma e aí a coisa toda, que parecia uma distração, se torna mais que isso. Gosto de escrever sob essas duas perspectivas. Cada vez que alguém reler o que escrevi, aliás, poderá perceber algo novo. Camadas sob camadas. 

– Então seu foco está nos outros?

– Não – respondi. – É total me mim. Acontece de ser parte de mim este tentar ajudar os outros a se entenderem. É bem egoísta a coisa toda. E nisso eu me identifico com o pirata sobre o qual eu escrevo. Ele sabe que quando faz algo por alguém, está fazendo por si mesmo, na verdade. Pra manter a paz dele consigo mesmo, na medida do possível.

– Você é alguém que vive em paz?

– Na medida do possível... – respondi, sorrindo, não tão convicto quanto eu gostaria.

A conversa foi interessante. Perguntas inteligentes. Foi diferente. Talvez por isso o blog da garota não tenha tido espaço no mundo. O diferente precisa lutar tanto pra existir, que no geral não chega a se estabelecer. Muita energia é gasta na luta por espaço. Energia que poderia ser gasta na produção de conteúdo. O que me faz pensar se minha escrita vai ir além...

A entrevista não foi apenas um exercício, no entanto. A partir dela, pude vislumbrar todo um episódio no qual o muro entre a minha realidade e a do pirata Ônix para se tornasse menos... concreto.

Lúdio

- O livro proibido -

Dizem que conhecer o passado é vital para construir o futuro, mas conhecer o futuro pode ser vital para o passado, às vezes. Coisa rara, certamente. E situações raras são comuns na vida de certo pirata.

Livros empilhados. Alguns abertos, outros fechados. Capas de couros. Papéis amarelados pelo tempo. Todos antigos. Não tanto quanto Ônix Pedra-Negra esperava, porém. Ele buscava um livro que não teria uma capa como aquelas. Procurava um livro do passado esquecido do velho tempo.

A informação sobre a existência de tal livro na biblioteca da cidadela Cida havia chegado aos seus ouvidos três meses antes de uma forma inusitada e a veracidade parecia improvável. Se fosse verdade, no entanto, mudaria a forma como encarava sua vida e tinha de considerar a possibilidade. A mensageira havia aparecido em seu navio de forma tão misteriosa quanto a maneira como desapareceu.

Havia passado quase uma hora olhando o andar inferior da biblioteca e não tinha visto alguém ali. O que surpreendeu nem foi tal fato, e sim o de ainda haver uma biblioteca num reino onde poucos sabiam ler. Mas a biblioteca existia, como informado, e era um argumento a mais fortalecendo a possibilidade de o livro ser real.

Resolveu subir a escada que levaria ao segundo andar, mas parou antes do primeiro degrau, ao ver uma moça no alto da escada, abraçada a alguns livros. Usava óculos. A saia dela deixava a maior parte da perna à mostra e o ângulo do pirata o permitia ver um tanto mais.

A moça o olhou por um instante e entendeu o sorriso desavergonhado dele, acentuado pelo cavanhaque que contornava a boca. Ela respirou fundo e desceu, sem olhar para o chão, mirando o pirata.

Ficou claro para o pirata que aquela era a bibliotecária responsável pelo lugar. Deduziu que ela esteve lendo no andar superior todo o tempo, provavelmente sem se preocupar com qualquer visita inusitada. E qualquer visita provavelmente seria inusitada.

  A bibliotecária não esperou chegar ao final da escada para perguntar:

– Posso ajudá-lo?

– De muitas formas, pelo visto – o pirata falou.

A garota parou a poucos degraus dele, estreitou os olhos e questionou:

– Está insinuando, por ventura, que por eu possuir um corpo feminino, evidentemente agradável a ti, fica presumido que devo satisfazê-lo fisicamente, antes de intelectualmente, isso se é que o segundo objetivo é cogitado?

– É tão cogitado que era o primeiro objetivo, em verdade... – Ônix falou e, olhando para a moça de cima a baixo, completou: – Era.

  A moça não se intimidou e continuou a descer, dizendo:

– És, então, uma criatura volátil, a ponto de, com extrema facilidade, se distanciar de seu objetivo primário?

Ela não tinha medo do pirata e ele admirou a coragem dela e respondeu, num tom bastante amigável:

– Sim e não. Me distanciar do meu objetivo primário, neste caso, pode vir a ser o caminho mais garantido de alcançá-lo. Você se sentiria realmente grata por meus talentos, a ponto de, verdadeiramente, estar inclinada a me ajudar a encontrar o livro que procuro.

Ela deixou de encarar o pirata e assim que passou por ele, falou:

– E modéstia, pelo visto, não lhe convém.

– Modéstia é uma armadilha mal disfarçada de gente insegura que busca por elogio de gente besta o suficiente pra cair nisso. Não tenho tempo para estes joguinhos infantis quando me conheço o suficiente para tratar minhas virtudes, ou a falta delas, como fatos. Considero qualquer perda de tempo uma merda – Ônix explicou, indo atrás dela.

A bibliotecária colocou os livros que trouxe do andar de cima numa mesa e se virou. O pirata parou no meio do salão e disse:

– Seja como for, a falsa modéstia é pior do que a falta descarada dela. Para mim, todo tempo é pouco para tudo o que quero realizar. E, neste caminho, bem cabe deixá-la realizada. Aproveite.

– E por que precisaria de você para tal?

– A resposta para isso não vem em palavras. Se me permite... – disse ele. Arriscou um passo lento na direção dela, mas parou ao escutá-la dizer:

– Não. Não permito. Ser tocada pelo detentor de uma mente frívola, que usa a palavra... merda, é inadmissível. Seu suor invade o ar e o permeia com violência e descabida indecência. Tivesse bom senso, já não estaria neste recinto.

O pirata bufou um riso. Admirou o atrevimento dela. Aparentava menos de vinte anos, mas mantinha o nariz empinado. Aliás, seu tamanho a obrigava a fazer isso. Não tinha um metro e sessenta de altura. A intenção de Ônix, no entanto, não era intimidá-la, por isso perguntou, já interessado em conhecê-la melhor:

– Você não tem muitos amigos, não é?

– Tenho todos os amigos dos quais careço – ela disse, erguendo os braços para indicar a biblioteca como um todo.

O pirata arqueou as sobrancelhas praticamente escondidas pela bandana escura e falou:

– Adoro livros. São inspiradores. Ajudam a nos preparar para as vivências, mas, não as substituem. Não devia ser tão... fechada em si mesma, pois, diferentemente dos livros, minha querida, quando você se abre para um homem, você também aprende algo.

– Fala por experiência própria?

O pirata piscou algumas vezes, tentando não imaginar a cena. Achou estar diante de uma alma amargurada e perguntou:

– Qual o seu o problema? Foi molestada quando criança?

– Não. Mas, não me surpreende sua dedução. As pessoas geralmente acreditam que os acontecimentos ocorridos com elas, já ocorreram com os outros também.

Ônix voltou a sorrir. Ela era segura de si e ele gostava disso. Parte de suas provocações tinha exatamente a finalidade de encontrar pessoas mais convictas e corajosas. Mas como tudo tinha limite, ele tratou de alertá-la:

 – Sua língua é mesmo afiada. Só tome cuidado para que, na tentativa de ferir alguém, não fira a si mesma.

– Sei usá-la muito bem.

– Ah! Isso eu gostaria de comprovar... – Ônix insinuou. Não resistiu à oportunidade de ver até onde ia a determinação dela. – e também sei usar a minha. Podemos nos agradar mutuamente.

– Não estou aberta a negociações. – Ela retirou o relógio do bolso, olhou e continuou: – E, por falar nisso, está na hora de fechar a biblioteca. Queira se retirar, por gentileza.

– Não quero. Assim como não posso lhe obrigar que queira magníficas sensações, você não pode me obrigar que eu queira me retirar. Vim de longe. Sou o pirata Ônix e busco o livro de mesmo nome. Um livro do passado esquecido do velho...

– ... e proibido tempo – ela completou. Embora tudo do velho tempo fosse proibido, ela não parecia tentar fingir que o livro não existia e que não estava ali.

– Ao menos não vai insultar minha inteligência, fingindo não saber do que se trata.

– Mas você insulta a minha, se pensa que permitirei que tenha acesso a tal livro – A bibliotecária falou. – Já que se julga inteligente, não preciso explicar o significado da palavra “proibido”. Ele não está ao alcance dos olhos e não vou ajudá-lo a encontrá-lo.

– O que comprova meu argumento de que, se tivéssemos nos afastado do meu objetivo livro, para nos aproximarmos do objetivo prazer, o resultado agora seria a satisfação de todos nesta sala.

– Me darei por satisfeita quando você se for.

– Eu irei.

– Ótimo.

– Com o livro.

– Não vou revelar onde está.

– Mas eu sei onde está – o pirata afirmou e a bibliotecária olhou na direção de um quadro na parede, de forma automática, para verificar se o tinha deixado entreaberto, pois era, em verdade, uma portinhola de um compartimento secreto. Não estava. Não havia indício algum e bastou esta fração de segundo para ela perceber o que tinha acontecido. Ônix sorriu e continuou: – Ora, não se culpe. Até mesmo uma mente... não frívola.... pode cair nos truques mais simples.   

O pirata deu um passo na direção do quadro. A bibliotecária se colocou entre ele e o alvo e disse, ajeitando os óculos no rosto:

  – Não vou permitir.

– Você não tem tamanho pra isso, devo dizer – o pirata avisou. – Assim como não deve ter a perícia suficiente para tal.

Ônix avançou na direção dela e chutou uma, duas e três vezes, com a mesma perna que foi mantida no ar durante todo o processo. A bibliotecária, no entanto, bloqueou os três ataques com as mãos e chutou a perna do pirata antes que o pé dele pousasse no chão, obrigando-o a girar e ficar de costas para ela que pisou atrás do joelho da perna esquerda dele. O pirata não teve escolha a não ser se ajoelhar. Não esperava por aquilo e sacou um dos dois punhais pendurados na cintura. Antes de se levantar, girou no próprio eixo e desferiu um corte em arco para obrigar a moça a se afastar. Ela não o fez. Agarrou o punho dele, torceu e roubou o punhal.

O pirata sacou o outro punhal de imediato e atacou com um corte que foi bloqueado pela lâmina do punhal manuseado por ela. O objetivo de Ônix, porém, era ganhar espaço e tempo para se levantar e foi o que tentou. Em vão.  Mal iniciou o movimento e a bibliotecária pisou na coxa dele, bem perto do quadril, obrigando-o a ficar ali, abaixo dela. Ele entendeu o recado.

Irritado, o pirata empurrou a lâmina adversária para longe, obrigando a moça a girar. Era o momento de ele se colocar de pé, mas a moça aproveitou o giro para desferir um corte circular grande, enquanto saltava, para passar a lâmina no alto da cabeça dele, impedindo-o de alcançar aquela altura. O pirata teve de se abaixar novamente, por um momento, e quando acreditou que poderia finalmente se levantar, a bibliotecária saltou mais uma vez, no mesmo lugar, para atacar de cima para baixo, com todo o seu peso, impedindo a nova tentativa de Ônix alcançar a altura real. 

O pirata bloqueou a lâmina dela com a lâmina que segurava. E se cansou daquilo. Roubou o punhal da mão da moça sem dificuldade e achou que isso bastaria. Achou errado.

A bibliotecária não se intimidou ao ver o pirata com as duas lâminas e lançou um soco reto na direção do nariz dele. Ônix trouxe o punho da arma na mão esquerda para dentro, desviando o soco e fez a mão direita saltar a esquerda, ainda em contato com o punho dela, com a intenção de parar a lâmina segurada pela mão direita no pescoço dela e mostrar que a luta tinha terminado. A bibliotecária, porém, bloqueou o ataque, agarrando o punho dele. Girou o braço do pirata, torcendo-o de forma a obrigá-lo a ficar de costas para ela, ainda ajoelhado, como se ele fosse ser enforcado pelos seus dois braços. Sem hesitar, a moça enfiou o pé nas costas dele.

O pirata não teve outra escolha a não ser largar os punhais, que ficaram nas mãos da bibliotecária, e usar as mãos para evitar que beijasse o chão para o qual ia de encontro.

De quatro, Ônix previu o ataque nas costas e olhando por cima do ombro, redirecionou o golpe desferido pela mão direita da garota com um chute, desenhando um arco amplo no ar para encaminhar a mão dela sobre a esquerda, ao lado do seu corpo. A intenção do pirata não era apenas atrasar um novo ataque dela com a lâmina que estava na mão canhota. Durante o chute, ele girou e estava novamente de frente para a garota, embora ainda ajoelhado.

Pedra-Negra teria se levantado, mas na verdade precisou se abaixar para evitar um novo ataque dela que veio com a mesma mão direita, voltando, que direcionava o metal afiado para o rosto dele. Ao se erguer novamente a cabeça, depois do golpe passar por cima dela, ainda ajoelhado, Ônix viu o soco esquerdo da bibliotecária vindo em direção ao seu rosto, mas teve tempo de segurar a mão da moça, fechando a mão direita dele sobre a dela, fechado no punho do punhal.    

O primeiro soco, no entanto era uma distração, pois ela também socou com a mão direita e se a agilidade do pirata não fosse acima da média, teria sido atingido. Aparou, porém, o segundo punho. As duas pontas do punhal apontavam para fora e o pirata encarou a garota que não se intimidou.

Demonstrando força absurda para seu porte, a garota socou a cara do pirata com a mão dele que ele usava para segurar a dela. E fez o mesmo com a outra, alternando as duas numa sequência violenta.

 Ônix soltou os braços da garota e seu corpo quase tombou para trás. Ele, no entanto, se concentrou e arriscou um soco direto na barriga da bibliotecária. Ela, porém, desceu o punhal na mão esquerda na direção do punho dele. Sua intenção, no entanto, não era cravar a lâmina nele. Prendeu o antebraço do pirata entre o dela e a lâmina. O pirata socou com a outra mão e a bibliotecária fez o mesmo com o punhal da outra mão e girou pra travar ainda mais o oponente ajoelhado. De costas para ele, ela lançou o calcanhar no maxilar de Ônix e desfez o giro enquanto tirava a lâmina na mão direita da triangulação e a levava até o pescoço dele, onde estacionou firme.

Uma gota vermelha escorreu, deixando claro que a luta tinha terminado, assim como para avisar que ela não pretendia matá-lo, se houvesse rendição.

Ônix Pedra-Negra a encarou, de baixo para cima, o rosto convicto da garota, e murmurou:

– Você não entende...

– Eu sou a guardiã do livro antigo. Ele só deve ser revelado daqui a alguns séculos. Para as pessoas certas. Assim como foi revelado para as pessoas certas no passado, quando foi escrito. Entendo perfeitamente o meu papel.

– Me referia ao que está escrito – o pirata continuou. – Você não entende a língua antiga. Eu sim. Posso lê-lo.

– Como sabe que não possuo domínio sobre as línguas antigas?

Com muita cautela, ainda rendido, Pedra-Negra continuou:

– É o que a torna apta como guardiã. Mas, aposto, que gostaria de lê-lo. Deve ter lido todos os livros aqui; várias vezes. Sua mente deve ansiar por algo novo... mesmo que seja extremamente velho... Posso lê-lo para você, e para mim, claro. Isso colocaria um fim ao nosso impasse. O livro fica aqui e eu não saio sem saber o que ele diz. Afinal, deve estar curiosa. Por que um livro da findada, e secreta, era tecnológica, carrega o mesmo nome de um pirata safado? Sim... Meu nome é o título do livro, como sua inteligência deve ter presumido.

– Pode ser coincidência.

– Acabei de exaltar sua inteligência, garota. Você não deve ser alguém que acredita em coincidências. Além do fato de que, tal pirata, não só sabe sobre o passado esquecido, o que pouquíssima gente sabe, como sabe ler, escrever e falar as antigas línguas.

– Isso apenas torna você a pessoa menos indicada a ter acesso ao livro.

Ônix suspirou e falou, mostrando só naquele instante, que se rendia de fato. Suas palavras saíram encharcadas de angústia e incertezas:

– O livro pode contar a minha história, assim como a história de seu escritor e a razão de nossas vidas estarem ligadas através do tempo. Preciso dizer o quanto isso é importante para mim?

A bibliotecária ponderou em silêncio por um instante. Ela suavizou a pressão da lâmina contra o pescoço dele, mas o pirata não se aproveitou para se livrar. Ele estava disposto a conversar de verdade e para ter certeza, ela perguntou:

– E mesmo assim considerou me tocar, antes de tocar o livro? Deveria me sentir lisonjeada?

– O livro é importante, mas, como já falei: as vivências são mais. E eu não menti.

A bibliotecária libertou o pirata e se afastou dele, mas ainda segurava os punhais ainda com firmeza. A resposta dela não provava que ele não era um idiota qualquer. Mas não o redimiam ante as grosserias que já tinha dito.

Ônix se levantou, finalmente. Fez uma careta enquanto limpava o fiapo de sangue que escorria pela garganta, sob a análise da bibliotecária, que embarcou naquela averiguação:

– Isso ainda não é motivo para eu me sentir lisonjeada. Lembrei que me cortejar fazia parte de seu plano ardiloso para ter acesso fácil ao livro. 

– Mas não menti a este respeito também. Fui honesto em revelar tal plano. Prazeroso, não ardiloso, diga-se de passagem. O que deveria demonstrar que fui honesto em demonstrar interesse em cortejá-la, também. Os desonestos são aqueles que a treinaram e que governam este mundo. Escondem o passado de seu próprio povo.

– Para nos proteger – a garota ofereceu a resposta ensaiada.

– E, com a desculpa de proteção, mais uma vez, a tirania se mantém. Desde que pisei aqui, fui honesto com você.

– Um pirata que pode ser honesto?

– Interessante, não acha?

– Você nunca mente?

– Eu estaria mentindo se dissesse que não minto. Mas, só o faço quando extremamente necessário. Assim como só mato nestas condições.

– Você me mataria?

Ônix bufou um riso e respondeu:

– Não.

– Mas tentou.

–Não. Se eu tivesse tentado, você estaria morta.

– E se eu dissesse que, para ter o livro, precisaria me matar?

 – Acredite em mim. Se eu estivesse disposto a te matar para ter o livro, teria feito quando meus punhais ainda estavam comigo.

A bibliotecária jogou os dois punhais de volta pare ele. Ônix fez uma nova careta e enfiou as duas lâminas nas bainhas presas à sua cintura. Sorrindo, continuou:

 – Não precisamos passar por isso novamente. O resultado seria o mesmo. Nunca tirei a vida de uma garota e não vou começar hoje.

– Não me refiro a um duelo – a bibliotecária revelou. – Me refiro a uma magia que envolve o livro e a mim. Se alguém abrir o livro, eu morro.

O pirata avaliou bem a expressão da garota. No geral sabia quando alguém estava mentindo. Ela não estava mentindo para ele, mas considerava a possibilidade de terem mentido para ela. Tentando ser sensato, perguntou:

– Você tem certeza?

– Sempre acreditei saber quando estão mentindo para mim. Se não estou errada em acreditar em você, também não devo estar errada em acreditar neles. Se for verdade, e você ler o livro, eu não chegarei a ouvir uma palavra sequer.

O pirata sabia que não estava mentindo para ela. Então ela estava certa neste ponto e era o suficiente para considerar a habilidade dela se tão exata quanto a dele. Com a testa enrugada debaixo da bandana preta, perguntou:

– E o que acha disso?

– Uma bela... merda – Ela desabafou. O pirata bufou um riso triste e ela continuou: – Mas, não tenho escolha.

– Posso vê-lo, ao menos? 

A bibliotecária leu facilmente a expressão do pirata. Naquele instante, para ele, confirmar que o livro era real e que tinha real ligação com ele, talvez já fizesse alguma diferença em fortalecer suas convicções. Afinal, o que ele faria naquele tempo, pelo visto, ecoaria através do espaço e tempo e alcançaria o passado. Não deixava de ser fascinante. Tinha suas razões para testar o pirata e pegou o livro no compartimento. Com uma aflição contida, colocou aquela relíquia na mão dele.

Ônix olhou a ilustração da capa e pareceu hipnotizado. O enigmático desenho parecia fazer sentido para ele. Era de certa forma, familiar. Um peixe-mão sobre uma serpente-planta que formava, em verdade, uma lemniscata, o símbolo do infinito. Brotando da planta/serpente, havia uma maçã-coração. Não bastasse a sensação de Déjà vu, havia um pirata sobre a planta-serpente, apontando a espada para o coração-maçã. A capa estava desgastada, mas Ônix notou que o cinto do tal pirata tinha uma fivela no formato de um crânio alado, representando a que ele estava usando. O pirata era uma representação dele. Todo vestido de preto, como o próprio Ônix, embora os detalhes da roupa fossem diferentes. Não era uma representação muito fiel, mas chegava perto o suficiente para ilustrar. Pedra-Negra teve certeza. Era verdade.

– Me desculpe – o pirata falou e a bibliotecária sentiu ter cometido um erro. Ônix devolveu o livro para ela e continuou: – por lembrá-la de uma condição tão cruel quanto a sua.

A adrenalina foi em vão e o corpo da garota quase bambeou, mas ela se manteve firme. Pegou o livro e o colocou novamente no compartimento atrás do quadro, enquanto falava:

– Não há um dia que eu me esqueça, acredite. Fico feliz, ao menos, em constatar que você estava sendo sincero ao dizer que estava sendo sincero.

Era um momento significativo para a bibliotecária. Aquele pirata tinha realmente uma ligação com aquele livro. O livro que ela tanto protegeu.

No início achou ter sido um teste de seus mestres, mas se fosse, a farsa teria acabado quando ela colocou o livro que deveria proteger, acima de tudo, nas mãos dele. Não era um teste para ela. Aquele pirata estava ali por conta própria. A mente dela havia sugerido algo, momentos antes, e não tinha como não pensar na possibilidade com mais intensidade, a respeito do que viria a seguir.

– Você pode ser um pé no saco – Ônix falou, trazendo a bibliotecária de volta ao momento. – Mas, se eu abrisse o livro, estaria apenas lendo, num único dia, o que lerei dia a dia, provavelmente, vivendo. Isso se a história ali for mesmo a minha. Seja como for, prefiro você viva.

Ela sorriu. Sabia que o pirata estava falando aquilo muito mais para ele, do que para ela. Estava óbvio que tentava fazer de conta que não estava frustrado. E continuou:

– Posso lhe visitar, sempre que possível, para lhe contar algumas outras histórias. Afinal, li mais livros do passado esquecido, do que os contemporâneos que você tem aqui. Sem mencionar as histórias que vi acontecer, através de um pequeno portal mágico, que se alimentava do calor do Sol... histórias inspiradoras.

– Seria interessante – ela falou, dano um passo na direção dele.

– Posso ficar por hoje, aliás, já que aqui estou – o pirata arriscou, embora incerto sobre a leitura que fazia do rosto dela.

– Adoraria – ela o encarava.

– Então... – o pirata hesitou. Sabia bem quando uma garota estava aberta a uma aproximação, mas naquela situação, não lhe pareceu tão provável. Preferiu dizer o que realmente diria se não tivesse qualquer insinuação da parte dela: – Dou-lhe duas opções de histórias. A primeira é sobre um ladrão que possuía a magia de jogar cartas de baralhos que explodiam e vivia numa mansão com outros que também tinham poderes mágicos, mas este é o meu favorito. A segunda é sobre um mascarado, fascinado por rosas vermelhas, símbolo de sua vingança contra o governo, por quem nutro muita admiração, também.

– Quero ouvir sobre os dois. Mas não hoje. – ela se aproximou mais um passo.

– Por que não? – Ônix perguntou, sem compreender o que estava entendendo.

– A resposta para essa pergunta não vem em palavras se me permite... – A bibliotecária o parafraseou e deu mais um passo, ficando a apenas um dele. Desamarrou o espartilho, sem pressa. De perto, o pirata pôde ver que ela estava nervosa, embora determinada.

Ônix não esperava por aquilo. Pensando um pouco mais, no entanto, deduziu que a bibliotecária havia percebido além da honestidade dele, o destino deles estavam cruzados, de alguma forma. Era provável que ela se sentisse atraída por isso e o pirata se perguntou se devia. Não gastou muitos segundos para encontrar sua resposta. Afinal, sabia bem o significado que aquilo teria para ele e sabia que a bibliotecária era inteligente o suficiente para saber o que significaria ela e para os dois. Um momento. Bastou, então, se perguntar se realmente desejava aquilo, pois geralmente ele estava apenas mantendo sua interpretação de pirata. Cada vez mais, porém, Ônix estava mais à vontade com situações assim e aquela era uma das que, considerando seriamente, ele bem gostaria de vivenciar. E seu critério era apenas esse: a vontade de ambos, desde que soubessem que não passaria de um momento mutuamente agradável.

A vida parecia distribuir infortúnios de bom grado. Os fortúnios, por outro lado, exigiam um esforço maior de quem achasse que os merecia e se esforçava par ir além de suas limitações aceitas.

Aquela bibliotecária estava indo nitidamente além de seus limites. O rubor em suas bochechas mostrava que seu coração estava disparado, bombeando sangue pela expectativa e fuga da zona de conforto. Ela buscava um instante no qual se sentir plenamente viva e o pirata sorriu, aceitando o convite. Estava determinado a garantir a ela intensos momentos de vida, em retribuição pela confiança, e não tinha pressa alguma. Resolveu deixá-la à vontade e ir da forma mais gradual possível entre o primeiro leve toque de sua mão no rosto dela, até o momento no qual o mundo desaparecia para a garota, imersa em sua própria energia inebriante, trazida à tona por ele. 

*

Quase duas horas depois, Ônix se vestia, sentado no piso de madeira, cercado de velas em castiçais. A bibliotecária, mais vestida que o pirata, prendia o cabelo, olhando para a chama de uma vela. Quase sorria. Pedra-Negra notou que ela evitava encará-lo, ainda tímida, mas agradecida a si mesma pela coragem que teve. Para ajudá-la a ver naturalidade no momento, ele perguntou:

– Você sabe meu nome, mas, não sei o seu.

– Me chamo Aliandria – ela respondeu, olhando para ele.

– Belo nome. E, me responde mais uma coisa: você se sente presa ao livro?

– É meu dever fazer com que chegue às mãos das pessoas certas – ela deu de ombros, enquanto o pirata vestia a camisa. 

– Mas você não fez essa escolha, então, está presa a ele – Pedra-Negra comentou, puxando o colete de couro que se pôs a vestir.

Aliandria pensou por um instante e falou:

– Não mais do que você estaria se pudesse lê-lo. Acredito. Se é sua história, você não deveria conhecê-la. Ou estaria apenas fazendo o que leu que faria. Sem a liberdade para fazer, verdadeiramente, escolhas. Seja como for, você vai acabar fazendo o que precisa fazer, mas sem saber o que vem em seguida, é mais emocionante.

Pedra-Negra considerou as palavras, enquanto colocava o cinto com a fivela de crânio alado, e depois falou, ainda sentado diante dela:

– Ou, talvez, esteja escrito no livro que, somente ao lê-lo, eu realizei as façanhas que almejo, e que agora passam a ser uma incerteza. E, sobre a emoção, minha querida, há uma grande diferença entre conhecer o caminho e trilhar o caminho. Se você soubesse, ontem, que teria todas certas intimidades que acabou de ter com um certo pirata, hoje, ainda sim, teria sentido tudo o que sentiu. Há coisas que vão além das palavras. Além do que está escrito.

– Está arrependido, então, de não ter aberto o livro?

– Não – o pirata respondeu de imediato. – Vejo muita beleza em tudo o que está escrito, mas, vejo ainda mais em tudo o que posso viver além do que não está.

Ela concordou, sorrindo. Ele pegou uma pena e um pedaço de pergaminho em branco e escreveu algo. Soprou e soprou e depois dobrou. Parou diante dela e perguntou:

  – Você sabe que não sei quando poderei voltar, para lhe visitar e contar sobre histórias do passado esquecido, não é mesmo?

– Sim, eu sei.

– Mas voltarei. Você tem minha palavra... – o pirata falou, e entregou o papel dobrado que colocou na mão dela. Mão que ele beijou antes de se levantar e sair.

Quase um minuto depois, ainda extasiada com tudo o que tinha acontecido, Aliandria abriu o papel e nele tinha realmente uma palavra. A palavra do pirata. Estava escrito: Ônix. Ela riu da piada, mas logo lamentou, pois talvez isso significasse que ele não prometia que voltaria, de verdade. Mas achou que ele tentaria e achou ser o suficiente.

Aliandria estava, em verdade. Não esperava que o pirata tivesse sido tão gentil e que ela teria gostando tanto quanto gostou. Mal percebeu quando outra mulher desceu as escadas que vinham do segundo andar.

A mulher era uma amiga e Aliandria não se assustou quando ela parou ao seu lado. A recém chegada tomou cuidado para ultrapassar o círculo de velas sem colocar fogo no imenso vestido vermelho. Segurava numa das mãos um chapéu negro de aba larga, com detalhes em renda rubra. Ela leu o que estava escrito no papel, por cima do ombro da bibliotecária e, bufando um riso, disse:

– A palavra dele é uma pedra. Seu coração também deve ser. Não devia acalentar esperanças. Ouvi toda a conversa de vocês e... todo o resto. Pelo menos não preciso perguntar como foi... – ela sorriu. A bibliotecária se levantou. A amiga continuou: – Não interrompi por respeitar sua escolha, mas, não tenho certeza se ele foi o melhor que poderia conseguir.

Aliandria falou, enquanto reposicionava os castiçais em seus suportes nas paredes:

– Não ter certeza se ele foi a pior, neste mundo, já é um grande alívio. O pirata veio em busca de algo muito importante para ele e, ainda assim, preferiu abrir mão disso pela minha vida. Muito mais do que muitos fariam. Além disso, quantas pessoas visitam esta biblioteca, à qual estou confinada, além de você? E, destes poucos, quantos são homens? E, destes homens, quantos não são nobres que querem apenas livros que enfeitem suas bibliotecas e os façam parecer o que não são?

  – Mas um pirata? 

  – Não se trata dele, minha amiga, e sim de mim. Meu papel neste mundo é um dever que mistura tanta honra quanto crueldade.

Belinda, este era o nome da recém chegada, sabia muito bem o motivo de Aliandria ter aceitado intimidades com o pirata. Ela não podia morrer sem gerar um herdeiro ou herdeira que assumisse, através de seu sangue, sua missão mística.

Após retirar o último castiçal do chão, Aliandria continuou:

– E, conhecendo a solidão que essa missão impõe, não sei se minha liberdade conquistada, quando meu filho ou filha tiver idade para assumir meu posto, poderá ser desfrutada sem pesar. Só me resta esperar que tal herdeiro ou herdeira encontre, um dia, uma amiga tão leal que amenize a solidão, como eu encontrei.

  – Ah! Que bom que sou levada em consideração. – Belinda sorriu. – Achei que seus únicos amigos fossem os livros. Todos os amigos dos quais você carece.

– Você estava inclusa nestes amigos – Aliandria falou, ao se aproximar da mesa. Trocou o castiçal pelo primeiro livro que sua mão alcançou. Leu o título da capa e continuou: – Depois de ... “A ordem de Ashibaki. Mito ou verdade?”, você é minha preferida.

Elas riram, mas Aliandria retomou o tom sério para dizer:

– Não sabia se o pirata seria perigoso e só quis te proteger. Ele não precisava saber que você estava aqui.

– Será que um dia viveremos num mundo no qual a violência não precisará existir? ­– Belinda indagou.

– Não – Aliandria suspirou. – Nunca. Pois violência nasce da oposição e sempre teremos oposição às nossas idéias e precisaremos lutar por elas, física ou intelectualmente.

Belinda fez uma careta e falou:

– Então continuarei tentando ser a mais versada possível no combate intelectual, que, do meu ponto de vista, é mais poderoso, pois, se o oponente é desarmado, o é em definitivo. Através da compreensão. No combate físico, basta você se virar de costas e tal oponente poderá se armar novamente contra você.

– Magníficas palavras, Belinda. Devia escrever um livro. Quem sabe os senhores deste mundo não percebem a força de tais sutilezas?

Belinda se aproximou de Aliandria, pegou os ósculos dela, colocou no próprio rosto e falou, imitando o tom da amiga:

– Quantas pessoas visitam esta biblioteca, além de mim? E, destes poucos, quantos são homens? E, destes homens, quantos não são nobres que querem apenas livros que enfeitem suas bibliotecas e os façam parecer ser o que não são?

– Nenhum. – Aliandria entendeu o recado. Mirou o vazio, desanimada.

– Nem mesmo o pirata – Belinda falou, devolvendo os óculos da amiga. – É bom que enxergue isso.

– Ele é um caso à parte – Aliandria falou, colocando os óculos.

Belinda entendeu a afirmação da amiga. A situação daquela noite havia sido extremamente fora do comum. Tinha medo exatamente por isso. Seu receio era da amiga se apaixonar por quem não devia.  Aliandria leu a preocupação estampada na cara da amiga e continuou a explicar:

– Ele finge ser o que não é, mas também é o que finge ser. Mesmo intelectualizado, é também um guerreiro.

– E você, mesmo intelectualizada, é também uma guerreira. São opostos equivalentes – Belinda apertou os lábios um no outro e reconsiderou. – A base do equilíbrio. Quem sabe não encontrou realmente um parceiro? No fundo eu ficaria feliz por você. Bem no fundo... atrás de um muro de preocupações com alguns tijolinhos de inveja.

– Não – Aliandria riu. – Não temos um futuro juntos. Não vou me iludir e não vou me apaixonar, acredite.

– Mas se você conseguir uma criança dele...

– Ele jamais saberá – a bibliotecária afirmou. – Mas, mesmo que não tenhamos um futuro juntos, minha missão terá e o livro chegará às mãos nas quais precisa chegar. E se as palavras do velho vidente estiverem certas, haverá uma esperança para um mundo no qual a violência será abrandada a ponto de não ser chamada assim.

– Então, não se trata de nunca, como você disse – Belinda sorriu.

– Você perguntou se nós viveríamos num mundo assim – Aliandria se defendeu. – Será uma nova era. Não será para nós. E, talvez por não terem conhecimento do que nós vivemos, tudo se repita, como parece estar se repetindo agora por não termos conhecimento sobre o que aconteceu no passado esquecido, como o pirata disse.

– Neste caso, escreverei, se você também escrever – Belinda afirmou, se aproximando de uma mesa, na qual depositou seu chapéu. – E você e seus descendentes guardarão nossos livros juntamente com o livro do passado esquecido que carrega o nome do pirata e, quem sabe assim, o sopro de esperança não se torna um vendaval poderoso?

– Tem razão – Aliandria estava inspirada. – Se já li todos os livros que aqui estão, porque não escrever novos?

– Aqui estão as penas – Belinda ficou com uma e ofertou a outra à amiga.

– E aqui estamos nós.  – A bibliotecária pegou a pena.

– Que comece nossa jornada rumo ao futuro – Belinda falou, erguendo a pena num ato simbólico.

– E que ela seja uma luz a mais contra a ignorância – Aliandria ergueu também a sua pena. – Se for para te incentivar a escrever, escreverei e, com isso, tenho certeza de que não serei a única grata por você ter existido neste mundo.

– Você me superestima – Belinda sorriu, trazendo a pena para junto de seu coração.

– Você se subestima – Aliandria bateu a pena na testa da amiga.

– E quem de nós estará certa?

– Deixemos os filhos do amanhã decidir – Aliandria deu de ombros.

– Mas nunca saberemos – Belinda lamentou.

– Tudo que podemos fazer é fazermos tudo que podemos – a bibliotecária falou.

– Então façamos – a mais velha afirmou. – E meu primeiro livro se chamará...

Belinda mergulhou a pena no tinteiro, puxou um papel em branco e escreveu em letras desenhadas: “O verdadeiro combate”. E na parte inferior da página acrescentou: “Dedicado à Aliandria, a amiga. Empunhe bem a espada e nunca poderá largá-la. Empunhe bem a palavra e conquistará o silêncio.”

Aliandria sorriu, sem nada dizer.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >
capítulo anteriorpróximo capítulo

Capítulos relacionados

Último capítulo