Voltando para você - Livro 3
Voltando para você - Livro 3
Por: N. O. Mendes
Prefácio

Melissa Anderson

Dia especial? Talvez seja quando eu estiver a caminho do inferno. Finalmente dezenove anos, mas para quê? Não acredito que o Salvador teve coragem de m****r o sobrinho desprezível dele comprar um bolo para mim, não me arrependo nem um pouco de ter deixado tudo para ele comer sozinho. Eu claramente os odeio, mesmo que estejam ajudando-me agora, não consigo sentir nada além disso.

Eu não queria estar nesta casa, poderia ficar em um lugar sozinha, mas ele não autorizou alega que tem medo de alguém vir atrás de mim e isso me faz odiar ainda mais essa vida.

Olho ao redor do meu quarto, não possui nada aqui que indique ser meu e nunca terá. Não sou do tipo de pessoa que caracteriza os lugares com a sua personalidade, eu apenas existo aqui e isso é por pouco tempo, pois logo irei embora.

Não posso ser totalmente mal agradecida, o Salvador deixou o quarto totalmente confortável, mais do que tudo o que já experimentei. Tenho um guarda roupa grande com roupas que jamais pensei em comprar.

Minha sapateira possui quatro gavetas cheias. Possuo uma televisão, mesa com computador e uma cortina linda na cor vinho. Minha cama esta forrada com um lençol azul-claro e a coberta é em um tom vermelho sangue. Possuo dois travesseiros macios. O quarto é pintado na cor laranja cintilante e possui alguns quadros de paisagem na parede.

Realmente tudo é lindo, mas não é o meu lugar. Nada disso é meu, não tenho fotos na parede ou algo que eu realmente goste. Não posso me apegar a um lugar quando sei exatamente o motivo de eu estar aqui.

Sento em frente ao computador e abro o meu e-mail, vejo o que esperei a semana inteira. Finalmente poderei colocar o meu plano em prática. Esta tudo certo, para o meu novo emprego, amanhã será o meu grande dia.

Sorrio, sentindo o meu rosto arder, ainda me preocupo com o bolo em cima da mesa e a expressão que deixei no rosto de Tomaz, de fato ele não tem culpa de nada do que estou passando, mas não consigo gostar do que estou vivendo aqui.

Levanto e resolvo sair, não quero que as coisas se tornem piores do que já estão. A casa é grande, quando abro a porta dou de cara com um corredor, nele temos três portas, sendo duas de nossos quartos e uma do banheiro.

Ando um pouco e desço a escada que dá algumas voltas até que eu chegue ao térreo. A sala é aconchegante, possui uma televisão grande, um sofá que consegue ser mais confortável do que minha cama e mais algumas coisas.

Vejo fotos do Tomaz com sua família, mas evito olhá-las quando me recordo que nunca terei isso. Quando entro na cozinha encontro-o sentado a mesa, seus olhos encontram os meus e vejo toda a raiva e mágoa que esta estampada, ele não faz questão de esconder e sinto-me satisfeita por isso.

— Se te conforta eu também não a queria aqui. – Diz ríspido.

— Eu sei, o Théo deixou isso claro para mim. – Falo ainda de pé não tenho coragem de me sentar.

— Então pare de agir como se fosse escolhida para algo e coma a porcaria do bolo. – Exige irritado.

Eu o encaro vendo a irritação tomar conta do seu rosto, se ele soubesse que eu já tinha sido escolhida e não era para algo bom, não falaria dessa forma, porém não posso julgá-lo ele não sabe de nada.

— Tudo bem. – Cedo e sento-me a mesa.

Corto o bolo e lhe dou o primeiro pedaço, em seguida corto um pedaço para mim. O bolo é de chocolate com morango, esta bem recheado e é uma delicia. Como um pedaço pequeno e ele desperta em mim algo que eu desejava deixar para trás.

— Venha Clara é meu aniversário, vamos comemorar. – Diz Ellya correndo por uma grama em que não deveríamos estar pisando.

— Ellya nós temos que voltar, não podemos ficar aqui. – Falo com medo, sei bem o que acontece quando ficam irritados com nós.

— Não tenha medo, não vão fazer nada. Eu quero achar um bolo para mim, tenho direito não é? Afinal é meu aniversário. – Comenta e entra em uma padaria.

Sei que ali não é o nosso lugar. O espaço é pequeno e as poucas pessoas que lá estão são distraídas. Ela escolhe um bolo de morando e saímos correndo voltando para a grama a fim de nos esconder.

— Devolvam isso suas ladras. – Grita um homem que desconheço a voz.

Não o obedecemos, corremos mais rápido enquanto ela segura o bolo. Escondo-me em um buraco que encontro perto de algumas árvores, sinto que Ellya esta vindo atrás de mim, mas ela demora e quando chega ao meu campo de visão parece feliz.

— Consegui Clara, vamos comer o meu bolo. – Diz, mas antes que consiga chegar perto de mim, ouço o estrondo.

Ela caí a alguns centímetros de mim e o bolo que parecia tão apetitoso agora esta recheado com o seu sangue. Ela ainda sorri, mesmo morta. Não a pondero acredito que esteja mais feliz.”

Sinto o meu estômago brigar comigo e o único pedaço de bolo que comi retorna com toda força. Corro para o banheiro que fica no andar de baixo e começo a vomitar mesmo sem fechar a porta, não tenho muito tempo.

Acho que tudo o que comi durante o dia esta indo embora e quando finalmente termino, dou descarga e lavo o rosto e a boca. Após escovar os dentes encaro o espelho e sinto as lágrimas invadirem os meus olhos.

Ellya era apenas uma menina com sonhos, mas ela se foi. Eu deveria ter ido em seu lugar, no lugar de todas elas, mas eu estou aqui e me odeio por isso. Tento controlar-me e vou até a cozinha, vejo que o meu colega observa-me preocupado.

— Esta maravilhoso, mas... – Paro de falar e encaro minhas mãos, sentindo as lágrimas passearem pelo meu rosto. Limpo-as e respiro fundo. — Perdoe-me, contudo sinto que não posso ficar aqui esta noite. – Digo e consigo olhar para ele.

Vejo-o respirar fundo e seus olhos curiosos me analisam, eu fico onde estou faltam-me forças para andar mesmo sabendo que o melhor que faço é sair dali.

— Tudo bem Melissa, eu organizo a cozinha, mas amanhã é o seu dia. – Murmura parecendo preocupado. — Quer me falar o que houve? – Indaga.

— Não. – Sussurro e me afasto.

Volto para o quarto e permito que as lágrimas insistentes saiam. Choro por mim, pela culpa e por todas que não puderam ser salvas. Desejo ardentemente estar com elas mesmo sabendo que não posso.

Abraço com força o meu travesseiro e me permito ficar ali sentindo o meu corpo tremer. Quando abro os olhos vejo vultos passeando pelo meu quarto, às vezes parece que eles vieram me buscar e isso me amedronta ainda mais. Fecho os olhos com força e tento concentrar-me em minha respiração, tento me livrar desses medos que querem dominar-me, mas não consigo.

Tudo volta, os temores e os medos. Isso parece possuir-me, pensei que isso acabaria, porém eles insistem em ficar comigo meus demônios, os fantasmas que me foram impostos.

Deixo que a escuridão tome conta de mim, pois já perdi as minhas forças, mas agora me sinto segura, afinal somente ela é a minha mãe. A luz nunca me foi convidativa, não sinto que sou bem vinda. Eu sempre serei filha da escuridão.

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