Ivy Calleya
O dia da viagem havia chegado, e usando um casaco de pele que cobria quase meu corpo inteiro, eu segui até a carruagem que estava à minha espera.
Enquanto caminhava sobre a neve que afundava a cada passo, minhas mãos ficaram vermelhas por conta do frio, e por um momento pensei que iriam congelar.
Quando me aproximei da carruagem pude ver uma fila extensa de cavaleiros que me aguardavam para a escolta, e no fim daquele corredor formado por homens de armadura, estavam Helena e Victor Calleya.
Apressei meus passos, e Victor, vendo minha dificuldade de caminhar, por conta do peso da roupa e também pela da fraqueza que ainda me causava tonturas, veio até mim, pegando em meu braço com carinho, e me ajudando a chegar até a carruagem.
— Filha… Você tem certeza que quer ir a esse baile? — Ele perguntou, e pude ver em seu rosto uma expressão de preocupação, ele apertou mais meu braço e eu senti que ele tinha medo que algo de ruim acontecesse.
— Sim… — Respondi de forma direta, e continuei, me aproximando de Helena, que me aguardava com uma caixa dourada em suas mãos.
— Prometo que irei tomar cuidado, não precisa se preocupar e não sou mais uma criança… — terminei, e vi ele abaixar seu olhar, ficando cabisbaixo.
— Eu sei, Ivy. — Ele soltou meu braço, e foi para o lado de Helena, abrindo a porta de carruagem.
Era a primeira vez que via uma carruagem tão grande e uma bandeira com um brasão tão brilhante, pude ver o estofado na cor violeta, e também os detalhes prateados que adornavam seu interior, ela era tão bela que faziam as carruagens reais do reino de Lyra parecerem caixas de sapato.
Quando cheguei a frente de Helena, ela estendeu aquela a caixa dourada até mim, e com um sorriso que eu não sabia ao certo se era felicidade ou nervoso, ela a me entregou.
— É um presente… como é o seu primeiro baile precisa estar tudo perfeito, encomendei. — Helena falou, e após eu pegar a caixa em minhas mãos, ela veio até mim, me dando um abraço apertado.
— Irei para Lyra daqui a alguns dias para resolver algumas questões politicas, já deixei todos informados sobre sua chegada, e também, pedi a um de nossos amigos da família Tully para que lhe emprestasse uma de suas propriedades para que você ficasse até minha chegada.
— Obrigada mãe…— Senti meu coração se aquecer, e apertei forte a caixa, a levanto para próxima do corpo em um abraço.
— Agora você precisa ir… O navio irá sair daqui a algumas horas, e você não pode se atrasar. — Ela terminou, desfazendo o abraço, e com o coração apertado eu me despedi, entrando na carruagem.
Suspirei, vendo a imagem de Helena e Victor ficando para trás através da janela, e junto aos cavaleiros, viajei por algumas horas, até chegar ao porto Colosso, o maior e mais bem equipado porto do reino de Oracalia.
Meus olhos brilharam quando vi o barco que me aguardava, era primeira vez que eu faria uma viagem pelo mar, e em meu peito, a ansiedade e o medo se misturavam.
Quando ainda era Camille Larsen, sonhava com viagens assim, mas infelizmente, vivi toda minha vida medíocre servindo a Adiel, a seu reino, e nunca fiz nada para mim mesma.
Bufei, me lembrando de tudo que havia jogado fora, meus sonhos, minhas vontades, e apertado as mangas do casaco com força, eu segui em direção à entrada do navio.
Fui recebida pelo capitão, que assim como seus subordinados, me cumprimentaram com reverência, e enquanto contavam histórias e aventuras de suas viagens pelos mares, meus pertences foram colocados em meu quarto.
Quando finalmente partimos, vi o porto se afastar, e a costa ficar distante até sumir de minha vista.
Senti meu estômago revirando, e me segurando para não vomitar, eu permaneci firme na janela, sentindo o vento frio em bater em meu rosto, o ar gélido em meus pulmões.
— Logo estarei em casa… Alexandre.— Surrarei, olhando para o céu claro repleto de nuvens, e sorri.
Estava a noite, e eu peguei a caixa que havia sido me dada de presente por Helena, e ao abri-la, vi que se tratava de um belo vestido usado pelas pessoas de reinos onde o sol reinava, totalmente diferente dos vestidos longos e fechados que eram frequentemente usados em Oracalia.
Ele era branco, lindo com alguns detalhes prateados, tinha alças finas e pequenos diamantes o decorando, era aparentemente simples, mas ao olhar para ele com atenção era possível ver o seu valor, o quanto era caro e consequentemente chamativo.
— Obrigada.. Mãe… — Eu agradeci novamente, olhando carinhosamente para o vestido em minhas mãos.
A viagem levaria alguns dias, mas isso não me assustava. Acabei me acostumando com o balançar das ondas, e quando pensei que estava habituada à rotina, com toda aquela movimentação e o barulho, um som ensurdecedor ecoou pelo navio, me fazendo dar um pulo por conta do susto, senti o chão e as paredes vibrarem, e um forte cheiro de fumaça inundar o quarto.
— Uma explosão? — Eu me perguntei, cobrindo meus ouvidos de forma instintiva.
Eu estava em meu quarto, e ouvi os gritos de desespero de todos que corriam desnorteados pelo deck, e sem pensar duas vezes, sai para ver oque acontecia.
No caminho, em um dos corredores, um dos cavaleiros que servia Helena veio preocupado até mim, ele estava ofegante, e carregava algumas de minhas malas em seus braços.
— Princesa… você está bem? — Ele perguntou olhando para mim com cuidado, procurando qualquer ferimento ou arranhão. — Precisamos partir… ouve uma explosão no casco, e não vai demorar muito para o navio começar a afundar.
— Oque? Uma explosão? Mas como? Navios não explodem do nada... — Eu questionei confusa, enquanto aquele velho cavaleiro pegava firme em minha mão, me arrastando pelo corredor até o convés, onde já preparavam um barco para que eu pudesse escapar dali.
“ Isso não tem sentido… uma explosão no navio que transporta a filha de uma grande imperatriz.. Isso tem cheiro de sabotagem… Traição… “ Pensei, sentindo o navio ceder, afundando lentamente enquanto todos gritavam e tentavam consertar as coisas antes que fosse tarde demais.
— Rápido, precisamos ir… — O cavaleiro gritou, e quando olhei para seus olhos, pude ver que ele também desconfiava de algo. — Mandem um corvo para Oracalia… Informe a sua majestade Helena oque aconteceu… e também, mande um corvo para Lyra, diga a eles que precisamos de ajuda.— Ele ordenou, e vi o próprio capitão do navio correr até sua sala para preparar a carta.
— Rápido princesa… precisamos sair daqui — Ele me puxou para perto, e enquanto me ajudava a entrar no pequeno barco, colocando o pouco de minhas coisas que ele havia conseguiu pegar, falou baixo, próximo a meu ouvido. — Tem um inimigo infiltrado no navio.
Ivy Calleya Senti meu corpo enrijecer quando ouvi aquelas palavras. — Um inimigo? Do reino de Oracalia? — Eu perguntei, olhando para o cavaleiro assustada, apertando com força. o vestido que ainda estava em minhas mãos. Eu sabia que Helena Calleya não tinha uma boa relação com os reinos vizinhos, e saber que havia um inimigo a bordo, só podia significar uma coisa: alguém queria a filha da imperatriz morta, e provavelmente era alguém próximo, pois eram poucos que sabiam da minha ida até o baile em Lyra. Me movi rapidamente, e de forma desajeitada pulei dentro do pequeno barco, e em seguida o cavaleiro fez o mesmo. Vi os outros homens que haviam ido fazer minha escolta formar uma parede de proteção, impedindo que os trabalhadores do navio que estavam fora do controle invadissem o bote. — Se mais pessoas entrarem, o bote irá afundar.. — Ouvi outro cavaleiro falar enquanto segurava um dos homens que estava fora de si. — Vão logo.. Não vamos aguentar por muito tempo. — Ele gritou cans
Ivy Calleya Encarar o fato de que aquele homem a minha frente era o companheiro destinado de Ivy, foi como encarar tudo que eu sonhei em minha vida anterior. Tudo que aquela versão minha de 16-17 anos, tinha desejado para sua vida. Um amor, um romance com alguém que verdadeiramente me entendesse, que me aceitasse. Droga. Eu não tinha tempo para pensar nesse tipo de coisa, não depois de tudo que havia acontecido comigo, não depois de tentarem me matar, de novo… Não. Eu tinha que focar no que importava, na minha vingança e claro: no meu filho, que eu iria recuperar, custasse o que viesse a custar. — Obrigada pelo convite para dançar, — acabei por dizer, tentando quebrar o silêncio que embora não fosse constrangedor ou desconfortável, ainda era um silêncio, e isso era o oposto do que eu desejava para aquele momento. — É a primeira vez que uma dama me agradece por um convite para dançar, — ele praticamente sussurrou, de forma abafada, muito provavelmente pela voz vir de dentro daqu
Ivy Calleya No momento em que minha mão tocou seu rosto, sua máscara, senti minha pele arrepiar, e no mesmo instante, ele a segurou, mas diferente do que imaginei, seu toque não era bruto, nem exagerado, era gentil. — Não deveria brincar com estranhos — Foi tudo que ele disse, ainda com sua enorme mão sobre a minha, e eu sorri. — Está com medo de mostrar seu rosto? — Perguntei, na tentativa de provocá-lo, e ouvi uma risada abafada sair daquela máscara que era quase completamente fechada. — Medo?! — ele perguntou, apertando minha mão de forma delicada, a tirando de seu rosto. — Eu desconheço essa palavra. — Ele terminou, me puxando pelo braço, me fazendo ficar confusa com seu movimento repentino. — Se quer tanto ver meu rosto assim, irei lhe mostrar — ele falou, me guiando para dentro do palácio novamente, mas dessa vez, entramos pelo corredor lateral, indo em direção às escadas que levavam aos quartos de hóspedes, (onde os visitantes de reinos distantes ficavam quando faziam visit
Sebastian Jaeger Eu estava na guerra há meses, preso em um cerco, esperando mais uma vez a ordem do imperador para que as tropas avançassem, mas isso não aconteceu. Quando finalmente recebi uma carta de Adiel, esperava tudo menos o verdadeiro conteúdo que ela continha. Ele não falava sobre a guerra, sobre os sacrifícios dos soldados e cavaleiros e das vidas inocentes perdidas, mas sim sobre um baile real, um que minha presença era necessária, — como se nada mais em todo o universo pudesse ser mais importante que toda aquela droga. “Desgraçado…” Eu pensei, apertando a carta em minhas mãos, sujando com o sangue ainda fresco em minhas mãos, o papel branco e perfumado, — e com um rosnado, gritei por meu escudeiro para passar as informações adiante e avisar a todas as tropas que estaríamos recuando. Adiel queria uma breve trégua na guerra, tudo para acalmar os ânimos dos nobres que iriam até sua “festinha” na capital de Lyra, uma cerimônia idiota feita apenas para amaciar o ego da nobr
Camille LarsenAinda consigo me lembrar vividamente do dia em que tudo começou, do momento em que pisei naquele palacete, no início da minha ruína.As mãos delicadas de Helen Wills apertavam as minhas, e eu sentia o medo pulsando em minhas veias. Helen, a irmã mais velha de minha falecida mãe, era uma das últimas pessoas vivas de minha família, de nossa linhagem.— Eu estou com medo, tia Helen… — sussurrei, a voz trêmula. E ela me lançou um olhar severo.— Deixe de frescuras, Camille — retrucou ela, com firmeza. — Não temos escolhas. Não há mais lugar para você em nossa casa. Seus pais morreram, e você sabe qual é o seu dever como ômega, como a última herdeira dos Larsen.Eu era apenas uma criança, mas compreendia as palavras que saíam da boca de Helen, era como se fossem um feitiço, ela as repetia todas as noites, antes de eu dormir, como se quisesse gravá-las em minha mente. A sobrevivência de nossa linhagem dependia de procriação, mas não com qualquer pessoa. Apenas com aquele que
Ivy CalleyaA dor havia cessado, assim como as vozes das pessoas à minha volta, e tudo que me restava eram as memórias, elas iam e vinham como ondas, me fazendo lembrar de cada acontecimento, de cada erro que eu havia cometido.Estava frio, meu corpo parecia ter sido abraçado pela neve do inverno, pelo gelo… Era como se eu estivesse adormecida por muito tempo, presa em um pesadelo.— Pela Deusa!… Chame o sacerdote… a princesa está despertando!.. — Pude ouvir uma voz rouca e grave falar, o som estava distante, mas mesmo assim era audível o suficiente para chamar minha atenção.Meus olhos se abriram de repente, e toda aquela escuridão que me cercava, resplandeceu, era como se eu olhasse diretamente para o sol, como se fosse a primeira vez que eu enxergasse a luz.— Princesa!? Você está bem? Consegue me ouvir?! Virei assustada, ainda confusa, até que aquele borrão a minha frente ficou nítido, e eu pude enxergar um velho de cabelos grisalhos, que usava uma túnica esverdeada, à minha fren
Ivy CalleyaEu me alimentei, descansei e tomei os diversos chás de ervas que aqueles sacerdotes do templo de Urc me deram, eram muitas xícaras por dia, e minha boca permanecia com o gosto amargo quase o tempo todo, mas mesmo assim continuei os tomando.Já haviam se passado algumas semanas, e eu sentia que estava ficando cada vez mais revigorada. Até que em uma daquelas manhãs frias uma das serviçais do palácio veio até mim, eles eram diferentes dos criados de Lyra, seus cabelos tinham sempre o mesmo tom claro, como se fossem realmente iguais nas histórias que me foram contadas, como se todos tivessem sido banhados pela luz da lua.— Princesa.. Vossa Majestade, Helena Calleya, chegou de viagem.. Ela deseja vê-la, e pediu para que você comparecesse ao salão para acompanhá-la no café da manhã. — Como sempre, a serviçal evitou contato visual, e após ouvir minha resposta, me auxiliou a vestir algo adequado.— Como ela é? — Perguntei despreocupada, todos estavam cientes da minha total perd
Ivy Calleya Tudo à minha volta havia ficado escuro novamente, e a única coisa que mantinha minha consciência ainda desperta, eram os gritos dos serviçais que vinham preocupados até meu corpo caído ao chão, e a voz com timbre abalado de Helena. Fui levada até meu quarto, mas diferente das outras vezes, levaram apenas 2 dias para que eu me recuperasse, e levantasse da cama sozinha, sem nenhum apoio. Eu tentei não pensar muito, não me estressar para que a saúde daquele corpo não fosse afetada, más era impossível. Toda vez que eu lembrava de Alexandre, meu pequeno filhote, nos braços da víbora que era Lindsey Ingraf, sentia minha carne tremer, e o gosto de ferro brotava em minha boca. Aquele corpo tinha pouco tempo, e eu sabia disso, e precisava de um plano, um que me desse livre acesso ao palácio de Adiel, que me fizesse ter controle sobre aqueles nobres corruptos e mentirosos, pois somente daquela forma, eu conseguiria colocar meus planos em prática. Eu precisava de poder, precisava