Desde que a minha mãe foi diagnosticada com câncer, eu tenho evitado sair de casa e comecei a passar mais tempo com ela. Me permitia sair apenas para fazer entrevistas ou ir ao mercado. Falando em entrevista, eu teria que resolver o que iria fazer. Menti para a Rose quando disse que uma empresa havia se interessado no meu currículo. Não tinha empresa nenhuma, muito menos alguém que estivesse interessado em mim.
Entretanto, ontem a noite, enquanto eu pesquisava sobre vagas de trabalho, acabei clicando em um site que me chamou bastante atenção, admito. E mesmo que ele fosse errado, eu não poderia sair escolhendo um bom emprego, se ninguém queria me dar uma chance. Minha mãe estava dependendo de mim agora. O tratamento dela custava muito mais do que nós poderíamos pagar.
— Mãe, cheguei - digo em um tom um pouco alto, para que ela escute. Deixei a minha bolsa no sofá e subi para o quarto dela - Está no quarto? - continuei sem receber nenhuma resposta dela - Mãe?
Assim que cheguei no cômodo, vi uma cena que me assustou muito, mesmo que tenha se tornado tão frequente nesse último mês.
— MÃE - ela estava desmaiada, caída no chão ao lado da cama - Mãe, consegue me ouvir? - mexi no corpo dela e continuei sem respostas.
Então, sem esperar eu liguei para uma ambulância e aguardei cerca de quinze minutos até os paramédicos baterem na porta de casa e levarem a minha mãe para o hospital.
— Boa tarde, doutor Fernandes - cumprimentei o médico assim que ele entrou na sala.
— Essa é a quarta vez, em menos de um mês.
— Sim - abaixo a minha cabeça.
— Não podemos adiar mais, querida. Ela precisa fazer essa cirurgia e o tratamento depois - eu sei. Eu sabia disso e adiar cada vez mais o tratamento da minha mãe estava me matando aos poucos por dentro. Mas eu não tinha dinheiro suficiente.
Eu olhei para a mulher de quarenta e nove anos, que estava dormindo tão tranquilamente naquela cama com lençóis brancos e decidi que não iria deixar aquilo acontecer de novo. Eu tinha que cuidar da minha mãe, e eu iria.
— Você precisa assinar o quanto antes a autorização dessa cirurgia.
— Se eu assinar, ela vai ficar bem?
— Bom, quando diagnosticado e tratado na fase inicial da doença, como foi o caso da sua mãe, as chances de cura do câncer de mama chegam a até noventa e cinco por cento. Mas ela precisa começar o tratamento agora.
— São caros? - Ele balançou a cabeça em confirmação - Quanto?
— Bom, custa pouco mais de onze mil para ser tratado no começo, mas pode pular para cinquenta e cinco mil no terceiro estágio.
Eu sentei e escondi o meu rosto entre as mãos. Não queria chorar ali, mas também não foi fácil segurar a vontade.
— E quanto custa uma sessão de quimioterapia?
— Para ser exato, o custo total médio, por sessão, corresponde a um mil setecentos e oitenta e três reais.
— Quantas sessões de quimioterapia ela terá que fazer?
— Olha… - ele olhou para a minha mãe - Isso irá depender do desenvolvimento dela, mas se tudo ocorrer bem na cirurgia, eu irei pedir para que ela faça a quimioterapia umas três vezes por mês, durante três meses. Além de fazermos também, a reconstrução mamária.
— Então, no mínimo, eu teria que arrumar cem mil reais? - fechei os olhos novamente quando ele concordou com a cabeça
— Isa, se não tiver como pagar, vocês podem entrar na fila e esperar serem selecionadas para a cirurgia, mas pode durar cerca de cinco meses até que ela seja aceita.
— Em cinco meses de espera isso pode piorar, não pode? - perguntei e novamente ele respondeu em silêncio.
— Eu preciso atender outro paciente agora, mas qualquer coisa me chame, tudo bem?
— Tudo bem, doutor Fernandes. Muito obrigada!
— Imagina! - ele sorriu e saiu do quarto, me deixando sozinha com os meus pensamentos pelos próximos vinte minutos, que foram o suficiente para que a minha mãe acordasse.
— Filha?
— Oi, mãe - me aproximei dela - Como a senhora está?
— Eu fiz de novo, não fiz? - ela referia ao desmaio e eu apenas balancei a cabeça - Já podemos ir pra casa?
— Na verdade não.
— Por que? Eu já estou melhor.
— A senhora vai ficar aqui e obedecer o médico. Daqui a alguns dias, fará a cirurgia e começará com o tratamento.
— Filha, você agendou a minha cirurgia? Sabe que não temos como pagar isso - Eu dei um sorriso para ela e comecei a mexer em seu cabelo.
— Agora temos - senti um nó se formar em minha garganta.
— Temos? Como assim? - Eu respirei fundo, não queria mentir para ela, mas era necessário.
— Eu consegui aquele cargo de assistente que eu tinha te falado na segunda-feira.
— Sério? - ela tinha aquele mesmo olhar que a Rose expressou mais cedo. Internamente eu me amaldiçoei por estar mentindo para as duas, me amaldiçoei mais ainda por estar cogitando aquela ideia.
— Sim. Eles pagam bem e eu vou conseguir pagar o seu tratamento.
— Tudo? - ela arregalou os olhos - Porque eu pesquisei e isso é muito caro.
— Eu vou pagar a metade e… - respirei fundo antes de continuar - O plano irá cobrir a outra.
— Ah meu Deus, filha - ela me abraça - Isso é uma ótima notícia.
— Sim, mãe. É uma boa notícia, não? - eu fechei meus olhos e me controlei para não chorar - Agora eu preciso ir, tá? Tenho que assinar a autorização do hospital e avisar ao doutor que ele pode agendar a sua cirurgia.
— Ok, meu amor - ela me soltou e me deu um beijo na testa - Obrigada por cuidar de mim. Sei que foi difícil arrumar esse emprego, então obrigada por ser essa filha maravilhosa. Eu prometo dar duro depois e devolver cada centavo do seu salário.
Ela começou a chorar e eu não aguentei, acabei chorando junto, mas acontece que as lágrimas dela eram de alegria, enquanto a minha era de tristeza e preocupação. Eu estava mentindo para a minha melhor amiga e para a minha mãe. Eu estava decepcionada comigo mesma.
— Eu te amo!
— Eu também te amo, muito! - ela me respondeu com certo orgulho na voz - Minha Bella.
— Amanhã eu trago algumas roupas suas e produtos pessoais, tá?
— Tudo bem - Eu deixei o quarto e fui até o consultório do doutor Fernandes. Mesmo tremendo e bastante nervosa, eu assinei a autorização para que eles dessem início ao tratamento da minha mãe.
E agora eu uma para conseguir onze mil reais para dar garantia a vida e ao conforto da minha mãe. O que mais me preocupava, era que esses onze mil reais não era nem a ponta do Iceberg.
A grande pergunta era: "Onde eu iria conseguir todo esse dinheiro?"