Thomas
— Soube que o Barão Collin Hill vai se casar. — Flora, minha jovem e animada governanta comenta de repente, enquanto ela abre as cortinas do meu quarto para deixar a luz do dia entrar.
— Bom para ele! — resmungo um tanto seco, ajeitando a minha gravata e suplicando aos céus que ela não continue com essa conversa.
— Sabe o que eu penso?
Não e não quero saber!
— Que o Senho deveria ir, sua graça. A final, o Senhor é um grande amigo do Barão, certo? — Reviro os olhos para essa sugestão.
A verdade, é que desde que perdi a Rebecca, minha esposa e o meu filho tudo ao meu redor perdeu o seu significado para mim. A morte é mesmo uma víbora traiçoeira, que roubou a dona do meu coração e pior, ela o levou consigo. Portanto, amar outra vez nunca será uma possibilidade para mim. Embora eu saiba muito bem que preciso de uma mulher aqui dentro para me ajudar a pôr a ordem nessa casa e cuidar de minhas cinco irmãs.
Não é catastrófico que a morte insista em me rondar? Primeiro os meus pais e a agora a minha pequena família.
— O convite é a coisa mais graciosa que já vi na minha vida. — Flora me desperta dos meus pensamentos. — E dizem que a rainha estará presente durante a cerimônia. Que chique!
— Não me admira — resmungo com certo desdém. — A rainha sempre o viu como um dos seus filhos — retruco, me afastando do espelho. — Preciso ir ver algumas questões com alguns fornecedores. — Mudo de assunto. — Flora, por favor avise para as minhas irmãs que podem começar sem mim.
— Oh, espere um pouco, sua graça! — A jovem governanta pede, parando bem na minha frente, impedindo a minha passagem. E com um sorriso, a garota começa a ajeitar alguns detalhes do meu terno. Depois, atenciosamente ela mexe na gravata que eu julguei estar impecável. — Pronto! — Ela sibila, arrastando a palma da sua mão pelo meu peitoral.
Contudo, percebo o vislumbre de um brilho sonhador em suas retinas quando ela ergue os meus olhos para os meus.
— Não faça mais isso! — rosno um tanto frio, arrancando imediatamente o sorriso do jovem rosto e consequentemente apago o seu brilho também.
— Me desculpe, sua graça! — Flora parece sem graça. — Eu não tive a intenção. — Ela se afasta de mim. No entanto, não seguro um olhar repreensivo.
— Saia, Flora! — ordeno lhe dando as costas, porque não quero ter que ouvir as suas explicações.
— É claro, sua graça! — Através do reflexo do espelho a observo curvar-se ligeiramente e logo ela sai do meu quarto, fechando a porta em seguida.
Respiro fundo algumas vezes.
Ainda não sei por que aceito esses seus acessos de abusos!
A verdade, é que Flora é a filha da antiga governanta dos meus pais. E que ela foi criada praticamente junto as minhas irmãs, já que ela tem a mesma idade da minha irmã mais velha. E logo de Bridget, sua mãe se afastou dos seus afazeres, a filha assumiu o seu lugar. Devo dizer que ela é um desastre com as minhas irmãs, mas com a casa, a garota até que dá conta.
— Sua graça! — Josephine, a mais velhas de minhas irmãs me cumprimenta assim que me vir descer as escadas.
— Bom dia, querida irmã! — sibilo carinhosamente, beijando a sua testa e recebo um lindo sorriso seu em troca.
— Recebi um convite para ir a uma peça com algumas amigas…
— Não! — A corto bruscamente, porém, não rude e mesmo assim desmancho o vestígio de um sorriso que nem chegou a se abrir direito nos seus lábios.
— Mas, Thomas…
— Você não tem aula essa manhã, Josephine? — inquiro a interrompendo outra vez. Ela solta uma respiração consternada.
— Eu posso faltar hoje? Só hoje, querido irmão, hã? — insiste com voz carinhosa, lançando-me um par de olhos pidões.
— Não! — respondo taxativo dessa vez. Ela resmunga algo que eu não consigo ouvir e se retira.
Que droga, preciso de alguém que as ponha nos seus devidos lugares, ou tudo irá ladeira abaixo!
— Sua graça!
— Bom dia, Alfred! Já podemos ir — falo com meu habitual tom sério, saindo de casa no mesmo instante.