Ser filha do alfa da Matilha Black é carregar um nome que nunca me pertenceu de verdade. Desde pequena, fui moldada para liderar, representar e proteger. Mas ninguém nunca me perguntou se eu queria isso. Ninguém nunca me perguntou se eu queria... ser ela.
Amber Black. Futura alfa. Loba de cento e cinquenta anos presa em um mundo onde cada escolha já foi feita por mim.
A sala de reuniões da Casa Black era fria e silenciosa. Paredes de vidro escuro revelavam a floresta densa do lado de fora, enquanto dentro tudo era moderno e impecável: a longa mesa retangular, as cadeiras de couro alinhadas, a tecnologia de última geração. Nenhum símbolo antigo. Nenhum resquício de mitos. Apenas estratégias, ordens e decisões.
Estavam todos ali.
Meu pai, sentado à cabeceira, com sua postura firme de comandante e o olhar calculista de quem carrega o peso de gerações. Minha mãe, sentada ao lado dele, elegante e silenciosa como sempre. Meu tio Dorian, o braço direito do meu pai e conselheiro da matilha. E Jace, meu primo e melhor amigo, com os braços cruzados e o maxilar travado. Ele sabia o que estava por vir. Eu sentia.
— A RedBloom está se movendo — começou meu pai, sem rodeios. — Cassandra RedBloom assumirá a liderança em breve. A menina cresceu, treinou, e agora eles dizem que ela está pronta para o trono.
Cassandra.
Eu a conhecia de longe. Bonita, cruel, estratégica. Uma alfa no sangue e no coração. E, diferente de mim, ela parecia querer o poder.
— E eles já encontraram um parceiro para ela — ele continuou, digitando algo no notebook e projetando uma imagem na tela da parede.
Um homem forte, de postura imponente e olhos escuros. Eu não o conhecia, mas a presença dele já dizia o suficiente. Ele era RedBloom. E estava pronto para a guerra... ou para o domínio.
— Não podemos ficar para trás — meu pai disse, olhando diretamente para mim. — Martin é nossa resposta.
A tensão na sala se espalhou como eletricidade.
— Ele é forte, leal, respeitado. Já provou seu valor incontáveis vezes em campo. E mais importante: está pronto para proteger você... e a liderança da nossa linhagem.
— Então é isso? — perguntei, a voz seca. — Porque Cassandra tem um parceiro, agora eu também preciso ter um?
— Não é sobre ter um parceiro, Amber — respondeu meu tio, com o tom diplomático que ele sempre usava quando queria me convencer. — É sobre equilíbrio. Força. Estratégia. Se os RedBloom formam um par de alfas, precisamos fazer o mesmo.
— E Martin é a sua melhor jogada? — questionei, cruzando os braços. — Nem sequer perguntaram o que eu quero.
Meu pai bateu a palma da mão sobre a mesa. Não com raiva — mas com decisão.
— Isso não é uma questão de desejo, Amber. É uma questão de dever.
"Não se cale, Amber." A voz surgiu repentina dentro de mim, firme como o aço e ao mesmo tempo acolhedora como um abraço quente na escuridão.
Nyx.
Minha loba interior despertava, agitada sob a superfície da minha pele.
"Você tem o direito de lutar por si. Não deixe que decidam seu destino por conveniência. Nós somos mais do que isso. Você é mais do que isso."
Meu coração bateu mais forte. Por um instante, me ancorei naquela presença familiar feroz, instintiva, minha.
Olhei para Jace. Ele não disse nada, mas seus olhos diziam tudo: Eu estou com você, aconteça o que acontecer.
— E se eu não quiser isso? — minha voz soou mais baixa do que eu esperava, mas firme. — E se eu quiser escolher por mim? E se eu quiser algo diferente?
O silêncio caiu pesado.
Meu pai me olhou como se eu tivesse dito a coisa mais absurda do mundo. Não de forma cruel, mas com a frustração silenciosa de alguém que vê um plano perfeito ameaçado por uma única peça fora de lugar.
— Amber — ele disse, com aquele tom de voz que sempre usava quando queria que eu me lembrasse de quem eu era —, a Matilha Black conta com você. Você é a próxima alfa. Seu sangue, sua força, sua liderança... são o que mantém todos nós seguros. Essa união com Martin não é apenas uma escolha estratégica. É proteção. É continuidade. É o que precisamos.
— E o que eu preciso? — perguntei, encarando-o. — Alguém pensou nisso?
"Eles não veem o que você sente, mas eu vejo." Nyx sussurrou, mais suave agora. "Eu sinto sua dor, sua angústia. Você não está sozinha nessa luta. Eu estou com você. Sempre estarei.”
Minha mãe desviou o olhar. Meu tio ajeitou a gravata, desconfortável. Martin, que não estava presente, parecia mais uma sombra pairando sobre a sala do que uma pessoa de verdade. Mas antes que meu pai respondesse, uma cadeira se arrastou.
Jace se levantou.
Ele foi até mim devagar, o maxilar ainda travado, como se cada palavra que segurava fosse uma luta interna.
— Com todo o respeito, Alfa — ele disse, dirigindo-se ao meu pai —, gostaria de pedir permissão para levar Amber lá fora. Só por alguns minutos. Ela precisa respirar... e pensar.
Meu pai observou o primo com um olhar avaliador. Jace era um ano mais velho que eu — cento e cinquenta e um anos —, mas sempre me tratou como igual. Não como a futura alfa, não como a filha do líder... apenas como Amber.
Após alguns segundos, o Alfa Black assentiu com um breve movimento de cabeça.
— Mas não demorem. Ainda temos decisões a tomar.
Jace não esperou outra palavra. Tocou levemente meu ombro e me guiou para fora da sala de reuniões. O ar frio da floresta nos envolveu assim que cruzamos a porta de vidro. A noite estava silenciosa, mas o peso da conversa ainda pulsava entre nós.Caminhamos lado a lado até o deque de madeira que se estendia sobre o penhasco. Lá de cima, dava para ver a floresta escura se estendendo até onde a vista alcançava, e o som distante de um rio cortava o silêncio como um sussurro antigo."Não importa o que eles digam lá dentro," Nyx murmurou, "só se lembre: Você é feita para liderar, sim... mas nos seus próprios termos.”Jace se recostou na grade e me olhou.— Você está bem?— Não — respondi, finalmente deixando o controle escorregar da minha voz. — Eu tô cansada de sentir que sou uma peça num tabuleiro, Jace. Como se tudo já estivesse escrito, como se eu fosse só... uma ferramenta.Ele me olhou com calma, sem pressa de responder. Como só ele sabia fazer.— Você é mais do que isso, Amber. Semp
Revirei os olhos — ou ao menos, fiz o equivalente canino disso — e me levantei. Eu sabia que ele estava certo. A paz tinha prazo. E já havia acabado.Corríamos lado a lado quando Jace parou abruptamente, o corpo tenso, orelhas erguidas.“Você ouviu isso?” ele perguntou por pensamento.“Ouvi... caiu na água. Perto da cachoeira.”A tensão tomou conta de mim imediatamente. A cachoeira era a fronteira natural entre os nossos territórios — o último limite da matilha Black. Cruzá-la era mais do que imprudente: era violação. A paz frágil entre as alcateias dependia de cada centímetro respeitado."Alerta, Amber." A voz de Nyx soou dentro de mim, firme, mas serena. "Isso pode ser só uma distração... ou o começo de algo maior."“Vamos ver o que é”, disse ele. “Mas com cuidado.”Nos aproximamos silenciosamente, as patas afundando suavemente na vegetação molhada, até os primeiros respingos da queda d’água atingirem nossos pelos. Ali, protegidos entre as árvores, nos olhamos.“Vamos mudar”, sussur
Mas ele apenas sorriu de canto, como se soubesse de algo que eu não sabia.E então… virou-se e desapareceu entre as árvores, sumindo pela floresta como se nunca tivesse estado ali.Foi como se alguém tivesse arrancado o chão debaixo das minhas patas. O elo que me puxava com tanta força se rompeu subitamente, e o vazio que ficou foi quase doloroso. Minhas pernas fraquejaram. Dei um passo para trás, arfando alto.Voltei a mim como quem desperta de um sonho intenso demais. O mundo voltou com violência. O cheiro da floresta, o som da água da cachoeira, a presença de Jace logo atrás de mim.Fiquei ali, parada, olhando para o ponto onde ele sumiu, sentindo o eco de algo que não fazia sentido..., mas que me marcaria para sempre.“Quem... quem era ele?” perguntei, mais para mim do que para Jace.Fiquei parada ali por longos segundos, observando o ponto exato onde ele desapareceu entre as árvores. O coração ainda batia como tambores antigos, e meu lobo rosnava baixinho dentro de mim, frustrado
Alfa: É o desígnio do filho primogênito do atual alfa, podendo ser menino ou menina.Conselho Alpha: Grupo dos lobos líderes, que participa de reuniões importantes para melhorar o futuro da matilha.Beta: Braço direito da futura Alfa Ômegas: Membros da família real da matilha, como irmãos do alfa, primos e demais participantes. Gamas: Membros da matilha, podendo ser machos ou fêmeas. Guardiões: Guardas da Matilha e das fronteiras.Vareth: O elo que uni as almas destinadas a ficarem juntas. Lua de Sangue: Acontece apenas quando um novo alfa está pronto para se tornar líder.Monte Lunar: Zona neutra onde é realizada coroações e casamentos de todas matilhas de Lunaris. Acasalamento: Quando dois parceiros finalmente se aceitam de corpo e alma, marcando um ao outro para sempre. Ciclo de Calor: Período intenso que acomete as fêmeas que só passa quando se relacionam com seus parceiros. Caso não ocorra, torna-se insuportável, causando muito sofrimento para ambos. Podem durar até 7 dias.
A reunião do conselho terminou como todas as outras e nem me surpreendia mais. Cassandra mais uma vez se levantou enfurecida e deu as costas deixando todo mundo boquiaberto com sua atitude. Minha prima era valente, destemida, uma alfa perfeita, nasceu destinada a liderar e eu nasci destinado a ser o seu braço direito, para apoiá-la em quaisquer circunstâncias. Observo-a sair do grande salão a passos largos, fúria emanando dos seus poros e no meu íntimo, sinto graça.Cassandra está cansada de saber que o conselho não vai mudar, se enfurecer e sair pisando dura só os faz perceber o quão afetada ela está, por isso pressionam mais para encontrar a leve fissura e fazê-la ceder. O que o conselho não percebeu ainda, é que minha prima nunca está sozinha.Levanto-me gentilmente e antes que eu possa dar as costas, a voz do alfa me faz parar.— Aaron, vá procurar aquela mimada da sua prima e traga-a de volta. — Meu tio, Benjamin, o poderoso alfa da matilha Redbloom ordena. — Precisamos ajustar e
Reviro os olhos para o que diz, ela sempre reage de forma exagerada e eu sempre vou jogá-la no lago quando tiver oportunidade. Ninguém manda ela ser tão desatenta. Para não ficarmos em uma conversa unilateral, ergo-me mudando de forma, mas no segundo em que meus olhos se encontram com o seu, não me contenho mais e explodo em uma risada capaz de derrubar as árvores dos arredores de tão alta. Começo a soluçar de tanto rir e preciso me dobrar, apoiando-me nos joelhos para recuperar o fôlego e conseguir falar.— Tinha que ver, seus olhos se arregalaram quando percebeu que estava no entorno da cachoeira e não ia conseguir fugir. — Digo e minha voz sai estrangulada devido a risada alta que soltei segundos atrás. — Você é tão fácil de distrair Cassie, só precisei passar na sua frente e tomar outro rumo.Seu semblante muda e nos próximos minutos, entramos em uma conversa séria da qual queria evitar por mais alguns instantes, não queria que clima ameno e tranquilo no qual estávamos mudasse, m
Cassandra está desesperada atrás de respostas, o dia já está prestes a amanhecer e nós dois estamos perdidos por entre os livros. Minha prima está decidida a descobrir qual a ligação com aqueles dois antes mesmo do dia amanhecer, ela está convicta que houve bruxaria naquele momento. Já eu, acho que foi algo muito diferente disso, embora não consiga associar exatamente o que é.Ouço um engasgo e preocupo-me, me aproximando rapidamente da minha prima que empalideceu e encara as páginas de um livro antigo em suas mãos como se fosse seu pior inimigo.— O que? — Pergunto baixinho, ela ergue a cabeça e me encara, em seus olhos é visível o pânico que ela sente e aos poucos, vou me sentindo cada vez mais envolvido naquela nevoa sombria. — O que você descobriu?— Aqui diz detalhadamente tudo, Aaron, não deixa rastro para dúvidas, muito menos pontas soltas..., mas eu não aceito!— Não aceita o que?— Leia, atentamente o que está escrito aqui. — Diz com a voz falhando e me entrega o livro pesado
— Isso só pode ser um engano Cassie. — Seu rosnado atravessa a biblioteca e chega a mim, encolho-me brevemente, respiro fundo e encaro a loba, Lyra está totalmente no controle agora e lidar com ela é como lidar com fogo, sua postura está toda altiva e tomba a cabeça para o lado, me lançando um olhar mortal. Que grande merda. — Você se enganou, Lyra, assim como Osiris... Não é possível que vocês acreditem mesmo que encontrou seus parceiros, logo na matilha Black, é inaceitável.Seu peito ruge em pura fúria, fazendo-me estremecer.— Vocês, humanos, complicam tudo. Devia ser fácil, ser lindo, ser único. Meu parceiro estava lá, do outro lado do rio, lindo como os flocos de neve e não me deixaram chegar perto dele!! — A voz que surge sai uma mistura estranha de rosnado e delicadeza. — Eu o quero!— Lyra isso é impossível.— Não ouse dizer que estou errada, Aaron Redbloom... Se Osiris deixou que mantivesse sua controle, é porque ele tem um plano maior para tudo isso. Mas eu não aceito isso