Capítulo 05

Chego à minha antiga casa e olho para onde eu vivi os melhores dias da minha vida, eu não fazia ideia do quanto as coisas poderiam mudar, o quanto tudo poderia ser destruído.

A pequena cabana agora cheirava a mofo, as janelas estavam quebradas, provavelmente os bichos tenha entrado depois que fomos embora, ou algum viajante a usou para algo, ela estava caindo ao pedaços, mas ainda me sentia mais segura aqui do que na enorme casa que me deram para morar. Lembro- me do dia em que nos mudamos, a carruagem de ouro parou de frente a nossa casa. O homem de cabelo branco e com uma barriga enorme nos mandou entrar, pois eu era uma das escolhidas da rainha e isso era uma grande honra.

 Eu não sabia, na verdade não tinha idade para entender, apenas sabia que meus pais estavam com medo e aquilo deveria ser um sinal.

Comecei a levantar as cadeiras que estavam no chão, o pó tomava o lugar, eu sei que é bobagem limpar esse lugar, sabendo que nunca mais voltarei aqui, mas parecia certo deixá-la limpa, a floresta tinha tomado todo o lugar, a casa estava cercada por ervas daninha, os cupins comeram as paredes, uma chuva forte e a casa seria desfeita, meu país nunca poderiam voltar a morar aqui, uma parte minha acreditava que eles voltariam, que quando as novas escolhidas fossem levadas, eles voltariam para cá, tentaram me esquecer e com sorte conseguiriam. Mas vendo a casa assim, eu soube que isso era só um sonho bobo, eles jamais voltariam, nunca mais seria como antes.

Fiquei ali na casa mais tempo do que esperava, olhei tudo, cada coisa que toquei me fez lembrar de algo, cada coisa tinha sua história e quando vi já era tarde demais para voltar pra casa, então deitei na minha antiga cama que não chegava a ser tão confortável e nem tão bela quanto à outra, mas me abrigava e me confortava muito mais. Senti que havia camundongos ali, mas não liguei, era bem melhor do que não escutar barulho nenhum.

Olho para o espelho quebrado, onde minha mãe se via e cantarolava, ela inventava músicas que acha que eu iria gostar e dizia em suas letras que mulheres iam à guerra, até dizia que mulheres venciam as guerras. Mesmo ela não acreditando nisso era maravilhoso como ela me fazia acreditar.

Agora ela não canta mais, mesmo tendo um espelho muito maior na nova casa, seus olhos verdes não brilhavam mais como antes e seu cabelo preto sempre estava preso em um severo coque. A felicidade dela tinha ficado ali, agora sei que a felicidade de todos nós tinha ficado ali, junto com aquele espelho velho, junto a essa cabana velha.

Já estava sonolenta quando ouvi um barulho vindo do lado de fora, vozes e passos podiam ser ouvidos. Me ergui da cama e fui de fininho até a janela para ver três senhores de armaduras, as quais reluzia no escuro da noite e sobre a luz da lua, deviam ser da cavalaria da rainha.

— Vamos pernoitar aqui? — Um homem questiona os outros.

— Sim, já estamos perto do reino. — Um deles fala parecendo bem disposto a se abrigar na casa, que para eles deve estar abandonada.

— Preferível dormir sobre as estrelas, pois elas não caíram sobre nossa cabeça. — Um dos homens fala.

— Se esqueceu dos ladrões da floresta? — outro protestou.

Eu não conseguia ver seus rostos, mas eu sabia do que eles estavam falando, falavam dos dois irmãos que eram os ladrões mais perigosos de toda a floresta e que todos conheciam histórias a respeito dos feitos deles.

Sentei-me no canto e fiquei os observando, eles fizeram uma enorme fogueira do lado de fora, onde costumava ser meu quintal e os três se sentaram, havia um homem mais velho de cabelos grisalhos, o segundo que não parecia tão velho assim, mas que não chegava a ser novo com o último deles, que de onde eu podia ver aparentava ser pouco mais velho do que eu, porém era ele que comandava os outros.

— Está ansioso para rever a rainha? — O mais velho de cabelos brancos pergunta olhando para o mais novo.

— Ela é a mulher mais bela de todo o reino. — Ele diz orgulhoso como se aquilo fosse uma resposta.

Não tem como deixar de notar o quanto ele é bonito, mesmo na penumbra da noite é iluminado pela luz da fogueira a sua frente percebi os ombros largos envoltos na armadura, a bela barba aparente e os cabelos grandes e alinhados. 

— Sim ela é! — Outro diz com rancor.

— Não vejo a hora de tê-la em meus braços. — ele rebate e sinto uma curiosidade imensa para ver seu rosto, para ver o amante da rainha.

— Sorte sua rapaz que foi escolhido por ela! — Diz o velho.

— E quando ela se cansar, ficará sem a cabeça assim como todos os outros. — o outro ranzinza continua.

— Não diga isso Bartolomeu. — O mais velho repreende o homem de nariz torto.

— O deixe Emanuel, ele só sente inveja assim como todos. — O belo rapaz diz alegre.

— Então a pedirá em casamento? — Outro diz com tom de gozação.

— Sabe que a rainha não se casaria comigo e nem com ninguém.

— Isso não é verdade. — O mais velho diz.

— Ora, quantos estão vivos depois disso? — O narigudo pergunta com a voz de desdém 

— Ela não os mata. — O mais jovem diz e percebo que está muito irritado com a fala do companheiro.

— Só morrem em batalhas quando não são mais convenientes. — Bartolomeu fala mexendo os ombros, aparentemente ele não acreditava na rainha tanto assim.

— Ousa questionar a honra da rainha?! — o jovem se altera mostrando seu desconforto com a conversa, afinal falar da rainha dessa maneira era visto como traição.

— Um ainda vive. — O velho fala calmo, como se não notasse quantos os outros estavam exaltados.

— Você... — O mais novo parecia absurdo demais para terminar a pergunta.

— Não, mas conheci alguém que foi dela. — o velho confidência. — Está bem vivo até onde sei.

— Como pode? Não conheço um homem que continue vivo. — O homem de nariz torto diz.

— Ele pediu a permissão para não fazer mais parte da guarda do reino. Conheceu o verdadeiro amor e disse isso para a rainha. 

— E ela foi piedosa? — A voz surpresa do homem, era algo que me assustava. Claro que sempre pensei o pior da rainha, mas ela fazia tudo para o bem do reino, era isso que eu e as outras aprendemos.

— Não sei se o que ela fez com eles possa se chamar de piedade , mas ele está vivo se é o que importa.

— O que ela fez? — O soldado mais novo perguntou tão curioso com a história quanto eu, que continuava a ouvir tudo encoberto pelas sombras em meu quarto.

— Não posso dizer — O velho se deita dando por encerrado o assunto.

— Acredita nele? — O belo rapaz pergunta para o outro.

— Não sei, mas  Emanuel não costuma mentir.

— É melhor dormimos amanhã vamos ter um longo dia pela frente. — Eles se deitam e eu os observo até não haver mais fogueira, era estranho ver outros falarem da rainha assim, sem uma adoração exacerbada, mas aquilo aquietou o meu coração.

— Acorde! — Por um momento pensei que estava sonhando, a voz era suave como se não quisesse me assustar, me remexi para o lado e o cheiro de madeira velha me faz lembrar da onde estou, sinto meu coração dar um salto. Abrir os olhos e  me deparo com um par de olhos verdes me encarando, ele apontava um espada para mim.

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