Patrícia, com seus trinta anos e a beleza estonteante que sempre carregou como uma arma, engoliu em seco. Seus olhos verdes, normalmente altivos, estavam marejados. Os cabelos loiros perfeitamente penteados, sua postura firme. Mas por dentro, ela estava devastada.
— Heitor, por favor... — sua voz saiu num sussurro, embargada. — Nem eu nem seu pai tivemos culpa. Simplesmente... aconteceu. Eu era jovem, imatura, e ele... ele também. A vida nos atropelou. Não foi por maldade, simplesmente aconteceu. — Aconteceu? — ele riu sem humor, com um toque de escárnio. —Me trair com meu próprio pai ,não foi um acidente ,foi uma escolha dos dois e eu nunca vou perdoa-los por isso. Olha a ironia da vida você preferiu meu pai por causa de grana e hoje eu sou muito mais risco que ele. — Some daqui. E nunca mais coloque os pés nessa holding. Se eu vir você aqui outra vez,eu pessoalmente jogo você na rua.. Patrícia vacilou, ferida pelo desprezo dele. Saiu em silêncio, olhos marejados, mas também com o orgulho ferido e uma raiva latente pela forma como ele ainda a tratava, mesmo depois de tantos anos. Assim que a porta se fechou atrás dela, a tempestade irrompeu. Heitor chutou a cadeira, arremessou o celular contra a parede, virou sua mesa com um empurrão feroz. Papéis voaram, porta-canetas se espatifaram no chão. A fúria dele era mais que visível: era quase tangível. Laura, que ouvia os sons de destruição do lado de fora, congelou. Um calafrio percorreu sua espinha quando ele ligou o aparelho de comunicação e sua voz soou com rigidez: — Laura. Na minha sala. Agora. É urgente. O coração dela bateu acelerado. Cada passo até a sala dele era uma mistura de medo, tensão e uma inquietação que ela não sabia nomear. Respirou fundo antes de empurrar a porta entreaberta. — Senhor Arantes eu... — Entre. E tranque a porta! — ele vociferou sem nem olhar para ela. — O quê? Eu acho melhor chamar alguém da limpeza ... — Eu mandei entrar e fechar a porra da porta! Por acaso é surda? A fúria dele a atingiu como um tapa. Mas Laura, talvez movida pelo susto, talvez por puro instinto, perdeu o medo. — Não, eu não sou surda. E também não sou seu capacho. Sou sua funcionária. Não tem o direito de gritar comigo desse jeito! Ele se virou, os olhos ardendo de raiva. Avançou dois passos. — Quem você pensa que é pra me desafiar? Está despedida. Pegue suas coisas e suma da minha frente! Vocês são todas iguais! Não valem nada! — Ah, então é isso? Vai gritar e me demitir só porque não aceito ser tratada como um lixo pelo senhor ? Se pensa que vou aceitar esse comportamento só porque está acostumado a ter tudo que quer, está enganado! Sou eu que me demito! — Não antes de eu te dar a certeza que você disse que não tinha — disse Heitor, a voz baixa, controlada, mas com um tom de ameaça velada que fazia a pele arrepiar. Ele se aproximou lentamente, os olhos fixos nos dela com uma intensidade cortante. Parou a poucos centímetros de seu rosto, tão perto que Laura podia sentir o hálito mentolado dele roçar seus lábios como uma provocação silenciosa. — Do que está falando? — perguntou, a voz saindo mais fraca do que gostaria. Heitor sorriu de lado, sem humor. Seus olhos a fitaram como se enxergassem além da superfície. — Da sua mensagem provocadora ontem à noite. Aquela em que você disse que não tinha certeza de nada. — Ele segurou a mão dela com firmeza, mas sem brutalidade, e a levou até seu peito. — Acha que meu coração bateria assim se eu não te quisesse, Laura? A mão dela repousava sobre o peito dele, sentindo o ritmo acelerado, quente e firme sob a camisa impecavelmente alinhada. Ela quis puxá-la de volta, mas estava presa no olhar dele, no magnetismo estranho que sempre a deixava vulnerável. — Isso é...não prova nada. — É mesmo? — murmurou ele, deslizando a mão dela para mais abaixo, até ela a evidência do corpo dele do que ele dizia ,sua enorme ereção. — Acha que eu estaria assim... se não te desejasse? Laura puxou a mão rapidamente, como se tivesse sido queimada. O rosto pegou fogo de vergonha, raiva... e algo que ela não queria nomear. — Você só pode ser um monstro — disse ela, tentando recuperar o controle da própria voz. — Seu pai está no hospital, senhor Heitor . E você está aqui... pensando em sexo? — Meu pai está bem — respondeu ele, seco. — Liguei pessoalmente para o médico que o atendeu. Um profissional de minha confiança. Ele me garantiu que não há risco imediato. A vadia da minha madrasta usou isso como desculpa para me forçar a vê-lo Laura piscou, confusa. — Por quê? Ela queria que você fosse até lá? Heitor deu de ombros, mas seu semblante estava fechado, sombrio. — Provavelmente uma tentativa desesperada de reconciliação. Ou de apaziguar a culpa que os dois carregam desde que destruíram minha vida. O silêncio entre eles pesou. Laura não sabia o que responder. A dor que ele tentava esconder estava ali, evidente. E, por um momento, ela esqueceu da tensão, da provocação. Quis tocá-lo de novo, não por desejo, mas por empatia. Mas ele mudou de tom tão rápido quanto veio, voltando a erguer o muro que separava o mundo dele do resto das pessoas. — Já chega de perguntas. Você ainda é minha funcionária, e o fato de eu querer te levar pra cama não te dá o direito de invadir minha vida pessoal — disse ele, agora num tom frio, quase cruel. — Você me demitiu. Na verdade, eu pedi demissão. Então, tecnicamente, não sou mais sua funcionária — rebateu ela, erguendo o queixo, tentando ignorar o coração que ainda batia forte. — Se quiser sair, tudo bem. Mas terá que cumprir o aviso prévio. E até lá, ainda trabalha para mim. Portanto, continue sendo uma boa menina e chame alguém da limpeza para organizar essa bagunça. Laura cruzou os braços, desafiadora. — Eu não acato suas ordens, senhor Arantes. Ele arqueou uma sobrancelha, se aproximando novamente com aquele olhar indecifrável. — Tem certeza? — perguntou, em tom suave, quase irônico. — Porque eu lembro bem da mensagem que te enviei. Pedi que viesse de vermelho hoje... e você veio. — Eu não estou usando vermelho — disse ela, firme, tentando manter a pose. — Não? — Ele inclinou o rosto para o lado, como se estivesse analisando-a. — Então me deixe ver sua calcinha.