O Grito Que Nasceu Primeiro
Aria
É estranho como o corpo armazena memórias que a mente tenta empurrar para porões.
Eu achava que o parto de Julian estava contido nos arquivos “assunto encerrado”, mas bastou ver Alexandro correndo pelas obras, erguendo licenças como escudos, para sentir a antiga dor vibrar nos ossos.
Esta madrugada, o céu de Tiradentes está pesado de nuvens.
Sento na poltrona, no escuro, e deixo as lembranças se abrirem como portas rangentes.
Quatro anos atrás. Hospital Regional, 03:17 da manhã
O corredor cheira a alvejante e susto.
Estou sozinha numa cadeira de rodas, as contrações explodindo em dores insuportáveis como trovões internos.
A enfermeira, gentil mas apressada, pergunta se o acompanhante ficou preso no trânsito.
Minto que sim, mesmo sem saber se Alexandro ainda me amava ou já me odiava de vez.
— Respira, querida, respira! ela diz.
Segue empurrando enquanto o mundo se estreita em luz fluorescente.
No pré-parto, o lençol gelado cola nas coxas.
Lembro