Ethan não dormiu naquela noite.
O rosto de Ema — seus olhos frios, o tom impassível, a forma como o ignorou diante da multidão — queimava em sua mente como ácido. Ele andava de um lado para o outro no quarto do hotel em Revieras, camisa entreaberta, os cabelos bagunçados pela frustração. Como ela pôde esconder quem era? Como ela pôde desaparecer, forjar a própria morte, e voltar agora… mais poderosa do que nunca? “Ema Castro.” Ele repetia o nome como um mantra, ainda tentando encaixá-lo na imagem da mulher que conheceu. A Ema Lina era doce, espontânea, um pouco rebelde, mas nunca… manipuladora. Ou talvez sempre tivesse sido. E ele, cego pela arrogância, não viu. Pegou o celular e abriu a matéria mais recente: “A misteriosa herdeira do império Castro faz sua estreia oficial e causa alvoroço entre os grandes empresários de Revieras e Mali Beach.” A foto anexada mostrava Ema sorrindo para a câmera, segura, radiante, com um olhar que não pedia aprovação — ordenava respeito. Ethan apertou o celular com força. Ele precisava falar com ela. De verdade. Precisava entender o que era verdade e o que era só jogo. E, acima de tudo, precisava dizer… que a queria de volta. --- — Você está ficando maluco — disse Lucca, enquanto dirigia o carro pela orla de Revieras. — Cinco anos se passaram. Ela mudou. Você mudou. E... ela claramente não quer te ver. — Ela me odiar é melhor do que me esquecer — retrucou Ethan, seco. Lucca olhou de relance para o chefe. — Você não quer apenas conversar com ela, não é? — Eu quero tê-la de volta. O silêncio preencheu o carro por alguns segundos. — Você está preparado para o que vai enfrentar? Ethan olhou pela janela, onde as ondas quebravam na areia com fúria ritmada. — Não. Mas isso nunca me impediu antes. --- No casarão branco no alto da colina, Ema girava a taça de vinho tinto entre os dedos. A vista era impecável, o mar tocava o céu no horizonte, e o vento noturno dançava pelas janelas abertas. Mas seus pensamentos estavam distantes. — Ele foi atrás de você? — perguntou Lisa Sato, jogada no sofá com um robe de seda e expressão curiosa. — Tentou. Eu não deixei. — E como você se sentiu? Ema sorriu sem humor. — No controle. Lisa a observou em silêncio. Sabia que por trás daquela resposta havia um emaranhado de emoções que Ema se recusava a nomear. — Você ainda o ama? — Eu amo a mulher que eu sou hoje — respondeu, virando o resto do vinho. — E ela não tem tempo para um homem que um dia a destruiu. Lisa sorriu com carinho. — Você sempre foi boa com frases de impacto. — E você sempre foi boa em lembrar que nem tudo que a gente diz é verdade. Lisa se aproximou. — Ema, olha pra mim. Se ele for atrás de você de novo — e ele vai — você está pronta? Ema se levantou, caminhou até o espelho e encarou sua própria imagem. Os olhos escuros não eram mais os de uma garota apaixonada. Eram os de uma mulher ferida que aprendeu a ferir de volta. — Estou. E, dessa vez, eu tenho o palco e a luz. Ele só tem a culpa. --- Dois dias depois, Ethan invadiu o saguão da Fundação Castro sem aviso. — Preciso falar com a senhorita Ema — disse à recepcionista, a voz firme. — Ela está em reunião, senhor Sanchez. E, para falar com ela, é necessário agendar. — Não vou sair daqui até vê-la. A mulher hesitou, claramente desconfortável com a presença insistente daquele homem conhecido por sua influência — e por seus escândalos empresariais discretamente abafados. Depois de alguns minutos, um segurança se aproximou. — Senhor Sanchez, a senhorita Ema mandou avisar que o senhor pode entrar. Mas tem apenas dez minutos. Ethan subiu os degraus com passos decididos. Quando a porta se abriu, ela estava de costas, observando a vista da sacada de vidro. Ao ouvir a porta fechar, virou-se lentamente, sem pressa. — Você tem um talento especial para aparecer sem ser convidado — disse, sem sorriso. — Preciso conversar com você. — Isso está claro. — Por que forjou a própria morte, Ema? Ela riu, sarcástica. — Eu não forjei uma morte. Eu fugi de uma vida. Da vida que você me ofereceu com desprezo e desconfiança. — Eu errei, eu sei. Mas você me tirou o direito de saber que estava viva. De tentar me redimir. — E por que eu deveria dar esse direito a você? — rebateu, o tom mais frio. — Você deu algum direito a mim quando me humilhou? Quando duvidou de cada gesto meu? Quando me acusou de interesseira sem nem me ouvir? Ethan recuou um passo, atingido. — Eu era um idiota. Cego pela raiva, pelo orgulho. Mas quando achei que você tinha morrido… Ema, eu quase enlouqueci. Ela o olhou por um longo segundo. Pela primeira vez, um vislumbre de dor percorreu sua expressão, mas foi rápido — e logo substituído por algo mais perigoso: indiferença maquiada de elegância. — Você teve cinco anos para se arrepender. Eu tive cinco anos para me transformar. E agora, Ethan… você vai ter que assistir. — Assistir o quê? Ela se aproximou, parou a poucos centímetros dele, olhos nos olhos. — Assistir à mulher que você perdeu... brilhar. E ignorar você como se fosse invisível. E, antes que ele respondesse, Ema virou-se com um passo elegante e voltou à sua mesa. — Acabou o tempo. Pode se retirar. Ethan a olhou por um momento, completamente dividido entre raiva, dor e admiração. Ela estava ali. Ela era dela mesma agora. E ele... ele era só um fantasma do passado implorando para voltar. Mas o jogo estava apenas começando.