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CAP. - A Forja dos Sobreviventes Parte 1.

CAP. - A Forja dos Sobreviventes- Parte 1

O escuro era absoluto. Darius não corria, ele caía. Um abismo sem fim que roubava o ar dos seus pulmões. O vento cortava o seu rosto, frio como a lâmina de uma adaga. E então, o nada. Ele não aterrou. Apenas parou, a flutuar suavemente, como se o próprio ar o tivesse segurado.

Ao olhar para baixo, o que viu paralisou-o. Não era um reflexo, era uma promessa. Um homem. Os cabelos loiros eram os seus, mas o rosto tinha contornos firmes, um queixo definido que ele não possuía. E os olhos... os seus olhos azuis brilhavam com uma intensidade que o assustava, carregados com uma dor que ele ainda não conhecia. Metade do rosto banhado em luz, a outra metade engolida por uma sombra que parecia viva. O olho esquerdo, cercado por uma borda vermelha, era um poço de escuridão.

É isso que eu vou me tornar?

Darius acordou com um puxão no braço, ofegante, os cabelos grudados à testa pelo suor, os olhos azuis arregalados. A luz do dia feriu seus olhos. O cheiro não era de maresia ou sangue, mas de suor e tecido úmido. Dezenas de rostos infantis o encaravam, uma mistura de curiosidade e pena. Logo percebeu que as crianças que o rodeavam eram de diferentes reinos. Olhares curiosos e preocupados se voltaram para ele. Ele estava numa tenda, deitado num catre. O sonho desapareceu, mas a sensação de escuridão permaneceu, colada à sua pele como uma segunda camada de suor frio.

— Você acordou! Como você está? — perguntou uma menininha, os olhos grandes demais para o rosto pequeno.

Darius apenas a encarou, a garganta apertada. A realidade era, de alguma forma, mais assustadora que o pesadelo.

Darius passou a mão no rosto enquanto lembranças pesadas invadiam sua mente: a destruição, a morte de sua família, a solidão. Tudo parecia real agora.

— Qual é o seu nome? — perguntou uma garota de rosto redondo e cabelos cor de laranja. No peito, um símbolo de três ondas denunciava-a como sobrevivente de Nerevia. — Eu sou a Marsalla.

Darius hesitou. O nome que César lhe dera parecia estranho em sua própria língua.

— Eu sou… meu nome… eu… — ele hesitou — eu sou Darius. Me chamo Darius — murmurou, com a voz embargada.

— Certeza? — ela retrucou, desconfiada.

Um rapaz de pele morena aproximou-se.

— Eu sou o Lior. Você ficou apagado por uns quatro dias. Veio de Nerevia, certo? — disse, a voz baixa. — A minha família também morreu. Nós éramos de lá.

A palavra "morreu", dita de forma tão simples, atingiu Darius como um soco. Ele afundou o rosto nas mãos. Logo, outros soluços ecoaram pela tenda. Eram todos órfãos da mesma guerra.

Darius ergueu os olhos marejados, confuso.

— O que aconteceu? Por que Nerevia foi atacada pelos outros três reinos?

Um rapaz mais velho, de braços cruzados e ar arrogante, quebrou o silêncio.

— Parem de choramingar. Não vai trazer ninguém de volta.

Marsalla olhou para ele, os olhos verdes faiscando.

— E quem é você para falar?

— Eu sou o Leonar, de Stoneval. E eu sei por que isso aconteceu. Vocês não sabem de nada? O mundo é sustentado pelo equilíbrio dos quatro reinos. Se um deles se mete com magia negra, como o rei de vocês aparentemente fez, todos os outros sofrem as consequências. Foi por isso que os outros reinos intervieram.

— Mas… que equilíbrio? — perguntou, pensando na hipocrisia — Matou tanta gente que provavelmente nunca tinham ouvido falar do Submundo, ou talvez nunca sequer tivessem visto o rei.

— Eu só sei que, na minha vila, na enseada, os peixes sumiram há meses. A água ficou parada. Meu pai dizia que o Oryn estava secando — disse Lior, com a voz embargada.

Leonar estalou a língua, impaciente.

— Oryn é a essência da vida. Nasce do Yin, que é a calma, e do Yang, que é a força. Em Nerevia, o Yin se corrompeu. Por isso tudo morreu. É simples.

Darius ouviu tudo em silêncio. Oryn. Yin. Yang. Palavras que César lhe tivera ensinado em lições aborrecidas, sob o teto dourado do palácio. Ele nunca imaginou que elas teriam o cheiro de cinzas e o som de choro.

— Por que estamos aqui? — perguntou Marsalla, olhando ao redor, insegura. — E também há crianças de outros reinos, nunca ouvi sobre algo assim.

— É o "Forja dos Elementais" — disse Leonar, com a naturalidade de quem fala o óbvio. — Acontece todos os anos. A única diferença é que nos arrastaram para cá mais cedo. A queda de Nerevia desequilibrou tudo. O mundo precisa de nós antes do tempo.

Mikkel, o rapaz de cabelos castanho-ruivos, concordou com a cabeça.

— É verdade. O meu irmão mais velho é soldado em Ignel. Ele disse que os Grão-Mestres estão desesperados. Ele esteve em Nerevia há uns meses, numa excursão, e disse que o Oryn de lá estava fraco.

Max, o menino baixinho que até então só observava, falou pela primeira vez, a voz trêmula.

— Fraco? Na minha vila, ele já tinha secado. — Todas as cabeças se viraram para ele. — Eu era da enseada perto do cais. Não havia peixes. A água do mar estava parada, sem ondas. Os adultos... eles perderam a energia. Foi por isso que a comida começou a faltar.

Um murmúrio de medo percorreu a tenda. A história de Max era mais real e assustadora do que qualquer teoria.

Leonar estalou a língua novamente, impaciente por ter perdido o controle da conversa.

— É óbvio que isso ia acontecer. O Oryn nasce do equilíbrio. O Yin de Nerevia, a calma, a defesa, foi corrompido. E quando o Yin se corrompe, o Oryn seca. É a primeira coisa que se aprende em Stoneval.

— Será que alguém da família real sobreviveu? — uma criança mais ao fundo perguntou, a voz cheia de uma esperança frágil. — Se sim, ele é o nosso símbolo...

— Tomara que ele tenha morrido — a voz de Lior cortou o ar, seca e grossa como uma lixa. — Isso trará paz.

Darius abaixou a cabeça, engolindo em seco. Sentiu o sangue subir-lhe ao rosto, uma vontade imensa de gritar que eles estavam errados, que o seu pai era um bom homem. Mas a única coisa que podia fazer era calar-se. Misturar-se. Desaparecer.

Ele nunca tinha saído dos muros do castelo. Tudo o que sabia vinha dos livros, das histórias dos antepassados, da luta entre o céu e a terra, dos dragões, dos heróis, até os demônios e tudo o conhecimento vinha das lições do tutor, que lhe ensinou as bases da magia e o que era o yin. Por anos se achou um fracasso, incapaz de despertar seu poder, mesmo sendo filho do rei. Treinou em silêncio, treinou até a exaustão, até finalmente conseguir. Mas quando conseguiu… o destino lhe roubou tudo. Nunca pôde mostrar ao pai o que havia aprendido.

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