- Malú - chamou Ramon Galeto, o chef e dono do restaurante Galeto Grill - Eu testei sua receita.
Malú largou a faca que cortava os legumes e se desviou dos garçons que retiravam seus pedidos, então chegou próximo de Ramon completamente animada, era sua Sous chef, e cozinhar uma paixão. O sonho de Malú sempre foi o de se tornar uma chef renomada assim como Ramon e, em algum dia, ter seu próprio restaurante. Mas, enquanto não conseguia juntar o dinheiro o suficiente para isso, aceitou aquela oportunidade de trabalhar com ele. Sua função era estar no comando da cozinha ao lado do chef principal, entretanto, algumas vezes servia mesas e até ajudava na organização ou recepção quando preciso. Maria Lúcia ou Malú, como a chamavam carinhosamente, se desdobrava entre o restaurante à noite e seu curso de especialização na gastronomia internacional. Não estava sendo nada fácil sua rotina, havia noites como aquela, em que mal conseguia parar em pé, tomada pela exaustão. Ramon lhe ofereceu a colher para que experimentasse o molho, sabia de sua paixão culinária, inclusive havia sido seu professor durante a faculdade. Ramon pertencia a uma família de chefs renomados da alta cozinha, por isso, administrava o seu próprio restaurante, que era sucesso. Ela levou o molho branco aos lábios e experimentou, ficando chocada com o sabor, uma mistura perfeita. E Ramon também carregava um sorriso de canto satisfeito. - Mais uma vez, você acertou, Malú. - Ramon, isto está bom! Os olhos de Ramon ainda insistiram em ficar sobre os dela, a jovem de vinte e cinco anos, morena, de corpo naturalmente bronzeado, cabelos negros na altura dos ombros e um corpo moldado por curvas, coxas, seios e bunda volumosa. Malú era do tipo sexy, atraente, e ao mesmo tempo um rosto angelical e inocente. Talvez fosse este jogo completo que a tornava tão atraente. A voz de Téo, um dos garçons do restaurante e amigo de Malú, os interrompeu. - Ramon, mais três deste prato. Para os clientes Master Gold - enfatizou o rapaz, piscando para ambos. Clientes "Master Gold" era um código que os funcionários do restaurante haviam criado para se referir a algum cliente especial, artista famoso, políticos ou jogadores de futebol que frequentavam o restaurante. Uma mulher que cortava os legumes falou animada: - Aposto que é influencer. Se for algum maquiador, me deixa atender? Mas Téo meneou com a cabeça enquanto Ramon preparava os pedidos. - Um deles é o sobrinho do governador. Alguns ao redor fizeram um "oh" devido à importância dos clientes. Ramon interveio: - Mas o senhor Cassanni não me informou que viria, sempre faço uma reserva especial. - Não, o governador não está, apenas sua equipe, e chegaram agora, não havia reservas. Ramon achou aquilo estranho. Então, Malu ficou em êxtase com o pedido dos clientes tão importantes. Sempre que suas ideias lhe proporcionavam bons resultados, ela não se continha em assistir à reação deles ao experimentar, por isso se colocou prontamente a lhe ajudar a servir. - Eu o ajudo a servir! - falou, saindo risonha enquanto organizava a bandeja para recolher os pedidos. O restaurante estava cheio, afinal era uma sexta à noite, os empresários da região costumavam se reunir ali para um happy hour naquele horário. Quando Malú se aproximou da mesa indicada pelo amigo, notou que se tratava de cerca de quatro pessoas, todos homens bem vestidos em ternos que certamente custavam um carro popular. Um deles se destacava, era alto, cerca de um metro e oitenta, forte, cabelos escuros impecavelmente penteados e uma barba mais parecida ter sido desenhada em seu rosto. Sua expressão era bastante séria e fechada. Então, Malú se aproximou, e por algum motivo insano, teve a impressão de que aquele homem lhe analisava da cabeça aos pés, o que era um absurdo, já que um homem tão fino jamais se interessaria por uma jovem vestida de calça, camisa social preta, um avental com a logo do restaurante, e cabelos presos em um coque sem graça. Ela havia até se maquiado como sempre faz, mas naquele dia saiu atrasada e mal passou um rímel e batom. Os homens à mesa falavam sobre algum assunto político. Téo começou a servir e se retirou. Malú fez o mesmo, enquanto colocava o último prato na mesa, um dos rapazes esbarrou em seu braço, o conteúdo líquido do prato se moveu e uma pequena quantidade, quase insignificante, jorrou para o paletó de um deles, aquele que a deixara tão intimidada. Malú ficou trêmula, aquilo nunca aconteceu, mesmo sendo cozinheira auxiliar, recebeu um treinamento impecável para trabalhar ali. E sabia que a culpa não tinha sido sua. Entretanto, o tal homem misterioso ficou visivelmente irritado, seus olhos cor de mel fitaram Malú de uma forma que ela quase perdeu o fôlego numa mistura de raiva e sedução. - Me perdoe, a culpa foi minha, Dante, não se irrite com a moça - o responsável pela tragédia se manifestou. Então, o tal Dante pegou o guardanapo e se limpou sem dizer uma só palavra. Malú ainda estava gélida com toda a situação, a bagunça era o menor de seus problemas, já que aquele par de olhos misteriosos ficaram gravados em sua memória. O homem, amigo de Dante ainda brincou: - Está tudo bem, moça, não se preocupe, meu amigo não vai mordê-la. Ele tem essa pinta de mafioso, mas é um cara legal. No entanto, Malú parecia mais apreensiva mesmo todos à mesa sorrindo, quer dizer, quase todos. Dante permaneceu sério. Quando terminou de limpar a mancha que ainda havia deixado uma pequena marca circular próximo ao ombro, ele a fitou como se as palavras do amigo lhe fizessem sentido: "mordê-la", aquilo surtiu um efeito em ambos que deixou Malú mortificada. Ele teria confirmado, através do olhar de canto, que poderia fazê-lo? Ela se ajeitou timidamente, percebendo que ninguém estava notando aquilo, e talvez fosse por puro fruto de sua imaginação fértil e falta de um namorado. Téo insistia em lhe dizer isso, que a vida não estava resumida apenas em trabalho, estudos e seu pai. Na verdade, Téo usava um termo bem direto: "Você precisa transar de vez enquando, vê se arruma um namorado". Nervosa em meio às suas emoções, Malú continuou seu trabalho. - Acho que houve um erro... Está faltando um prato... - estava muito agitada, falou a primeira coisa que veio à mente notando que o homem charmoso não foi servido. E como se já não estivesse mexida o suficiente, recebeu dele a atenção direta naquele momento, Dante. - Não houve nenhum erro. Eu pedi outro prato. Tenho alergia a proteína do leite, aliás, que diabos inventaram de colocar leite nesta receita? Mesmo desmotivada por ter sido sua a ideia de modificar a receita, Malú tentou não se sentir ofendida. Mas o fato era que havia se sentido muito intimidada com aquele homem. Precisou repetir mentalmente para si: "É apenas um homem bonito e incrivelmente charmoso, se acalme", então aproveitou para sair e tentar se recompor. -... ah... Vou conferir o pedido do Senhor... Quando já estava dentro da cozinha, Malú precisou apoiar as costas na parede e respirar fundo, nem tinha notado que havia prendido o fôlego. Mas conseguiu se recompor rapidamente e pediu a Téo para continuar atendendo aquela mesa. Além do mais, faltavam poucos minutos para seu expediente acabar e desejava nunca mais ver aquele homem. * A noite estava fria, era o momento de voltar para casa. O transporte público naquele horário era complicado, nenhum motorista aceitava entrar no morro tão tarde. Poderia ir a pé, não ficava tão longe, mas estava exausta e tinha aula logo pela manhã. Apesar de ser uma cidade quente, aquela noite estava fria. Malú fechou a jaqueta que vestia por cima do vestido para conter o frio. Precisou sair rápido, pois Ramon sempre se oferecia para levá-la para casa, mas ela odiava incomodar, e sabia que ele insistiria como em todas as vezes. Então, um carro de luxo passou ao seu lado. Ela conhecia bem aquele veículo, pois além de Nícolas ser um dos chefes do morro, havia sido seu ex-namorado. O único que ela conhecia que era dono de um veículo rebaixado tão exuberante, foi inevitável não se sentir inquieta, aquele homem era completamente obcecado por ela, sempre insistindo em uma chance de reatar. Mas Malú não tinha interesse algum, Nícolas era um homem violento e seu atual estilo de vida não lhe agradava nem um pouco.