Capítulo 2

(Ponto de Vista de Aria)

Fiquei sem palavras pelos segundos seguintes, enquanto suas palavras me atingiam como um trem desgovernado. Esperei… Esperei que aquele olhar duro suavizasse com algum arrependimento pelas palavras cruéis que ele havia lançado contra mim, mas isso não aconteceu. Ele apenas continuou me fitando com raiva, mostrando as narinas inflando em fúria.

— Adam, como... Como pôde dizer isso para mim? — Perguntei, desviando o olhar para Sophia, que agora se escondia atrás da figura alta e musculosa dele. — Na frente dela?

— Porque é a verdade! — Ele gritou de novo, me fazendo soltar um pequeno som de desespero. Adam nunca havia gritado comigo antes. E, embora doesse admitir que ele estava mesmo dizendo a verdade, ele jamais havia dito isso em voz alta. No fundo… Eu sempre soube. Mas ouvir diretamente dele fazia tudo doer de forma brutal, como se mil agulhas perfurassem meu coração, extraindo o sangue com uma dor que mal me deixava respirar.

Logo em seguida, ele passou os dedos pelos cabelos, demonstrando frustração. Parecia que preferia não ter que ter essa conversa comigo. E, justo quando pensei que havia acabado, ele continuou a falar, me destruindo ainda mais.

— Você não passa de uma secretária qualquer que se infiltrou na minha vida. Se não tivesse se jogado em cima de mim naquela noite, nada disso teria acontecido! Esse casamento jamais teria existido, e você sabe disso.

Ele trouxe à tona o passado…. O nosso passado. A noite que significou tudo para mim, mas que, claramente, nada representava para ele. Diante da situação, engoli seco uma, duas, várias vezes, até que minha garganta e boca ficaram completamente ressecadas. No entanto, chorar não era uma opção. Mostrar qualquer sinal de fraqueza diante de Adam já seria doloroso demais, e, pior ainda, diante de Sophia, seria simplesmente imperdoável. Por isso, reprimi as lágrimas com toda a força que pude, enquanto suplicava mentalmente para que voltassem, antes que escorressem pelas minhas bochechas.

— Eu nunca me joguei em cima de você, Adam. Por que não consegue acreditar em mim? — Consegui dizer, mas ele ergueu a mão, sinalizando para eu parar de falar, e eu fechei os lábios.

— Não fique aí tentando bancar a inocente, Aria, porque isso está longe de quem você realmente é. Apenas disse a verdade, e não me importo se você não consegue lidar com ela. — Ele disse, encarando-me com firmeza.

— Não deixe que o que aconteceu hoje volte a se repetir. Saiba qual é o seu lugar, e não terei motivos para falar com você assim. Entendeu?

Ele enfatizou cada palavra daquele aviso e virou as costas para mim antes que eu pudesse abrir a boca novamente.

— Está tudo bem? — Não pude acreditar como sua voz mudou de firme para suave no segundo seguinte, ao se virar para Sophia. Em resposta, ela fez uma careta exagerada que imediatamente me fez cerrar os punhos, pois deixava claro que algo não estava certo.

— O café estava quente, e acho que vou ter que ir ao hospital para evitar uma cicatriz. — Disse com a voz baixa, porém suficiente para chamar atenção.

Por reflexo, observei meu próprio corpo, também encharcado com o mesmo café. Contudo, o líquido sequer estava quente o bastante para queimar.

Mesmo assim, Adam nem questionou. Acreditou nela no mesmo segundo e, com toda a ternura, a abraçou. Foi nesse instante que a vergonha me atingiu com força, gelando meu corpo como um choque térmico.

— Eu levo você. Espere aqui, vou pegar as chaves. — Disse ele ao se afastar, indo até a mesa para pegar as chaves do carro antes de voltar ao lado dela. Então, pegou a bolsa de Sophia e a conduziu para fora. No fim, estavam tão imersos um no outro que pareciam ter esquecido completamente da minha existência, deixando-me sozinha no centro da sala.

O silêncio me envolveu e fiquei entregue aos meus pensamentos, lambendo as feridas que as palavras dele haviam deixado. Nunca consegui convencer Adam de que não forcei nada entre nós, mas até hoje ele continuava acreditando que eu o droguei para dormir com ele na noite em que jantamos com a família dele, três anos atrás. Contudo, jamais esqueceria do olhar puro de nojo e choque no rosto dele quando acordamos juntos na manhã seguinte.

Desde aquele momento, compreendi que Adam jamais me amaria de verdade. Ainda assim, insisti em alimentar uma esperança frágil, mesmo que ela diminuísse gradualmente com o passar dos anos. Nesse processo doloroso, o único que permaneceu ao meu lado e me ofereceu apoio constante foi o avô dele.

Depois de um suspiro profundo, retornei ao meu escritório e alcancei o celular, apenas para me deparar com algo alarmante. Meus olhos se arregalaram ao notar que, durante todo o tempo em que estive no escritório de Adam, um número havia ligado insistentemente. O medo tomou conta de mim assim que reconheci a origem: era o hospital.

Liguei de volta imediatamente, com o coração disparado. Atenderam no segundo toque.

— Sra. Miller, estamos tentando falar com você desde o início da tarde! — Afirmou uma voz feminina.

— Por quê? Aconteceu algo? Minha avó está bem? — Perguntei, atropelando as palavras, tomada pelo desespero e pelo pânico.

— Você precisa vir ao hospital, sua avó…

Sem esperar que ele terminasse, virei as costas e saí correndo da sala. Assim que atravessei a porta, chamei um táxi e pedi que me levasse direto ao hospital. Quando cheguei ao quarto dela, no entanto, vi os lençóis e cobertores sendo dobrados cuidadosamente, e a cama já estava vazia. Aquilo só fez crescer ainda mais o pânico que me consumia, junto ao medo sufocante que me tomou por completo.

— Onde está minha avó? — Perguntei. — Onde ela está?

A enfermeira que limpava o quarto me lançou um olhar de pena que me embrulhou o estômago.

— Sinto muito, senhora Miller, mas sua avó faleceu há dez minutos e foi levada para o necrotério do hospital. Meus pêsames. — Ela informou.

Era como se o mundo tivesse congelado ao meu redor, e, mesmo sem entender como, consegui seguir até o necrotério ao lado da enfermeira. Ao chegarmos, ela parou diante da porta e, com um gesto contido, indicou a maca onde o corpo da minha avó repousava, inteiramente coberto por um lençol branco.

Caminhei até ela com as pernas trêmulas e, no momento em que levantei o lençol e vi o rosto pálido dela, desabei em um choro alto, desejando poder voltar um mês no tempo para impedir o acidente que a deixou assim... O mesmo acidente que levou de mim minha única família viva.

— Vovó... — Chamei com a voz partida, segurando a mão dela. Estavam frias demais, tão sem vida, e as lágrimas começaram a escorrer em torrentes enquanto me lembrava do calor com que essas mãos costumavam tocar meu rosto.

— Me perdoa... Me perdoa, por favor. — Chorei, agarrando-me a ela com força e me odiando por não ter estado presente em seus últimos momentos. O certo seria ter estado com ela, mas, em vez disso, fiquei presa às minhas próprias angústias, preocupada demais com o papel que representava na vida do homem com quem me casei…

A enfermeira entrou na sala e disse:

— Ela pediu que entregássemos isso a você.

Enxuguei as lágrimas, fungando, enquanto pegava o que parecia ser um chaveiro. Não consegui pensar em nenhum motivo para aquele ser o presente de despedida da minha avó, mas também não importava. As mãos frias dela já haviam me feito encarar a realidade: minha avó estava morta.

Em seguida, caí de joelhos ao lado da cama e chorei, murmurando e implorando para que ela voltasse.

— Aria. — Ouvi a voz de Adam atrás de mim e, ao me virar, fui tomada por um misto de surpresa e alívio. Com certeza o haviam contatado também e, por já estar no hospital acompanhando Sophia, decidiu passar por aqui. Embora ela estivesse conosco no mesmo ambiente, escolhi ignorá-la completamente. Me concentrei em Adam, porque, naquele momento, era dele que eu mais precisava. Precisava de um abraço, de um gesto que me dissesse que tudo ficaria bem.

— Adam. — Murmurei, caminhando até ele e o abraçando com força, enquanto as lágrimas retornavam sem que eu pudesse contê-las. Seu corpo enrijeceu ao meu toque, mas não o soltei. Eu precisava do calor dele... Precisava dele porque era tudo o que me restava, e não suportaria perdê-lo também.

Esperei que ele me afastasse, mas isso não aconteceu. Ainda assim, ele também não me abraçou de volta. No entanto, naquele momento, isso pouco importava. Chorei sem conseguir me controlar e, somente quando os soluços começaram a cessar, fui me soltando aos poucos.

Ele pigarreou e tirou o celular do bolso, dizendo:

— Vou fazer uma ligação para iniciar os preparativos do funeral.

Ele se virou para sair, e Sophia o acompanhou, mas eu simplesmente não suportei vê-lo me dando as costas e indo embora. Por impulso, segurei sua mão.

— Fique, por favor. — Minha voz saiu fraca e vulnerável, mas, naquele momento, isso pouco importava. — Por favor, não vá... Fique aqui comigo. — Supliquei, sem conseguir conter a dor.

Adam abriu a boca para dizer algo, mas um grito agudo nos surpreendeu.

No exato momento em que o som ecoou, nos viramos juntos para a origem e a vimos agachada, segurando o estômago com uma expressão evidente de dor. Sem pensar, Adam correu até ela num impulso instintivo, o que fez meu coração, já fragilizado, afundar ainda mais.

— Sophia, você está bem? — Perguntou com preocupação evidente na voz.

Ela balançou a cabeça.

— Tem algo que eu queria muito te contar, mas não sabia como. — Disse, segurando a barriga enquanto me encarava diretamente.

— O que aconteceu? — Adam perguntou, ainda tomado pela preocupação.

— Adam... Eu... Eu estou grávida.
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