Ele abaixa a cabeça e coloca as mãos no bolso do seu sobretudo, não deixo de sentir algo nele, algo que não sei descrever, — Hum... Não julgo, eu também sou péssima em senso de direção. Para onde você quer ir?
Seus olhos encontram os meus, um tom azul profundo, serenos e firmes com seu rosto iluminado. Um frio percorre a minha barriga e me faz recuar mais um passo. — Quero ir para o Palece Engel, sabe onde é? — O quê?! Meus olhos piscam algumas vezes em surpresa, definidamente não encontrei alguém 'normal' perdido na rua. Notando a minha surpresa, seu sorriso se torna um sem graça. — Desculpe, você também não sabe onde é? — Fala sério! — Respondo de imediato, — esse é um dos meus restaurantes favoritos! Eu amava ir lá com o meu pai. "E é um dos restaurantes mais caros que existem no país... Parei de ir depois da morte do meu pai, mesmo agora com as meninas estáveis financeiramente, não me atrevi a ir sem ele". Engulo a seco minha animação ao ser inundada com lembranças tão fortes e nostálgicas, um estranho não deveria saber tanto. — Bom, você não está muito longe, só desviou um pouquinho do caminho. — Ufa! Isso é um alívio. — De fato hahha, o restaurante fica a dois quarteirões, se você ir direto e dobrar na quinta rua a esquerda, você chega lá rapidinho. — Eu não acredito que estava tão perto assim, que vergonha. "Nem tanto, pra sedentárias como eu, não conseguiria fazer essa caminhada toda". — Então é isso, boa noite e um bom jantar senhor. Sorrio de maneira educada e me viro de costas para ir embora. De todas as coisas, a minha noite de hoje foi de estrela do piano a uma jovem mimada fazendo birra para suas irmãs, eu realmente deveria sentir vergonha e me desculpar com elas o mais rápido possível. Deveria também dar ouvido aos conselhos, não deveria ser tão sentimental assim... — Senhorita! — Sim? — Respondo automaticamente. Um vento forte faz meu cabelo voar e bagunçar para frente, envergonhada, amarro ele enquanto o senhor perdido cai em gargalhada. "Ótimo! Salvo ele e ainda tem a coragem de sorrir da minha desgraça!". Sua gargalhada é doce e tocante, daquelas que te contagia, sem perceber, estou sorrindo junto a ele da vergonha. — Pra agradecer e me desculpar pelo riso, gostaria de um jantar? É por minha conta. — Perdão? — Sorrio mais um pouco, não tem como minha noite ficar mais esquisita. Fico tentada, muito tentada. Está tarde e meus pés estão doendo, — Eu já jantei, mas obrigada pelo convite. Dou a iniciativa de sair do local, porém, ele novamente fala com sua voz firme, mas gentil, — Então, que tal uma sobremesa? Seus olhos me arrebatam novamente, meus instintos aguçados e atentos lutando contra meu coração sedento por uma aventura noturna. Ele é lindo, bem trajado, educado e... Lindo. Por quê não? "Seria estranho recusar uma segunda vez, não seria?". — Certo, apenas uma sobremesa. — Eu prometo. O senhor perdido liga para alguém, eu mesma passo nosso endereço para seu assistente e não demora muito para nos encontrar. O carro é discreto. O motorista se curva para ele e me cumprimenta de maneira formal e antiquada. Estou surpresa, de que família seria ele? Estamos no mundo moderno, mas parece que para esses dois ainda estamos na época vitoriana. — Vamos? — Por Deus, novamente seu sorriso, seria ele um galã? — Algum problema? — O carro é seu? — Pergunto, logo de cara. — Sim, é meu, se for muito simples e... — O quê? Não hahha, ele é bom, só fiquei surpresa por você não estar com ele desde o começo. Seu rosto por um momento, milésimos de segundos fica um neutro, mas logo seu sorriso aparece e sua mão é estendida a mim, — vamos? — Certo... Entro no carro escoltada por ele, e logo estamos no restaurante. Meus olhos se fixam na faixada do prédio com a essência do meu pai ainda mais vivida em minha mente. Naquela época, meu pai era um pianista 'fracassado'. Sua carreira foi para baixo com polêmicas sobre seu alcoolismo após a mamãe nos deixar. Mesmo na miseria, papai nos trazia todo mês para comer aqui. O restaurante Palace Engel é conhecido pelos seus belos chefes de cozinha, e também por ser um restaurante preservado. Os famosos e ricos sempre estão aqui, pois não tem câmeras. Sua privacidade é perfeita para passar tempo sem multidão os cercando. Senhor perdido me guia até o primeiro andar, em uma cabine privada com direito a vista do terraço, ele faz os pedidos e tira o sobretudo, mostrando sua roupa social um pouco mais colada ao seu corpo. "Ele é bem... Forte...". — Eu fui muito mal educado, peço perdão, nem perguntei o nome da minha querida e linda salvadora. Seu comentário me pega de surpresa e arfo sentindo minhas bochechas corar. — Meu nome é Sleny, muito prazer. — Um belo nome. — Obrigada, e o seu? — Bom, Sleny, o que você faz da vida? "Ele não ouviu a minha pergunta? Falei baixo?". — Ah... Bom, eu concluí meu ensino médio, só que... Estou perdida hahha... Não sei o que devo fazer ainda, por enquanto, só sou uma garota aproveitando a idade. — Entendo. O clima antes carismático se torna um silêncio sufocante. Minhas mãos começam a soar. Os olhos dele fixos em mim faz com que minhas orelhas esquentem e minha cabeça gire. "O que devo fazer? O que devo falar? Será que tem algo no meu rosto? Meu cabelo tá bagunçado?", antes que eu pire com todo o nervosismo, o garçom chega com uma taça de sorvete sabor morango, e um bolo de chocolate. — Wou! — Fique a vontade Sleny, minha salvadora. Pode comer. — Mas e você? — Infelizmente não posso comer doces, ordem do médico. — Ordens? — "Ele está doente?". — Não se preocupa, é sério hahha, pode comer Sleny, não quer estragar essa belezura né? Eu sorrio enquanto pego o garfo, a cauda de chocolate quentinha molhando o bolo. As sobremesas daqui são as melhores do mundo todo, não que eu já tenha viajado pra fora do país, mas eu que não vou perder essa oportunidade depois de anos, — pode deixar comigo! — Dou a primeira garfada com toda satisfação do mundo. O chocolate, a massa praticamente derretendo na boca, sem dúvidas nada mudou por aqui. — Nossa, é incrível! Sério. O senhor perdido sorrir, seus olhos me admirando a cada segundo. — Você que é incrível Sleny, incrível e fofa. Seu elogio repentino me causam cócegas e aquece meu corpo. Não foi tão ruim assim sair pra clarear a mente. Nunca ando sem as minhas irmãs. Exceto por um alguém, ninguém me tratou de maneira tão gentil. Talvez tenha sido um anjo enviado pelo universo para me consolar.