O sábado amanheceu, trazendo consigo a inevitabilidade da "viagem em família" para a praia. O caos da loja de brinquedos e a promessa impulsiva de Tobias haviam se solidificado em passagens de carro, reserva de hotel e malas feitas às pressas. Zenon estava na entrada de seu prédio, cercado por bagagens que pareciam ter se multiplicado durante a noite, com Jade e Sud pulando de excitação ao seu redor. Zenon, apesar da maquiagem leve que usava para disfarçar as olheiras (cortesia do estresse de organizar uma viagem falsa de última hora), exibia sua eficiência habitual. Ele checava se todos os brinquedos recém-adquiridos estavam embalados de forma segura (e discreta), se as roupas de banho estavam na mala certa e se as crianças tinham seus lanches e travesseiros. A ideia de uma viagem com Tobias, os sobrinhos dele fingindo serem filhos deles, e Kael, o catalisador de toda essa loucura, era exaustiva só de pensar, mas Zenon se concentrava na tarefa logística à frente. Ele havia conco
A viagem à praia se desdobrou em uma série de cenas cômicas e cansativas, cortesia da energia inesgotável de Jade e Sud e das tentativas desastradas de Tobias de parecer um pai casual e divertido. Kael, por sua vez, parecia se encaixar surpreendentemente bem na dinâmica caótica, rindo das travessuras das crianças e observando a interação (falsa) de Tobias e Zenon com uma fascinação genuína. Zenon, o gerente de crises não oficial da farsa, passava a maior parte do tempo garantindo que as crianças não revelassem acidentalmente a verdade ou se colocassem em perigo, tudo isso enquanto mantinha a pose de "ex-parceiro amigável" para Kael e observava a atuação (às vezes exagerada) de Tobias. Em uma tarde, enquanto Kael levava Jade e Sud para construir um castelo de areia monumental perto da água – uma atividade que Zenon supervisionou de perto antes de permitir –, Zenon decidiu tirar um momento para si. Ele foi até o bar do hotel na beira da praia, u
Tobias ajustou a gola de sua camisa impecavelmente branca, o reflexo no espelho devolvendo a imagem de um homem que parecia ter tudo. Um cirurgião plástico renomado, com uma clínica próspera no coração da cidade, e prestes a se casar com Anny, uma mulher considerada uma das mais belas e cobiçadas socialites. O casamento, marcado para dali a poucas semanas, prometia ser o evento do ano, selando a união de dois mundos que, na superfície, pareciam perfeitamente alinhados. Dinheiro, status, beleza – o pacote completo. Tobias, aos trinta e poucos anos, sentia que finalmente estava concretizando mais um sucesso em sua vida meticulosamente planejada. Ele sorriu para o espelho, um sorriso que não alcançava completamente seus olhos. Havia uma leve apreensão. Não nervosismo de noivo, mas uma intuição silenciosa, um pequeno nó no estômago que ele vinha ignorando nas últimas semanas, atribuindo ao estresse pré-casamento. Anny era linda, charmosa, e se encaixava perfeitamente no que a sociedade
Dois anos se passaram. A dor aguda da traição de Anny havia se transformado em uma cicatriz profunda, enterrada sob camadas de sucesso profissional e um cinismo cuidadosamente cultivado. Tobias não era mais o homem ingênuo e confiante que acreditava em contos de fadas de casamentos perfeitos. Ele havia aprendido, da forma mais cruel, que relacionamentos podiam ser transações, e sentimentos, meras ferramentas de manipulação. Ele estava sentado no mesmo tipo de bar escuro e barulhento que se tornou seu refúgio na noite em que seu mundo ruiu. Não era o mesmo bar de dois anos atrás, mas a atmosfera era a mesma: discreta, com a penumbra servindo como um manto de anonimato para almas solitárias ou simplesmente em busca de algo passageiro. Tobias frequentava vários desses lugares pela cidade, misturando-se à multidão, um lobo em pele de cordeiro. Seus dedos tamborilavam no balcão de madeira polida, o tilintar suave do gelo em seu copo de uísque ecoando o ritmo lento de sua respiração
A rotina de encontros casuais, antes um refúgio seguro para Tobias, começava a pesar. Dois anos no jogo da aliança falsa haviam entorpecido parte da dor, mas também o haviam deixado com uma sensação persistente de vazio. Ele era procurado, sim, mas nunca realmente encontrado. Desejado, mas nunca verdadeiramente conhecido. A solidão, antes mantida à distância pela agitação das noites, parecia agora espreitar nas frestas. Nessa noite, ele decidiu variar. Em vez de ir sozinho para um dos seus bares habituais, combinou de sair com Niran, seu melhor amigo de longa data. Niran era um advogado com um senso de humor afiado e uma visão de mundo que, muitas vezes, servia como um contraponto necessário para o cinismo de Tobias. Ele sabia da história com Anny, embora Tobias não entrasse em detalhes, e Niran respeitava o espaço do amigo, oferecendo companhia e distração quando percebia que Tobias precisava. Eles escolheram um bar diferente naquela noite, um pouco mais animado, com uma band
A luz da manhã filtrava suavemente pelas cortinas entreabertas do quarto de Kael, pintando o ambiente com tons dourados e preguiçosos. Tobias acordou sentindo um calor agradável, o peso confortável do corpo de Kael ao seu lado, a respiração suave na nuca. Era uma sensação de paz e contentamento que ele não experimentava há muito, muito tempo. Contrastava bruscamente com as manhãs solitárias e apressadas que se seguiram aos seus encontros casuais. Com Kael, a noite anterior havia sido mais do que física; houve uma conexão, uma leveza e uma sinceridade que o tocaram profundamente. Ele se virou com cuidado para encarar Kael, que ainda dormia, o rosto relaxado e bonito. Um leve sorriso se formou nos lábios de Tobias. Talvez Niran estivesse certo. Talvez ele estivesse pronto para receber algo novamente. Kael despertou lentamente, seus olhos encontrando os de Tobias. Um sorriso genuíno e caloroso iluminou seu rosto. "Bom dia", ele sussurrou, a voz um pouco rouca pelo sono. "Bom dia
A manhã seguinte ao desastre com Kael foi, sem dúvida, uma das piores na vida de Tobias desde a traição de Anny. Ele chegou à clínica com a aparência quebrado, os olhos fundos pela noite mal dormida, as roupas um pouco amarrotadas pela pressa de se vestir e sair do apartamento de Kael. O brilho usual de sua persona pública estava apagado, substituído por uma aura de desespero e confusão. O consultório de Tobias, geralmente um santuário de ordem e perfeição asséptica, parecia alheio ao caos que fervilhava dentro dele. Zenon, seu assistente por cinco anos, estava na recepção, organizando a agenda do dia com sua eficiência habitual. Zenon era o oposto de Tobias em muitos aspectos: calmo, centrado, com uma força silenciosa que transparecia em sua postura ereta e olhar atento. Ele usava óculos que descansavam na ponta do nariz quando estava concentrado, e suas mãos fortes e ágeis se moviam com precisão. Zenon era mais do que um assistente; ele era o braço direito de Tobias, o c
O silêncio na sala de Tobias na clínica era denso, quebrado apenas pelo tique-taque de um relógio de parede e pela respiração pesada de Tobias. Ele ainda segurava o telefone, o olhar fixo em Zenon, que o encarava com uma expressão que misturava confusão, alerta e uma boa dose de ceticismo. A demanda de Kael ecoava na mente de Tobias: "me faça conhecer seu ex-parceiro". A impossibilidade da situação era gritante, mas a esperança de não perder Kael era ainda mais forte. "Zenon...", a voz de Tobias era um sussurro rouco. "Você... você ouviu?" Zenon assentiu lentamente, seus olhos por trás dos óculos não desviando do rosto pálido de Tobias. "Ouvi, Tobi. Ele quer conhecer seu 'ex-parceiro'. A pessoa com quem você 'fingiu' estar casado... usando a aliança." Zenon pausou, a compreensão total do absurdo atingindo-o. Seus olhos se arregalaram levemente. "Você não está pensando que...?" Tobias deu um passo à frente, estendendo as mãos em um gesto de súplica. "Você é a única pessoa que s