Capítulo 3

— Onde estava? Procurei-te diversas vezes hoje. — Nina esperava Eliza em seu quarto e a questiona assim que ela adentra apressada.

— Estava com os turistas fazendo meu serviço de guia. Nina, todos estão amando os sorvetes da tia Cissa. Tem sido um sucesso! — ela diz já tirando a blusa e o short, para entrar no banho.

— Graças a Deus e a você por isso. Mas essa história de fazer bicos como guia turística e tradutora, olha só no que deu? Está indo de novo para a floricultura sem almoçar. Precisa pensar na saúde Eliza. — Provoca Nina. Sentada na cama de Eliza enquanto ela se despe e entra no banheiro. — Eu vou descer e fico um pouco lá para você, para que possa almoçar antes de ir.

— Não precisa amiga. Deixei a marmita arrumada para comer lá mesmo, quando não tiver movimento. — Eliza fala de dentro do banheiro. Nina se j**a na cama, deitando-se. — Nina o que vai fazer hoje à tarde? Devia ajudar sua mãe... Aquilo ali está bombando.

— Ah Liz, eu já te disse, não levo o menor jeito com cozinha. E a Lara é quem cuida da administração. Elas são sócias, não posso pedir esse cargo para ela. Eu estou ralando para me formar em administração, não quero servir de garçonete. Fora que se eu for para lá, quem vai ficar na floricultura para Dulce, pela manhã? Agora que ela está doente, não aguenta mais. E você precisa desse dinheiro extra com os turistas para finalmente fazer o curso que tanto sonha.

Eliza sai do banho enrolada de toalha. — Nina você sempre se sacrifica por todos nós, não é? E olha, se você sair da floricultura e consequentemente eu também sair, Dudu vai empregar a Flávia, aquela moça que engravidou do turista ano passado, lembra? Ela também está precisando de emprego. Já a ensinei a fazer alguns arranjos principalmente os da igreja e ela já sabe muita coisa.

Ela pega no seu guarda-roupa um vestido azul, de mangas balonê, cinturado e longo, que possui uma tira de pano imitando um cinto. Ela ajeita esse cinto na sua cintura, apertando-o, calça suas sandálias de couro rasteiras, prende os cabelos em um coque e passa seu perfume. A amiga parece pensativa, deitada em sua cama.

— Vai comigo Nina? — a amiga acorda de seu pensamento e levanta confirmando que sim. — Você está bem?

— Estou... Sabe do que eu me lembrei? Assim, do nada, aqui deitada?

— Não. — Eliza põe as mãos na cintura.

— Daquele nosso baile dos 15 anos. Mais precisamente dos belos moços que nos cortejaram... — os olhos dela brilham ao falar seus pensamentos. Eliza respira fundo.

— Cortejaram é? Fala sério, Nina. Eu fui cortejada, agora vocês? Poupem-me. Não gosto de me lembrar daquele dia, sempre que lembro sinto uma imensa tristeza pelo que fiz aquele moço.

— Nunca quis saber dele, Liz? De todos três o seu era o mais alto e mais gato. E foi o mais gentil.

— Meu? — ela sorri. — Quem me dera ele ter sido meu. Eu o perdi para sempre quando o deixei com a cara vermelha, sem dar nenhuma explicação. Sabe, eu pensei muito nele, por muito tempo. Mas o homem nunca apareceu, nunca vi ninguém parecido, ou que tivesse a sua voz. Acho que eu reconheceria aquela boca linda assim que eu a visse. Ele me disse que morava no lado norte, e pelo tamanho do anel de ouro que ele tinha no dedo, ele deve ser bem rico. Não deve ter sido fácil para um rapaz de boa família, levar um tapa de uma plebeia da Vila. Eu não voltaria se fosse ele..., mas agora a realidade me chama e eu preciso trabalhar, vamos?

— Vamos. — Nina responde e acompanha Eliza, que pega a sua bicicleta rosa, com cestinha e bagageiro. Ela levanta aquele vestido comprido azul marinho e se senta no coxo da bicicleta e Nina ponga na sua garupa. As duas descem ladeira abaixo, sorrindo e fazendo todo mundo sorrir as vendo na bicicleta e gritando.

Assim que chega à porta da floricultura, Nina desce da garupa e Eliza, ainda sorrindo da maluquice, leva sua bicicleta para a porta e a 'estaciona' na lateral da loja. — Ainda bem que chegamos inteiras. — diz Nina.

Eliza destranca a porta da floricultura e abre, pega os jarros de plantas e dispõe do lado de fora as jardineiras, pendura as samambaias, ajeita os baldes com rosas e outras flores debaixo do toldo.

— Liz! — Nina prossegue. — Você pretende dar mesmo uma chance ao Maurício?

— Eu? Com o Maurício? Tá maluca Nina? Quem te disse uma coisa dessas? — Eliza sorri da pergunta de Nina.

— Ele. — Nina diz se encostando ao balcão.

— Acho que ele entendeu errado quando eu aceitei jantar na casa dele. Mas foi a sua mãe quem me convidou. Por isso eu aceitei. — Ela se senta na cadeira atrás do balcão, após organizar tudo.

— Graças a Deus que é só mais uma confusão dele. Maurício é bonito e tudo, mas... Sei lá. Eu não gosto dele. Não é para você. — Nina diz tentando não comentar que sonha em um dia a amiga reencontrar o garoto da máscara preta. O único que foi capaz de arrancar um beijo de Eliza e fazê-la sorrir sozinha, se lembrando dele.

— Não é mesmo. Quero que ele arranje alguém que goste dele. Essa coisa de namoro e amor não é para mim. Já disse a ele que assim que eu tiver conseguido a dinheiro para estudar, eu vou-me embora e deixo todas as lembranças ruins daqui para trás. Apesar de gostar da Vila e de ter pessoas que eu amo ao meu lado como você, Lara, Dudu e Tia Cissa e Fran, eu preciso sair desse lugar. você entende, não é? Prometo que venho te buscar.

— Aham. Você é tão inteligente amiga. Não pode ficar presa aqui nessa ilha. A não ser que conseguisse um emprego com os Firenze. Já pensou? Você executiva? — elas sorriem e Eliza apoia a cabeça com o braço dobrado em cima do balcão.

— Queria que um anjo passasse aqui e dissesse Amém para abençoar seu desejo. Mas como vou conseguir um emprego lá, se eu não tenho uma faculdade? Aquele povo só pega pessoas com experiência, indicação ou extremamente qualificadas. E eu não tenho nenhuma dessas coisas. — A amiga dela lamenta com um suspiro e Liz a olha de canto e faz aquela cara de tédio. — Pelo visto os turistas de hoje não estão dispostos a comprar flores. Nossa, que paradeiro. — Liz bufa.

— Você devia ficar na porta. Sempre que fica em pé do lado de fora isso aqui fica cheio de gringo gato. — Nina diz e ambas sorriem. — Eu não entendo bem como você ainda consegue chamar tanta atenção, com essas roupinhas de velha. Amiga, você devia largar de ser tão pão-duro e comprar umas roupinhas. Acho que estando extremamente arrumada, podia chegar à sede da Firenze e pedir para falar com o dono da porra toda, que ele te daria um emprego na mesma hora. — Eliza sorri.

— Nina, os anos passam e você não muda. Continua essa sonhadora, que acha que as coisas vão acontecer assim como nos livros de romance ou contos de fadas. — Nina sorri.

— Não custa nada sonhar! Ainda! — as duas voltam a rir.

— Como será que deve ser o Sr. Firenze? — Liz indaga curiosa. — Eu o imagino sendo um homem de estatura mediana, cabelos pretos, meio gordinho da cara redonda, olhos pretos, sei lá... Uns 30 anos? E... Extremamente metido a besta. Aquele tipo de pessoa que fica com o celular na mão — daqueles bem caros — acompanhando as ações na bolsa de valores, ou analisando os preços do último lançamento de um carro importado. Ou um novo modelo de jatinho. Eu já vi que ele anda muito de helicóptero, sempre os vejo pousar em sua mansão.

— Amiga, eu já vi uma foto do senhor Firenze em uma revista de fofocas, só que ele estava de lado, mas deu para ver que ele é lindo. Ele tem cabelos volumosos, lisos, é alto e nada barrigudo. E é bastante jovem. Ganhou um prêmio por ser um jovem empreendedor. — Ela olha a amiga enquanto Nina fala.

— Essas revistas usam Photoshop em tudo. Mas, para um homem tão rico não deve ser difícil comprar a beleza. Como diz tio Fran: — as duas se juntam para falar em coro — Não existe ninguém feio, o que existe é gente sem dinheiro! — As duas caem na gargalhada. — Seu pai é uma figura Nina!

Quando elas ainda estão rindo dos dizeres de Fran, dois carros pretos de luxo com os vidros escuros param em frente à floricultura. As amigas se entreolham surpresas, abismadas, impressionadas com os possíveis clientes.

— Será que eu cometi algum crime cibernético internacional e a CIA veio para me levar presa? — Eliza sussurra perto do ouvido de Nina. Nina põe a mão na boca para tampar o sorriso, enquanto dois motoristas descem do veículo e param de frente às portas traseiras dos respectivos carros e dois homens bem-vestidos, com ternos que deviam custar quase o preço da floricultura inteira, saltam de lá e adentram a simples lojinha.

Eliza reconhece um deles, é o Lu, um amigo que ela fez recentemente na loja e que ela o ajudou, conversando com uns Japoneses via videoconferências e emails.

O outro homem loiro, de cabelos curtos, de óculos escuros e uma barba por fazer, alto e esguio, encara Liz encantado.

É Antônio, que veio junto com Luciano para falar de negócios com Liz. 

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