Capítulo 01 

(Seis Anos Depois)

Levantei, fiz minha higiene matinal e me preparei para mais um dia. Afinal, hoje conheceríamos o novo CEO e, sim, eu estava curiosa.

Os corredores de vidro da empresa refletiam minha imagem conforme eu avançava. Meus saltos ecoavam com precisão, como um lembrete do caminho que trilhei até aqui.

O passado já não pesava sobre meus ombros, e a menina insegura aquela que trabalhou como auxiliar de serviços gerais para ajudar a família não existia mais.

No lugar dela, havia uma mulher confiante, determinada e, acima de tudo, implacável.

Os funcionários desviavam o olhar quando eu passava. Alguns me cumprimentavam com acenos respeitosos, outros cochichavam entre si admirados ou intimidados.

Eu sabia o que diziam. Sabia o que pensavam.

Ana Luíza Martinelli não era apenas a nova diretora-executiva, mas também a mulher que nunca aceitava um “não” como resposta.

Meu nome não estava mais vinculado à humildade do passado, mas à força que conquistei no presente.

Ao entrar na sala de reuniões, senti os olhares recaírem sobre mim. Alguns eram de respeito. Outros, de inveja.

Os diretores masculinos foram rápidos em me cumprimentar com sorrisos educados e elogios velados, enquanto algumas diretoras apenas me analisavam olhos afiados, repletos de julgamento.

Já estava acostumada.

Murilo, sempre perceptivo, aproximou-se e sussurrou próximo ao meu ouvido:

— Não se preocupa com as recalcadas. Elas gostariam de estar no seu lugar, mas não têm coragem pra isso.

Segurei um sorriso e virei minimamente o rosto para ele, mantendo a compostura.

— Eu não ligo, Murilo. Se eu me preocupasse com a opinião alheia, não teria chegado onde estou.

Ele soltou uma risada baixa, aprovando minha resposta.

— É por isso que eu gosto de você, chefe. Sempre acima de tudo isso.

Dei um pequeno sorriso e me sentei à mesa, puxando minha pasta de anotações. A reunião ainda não havia começado, pois o novo CEO não havia chegado.

— Você sabe quem é? — perguntei a Murilo enquanto organizava alguns documentos.

— Ainda não. Mas ouvi dizer que ele é implacável — respondeu, dando de ombros. — Quem sabe você e ele não formam um belo par? Afinal, você também não é exatamente conhecida por ser boazinha.

Ri com ironia.

— O dia em que eu precisar de um homem implacável ao meu lado será o dia em que eu enlouqueci.

Ele estava prestes a responder quando um pigarro alto cortou nossa conversa.

Instintivamente, levantei os olhos. E tudo ao meu redor parou.

Meus dedos, que seguravam a caneta, travaram. Meu coração, até então sob controle, falhou uma batida.

Não podia ser.

Mas era.

Ali, parado à frente da sala, estava Enzo.

Os anos não o haviam mudado tanto quanto eu gostaria. O olhar continuava o mesmo — intenso e cínico.

O terno, perfeitamente ajustado ao corpo esculpido. A postura, de quem sabia que estava no controle.

Ele parecia exatamente como eu me lembrava. E isso me irritou.

Não era justo que ele continuasse o mesmo, enquanto eu tive que me reconstruir do zero.

Murilo, ao meu lado, baixou a cabeça e murmurou:

— Pelo visto… ele é o novo CEO.

Engoli em seco, mantendo minha expressão impassível. Meu passado podia estar diante de mim, mas ele não teria o prazer de saber que ainda me afetava.

— Tudo bem? — Murilo perguntou, observando-me de canto de olho.

Soltei um suspiro discreto, ajeitando-me na cadeira com ainda mais profissionalismo.

— Claro. Por que não estaria?

Ele sorriu de lado.

— Você disfarça bem, chefe, mas eu te conheço.

Lancei um olhar de advertência, e ele levantou as mãos, rindo baixinho.

— Sem mais comentários — sibilei.

Enzo caminhou até o centro da sala e, com uma calma irritante, colocou as mãos nos bolsos, analisando cada um ali.

Então, seus olhos encontraram os meus.

A troca de olhares durou apenas um segundo, mas foi tempo suficiente para que algo elétrico passasse entre nós.

Ódio.

Ressentimento.

E uma pitada de algo que preferi não identificar.

Ergui o queixo levemente, desafiando-o. Se ele queria me abalar, teria que tentar muito mais.

Ele sorriu. Um sorriso discreto. Enigmático.

Eu quis socá-lo.

— Bom dia a todos — sua voz ecoou pela sala, firme e autoritária. — Como alguns já devem saber, fui designado como o novo CEO desta empresa. Espero que possamos trabalhar juntos de maneira produtiva. Meu objetivo é elevar esta companhia a um nível ainda mais alto e, para isso, conto com cada um de vocês.

O discurso era formal, ensaiado. Mas cada palavra soava como uma provocação.

Ele fez uma pausa antes de continuar:

— E, claro, sei que há pessoas excepcionais aqui. Algumas que, confesso, foi um prazer reencontrar.

Seus olhos caíram sobre mim.

Murilo, perceptivo como sempre, comentou baixinho:

— O que quer que tenha acontecido entre vocês… esse homem ainda se lembra muito bem.

Mantive a expressão neutra.

— Não me interessa no que ele está pensando.

— Jura? Porque parece que ele está testando sua paciência.

Ele tinha razão. Mas eu não admitiria.

A reunião continuou com as apresentações e diretrizes. Enzo se manteve profissional o tempo todo, mas eu conhecia aquele olhar. Ele estava se divertindo.

Com minha presença. Com minha reação contida.

Ao fim, quando todos começaram a sair, levantei-me para seguir à porta, mas fui interrompida por uma voz familiar:

— Analu.

Fechei os olhos por um segundo antes de me virar.

— Senhorita Martinelli — corrigi, fria. — Agora somos apenas colegas de trabalho.

Ele sorriu de canto.

— Eu sei. Mas é curioso… nunca imaginei que nos encontraríamos assim.

Cruzei os braços.

— A vida é cheia de surpresas. Algumas bem desagradáveis, devo admitir.

Ele soltou uma risada baixa.

— Ainda com a mesma língua afiada, vejo.

— E você, ainda com o mesmo ego inflado — retruquei, olhando para o relógio. — Agora, se me der licença, tenho uma empresa para administrar.

Passei por ele, sentindo seu olhar em minhas costas como fogo.

Eu não sabia qual era o jogo de Enzo.

Mas uma coisa era certa:

Ele não ia vencer.

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