O barulho de buzina em frente à casa de minha mãe fez com que eu corresse e pegasse minha mochila. Despedi-me de minha mãe rapidamente antes de sair.
Enquanto olhava eu me aproximar do carro, ela gritou me pedindo:
— Prometa que voltará!
— Eu voltarei — prometi. A única promessa que não fazia questão de cumprir.
Após Erick dar a partida no carro, a música presente dominou o ambiente. Por fim, questionei quebrando o silêncio:
— Então também está estudando o caso antigo dessa cidade — ele apenas assentiu encarando a estrada. — Conseguiu algo interessante? — perguntei interessada.
— Não sei, diga você. Como sabe desse caso?
— É um caso que marcou a infância das crianças da cidade. Foi algo tão assustador e ninguém teve resposta do que houve.
— Percebeu algo diferente vendo o arquivo?
Erick não era fácil de lidar, ele de fato era um investigador. Não respondia facilmente as perguntas que lhe eram direcionadas.
— Na verdade... — suspirei — não sei o que você sabe da história, mas houve o testemunho de duas crianças na época, porém não o encontrei anexado no arquivo — falei.
— Sim, além disso, não foi feito o exame de DNA da vítima e não foi encontrado nada que pudesse acusar o motivo de não o fazerem.
— Você sabia que o detetive do caso era o senhor Alberto Queiroz?
— Sim, estou curioso para saber quais serão as explicações dele sobre esses fatos.
Quando passamos pela rua onde estava localizado o galpão, aumentei o volume do som para preencher o ambiente e apertei minhas mãos em punho. Toda essa estrada me fazia estremecer.
— Algum problema? — Erick perguntou.
— Não, apenas gosto dessa música — falei me recostando no banco. Erick franziu a testa e, então percebi que não era música que tocava alto dentro do carro, mas sim o noticiário da cidade. – Antes... — coloquei novamente o volume baixo e continuei. — Estava tocando uma música que eu gosto — tentei disfarçar.
— Está certo — ele sorriu ainda focado na estrada em sua frente. Nesse momento pude notar melhor sua aparência. Seus cabelos escuros estavam arrumados com a ajuda de um gel que fixava seu penteado, a camisa social branca fazia um verdadeiro contraste em sua pele bronzeada que era quase escondida pela gola. Erick me encarou por alguns segundos, talvez percebendo que eu o fitava.
— Conheceu há muito tempo o noivo? — perguntei.
— Na verdade, desde minha infância. Meu avô era vizinho de Marcos, acabei convivendo com ele quando vinha visitar meu avô.
— Sério? Eu, Juliana e Marcos sempre brincávamos juntos, acredito que por isso que os sentimentos dos dois devem ter aflorado. Será que já nos encontramos alguma vez? — perguntei. Erick olhou novamente para mim e, balançando a cabeça em negativo, falou:
— Não conversava com qualquer criança.
— Ei! – gritei. — Eu não era qualquer criança.
— Tenho certeza que não — quando finalmente chegamos à cidade, Erick me questionou onde eu morava e quando passei o endereço do prédio, ele arregalou os olhos.
— O que foi?
— Você realmente mora nesse condomínio?
— Sim — até confirmei com a cabeça para frisar.
— Bloco E — comentou.
— Não, Bloco B — falei.
Erick sorriu.
— Digo, eu moro no bloco E.
— Está me dizendo que mora no mesmo condomínio?
— Parece que a coincidência não para em apenas querermos estudar o mesmo caso.
— Para fechar, poderíamos sair no mesmo horário para trabalhar e você me oferecer carona todos os dias — falei entusiasmada enquanto Erick parava em frente ao bloco B.
— As coincidências terminam aqui — falou.
— Está bem, está bem — ergui minhas mãos como se me rendesse e saí do carro. Acenei para me despedir, mas Erick nem sequer buzinou, apenas acelerou o carro. — No mínimo esse homem é bipolar — falei alto.
No dia seguinte nem esperei pela bondade de Erick e fui direto para a delegacia. Cheguei, cumprimentei apenas com um aceno de cabeça os rapazes e, próximo à mesa de Queiroz, pedi:
— Senhor Queiroz, podemos conversar em particular?
Queiroz olhou por cima de seus óculos e concordou levantando-se. Entramos em uma pequena salinha onde eram feitas as entrevistas com os suspeitos.
— O senhor gostaria de explicar sobre o que aconteceu com os depoimentos das crianças? – questionei.
— Você era uma das crianças — falou me observando. — Como deve saber aqueles depoimentos não serviram para muita coisa, então acabamos os descartando.
— Descartaram os depoimentos? Isso é possível? Você tem permissão para descartar depoimentos? — Queiroz ficou em silêncio. — Vocês fecharam o caso sem investigar?
— Investigamos, mas não encontramos nada.
— Não tem como os assassinos terem simplesmente desaparecido.
— Não encontramos nada que possa acusar alguém.
— Então está me dizendo que aquela mulher se matou? Queimou o próprio corpo?
— Havia gasolina no chão e fósforo, pode ter sido algum acidente.
— Quem era ela? Fizeram teste de DNA?
— Está cheia de perguntas, senhorita Catarina — Queiroz falou se levantando.
— Com uma equipe incompetente daquela, difícil não ter perguntas — Erick quem disse entrando na sala.
— Quem você pensa que é para entrar na nossa sala enquanto há uma reunião, e ainda, querer me desrespeitar?
— Não estou te desrespeitando e já não nos conhecemos? Sou o detetive Garcia. — Erick estendeu suas mãos para cumprimentar Queiroz que apenas passou por ele para sair da sala, mas antes que fechasse a porta em suas costas, Erick falou: — Se não fosse incompetência, não teriam desaparecido os depoimentos. Teriam feito o teste de DNA e, ainda mais, não teriam simplesmente fechado o caso sem uma resolução, ou sem ao menos uma boa explicação.
Levantando-me também falei:
— Acredito que Queiroz não tenha ficado muito feliz.
— Vou reabrir o caso. Catarina, você gostaria de participar da investigação?
Por um momento fiquei parada o encarando. Tudo que eu estava fazendo até hoje era para um dia conseguir investigar este caso, e detetive Erick estava me dando essa oportunidade.
— Sim, é o que eu mais desejo — respondi empolgada.
Erick sorriu e sem dizer mais nada saiu, deixando-me só.