Capítulo 1

Belladonna odiava as aulas de quinta-feira, principalmente quando o professor fazia questão que de a sala do último andar era perfeita para a aula. Ela estava quase no último lace de escadas quando Rochelle, uma das garotas de seu grupo do trabalho, mandou mensagem dizendo que “acidentalmente” esqueceu metade do projeto na biblioteca, fazendo a platinada ter que descer todos os onze lances de escadas e andar até a m*****a sala. Donna poderia facilmente dar um soco em que planejou a escola, onde já se viu a biblioteca ficar do outro lado da universidade?

A jovem andava, praticamente quase correndo, pelos corredores enquanto olhava a lista de livros que ela esqueceu e que provavelmente o bibliotecário teria guardado nas prateleiras. Ela queria morrer e ainda não era nem 08:30 da manhã.

«Se não for pedir muito, pega um latte na cafeteria para mim.»

«Foi muito cansativo planejar sua parte ontem a noite.»

Donna provavelmente queria mais matar alguém do que se matar. Ela não tinha culpa por ter tido que ficar dois dias inteiros sem internet por conta da m*****a vizinha que não era uma boa mãe, na verdade a garota se encontrava ainda extremamente brava por conta da situação. Aquela semana era para ser uma das melhores para a garota, mas desde segunda-feira às coisas pareciam estar indo em direção ao inferno.

Quando abriu a porta – ofegante, irritada, um pouco desarrumada e com um olhar mortífero –, Belladonna percebeu que realmente ainda não era nem oito e meia e as coisas haviam acabado de piorar. Parado a sua frente, com a mão na barriga e a camisa suja com um líquido marrom, estava o Professor Edgard Fitzgerald olhando para ela com um ódio dez vezes mais venenoso. A lembrança de saber que uma parte do grupo de professores teriam uma reunião com o diretor naquela exata manhã, fez com que os nervos dela sugerissem seriamente que correr era a melhor opção.

– Bom dia... Senhor Fitzgerald, acho que... Desculpa?... – a jovem disse, um pouco enrolada, e seus olhares cruzaram, uma rajada fria correu por suas veias. Ela estava fodida.

O professor permaneceu em silêncio olhando para a loira por segundos tortuosos antes de passar a mão na franja solta de seu penteado habitual. Todos os minúsculos nervos de seu corpo sabiam que uma carta enorme seria mandada, sem nenhum pingo de dó, para o e-mail que estava na mão dos professores.

Talvez um aumento da mensalidade? Talvez, os Fitzgerald eram uns babacas ricos e arrogantes.

Donna esperava xingamentos, uma ameaça de ele mexer em alguns palitinhos e a única faculdade em que conseguiu uma boa bolsa de estudos a expulsaria. Ela esperava tudo que poderia envolver hostilidade da parte de Edgard, mas o mesmo se virar e ir embora, simplesmente a ignorando e deixando-a sozinha na porta da biblioteca era o que me os esperava. Aquilo deixou a garota realmente surpresa.

Não como se ela tivesse uma relação ruim com o professor, simplesmente não havia relação, nem sequer era sua aluna. Fitzgerald dava aula sobre a história da arte e Donna cursava criminologia, as coisas estavam um pouco longe demais para que, em algum momento, eles estivessem na mesma sala de aula. Ela apenas ouvia os boatos sobre o professor, as histórias iam de como ele era frio e impossível, as vezes um pouco galinha, a boatos de que o professor era sádico dominador, as fofocas corriam soltas e felizes por todo o Campus. Além do fato de a universidade estar no nome da família dele, aquilo já era motivo o suficiente para uma azarada como Belladonna resolvesse manter o caminho longe de Edgard. Mas a vida é uma bosta.

— Senhor Fitzgerald? — a garota se virou para tentar se desculpar novamente com ele, porém, caminho do corredor estava vazio e o medo dela mil vezes pior.

Quando chegou no final das únicas aula que teria aquele dia, qual uma delas Belladonna chegou atrasada e todo o show de protagonismo de Rochelle fez com que ela recebesse uma horrenda brinca, a loira se encontrava sentada na biblioteca tentando escrever as dezessete páginas do trabalho que um dos professores havia pedido. Sua cabeça já estava pesando com tanta informação, que a garota se esforçava para lembrar, parecia até que já não faziam dois semestres que estudava na universidade, e não havia escrito nem cinco páginas. Virando já o, provável, décimo copinho de café, seus dedos voltaram a digitar freneticamente no computador.

A garota amava estudar sobre a origem dos crimes e a vida dos criminosos, desde pequena ficava fascinada com coisas que nem eram apropriadas para sua idade. Além do fato da adolescência ser regrada de pesadelos e sonhos sombrios, o que rendeu boas risadas para ela na época, pelo fato de que sua avó ficava apavorada e levava a adolescente para todo tipo de igreja possível em busca de uma “salvação”. Era engraçado, trágico e engraçado demais. Aquilo a fez amar ainda mais a parte que as pessoas costumam esquecer que existe, por isso se dedicou a estudar criminologia. Entretanto, buscar palavras para montar um trabalho daquele tamanho não parecia muito fácil. Ainda mais para quem não dormiu muito bem.

Os copos de café estavam começando finalmente a trabalhar no organismo de Donna, sua mente já estava mais rápida do que há minutos antes, cada pedaço sobre o trabalho chegava e corria pelos dedos de forma fluida e numa velocidade agradável. Em questão de duas horas ela já estava corrigindo a primeira parte do maldito trabalho, sentia falta de mais energia, porém, provavelmente, se ela tomasse mais alguns copinhos com certeza iria parar na enfermaria. A platinada virou o rosto olhando para a imensa biblioteca vazia, com os pufes perfeitamente arrumados e o bibliotecário sem sua habitual cartela de calmante na mesa. A época de festas após finalização do bimestre era o motivo de fazer aquele lugar se tornar aconchegante e silencioso, em contrapartida os dormitórios eram uma zona de guerra; cheios de jovens adultos com bebida e drogas no organismo o suficiente para derrubar um elefante, o cheiro de maconha, sexo e álcool tatuado nas paredes e as manchas que a faziam querer vomitar. Só de imaginar que teria que passar por aquele pandemônio para tentar ter no mínimo alguns minutos de sono antes das extracurriculares, Donna preferia dormir em um ninho de raposas.

Ela rolava o dedo no mouse, se espreguiçava na cadeira e girava a mesma enquanto escolhia uma música em seu celular, apenas para que soubesse se valia a pena ir para o quarto ou se talvez dirigir duas horas para dormir bem a noite toda era mais vantajoso. A garota soltou um suspiro derrotado enquanto se aproximava novamente do computador. Não importava o que ela escolhia, a opção de passar pelo menos uma noite na casa da tia era definitivamente inviável. A não ser que ouvir uma sinfonia de gemidos e no café da manhã escutar um sermão por ter deixado o dormitório fosse mais prazeroso que o inferno chamado “campus em época de festa” – na verdade era, mas gastar gasolina não estava nos planos.

Sem nenhuma opção boa, Belladonna voltou a corrigir o restante do trabalho.

Entre umas saídas para comprar algo para comer e alguns minutos fuçando as redes sociais e os grupos da universidade, que a ajudou a saber que a professora de libras havia dispensado a aula, Donna conseguiu terminar o trabalho antes das seis. De longe já conseguia ouvir a batida das músicas, um certo alívio pousou sobre seu peito quando percebeu que a festa em questão estava para começar em um salão desativado. Com certeza algum aluno seduziu alguém pela chave, ou um dos patrocinadores chorou por isso. Pelo menos a noite de sono da platinada estava garantida.

A garota já podia sentir o pijama macio e o som maravilhoso do silêncio que estaria lá. Com uns tampões e um tapa olho, ela mal escutaria a algazarra que seria a volta de alguns de seus colegas. Uma tosse forçada foi ouvida da mesa do bibliotecário e ela entendeu rapidamente que estava na hora de dar o fora dali. Jogou os livros na bolsa, salvou o trabalho no drive e atravessou a biblioteca em passos largos.

Os corredores estavam tão vazios que talvez desse para ouvir uma pena caindo. O final de bimestre era seu momento favorito, não havia ruídos – quando tinha, eram os funcionários ou alguns alunos tentando dar algum perdido – e muito menos centenas de jovens adultos, ainda, com os hormônios a flor da pele, em sua grande maioria. Donna pegou rapidamente seu caminho, saindo do prédio da universidade e olhando para o crepúsculo lilás acima do estacionamento do campus, algumas estrelas já salpicavam o céu e a brisa de fim de verão fazia o seu cabelo voar. As vezes, em momentos com uma vista daquelas, a garota perguntava a si mesma se aquilo tudo não era um sonho e que talvez logo chegaria a hora em que a tia Antonella iria a acordar para o café, mas, sempre quando esses pensamentos vinham a tona, os trabalhos e as aulas do professor Faust a puxavam de volta para a realidade.

— Aqui fora é lindo pra caralho, né? — Donna virou o rosto quando ouviu a voz familiar. Jackson estava parado ao lado dela, acendendo um cigarro totalmente preto e com suas roupas punk habituais.

— Pensei que você estaria na festa que está tendo hoje. — Ela disse negando com a cabeça o cigarro que o rapaz oferecia.

— Hoje eu estou cansado pra cacete, o Professor Fitzgerald comeu nosso couro frito com as provas dessa semana. — Jack fez um sinal com a cabeça em direção a um dos bancos e começou a andar em direção a ele junto da platinada. — Acho que em 24 anos de vida eu nunca vi um homem tão amargurado. Tipo, sabe aquelas pessoas que realmente precisam foder?

— Continue falando desse jeito, as garotas das artes cênicas estavam contando que o Senhor Fitzgerald escuta tudo. — disse ela tirando da bolsa alguns chocolates que sobreviveram a segunda aula.

— Ele não está aqui, nem os cachorrinhos que vivem lambendo a sola do sapato dele. Aliás, ouvi dizer que fez uma obra de arte nele. — o rapaz riu enquanto soltava a fumaça.

As bochechas de Donna esquentaram como se ela tivesse levado um tapa, só a memória daquela manhã foi o suficiente para que a fome da garota morresse um pouco.

— Eu tentei me desculpar, mas ele já havia ido embora...

— Relaxa, garota! — Jack bateu, um pouco forte demais, nas costas dela, de uma forma reconfortante. — Você tá longe de ser aluna dele, no máximo ele deve ter dado um show de estrela na sala do corpo docente.

— Jack, eu realmente acho que seria uma boa você maneirar nas ofensas. — a platinada olhou ao redor um pouco, nunca se sabia quando o carro de algum professor poderia aparecer do além.

— Estou a dois semestres de me formar, esse diabo não me assusta mais.

Um silêncio confortável ficou sobre os dois enquanto Jackson terminava o cigarro. Donna encostou a cabeça na jaqueta de couro, tomando cuidado com os espinhos de metal, e sentiu a falta de sono começar a possuir seu corpo lentamente.

— Como estão indo as suas aulas? — ela bocejou olhando para um arbusto que ainda tinha alguns morangos.

— Péssimas, o Professor Faust ainda me odeia por lembrar sua ex. — a risada de Jack foi genuína, como em todas as vezes em que a garota relembrava o fato.

— Isso o que eu chamo de chifre vitalício.

O barulho de t***s, não muito fortes, e de risadas ecoaram ainda mais pelo estacionamento. Donna era péssima em fazer amigos, entretanto, havia dado sorte em um dia ter sido acertada por um milkshake misterioso junto de Jackson. No começo ela achou que estaria sofrendo bullying, já que o rapaz sempre a chamava de “garota sabor morango” quando cruzavam os caminhos nos corredores. Por fim, era apenas uma forma de chamar a atenção dela, e deu certo.

Depois de um curto momento de risadas cansadas e suspiros mais ainda, Jack se levantou dizendo:

— Acho que devemos ir para nossas camas, você parece aquelas esculturas góticas horrorosas que a Senhora Bennet fez para o halloween.

A platinada não conseguiu segurar a gargalhada por conta da lembrança horrenda. Jogando a mochila no ombro, ela de um chute na perna do amigo e começou a andar em direção aos dormitórios.

— Você tem sorte por não ficar no campos, caso contrário eu já teria te chutado até seu quarto! — Donna gritou conforme Jackson se afastava em direção ao carro, mostrando um belíssimo e esmaltado dedo do meio para ela.

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