Atordoado, Pedro deu um passo para trás e levou a mão no rosto dolorido. Zoe foi pra cima dele, e furiosa, apontou o dedo indicador na sua cara.
- Você é muito abusado, Delegado! Sabia que eu posso te processar por assédio?!
- E eu posso te prender por desacato a autoridade e agressão física.
Pedro e Zoe se fuzilaram com os olhos. Rafael, em sua mente, já enfeitava a história para contar aos outros policiais. O dia em que uma mulher enfrentou Pedro e o colocou no seu devido lugar.
Porém, ao ver Pedro cerrar os punhos, Rafael se colocou entre ele e Zoe.
- Estamos todos exaltados. Vamos nos acalmar.
- Eu não quero me acalmar! - Zoe disse brava. - Ele me ofendeu!
Rodrigo achou melhor intervir.
- Foi um mal entendido, Doutora. Nós estamos sob muita pressão, e nem é seguro você estar aqui.
Com a cara e a coragem, Rodrigo pegou Pedro pelo braço, levou ele até a mesa, e o sentou na cadeira. Pedro fez menção de levantar. Rodrigo não deixou.
- Se lembre do Secretário.
Pedro entendeu o recado, e de má vontade, permaneceu sentado. Rodrigo puxou uma cadeira para Zoe em frente a mesa de Pedro.
- Sente-se, Doutora. Vamos resolver isso como pessoas civilizadas.
Ainda brava, Zoe sentou e cruzou as pernas.
Pedro sufocou um gemido. Como Zoe o desarmou e o deixou vulnerável, ele ainda não sabia. Mas sabia que seria motivo de chacota em toda a delegacia.
A bofetada ainda ardia consideravelmente. Como uma coisinha daquele tamanho podia ter tanta força? A força do ódio, talvez.
Pedro balançou a cabeça para tentar se recompor. Foi em vão. O joelho de Zoe estava a mostra e ele se perguntou como seria toca-la ali. Provavelmente seria outro tapa na cara. Era melhor se livrar logo daquela peste.
- Podem ir, Rodrigo e Rafael. Nós terminamos depois.
Os policiais se olharam, receiosos de deixarem Pedro a sós com Zoe. Porém, tirar a autoridade de Pedro ia gerar um novo conflito. Sendo assim, Rodrigo e Rafael saíram da sala.
Pedro se recostou na cadeira e encarou Zoe.
- Seu pai já esteve aqui algumas vezes, ele veio tirar alguns clientes. Eu não sabia que Álvaro tinha uma filha.
- Eu morava fora. Me mudei para cá recentemente e estou trabalhando na Conceitos Advocacia.
- O luxuoso escritório do seu pai. Desculpa se aqui não temos ar condicionado. - Pedro desdenhou.
Zoe ignorou o comentário do delegado, e foi direto ao assunto.
- Lucas é cliente do meu pai. No momento, ele está fora da cidade a trabalho e me pediu para pegar o caso.
A voz doce e macia, quase melodiosa, fez Pedro suspirar pesadamente. Ele se considera um homem solitário, frio e calculista. Não tem amigos, não tem mulher, não tem filhos, mal fala com os pais e a irmã, e Pedro gosta assim.
Agora do nada, de repente, sem aviso, uma mulher estava fazendo com que ele sentisse um misto de emoções desconhecidas.
- Você está bem? - Zoe perguntou.
O delegado parecia a beira de um colapso físico e mental.
- Eu estou bem. - Pedro mentiu. - Vamos ao que interessa. Lucas foi preso por dirigir bêbado e...
- Ora, Delegado. A prisão já está com o quê? Quase doze horas? Você tem mais doze horas para encaminhar os autos da prisão para o juiz. E vai escrever o que no relatório? "Garoto é preso por dirigir bêbado e perturbação da ordem"?
Pedro ficou ainda mais surpreso. Zoe não é só perfeita. É inteligente também. Uma combinação perigosa.
- Conclua.
Zoe sorriu.
- Para que gastar tempo e papel com essa bobagem? Ninguém morreu. Vamos resolver isso aqui mesmo, Delegado.
- Você é boa, Zoe. Eu confesso que estou impressionado.
- Obrigada.
Pedro se inclinou para frente.
- Eu poderia até aceitar esse seu argumento. Seria uma saída razoável.
- Sim, razoável. - Concordou Zoe.
Pedro balançou a cabeça negativamente.
- A minha resposta é não. Não é a primeira vez que Lucas causa problemas. Eu vou mantê-lo preso para garantia da ordem pública, e irei enviar os autos da prisão para o juiz. Lucas não quer avisar aos pais que está preso, ele pediu para avisar o advogado. No caso, o seu pai. E já que Álvaro te mandou... - Pedro deu um sorriso. - Você vai ter que mostrar serviço, Doutora.
Zoe respirou fundo. O delegado estava dificultando as coisas de propósito.
- Isso é por causa da bofetada? - Zoe debochou. - Tem o hábito de passar a mão em mulheres?
Pedro ficou sério.
- Isso é tudo, Zoe.
Zoe olhou Pedro por mais alguns segundos. Ele é tão grande e forte. Ela quis toca-lo. Imediatamente Zoe ficou de pé.
- Eu quero falar com o meu cliente.
- Sem chances.
- Você não pode me impedir! Lucas e eu temos o direito...
Zoe se calou ao ver Pedro levantar.
- Minha delegacia. Minhas regras.
Zoe não se deixou intimidar. Ela olhou no fundo dos olhos azuis.
- Você vai se arrepender, Delegado. Vai desejar nunca ter me conhecido.
Zoe saiu e bateu a porta com tanta força que as paredes estremeceram.
Petrificado, Pedro ficou olhando para a porta fechada.