Capítulo 4

Em poucas horas Pedro descobriu que Zoe não estava blefando. Ela entrou com um pedido de Habeas Corpus Liberatório, alegando que a prisão de Lucas foi arbitrária e abuso de poder. O juiz considerou a prisão sem justificativa e ilegal. Conclusão: Pedro não teve outra alternativa senão soltar Lucas.

Pedro queria dar um tiro em Zoe. Faltava apenas meia hora antes do fim do seu plantão, mas Pedro tinha que descontar toda a sua raiva em alguém.

- Rodrigo!

Rodrigo se preparou para o 3º round. Ele entrou na sala. Pedro estava em pé perto da janela. Já era noite.

- Sim, senhor.

- Feche a porta.

Rodrigo hesitou.

- O quê?

Pedro gritou:

- Eu mandei você fechar a porra da porta!

Rodrigo obedeceu. "Deus me ajuda".

Pedro se aproximou.

- Você andou aprontando pelas minhas costas. Que palhaçada é essa de transferência?

- É o melhor para nós dois, Pedro. Eu ia falar com você. Por favor, assine os papéis e nos tire desse sofrimento. Você não precisa de mim.

Pedro olhava para Rodrigo com evidente desgosto.

- Então é assim? Depois de todos esses anos, de todas as irregularidades que cometemos, você quer sair fora? Simples assim? Quer me deixar na mão?

- Eu só estou fazendo o que você faria. Nós fizemos prisões ilegais, desaparecemos com provas, alteramos cenas de crime, extraviamos drogas, falsificamos relatórios e inquéritos. Nós fomos longe demais, Pedro. Eu não quero mais fazer isso. - Rodrigo se manteve firme. - Você não tem nada a perder. Mas eu tenho família. Esposa e filhos.

Pedro escutou o desabafo de Rodrigo. Ao longo de sete anos, ele sempre esteve ao seu lado. Seguiu suas ordens cegamente, sem questionamentos, sem perguntas. E tudo ia muito bem, até Rodrigo começar a pensar por si mesmo.

Desde então, se tornaram inimigos declarados. É óbvio que Rodrigo não vai abrir a boca. Ele sabe que pode ser expulso da Polícia Civil e passar muitos anos preso como cúmplice. Ele quer apenas outra chance.

Pedro passou a mão pelos cabelos dourados. "Como será que é ter família? Ter esposa e filhos te esperando em casa? Ter comida fresca e uma cama quente?"

Pedro nunca tinha tido esses pensamentos ridículos. Por alguma razão, ele se lembrou de Zoe, e sua raiva retornou.

- O barco está afundando e você quer pular fora, é isso?

Rodrigo sustentou o olhar de Pedro.

- Você me disse mais cedo que é nas escolhas que os homens se separam dos meninos. Então, de homem pra homem, eu não suporto mais olhar na sua cara, Pedro. Você não é digno nem de dividir a cela com esses criminosos. Você não é um policial dando uma de bandido. Você é um bandido se passando por policial.

As palavras duras e verdadeiras, foram como um soco na cara de Pedro. A raiva deu lugar a frustração, e o delegado sentiu a cabeça rodar.

Rodrigo disse secamente:

- É fome. Se lembra da última vez que comeu alguma coisa?

Pedro se apoiou no ombro de Rodrigo. Ele não soube responder.

- Vamos. Eu te deixo em casa. A última coisa que nós precisamos é que você se envolva em um acidente de carro, e descubram cocaína no seu sangue.

Sem forças, Pedro se deixou levar por Rodrigo.

Zoe saiu do banho, e vestiu top e calcinha brancos da Calvin Klein. Ela tinha lavado os cabelos e estava com uma toalha branca enrolada na cabeça. O celular tocou. Era seu pai.

- Oi, pai.

- Oi, meu amor. Tudo bem?

- Tudo bem.

- Tudo certo com o Lucas?

- Sim. Ele já está em casa.

Álvaro riu.

- Essa é a minha garota. Eu estou tão orgulhoso de você, Zoe.

Zoe sorriu.

- Foi muito fácil. Quando vai me dar um caso de verdade, pai?

Álvaro riu divertido. Ama a filha mais do que tudo na vida. Zoe é a luz do seu caminho. Ele ficou profundamente aliviado quando ela voltou para casa.

Após a morte da mãe há dez anos, Zoe foi morar fora para estudar. Ela fez Faculdade de Direito, e trabalhou por cinco anos para Marc & Associados.

Zoe tinha medo de voltar para casa. Medo de voltar para as lembranças tristes e dolorosas do passado. Mas Álvaro, finalmente a convenceu.

- Em breve, eu vou cumprir o que prometi a você, Zoe. - Álvaro se virou na cama de casal do hotel onde estava hospedado. - A Conceitos está com muito trabalho. Você pode ajudar Dan e Lara na área criminal.

- Quando você volta?

- Se tudo der certo, em dois dias. Eu nem queria estar nessa Convenção. Todo ano é a mesma chatice. Eu gostaria de estar em casa com você, filha.

- Eu também gostaria que você estivesse aqui, pai.

Zoe foi sincera. Os anos que ficou afastada do pai não mudaram o que sente por ele. Na verdade, Zoe sente vergonha por ter abandonado o pai quando ele mais precisava dela.

- Como foi com o delegado? - Álvaro mudou o rumo da conversa antes que ficasse sentimental.

A pergunta repentina pegou Zoe de surpresa. Ela se fez de desentendida.

- Como assim?

- Pedro. O homem é osso duro de roer.

Zoe ficou com a boca seca ao lembrar do delegado de olhos azuis turquesa e cabelos dourados.

- Foi tudo... normal. - Normal estava longe de descrever o que tinha acontecido. Porém, Zoe não queria preocupar o pai. - Seguimos o procedimento padrão.

- Sei. - Álvaro não se deixou enganar. Ele suspirou. - Pedro foi grosso com você? Eu lamento ter te colocado nisso.

- Correu tudo bem, pai. Sério.

- Isso não vai acontecer de novo. Eu quero você longe de Pedro. Bem longe.

- Por quê?

Álvaro pensou antes de falar.

- Pedro é violento. Ele tem um temperamento explosivo. Há boatos de que ele está para ser afastado. Eu ouvi coisas estranhas sobre ele.

Zoe terminou de falar com o pai e jogou o celular em cima da cama. Ela foi até o espelho, levou a mão ao rosto negro no lugar onde Pedro a tocou e sorriu. Um sorriso enigmático.

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