INTERCÂMBIO - SEGREDO MCKEATON
INTERCÂMBIO - SEGREDO MCKEATON
Por: ANNY BALKENNT
PRÓLOGO

30 de janeiro de 2020

Saindo da Ponte Rio-Niterói, seguiu para a Rodovia BR-101 e entrou na RJ-124. Parou no acostamento e observou a placa que indicava o caminho. Dirigiu-se para a Rodovia RJ-106 até São Pedro da Aldeia e entrou à direita, na RJ-140.

Ao chegar nas imediações da cidade, respirou fundo e parou o carro em frente a uma banca de jornal. Saindo do veículo, seguiu em direção a um homem que parecia absorto com alguma informação do jornal que estava em suas mãos. Sorriu, cumprimentando-o em seguida. O homem barrigudo de bigode respondeu apenas um bom-dia indiferente.

Por favor, gostaria de saber como chego à Travessa Maçônica — ela perguntou.

O homem dobrou o jornal, colocou-o sobre o balcão e explicou o caminho com má vontade. Virou-se para atender o telefone, mas logo se voltou a ela com um olhar desconfiado. Sentindo-se desconfortável, apressou o passo em direção ao carro e, ao entrar no veículo, recordou- se com aflição da possibilidade de ter sido seguida até a cidade. Acariciou as pernas para controlar o nervosismo antes de ligar o motor. Finalmente, deu a partida e seguiu o trajeto informado.

Avistou uma placa de estacionamento ao lado de uma casa de chá. Já parada na vaga, respirou fundo para manter o pouco do controle que ainda havia lhe restado. Suspirou novamente, olhando para a entrada

da casa de chá. Obrigou-se a sair do carro, mesmo certa de que não estava pronta para cruzar aquela porta.

Entrou na casa de chá e foi recebida por uma atendente muito antipática, com um ar de desagrado estampado no rosto, pedindo que a seguisse sem ao menos perguntar o que ela desejava. Sem opção, acompanhou a atendente, angustiada com a situação que iria confrontar daquele momento em diante.

Uma senhora de expressão firme ficou em pé, estendendo a mão na sua direção. Ela apertou a mão da senhora e teve sua atenção desviada para os cochichos das pessoas nas mesas ao seu redor, que aparentemente comentavam algo relacionado à sua aparência.

Seja bem-vinda, Sarah Gadrel — a mulher falou, chamando sua atenção.

A senhora pediu que ela a acompanhasse num breve chá da tarde, para amenizar a tensão do primeiro encontro entre elas. Observando a mesa posta para duas pessoas, Sarah agradeceu o convite. Sentando-se com postura, sorriu e voltou sua atenção para a senhora que obviamente era seu contato. Lembrou-se de que havia sido instruída por Kosnir, que seria recebida na casa de chá por uma senhora muito elegante. Ela estava com óculos de armação fina, tinha olhos negros e cabelos grisalhos presos em um coque. Observou um casal que a encarava.

Sra. Susana Alveza, agradeço pela confiança em me contratar — Sarah falou, tentando desviar sua atenção do casal na mesa ao lado.

A Sra. Suzana alegou que havia cedido ao pedido de seu amigo Kosnir e colocou o dedo indicador na haste dos óculos.

Kosnir é um grande amigo! — falou sorridente — E me falou sobre a sua situação atual.

Sarah não entendeu porque a Sra. Suzana corou depois de falar, mas imaginava os termos que Kosnir teria utilizado para convencer a mulher a contratá-la com apenas uma ligação. A Sra. Suzana percebeu o olhar confuso de Sarah e se posicionou mais confortavelmente na cadeira, tentando se manter numa postura mais correta.

Entendo que esteja se sentindo confusa em falar de uma situação complicada — fez uma pausa — E por ser indicação de um grande amigo meu, não hesitei em chamar você para trabalhar.

A Sra. Suzana analisou o rosto transtornado de Sarah, respirou fundo e logo continuou:

Como não tem experiência, pretendo pagar um pouco menos do que o salário anunciado.

Agradeço sua consideração — falou Sarah — Realmente não estou confortável para falar do problema que ocasionou minha vinda para Cabo Frio.

Sarah tossiu para disfarçar o nervosismo. A Sra. Suzana, compreendendo que o assunto era muito complexo para uma conversa em público, optou por mudar de assunto. Começou a comentar sobre algo, descontraída, enquanto Sarah colocava fatias de frios na pequena broa de milho. Ela parou de falar, percebendo que Sarah não havia prestado atenção em nada do que tinha dito.

Você é uma mulher de poucas palavras. Muito bem, eu gostei de você! Eu não gosto de pessoas tagarelas. — disse com um sorriso

descontraído — Kosnir me falou brevemente sobre as atividades dele ao telefone. Ele parecia atormentado! E me surpreendeu pedindo para agendar nosso encontro.

A Sra. Suzana olhou para o casal que encarava Sarah e continuou:

Não se preocupe! São meras coincidências do nosso dia a dia — concluiu.

Sarah compreendeu que a Sra. Suzana falava indiretamente do casal, que desviou sua atenção para o jornal em sua mesa.

Eu sou responsável pela casa da família Battor e preciso que cuide do Sr. Herk. Ele sofreu um enfarte aos cinquenta anos, tem dificuldade para andar e vem apresentando indícios de esquizofrenia.

Sra. Suzana fez uma pausa e concluiu:

Estou muito cansada! O Sr. Battor evita tomar os remédios e, sinceramente, eu já não tenho mais força por causa da minha idade. Não pergunte ou a demito antes de começar! — as duas sorriram — Somente este ano o Sr. Battor teve o coração operado duas vezes, sendo que ele acaba de completar 83 anos de idade. Estou em uma luta diária; evito me envolver nos assuntos da família e espero que faça o mesmo.

Sarah percebeu a expressão descontente da Sra. Suzana ao recordar-se dos problemas enfrentados na casa da família Battor. Sarah desviou sua atenção para o casal que a encarava, ouvindo comentários que geravam discórdia entre eles.

A Sra. Suzana, ao perceber a curiosidade repentina de Sarah, tossiu para chamar sua atenção. Sarah olhou para ela.

Ocorreu uma explosão no Centro de Pesquisas de Doenças Raras, e estamos preocupados com os riscos futuros. Não fique surpresa com os olhares tortos! Atualmente, não estamos recebendo turistas na cidade devido a esse acidente — falou, percebendo que Sarah se sentia incomodada — Mas isso é algo que você sabia, não?

Desculpe-me, sou um pouco alienada! — Sarah respondeu.

Não se preocupe! Existem coisas mais importantes para se pensar. Uma atendente aproximou-se, pediu licença e entregou a Sra. Suzana um bilhete. Ela dobrou o bilhete, guardou-o na bolsa e avisou que precisava voltar para casa.

Saindo da casa de chá, conversando tranquilamente sobre assuntos aleatórios e sem importância, Sarah avisou que iria seguir o trajeto para a casa da família Battor em seu carro.

Sarah caminhou em direção ao estacionamento, sentindo-se estafada por causa dos últimos dias. Parou ao lado de seu carro, observando, do outro lado da rua, o semblante fechado da Sra. Suzana que aguardava o motorista abrir a porta.

Sarah entrou no carro e aguardou o sinal do motorista. Em pouco tempo já estava seguindo o carro, observando as ruas da cidade de Cabo Frio. Enquanto dirigia, sentia-se envolvida pela beleza incomparável da cidade. Ao contornar uma pequena praça, sentiu um inexplicável mau presságio. Entraram na Avenida Américo Vespúcio e pararam em frente a um prédio muito luxuoso. Ao descer, a Sra. Suzana fez sinal para que Sarah aguardasse, e ela observou o carro

entrando na garagem do prédio. Sarah estacionou em uma vaga com vista para o calçadão da praia. Mesmo distante, ainda conseguia admirar a orla com fascinação. Depois, ouviu toques leves no vidro do carro. Abaixou o vidro e recebeu um documento da Sra. Suzana.

Muito bem, Sarah Gadrel. Por favor, preste atenção porque não gosto de repetir duas vezes a mesma coisa. Naquela esquina — apontou — existe um estacionamento onde já foi acertado manter seu carro, essa permissão pode ser renovada após o prazo de experiência. Este documento é sua licença para usar o estacionamento.

Após as instruções da Sra. Suzana, Sarah fechou novamente o vidro por causa do vento forte. Seguiu em direção à esquina, virou, entrou na rua indicada e parou em frente a uma cancela de onde um segurança surgiu e solicitou-lhe o documento. Sarah abriu o vidro e o entregou ao segurança, que, após analisá-lo, devolveu o documento e fez um gesto para que prosseguisse. Continuou pelos corredores de carros enfileirados e estacionou na vaga indicada no papel.

Sarah saiu andando e virou a esquina, admirando a orla da praia. A Sra. Suzana a aguardava em frente ao prédio com um olhar triste.

O apartamento da família Battor, no 13º andar, era muito confortável e espaçoso, com uma escada na sala ao lado do corredor do primeiro andar. Sarah foi orientada a ficar apenas no primeiro andar, onde ficava seu quarto e o do Sr. Herk Battor, e a Sra. Suzana deixou claro

que a proprietária não gostava de empregados passeando pelo apartamento.

A Dra. Anna Battor exige sua privacidade. E como não vejo motivo para que ande pelo segundo andar, peço que se mantenha somente nas áreas necessárias ao seu trabalho — alertou com autoridade.

Sarah afirmou que havia compreendido muito bem as ordens e as normas. A Sra. Suzana acompanhou Sarah até o quarto e avisou que precisava realizar duas ligações. Sarah aproveitou para colocar as malas ao lado da cama. Ouvindo o som de passos, ergueu a cabeça, deparando-se com uma senhora de cabelo negro com fios grisalhos saindo do banheiro apressadamente. Sarah tentou falar, mas a mulher se virou e seguiu em direção à porta do quarto.

Seu nome é Marini!

Disse a Sra. Suzana, que se deparou com Sarah parada no corredor em frente à porta do quarto.

Marini não fala claramente nossa língua. Ela é indígena. Após o acidente militar, a aldeia em volta da região foi evacuada pelos militares e, com isso, os descendentes estão alocados no centro da cidade.

Ela não parece indígena — Sarah constatou. A Sra. Suzana olhou para Sarah com um sorriso.

O que esperava? Que ela andasse pelada? Marini estava me ajudando a cuidar do Sr. Battor, mesmo não sendo uma de suas obrigações. Ela trabalha uma vez por semana na limpeza do apartamento.

A Sra. Suzana aparentava estar mais descontraída e avisou que o Sr. Battor estava acordado. Como Sarah estava com uma blusa azul decotada, ela pediu para que se vestisse adequadamente para trabalhar. Sarah escolheu um jeans e uma blusa de manga branca e aproveitou para desfazer sua mala de mão, que continha apenas o que seria necessário para o seu dia a dia, e manteve a outra mala fechada. Sentou-se na cama, observando a mobília simples do quarto. Sentiu aflição ao recordar que na virada do ano acreditava que sua vida seria diferente. Bufou. Uma batida na porta a trouxe de volta à realidade. Sob o olhar de aprovação da Sra. Suzana para sua roupa, seguiram para o quarto do Sr. Battor enquanto ela explicava o ritmo do trabalho: era por seis dias consecutivos e as folgas seriam de acordo com as necessidades da Dra. Anna.

Ao entrar no quarto, Sarah sentia-se exausta devido à viagem e a maioria das explicações da Sra. Suzana sobre as crises do Sr. Herk fugiam de sua atenção.

O quarto do Sr. Battor era muito elegante com mobílias de madeiras escuras. A Sra. Suzana apontou para um senhor na cadeira de rodas que aparentava ser muito frágil e debilitado. Seguiu calmamente até ele.

Herk — chamou a Sra. Suzana.

Ele virou o rosto, olhando aborrecido para ela, e Suzana rodou a cadeira de rodas na direção de Sarah.

Sarah Gadrel é indicada de um amigo extremamente confiável, e ela vai ajudar a cuidar do senhor.

O homem a olhou zangado e começou a estapear o ar em sua direção. A Sra. Suzana demonstrou impaciência ao segurar a mão do homem no ar, aparentemente apertando-a para mantê-la parada. Sarah percebeu a intensidade do seu estresse em relação ao homem, observando sua reação refletida na marca que ficou no pulso dele. Seguiu sorrindo e ajoelhou-se ao lado dele tentando amenizar a situação.

Sr. Herk, estou aqui apenas para sua companhia, não precisa se zangar com minha presença — Sarah falou carinhosamente.

O Sr. Herk olhou com admiração e sorriu ao perceber a delicadeza da mulher que acariciava a marca em seu pulso. A Sra. Suzana ficou com semblante carregado.

Está na hora do seu remédio — ela avisou com um tom forte.

Ele balançou a cabeça negativamente e a Sra. Suzana precisou respirar fundo, tentando controlar a ira expressa pela força com que batia o pé no chão.

Sarah andou em direção à bancada com remédios e pediu para assumir as atividades. Suzana entregou dois comprimidos e um copo com água.

Por favor, então cuide disso por mim. Eu preciso de ar!

A Sra. Suzana saiu do quarto com as mãos no peito. Sarah compreendeu que a situação seria mais complicada do que poderia ter imaginado durante a conversa na casa de chá. Pediu a Deus proteção em suas ações e se virou para o Sr. Battor, que olhava as marcas em

seu pulso com olhar frustrado. Sarah andou até ele, parando ao seu lado. Ele suspendeu a cabeça com olhos vermelhos.

Sr. Herk, acredito que sua esposa ficaria extremamente satisfeita em saber que o Senhor tomou o seu remédio por conta própria. Pode fazer isso por ela? — perguntou delicadamente estendendo o comprimido e o copo com água.

Ele olhou para Sarah forçando um sorriso fechado, pegou com dificuldade o copo com uma das mãos e o comprimido com a outra, ingeriu-o rapidamente e devolveu o copo vazio.

Suzana olhou para Sarah, que percebeu seu olhar de preocupação por ele ter ingerido o remédio sem discussões ou pela força bruta.

Ela bufou ―homem patético‖ e se virou deixando Sarah sozinha com o Sr. Herk Battor.

Estafada com o excesso de trabalho e sem escalas de folga, Sarah começou a pensar que seu objetivo estava pendente, preocupada com sua atenção somente na saúde e bem-estar do Sr. Herk Battor. Parou em frente ao escritório da Dra. Anna, no segundo andar, avaliando a oportunidade de investigar o local em busca de informações. Suspirou e entrou cautelosamente em direção à mesa do computador. Ligou-o e usou possíveis senhas que estavam anotadas no caderno preto de Kosnir. Não conseguia raciocinar e abriu as gavetas, procurando por algo, sem saber exatamente o quê.

Como se soubesse o que deveria procurar. Burra! — reclamou.

O som de passos no corredor chamou sua atenção e Sarah desligou o computador, seguindo em direção à porta do escritório a passos largos. Havia desperdiçado as poucas horas de que dispunha para descansar, revirando os cantos da casa sem sucesso.

Deparou-se com a Sra. Suzana no corredor, saindo do quarto da Dra. Anna.

Procurando por mim, Sarah? — perguntou a Sra. Suzana.

Sarah suspirou aliviada pelo fato de a Sra. Suzana não ter percebido que ela estava saindo do escritório.

Sim! Preciso de folga — falou Sarah cruzando os braços. A Sra. Suzana sorriu e disse:

Falaremos em breve sobre esse assunto.

Ignorando o pedido de Sarah, a Sra. Suzana comentou sobre um programa com o qual havia aprendido receitas de doces e pães.

Sarah, aborrecida, pediu licença e seguiu para o quarto do Sr. Herk. Entrou e observou o homem estirado na cama. Sentou-se na poltrona com o semblante carregado.

Como ela iria descobrir a senha do computador? Ela estava iniciando a busca do jeito certo? Precisava voltar a se concentrar em sua missão, esse era seu único objetivo e não podia cuidar do Sr. Herk Battor o dia inteiro. Mesmo sentindo uma grande compaixão por ele, precisava se apressar porque não havia muito tempo para investigar antes de partir. Pegou o caderno de Kosnir para analisar as instruções registradas às pressas com letras tortas e rabiscos. Virou a página procurando uma informação que fosse legível, mas suas mãos ficaram trêmulas ao olhar

para as marcas de sangue na página do caderno. Em seguida, olhou para o Sr. Herk, que permanecia cochilando. Ela colocou o caderno embaixo da almofada da poltrona e fechou os olhos, tentando descansar por alguns minutos.

Acordou assustada com o Sr. Herk Battor encarando-a com uma expressão indecifrável, mas ele se afastou dela movendo a cadeira de rodas com os botões de controle. Sarah ficou observando-o antes de buscar seus remédios na bancada.

Às oito da noite, a Sra. Suzana informou que a Dra. Anna estava retornando de viagem.

Sarah, a Dra. Anna volta hoje, na verdade já deve estar chegando ao centro da cidade.

Sarah olhou para a mulher de aparência tranquila, mas percebeu uma linha de tensão surgir em sua testa quando o Sr. Herk Battor olhou para ela com ar áspero. A Sra. Suzana saiu a passos largos e Sarah conduziu o Sr. Herk para a sala, onde ele preferia assistir à televisão na tela maior, de quarenta polegadas. Enquanto o Sr. Herk assistia aos anunciantes no canal de esporte, ela olhava na direção da escada, pensando em uma provável senha para acessar o computador do escritório da Dra. Anna.

Sentiu-se perturbada por não estar seguindo o plano de Kosnir. O Sr. Herk fez sinal para ela se aproximar.

O que está procurando? — perguntou.

Sarah se assustou porque era a primeira vez que ele falava.

O que tem lá? — o Sr. Herk apontou para o corredor.

O escritório da sua esposa, Sr. Herk — Sarah falou baixinho.

Nada que encontrar naquela sala vai ajudar, está procurando no lugar errado! — ele avisou.

O homem parecia estar com uma nova expressão, e parecia muito lúcido em cada palavra pronunciada.

E o senhor sabe o que estou procurando? — perguntou a ele, que se sentou reto na cadeira, enquanto ela percebia que o homem não era tão frágil como aparentava.

Vá embora ou irá ficar presa aqui como eu — alertou com os olhos arregalados — Presa como eu!

Sr. Herk, por que esconde que é capaz de falar claramente? — ela perguntou.

Sarah ficou confusa com o comportamento dele, que segurou na mão dela com força.

Só vai encontrar sua prisão, o mal está entre eles!

O som de passos atrás de suas costas a despertou. Virou-se e se deparou com a Sra. Suzana, que parecia absorta com a situação. Sarah fingiu estar falando com o Sr. Herk.

A Sra. Suzana andou até a mesa de centro da sala e deixou uma bandeja com remédios sobre a mobília e saiu novamente. Herk puxou sua mão, chamando a atenção de Sarah novamente para ele.

Não há mais tempo para mim, eu acreditei nela. Eles dizem coisas sobre mim. São mentiras e mentiras. Estou preso aqui!

Sarah segurou a mão dele, que tremeu, respirando fundo; em seguida, Sr. Herk balançou a cabeça negativamente.

Estamos presos aqui! Todos! — falou olhando em seus olhos.

Sarah sentiu o corpo arrepiar com o sentimento de desespero por não saber se realmente o homem estava iniciando uma crise de esquizofrenia ou avisando algo que pudesse ajudar em sua missão. Ela segurou o rosto do homem com as duas mãos.

Eu não posso ajudá-lo, a menos que me conte o que está acontecendo — Sarah falou — Conte-me, Sr. Battor!

O homem afastou o rosto das mãos dela com o olhar apavorado.

Eu não existo! Eu sou Herk Battor, mas quem eu fui não existe mais porque eles não querem.

O Sr. Herk Battor ficou perdido em seus próprios pensamentos, ignorando-a totalmente, e fechou os olhos quando Sarah voltou a perguntar se ele sabia o que estava acontecendo. Ela concluiu que algo maior deveria estar acontecendo na cidade, além do que Kosnir poderia imaginar.

Sarah seguiu até seu quarto a passos largos, deixando o Sr. Battor sozinho na sala. Pegou o celular na bolsa, e discou o único número registrado na agenda.

Não posso atender, deixe sua mensagem. Obrigada!

Por favor, Neole, me ajude! — desligou o celular.

Sarah propagou diversas palavras de baixo calão, sentindo a cabeça latejar e um forte desejo de atirar o celular contra a parede; era a décima vez que ouvia a mesma mensagem. Voltou a passos largos e

sentou-se no sofá, olhando para o Sr. Herk entretido com um jogo que passava no canal de esporte. Sarah surpreendeu-se quando o Sr. Herk sorriu ao ouvir a Sra. Suzana avisar que a Dra. Anna estava na cidade há alguns dia e que estava voltando para casa naquela noite.

Me ajude a vestir um terno — ele pediu, assim que a Sra. Suzana se retirou do quarto para atender a uma ligação.

Sim! — Sarah respondeu.

Não confie em nada que contarem para você sobre mim — Sr. Herk alertou.

O que está acontecendo exatamente, Sr. Herk? — ela perguntou.

Não pode mais ajudar a si mesma — falou rispidamente e com ar de autoridade.

Ele olhou para o armário.

Eu quero vestir algo elegante hoje! — concluiu sorrindo.

Sr. Herk, o que sabe sobre o caso de pessoas desaparecidas? — Sarah perguntou.

Ele olhou para ela com um sorriso dissimulado e maldoso.

Às vezes, para ajudar, é preciso vivenciar, não acha? — ele perguntou.

Sarah observou o relógio que marcava vinte e uma horas. Eles aguardavam na sala de jantar pela chegada da Dra. Anna, que estava atrasada. O Sr. Herk havia insistido com a Sra. Suzana que queria um jantar para ele e sua esposa. Foi a primeira vez que Sarah o ouviu falando com ela. A Sra. Suzana cedeu ao pedido somente quando Sarah interveio, alegando que seria bom para ele.

Sarah se levantou da cadeira observando o Sr. Herk Battor, que cochilava com a cabeça encostada na mesa de jantar e com o rosto virado para a porta da sala, por volta das onze da noite.

A Sra. Suzana começou a retirada dos talheres da mesa. Sarah seguiu até ele e suspendeu sua cabeça.

Ela o posicionou na cadeira e seguiu para o quarto. Ele despertou quando entrou na sala e reclamou, mas baixou a cabeça. Depois, o som de chave na porta, que se abriu. O Sr. Battor animadamente pediu para Sarah esperar, alegando que sua esposa havia chegado. O sorriso dele sumiu quando um casal apaixonado entrou aos beijos, seguindo para a escada.

Sarah observou rapidamente a mulher, branca de cabelos castanho escuro lisos até o ombro, sendo suspensa pelos braços do homem branco, de braços fortes e cabelo castanho claro em um corte curto.

Sarah foi para o quarto, sentindo-se constrangida com a cena do casal na sala. A Sra. Suzana entrou com um semblante abatido, deixou na bancada uma bandeja com uma refeição para Sarah e pediu para que ela trocasse a roupa do Sr. Battor. Em seguida, saiu do quarto a passos largos.

Desculpe-me, Sr. Battor, não devia ficar acordado até tarde. A culpa foi minha! — falou Sarah — Está zangado com sua filha?

Ele olhou para ela; em seguida, sorriu e colocou as mãos no peito.

Anna... Ela sempre foi linda! Ainda me lembro de quando me apaixonei por ela. Doce, meiga, gentil e inteligente.

Sarah ficou inexplicavelmente constrangida com a informação do nome da jovem que estava acompanhada, e por saber que ela era a esposa do Sr. Battor.

Meu Deus! Desculpe-me, Sr. Herk. Não foi minha intenção — falou Sarah, constrangida pela gafe.

Escute com atenção, não existe nada que possa fazer por essas pessoas que procura. É tarde para mim e para elas também. Você tem que ir embora — ele avisou.

O que sabe sobre pessoas desaparecidas? Por favor, eu preciso de sua ajuda! — ela falou.

É tarde! E se não pode voltar ou partir, é tarde para você também — ele fechou os olhos.

O Sr. Herk começou a suspirar como se estivesse dormindo, mas Sarah já o conhecia o suficiente para saber que ele estava apenas fingindo para evitar conversa com ela.

Sarah se sentou na poltrona e olhou para o homem encolhido na cama. Ela sabia que uma dor como aquela não era rápida de se superar apenas fechando os olhos. Na verdade, você não consegue dormir, simplesmente passa horas acordado com um grande vazio no peito. Ela ainda sentia essa mesma angústia quando se recordava do que havia passado, mesmo após vários meses.

Acordou meia-noite, aborrecida com os problemas enfrentados e não podia continuar ignorando sua missão, porque havia lugares que

precisava investigar. Seguiu para a cozinha para beber água e ouviu o som de passos que chamaram sua atenção.

Ainda acordada? — perguntou a Sra. Suzana com a aparência tranquila.

Estava com sede! — respondeu de modo grosseiro.

Esqueça o que viu ou ouviu! Pela sua expressão, entendo que não aprova a atitude dela — falou Suzana — Mesmo porque, não é o seu objetivo — alertou.

Eu sinto pena dele! E não acho correto trazer um amante, ainda mais na casa em que vive um homem debilitado como ele — Sarah falou, lembrando como foi difícil para ela também lidar com aquele tipo de situação.

Não sinta! E não se intrometa onde não deve — avisou a Sra. Suzana.

Ele é um ser humano! Sinto pena dele e não tenho o hábito de ser fria com as pessoas — falou agressiva com a frieza da mulher a sua frente.

Peço que não se envolva nos problemas de família — disse Suzana.

Desculpe! Não consigo! Quando me lembro dos olhos dele enquanto eles subiam para o quarto... — Sarah parou de falar, sentindo os olhos arder. Suzana percebeu que havia algo além da situação do Sr. Herk.

Deus o está punindo pelo que fez no passado. Entenda que Deus não é cruel. Apenas escolhe uma forma de mostrar como se errou nessa vida — falou a Sra. Suzana, sentando-se ao seu lado.

Sarah reparou que a Sra. Suzana estava com um semblante mais leve e tranquilo. E seu olhar estava descansado, passando a impressão de que ela também sentia pena de Herk.

Eu não devia falar sobre esse assunto, mas acho que viu além do que devia. Então, não vejo motivos para não falar desse problema — ela tossiu — Herk foi padrasto da Dra. Anna. E eles tornaram-se amantes ainda quando viviam sob o mesmo teto que a mãe dela. Você acha mesmo que Deus não os puniria? Ele nesse estado debilitado e ela presa a um homem que poderia ser seu avô — a Sra. Suzana baixou a cabeça. Sarah suspirou com o semblante carregado de preocupações pessoais.

Eu quero minha folga Suzana! — Sarah avisou.

A Sra. Suzana concordou e avisou que no dia seguinte elas conversariam. Sarah levantou-se irritada, porque queria uma resposta imediata. Voltou para o quarto do Sr. Herk. Percebeu que ele continuava acordado. Encostou-se à poltrona, sentindo os olhos lacrimejar.

Que Deus me ajude! — ela murmurou em desespero.

Às dez da manhã, a Sra. Suzana avisou que era o dia de sua folga, e que ela estava livre para sair ou fazer o que fosse de seu interesse naquele dia.

Sarah entrou no quarto com o intuito de trocar de roupa para ir investigar endereços registrados no caderno de Kosnir. Ela apertou os

olhos ao lembrar que havia deixado o caderno no quarto do Sr. Battor, debaixo da almofada da poltrona. Bufou.

Sarah se deitou na cama atirando a sandália longe e fechou os olhos, concluindo que devia dormir, no mínimo, umas duas horas antes de sair.

Acordou horrorizada com a escuridão do quarto. Acendeu a luz da cabeceira e se surpreendeu com o relógio, que marcava vinte e duas horas. Sentada, recordou-se brevemente de toda a semana turbulenta que havia passado antes de chegar à cidade. Levantou-se e, rapidamente vestiu a primeira peça de roupa que encontrou, preferindo sair um pouco para aliviar a confusão em sua cabeça. Ela se aproximou da porta do quarto do Sr. Battor e ouviu a voz de uma jovem falando animadamente com a Sra. Suzana, que sorria. Sarah apressou o passo e seguiu para a porta. Estava usando um vestido bege com decote quadrado e salto básico. Andou para a fileira onde seu carro estava estacionado, respirando fundo.

Olhou o relógio de pulso, sentindo-se aborrecida ao perceber que havia contornado no sentido contrário ao da sinalização.

Estacionou o carro, seguiu a rua estreita com bares, chegou ao calçadão e observou as barcas atracadas. Parou na entrada de uma casa de dança que ficava no segundo andar de um restaurante. O som da música que ecoava era agradável e as luzes azuis iluminavam o local, chamando a atenção das pessoas.

Olhou para uma bela ponte iluminada e sentiu um calafrio com a sensação de alerta.

Ela bufou, seguindo para a fachada da boate, pagou a entrada e seguiu para o balcão. Colocou as mãos na cabeça, tentando manter a calma e se perguntou em voz alta: ―O que estou fazendo?‖.

Relaxa! Às vezes, estamos em um lugar porque é o destino, sacou?

disse o simpático atendente do balcão enquanto estendia um cardápio de bebidas para ela.

Obrigada!

Resolveu beber algo. Observou as pessoas dançando animadas e olhou o cardápio procurando por algo sem álcool, porque ela precisava dirigir quando saísse. Sem paciência, pediu um suco de laranja. Ela se virou e observou um homem branco de cabelos crespos e com uma blusa bege que rebolava em uma espécie de conga com hip hop no meio do salão. As pessoas dançavam animadas em volta dele. Ela sorriu e o atendente entregou-lhe sua bebida. Ela bebeu um gole demorado, sentindo queimar a garganta.

Que é isso? — perguntou ao atendente.

Vodka e suco de laranja! — ele respondeu — Queria o quê? Suco de laranja puro? — ele se virou para atender um cliente, gargalhando. Em uma atitude desesperadora, para esquecer todos os problemas, bebeu tudo. ―Que se dane essa porra toda‖, falou aborrecida.

Gargalhou sozinha, sentindo-se animada. O atendente deixou outro copo sobre a mesa com a mesma bebida. Um grupo de garotas se

aproximou do balcão. Ela pagou, terminou de beber e agradeceu; estava na hora de voltar para a casa da família Battor.

É isso aí! — Sarah falou sozinha.

As garotas sorriram, achando engraçado ver no balcão apenas dois copos de uma bebida considerada muito fraca.

Vamos dançar — falou uma morena completamente despenteada puxando Sarah pelo braço.

Sarah andou vacilante, seguindo para o agito no meio do salão. Uma roda se formou e cada pessoa fazia um passo diferente, e na sua vez, Sarah precisou improvisar: desceu rebolando até o chão e subiu batendo palmas. As meninas se agitaram, imitando-a. O homem que rebolava, exibindo-se para o outro grupo, veio no intuito de disputar passos com ela nas batidas da música eletrônica.

Vamos arrasar, amiga! — falou o homem de cabelo crespo, completamente bêbado.

Ele deu um selinho em Sarah, que começou a gargalhar, sentindo-se tonta.

Sarah sentiu sua atenção sendo repentinamente desviada para gritinhos que vinham da esquerda na área das janelas com vista para o canal. Um homem atraente conversava com duas garotas, uma ruiva, com aparência de uma boneca, e outra com cabelos longos e loiros. Ele estava usando jeans e uma camisa polo preta. Aparentava ter 1,80 m de altura. Tinha braços definidos e cabelo castanho claro, em um corte curto que realçava o rosto firme e retangular que mantinha um sorriso

largo. Ele levantou os braços acenando para um cara no balcão e Sarah observou a tatuagem tribal em baixo do braço.

Ela sentiu alguém se aproximar falando junto ao seu pescoço.

Um leão em busca de uma presa! — falou o homem de cabelo crespo.

Ela baixou a cabeça, virando-se para o grupo na intenção de se despedir deles. Sarah sentiu o coração se agitar, quando uma mão forte a fez se virar de forma bruta. Deparou-se, surpresa, com o homem que conversava com as garotas. Ele sorriu para Sarah, que baixou a cabeça sem reação.

Ele suspendeu seu rosto e Sarah colocou as mãos no peito dele, afastando-se um pouco para encará-lo. Mas ele a puxou para junto do seu corpo, imobilizando-a. Ela se sentiu tonta no momento em que ele tomou seus lábios.

Precisou afastar o rosto para recuperar o fôlego e não demorou muito para perceber que estava afastada do centro do salão. Ele a encostou no canto onde havia pessoas namorando de forma extremamente inadequada para o local. Surpresa, olhou à sua volta e viu que tudo era pouco iluminado. Ele a apertou contra a parede, suspendendo-a enquanto beijava seu pescoço. Ela envolveu os braços em volta do pescoço dele e sentiu seu vestido ser suspenso e a intensidade do desejo explodir quando ele a possuiu.

Ouviu os sorrisos dos outros casais afastados e encolhidos no escuro. Ela tentou se afastar dele, mas os movimentos a levaram a uma intensidade de paixão. Ela prendeu os dedos nos fios ondulados e

curtos do cabelo dele. Retribuiu o beijo de forma frenética. A boca dele abafava seus gemidos e ela enfiou a unha no pescoço dele. Ela se sentiu desfalecer nos braços dele, que se afastou dela, arrumando a roupa. Seu celular começou a tocar.

Ele olhou para ela e se afastou, seguindo para uma porta que indicava a saída de emergência. Constrangida com a ovação das pessoas no salão, que perceberam o namoro audacioso do casal na parede, seguiu às pressas para a saída de emergência e correu pelo caminho que dava na entrada principal.

Na rua onde estacionou, parou ao lado de seu carro e colocou as mãos na cabeça, pensando na besteira que havia cometido. Precisou ficar quase trinta minutos mascando balas até se sentir no controle para dirigir.

Seguiu o caminho de volta para a casa da família Battor, completamente desesperada por conta de seu comportamento inadequado.

Adentrou a cozinha, no intuito de beber água para ingerir um remédio preventivo que havia comprado numa farmácia 24 horas. A Sra. Suzana surgiu, reclamando de vários problemas com Herk ao longo do dia, entre outros assuntos.

Zangada e aborrecida, Sarah bufou.

Ainda não estou em meu horário de serviço — avisou.

Seguiu às pressas para o quarto e trancou a porta. Jogou a roupa no cesto e entrou no banho.

Maldição! — praguejou e deitou-se na cama com a mão na cabeça

O que estou fazendo da minha vida? O que está acontecendo comigo?

Fechou os olhos e adormeceu. Acordou desanimada para mais um dia de trabalho cuidando do Sr. Battor. Após se arrumar devidamente para as suas atividades, seguiu para a cozinha para tomar o café da manhã.

Bom dia! — falou a Sra. Suzana quando Sarah se sentou na cadeira.

Sarah optou por não mencionar a noite anterior.

Bom dia! — Sarah sorriu, desanimada.

A Sra. Suzana observou o semblante cansado de Sarah.

Você vai acompanhar o Sr. Battor ao Hospital Loana, para consultas e exames de rotina. São ordens da Dra. Anna, que anseia por conhecê-la pessoalmentel. Um fato muito interessante, já que vivem sob o mesmo teto — a Sra. Suzana debochou.

A Sra. Suzana iniciou um relato breve sobre as crises do Sr. Battor na ausência de Sarah e solicitou-lhe que repassasse as informações para o médico. Sarah foi tomada pela surpresa ao descobrir que o Hospital Loana era um dos endereços registrados no caderno de Kosnir. Sarah seguiu a passos rápidos até o quarto do Sr. Battor, que a aguardava na sala. Em desespero, sentou-se no chão ao descobrir que o caderno de anotações havia desaparecido. Ela colocou as mãos no rosto.

Meu Deus! — exclamou.

Algum problema, Sarah?

Sarah levantou-se assustada ao perceber que a Sra. Suzana estava parada com os braços cruzados.

Não, apenas cansada! — respondeu.

Sarah passou pela Sra. Suzana, que a observava com um olhar misterioso.

O motorista seguia na frente, empurrando a cadeira de rodas do Sr. Battor. Sarah entrou no carro e segurou suas mãos, pois estava nervoso. Ela sentiu seus pensamentos voarem na recordação da noite passada, enquanto aguardava o motorista guardar a cadeira de rodas no bagageiro do carro.

O Sr. Battor sorriu.

Estamos sendo levado para a casa dos demônios — ele falou — Maldito o dia em que pisei naquele lugar! — Herk berrou.

Sarah olhou para ele confusa.

Que lugar, Sr. Battor? — perguntou sem paciência.

A casa do inferno! — Herk arregalou os olhos.

Sarah sentiu um calafrio quando o motorista bateu a porta do carro. Ele olhou para trás perguntando se podia prosseguir e ela acenou para que seguissem para o hospital.

A subida do hospital estava repleta de flores de árvores. O portão surgiu mais a frente. O Sr. Battor apertou o pulso de Sarah.

Sr. Battor, está tudo bem!

Precisa ir embora, não há mais tempo. O mal está aqui! — Sr. Herk berrou.

Sarah olhou confusa sem saber o que deveria perguntar.

Saiu do carro esperando o motorista posicionar o Sr. Battor na cadeira de rodas. Ao aproximar-se da entrada do hospital, uma enfermeira gentilmente pediu para que a acompanhassem.

Um médico negro, com os olhos parecendo jabuticabas e o cabelo em corte militar, abaixou-se ao lado do Sr. Battor.

Como estamos hoje, Sr. Battor?

Herk desviou o olhar para a enfermeira com semblante fechado. O médico olhou para Sarah como se estivesse pronto para cumprimentá- la, mas permaneceu com uma expressão indecifrável. Ele empurrou a cadeira de rodas em direção ao corredor restrito sem cumprimentá-la. Sarah os seguiu, achando o comportamento do médico muito estranho. Após alguns passos, a enfermeira impediu, na entrada do corredor, que Sarah continuasse a acompanhá-los Ela sentiu um aperto ao lembrar-se da forma como o Sr. Herk estava desesperado.

São exames padrões! — alertou a enfermeira.

Ele tem idade para ter um acompanhante! — Sarah questionou a enfermeira.

Não se preocupe! São apenas exames de rotina — falou a enfermeira — A Dra. Anna me solicitou que a acompanhasse até a sala do diretor.

A enfermeira apontou para a sala de espera e pediu, delicadamente, para que ela aguardasse por alguns minutos o médico.

Não entendo porque preciso falar com outro médico! Acabei de conhecer o médico do Sr. Battor — falou, questionando novamente.

O Dr. Pedro Caio está apenas realizando os procedimentos padrões. Sarah observou, sentada no sofá da sala de espera, a rotina das pessoas que entravam e saíam dos corredores do hospital. Fechou a revista em suas mãos, colocando-a na mesinha ao lado. Bufou irritada, recordando-se de que estava em um dos endereços que deveria verificar. Ela não sabia o quê, exatamente, deveria procurar em um hospital, mesmo porque agora sua preocupação aumentava a cada dia. A enfermeira surgiu pedindo-lhe que a acompanhasse e Sarah a seguiu pelo vasto corredor do hospital. Após alguns segundos caminhando, a enfermeira parou em frente a uma porta e bateu duas vezes, abrindo-a em seguida. Uma secretária muito elegante largou o lápis e olhou para elas de cima para baixo. Sarah franziu a sobrancelha e a enfermeira ficou constrangida com a reação da secretária.

Seu nome é Solange Nec. Ela é grosseira com todos.

A enfermeira aproximou-se da mesa da secretária, que mantinha uma expressão de desafeto e respondeu algo muito baixo.

É apenas coincidência! Seu nome é Sarah Gadrel — falou a enfermeira.

A secretaria olhou novamente para Sarah, com olhar de desagrado, e pegou o telefone.

Dr. Becker, Sarah Gadrel o aguarda — a secretaria falou e, em seguida, murmurou algo para que não pudesse ser ouvida, colocando

as mãos no fone abafando a projeção de sua voz. Ela revirou os olhos e desligou o telefone — Ele a está aguardando.

A secretária se levantou, seguindo até a porta da sala do diretor e a abriu, pedindo para Sarah entrar. A enfermeira balançou a cabeça, desaprovando o comportamento esnobe da secretária.

A Dra. Anna está a caminho. Estamos felizes pelo progresso na saúde do Sr. Battor, acompanho o tratamento dele há dois anos — disse a enfermeira.

Sarah agradeceu, e seguiu para a sala do diretor. Entrou, observando que havia uma biblioteca atrás da mesa dele. Deviam existir, pelo menos, dez mil exemplares distribuídos em duas estantes grandes. Sarah olhou o médico de costas, que falava ao celular fazendo anotações em um caderno; quando ele se virou em sua direção sem olhá-la, sua reação foi sentar-se boquiaberta.

Por favor, preciso de alguns minutos para concluir uma anotação — pediu o diretor.

Sim! — respondeu gaguejando.

Uma médica jovem entrou carregando uma pasta e uma prancheta, e com um belo sorriso estampado no rosto.

Sarah observou os cabelos lisos, compridos na altura das costas, o vestido bege justo com decote, um pequeno corte na saia e, por cima, um jaleco branco.

O médico levantou os olhos e os pousou na saia da médica, que sentava ao lado de Sarah com as pernas cruzadas em frente a ele. Ela pegou nas mãos de Sarah com delicadeza.

Sarah, eu sou Anna Battor. É incrível! Você está na minha casa e eu não a conhecia pessoalmente. O hospital ocupa boa parte do tempo da minha vida. Segundo Suzana, Herk está muito melhor. Obrigada!

Anna percebeu que Sarah não conseguia deixar de olhar para o médico e sorriu. Sarah percebeu o sorriso abafado de Anna, que deixava clara a intenção de Sarah.

Todas têm a mesma reação! Lindo! — Anna murmurou.

Desculpe! — Sarah olhou para a médica — Não é o que está imaginando!

O médico soltou a caneta sobre a mesa, olhando para elas com um belo sorriso, que se desfez em segundos ao olhar novamente para Sarah. Ele cruzou os braços, olhando para as duas.

Onde estava com a cabeça para contratar essa mulher? — ele perguntou, olhando para Anna.

Anna ficou confusa com a pergunta brutal e olhou para Sarah em busca de resposta.

Ela foi indicada por um amigo de Suzana — Anna respondeu.

Interessante como permite que qualquer um frequente sua casa — ele falou.

Anna sorriu, passando a mão pelo cabelo.

Alec, você geralmente é um cavalheiro! Posso saber o motivo da grosseria? O que está acontecendo? — Anna o questionou.

Ele continuou calado encarando Sarah.

É apenas uma mera coincidência! Suzana avisou — lembrou Anna.

Ele continuou encarando Sarah como se estivesse esperando que ela reagisse. Sarah franziu a testa.

Está sendo inconveniente e indelicado me encarando — disse Sarah.

Ela se levantou da cadeira, porque não pretendia ouvir as grosserias vindas daquele homem que não a conhecia.

Ele gargalhou.

Inacreditável! — bateu palmas — Grande interpretação para demonstrar que ofendi seu caráter, mas o detalhe importante é que caráter você não tem!

Sarah definiu o homem como o mais irritante e insuportável da face da terra, extremamente atrevido e debochado. E se em algum momento ela havia pensado em voltar à boate para reencontrá-lo, havia perdido qualquer desejo naquele exato momento.

Por favor, não estou entendendo — Anna falou sentindo o clima tenso.

Ele olhou para Anna franzindo a testa.

Anna, você está demitida!

O quê? — Anna cruzou os braços — Você não pode me demitir sem motivos! — falou irritada.

Não? — ele cruzou os braços sorrindo cinicamente.

O fato de ser o diretor não lhe concede o direito de tomar qualquer decisão, precisa falar antes com o conselho. E você não tem motivos para isso, não perca seu tempo.

Ele se levantou e seguiu até ela a passos largos e manteve o olhar zangado ao parar ao seu lado.

Ser o diretor me concede o direito de m****r a porcaria do Conselho para o inferno e demitir todos vocês juntos. O que me faria muito feliz nesse momento, porque já estou cheio de todos vocês me enchendo com suas perguntas.

Não estaríamos perguntando se nossas dúvidas já estivessem sanadas. Precisamos saber o que está acontecendo — Anna o encarou.

Precisamos? — ele perguntou — Sempre colocando outros para ocultar seus erros.

Não me ofenda! — Anna se levantou.

Sarah se sentiu tensa com o clima gerado pela sua presença na sala.

Acredito que está confundindo o que aconteceu, e descontando na pessoa errada. Não nos conhecemos e continuaremos assim. Então, não vejo motivos para esse espetáculo, Dr. Alec — Sarah falou após ler o nome na placa.

Alec se aproximou de Sarah com um grande sorriso.

Lembra-se da noite passada? — ele sorriu piscando o olho direito

Confesso que estou surpreso! Você estava extremamente alcoolizada, e foi tão fácil que me perguntei se receberíamos um caso de coma alcoólico pela manhã.

Sarah colocou as mãos no peito, sentindo-se ofendida.

Anna entendeu que era um problema pessoal entre eles e se sentou constrangida, colocando a mão direita na testa.

Seu cretino! Mesmo na pior hipótese de entrar em coma alcoólico, poderia me lembrar de algo, se tivesse sido bom. Mas como foi uma boa porcaria, tenho certeza de que seria maravilhoso perder a consciência.

Sarah tentou acertar um soco em Alec, mas ele desviou com facilidade.

Acabou sua encenação? Agora saia da minha sala, a menos que espere que eu devolva sua calcinha — ele fez uma pausa fingindo pensar, e enfiou as mãos no bolso procurando por algo.

Mesmo porque ela não está comigo.

Sarah acertou um soco no braço dele, que segurou seu pulso quando ela ergueu a mão novamente para bater. Anna entrou entre eles, afastando-os, e pediu educadamente para que Sarah se retirasse da sala. Anna saiu minutos depois, com as mãos na cabeça. A secretária estava com o olhar assustado para a porta quando ouviu o diretor chamar por ela. Anna seguiu para o corredor, sendo acompanhada por Sarah que não sabia como devia se comportar ou o quê falar naquela situação. Sarah suspirou aliviada ao chegar à sala de espera e se encontrar com a enfermeira e o Sr. Battor que estavam aguardando por ela. O Sr. Battor segurou a mão de Sarah quando ela parou ao seu lado, demonstrando que ele estava feliz em revê-la. E por um breve momento, Sarah sentiu o olhar de ciúmes de Anna.

No trajeto de volta para casa, Sarah não sabia exatamente como iria explicar o que havia ocorrido entre ela e Alec. Quando entrou no

apartamento, a Sra. Suzana estava muito abalada. Anna entrou agitada e bateu a porta da sala.

A Sra. Suzana parou ao lado de Sarah e tocou em seu ombro, demonstrando carinho.

Suzana. Quero essa mulher fora da minha casa! — Gritou Anna.

Ocorreu um mal-entendido — Sarah começou a falar, sendo logo interrompida por Anna que andou até a Sra. Suzana.

Não perca seu tempo tentando amenizar sua situação — Anna falou, furiosa.

Ela não conhece Alec — falou Suzana em defesa de Sarah.

Acha que faz diferença para mim? — perguntou Anna — Quero-a fora da minha casa ainda hoje.

Anna seguiu em direção à escada a passos rápidos. Sarah não perdeu tempo tentando se explicar novamente, mesmo porque a Sra. Suzana já estava indo em direção ao seu quarto. Sarah entrou no quarto se sentindo culpada pela situação constrangedora para Suzana, que a havia contratado a pedido de Kosnir.

Eu não sabia quem ele era — Sarah alegou em sua defesa.

Não faz diferença, a culpa não é sua! — falou a Sra. Suzana. Suzana contou algumas notas e as colocou em um envelope, jogando-o sobre a cama.

Estou pagando um mês de salário, espero que possa seguir bem na volta para o Rio de Janeiro. Recebi a notícia de sua demissão por telefone, sabendo que Kosnir ficaria inconformado — a Sra. Suzana colocou as mãos no ventre — Reservei um quarto para você em uma

pousada próxima à Ponte Sodré. Esperava que você pudesse nos ajudar. Kosnir não atende minhas ligações.

Sarah agradeceu e se sentou na cama, ouvindo os passos rápidos da Sra. Suzana no corredor, seguindo para a sala.

A pequena pousada ficava do outro lado do Canal Itajuru, próxima à estrada dos passageiros. Assim Sarah seguiu pela Ponte Feliciano Sodré. Na pousada, foi recebida pelo recepcionista, que lhe entregou as chaves e indicou o lugar do quarto. Entrou e fechou a porta. Sentou-se na cama e balançou a cabeça negativamente.

Pegou a bolsa, contou o dinheiro da carteira e somou-o ao do envelope. Levantou-se agitada, andou de um lado para o outro pelo quarto, tentando pensar em uma solução para o seu problema.

Ela não podia usar seus cartões ou falar com conhecidos para pedir ajuda, seria muito perigoso. Sentou-se novamente, pegando o documento na bolsa. Olhou para a carteira de identidade, apertando o plástico que estava começando a soltar.

O que vou fazer agora? — perguntou-se, desamparada.

E um estalo trouxe-lhe lembranças de algo que jamais esperava recordar em uma situação como aquela. Encolheu-se na cama, sentindo o coração bater forte. Logo depois veio à tona a memória dos momentos com Alec. Apertou os olhos e sentiu-se confusa, porque sabia que não podia entregar-se novamente àquele sentimento que ela havia conseguido reprimir. Olhou para o teto, preocupada ao lembrar- se de que não havia procurado o caderno de Kosnir no quarto do Sr.

Battor. Fechou os olhos para descansar por algumas horas antes de pensar em um segundo plano.

Sarah seguiu para a recepção da pousada, onde foi informada de que não serviam refeições. Resolveu seguir a pé até uma padaria lotada. Optou por entrar em uma lanchonete pouco movimentada, ao lado da padaria. Entrou a passos lentos, observando as pessoas que conversavam. Baixou a cabeça, sentindo-se magoada com as recordações do reencontro com Alec.

Sentou-se no balcão e pediu uma refeição qualquer do cardápio. Sentiu alguém se sentar ao seu lado no balcão e olhou para o lado. Uma mulher loira, com um corte quase cicatrizado no lábio inferior, olhava para ela com uma expressão engraçada.

Preocupada? — a mulher sorriu.

Muito! — respondeu Sarah.

Meu nome é Luci Ganoa — falou a mulher.

Sarah Gadrel — apresentou-se desanimada.

Luci perguntou o que Sarah havia escolhido no cardápio, e ela pediu o mesmo que Sarah, porém numa porção menor.

Você mora aqui? — Sarah perguntou um pouco mais interessada.

Não! Eu moro em Cordeiro. Venho aqui para dançar em uma casa noturna. E você?

Fui demitida da casa em que trabalhava — Sarah respondeu.

Precisa de grana? — perguntou a mulher sorridente.

Sim, mas não acho uma boa ideia — Sarah falou, sabendo o que a jovem iria propor.

Estou com o carro estacionado, eu posso deixá-la onde quiser. Você parece cansada! — falou Luci.

Sarah baixou a cabeça, sabendo que estava com olheiras, e jogou o cabelo para trás. Luci começou a comer as torradas com ovos mexidos. Sarah olhou novamente para o relógio na parede que marcava dez da manhã, e percebeu que um grupo de rapazes observava-a pela janela de vidro do lado de fora da lanchonete.

Não vai comer? — perguntou Luci, que já havia terminado a refeição.

Sarah olhou para a comida e logo disse que não.

Ela sentiu um arrepio quando um dos rapazes entrou na lanchonete seguindo em sua direção, mal-encarado. Ele parou ao lado dela.

Muito parecida! — falou e saiu em seguida. Luci sorriu e disse:

Coincidências! — E avisou que precisava ir embora.

Ao sair da lanchonete, Sarah se sentiu tensa com o olhar do grupo, e acompanhou Luci, que seguia para o carro. Luci compreendeu que Sarah iria aceitar sua carona.

Sarah observou que os rapazes vinham em sua direção. Luci abriu a porta do carro, entrando em seguida, e Sarah abriu apressada a porta do carona.

Sarah se sentou, respirando fundo, e olhou na direção do grupo.

Você conhece esses meninos? — Luci perguntou tranquilamente exibindo um belo sorriso.

Não! — falou Sarah.

O grupo se desviou do carro indo para outro lado. Sarah ouviu as gargalhadas dos rapazes que se afastavam pela rua escura.

Crianças! — falou Luci, ligando o carro.

Sarah não sabia exatamente o quão longe estava de Cordeiro, mas provavelmente devia ser distante porque o olhar de Luci demonstrava que ela estava exausta.

Luci começou a fumar. Sarah abriu a janela, sentindo a cabeça rodar por causa do fumo. Luci gargalhou.

Vai precisar disso quando chegar lá — falou Luci.

Sarah sentiu sua mente trovejar, quando se lembrou de que não havia informado o endereço da pousada em que estava hospedada.

Espere! Eu não quero dançar — reclamou Sarah.

Agora que me fala isso? — Luci olhou para ela zangada — Não posso voltar, o retorno fica longe e vou chegar atrasada. Você fica no camarote me esperando.

Não pode chegar alguns minutos atrasada? — Sarah perguntou.

Não! Ele iria me castigar novamente — Luci tocou nos lábios. Sarah precisou gargalhar, pensando na confusão em que havia acabado de se envolver novamente.

Na porta do galpão, um homem negro, com cabeça raspada e tatuagens em todas as partes visíveis do corpo, manteve um olhar desconfiado enquanto conversava com um homem pardo muito magro.

Safári! — Luci chamou.

Ele andou até ela e apertou-a nos braços fortes. Ela desviou o rosto quando ele aproximou o rosto do dela.

Fala minha musa! — falou animado.

Sarah é uma amiga minha! Eu preciso que fique esperando no camarote. É um lance pessoal! Coisa de família.

Desde quando piranha tem família? — perguntou grosseiramente.

Eu tenho família! — ela olhou para ele magoada.

Aqui vocês são putas! Aqui não existe história de família! Ficou claro, vadia? — gritou, ameaçando bater nela.

Sarah se sentiu cambaleante quando Luci fechou os olhos.

Vai lá! Você tem sorte que é uma das minhas favoritas — ele falou. Luci puxou a mão de Sarah, que andou a passos lentos. Safári bateu no traseiro de Sarah quando ela passou por ele.

Gostosa! — ele gargalhou.

O salão estava lotado com vários homens, separados em níveis, alguns nas áreas em que algumas garotas dançavam e outros nas áreas em que mulheres atendiam nuas e seminuas perambulando entre os clientes.

Sarah ouviu palavras obscenas de vários homens enquanto seguia Luci pelo salão. Sua roupa chamava muita atenção, porque não era comum para as mulheres que frequentavam aquele tipo de lugar. Ela nunca havia frequentado aquele tipo de lugar, mas, em algumas festas, já havia passado por algumas situações inadequadas. Apesar de estar constrangida, manteve-se fria ao que estava ao seu redor.

Sarah se sentou, sentindo suas mãos tremerem sobre as coxas, observando Luci se vestindo enquanto cumprimentava outras garotas. Sarah sentiu uma angústia que crescia como um alerta para sair o mais breve possível daquele lugar.

O homem negro entrou olhando diretamente para ela.

Garota coloca uma roupa! — ele falou com Sarah.

Já estou vestida! — ela falou avaliando o vestido casual. Safári olhou para ela, gargalhando.

Vai ser interessante! Coloca uma das roupas das putas! — ele ordenou.

Sarah ficou em pé, sentindo as pernas fraquejarem.

Eu estou acompanhando Luci! — ela respondeu olhando para Luci.

Garota, coloca esse traseiro para rebolar — ele ordenou. Sarah sentiu o pânico crescendo quando Luci segurou seu braço

Não o desobedeça! Sinto muito... — falou Luci. Uma das garotas entregou uma roupa para Luci.

Não! Luci, não vou conseguir! — Sarah sentiu o ar fugir dos pulmões.

Safári não vai deixar você sair sem dançar. Ele é perigoso! — uma mulata mostrou sua marca no pescoço — Não são mordidas, obedeça! Sarah trocava de roupa com as mãos trêmulas. Ainda sentada, precisou de alguns minutos para controlar a respiração.

Luci pediu para Sarah seguir até o palco acompanhando a mulata que esperava parada na porta, avisando que precisava atender a um cliente exclusivo dela no salão.

Desculpa! Safári não é confiável, às vezes. A mulata olhou para Luci com olhar aborrecido.

Nunca é confiável! — a mulata corrigiu Luci — Não faça mais isso! Essa garota não vive em nosso mundo.

Sarah parou em frente ao espelho.

Que merda, só confusão! — ela reclamou.

Seus cabelos negros com franja eram ondulados nas pontas. O salto alto aumentou seu 1,68 m de altura. A roupa deixava seu corpo curvilíneo bem acentuado e os olhos negros, com delineador, realçaram seu rosto infantil.

As dançarinas demonstravam incômodo com sua presença. Sarah, em desespero, começou a gargalhar sozinha, porque ela era uma mulher comum, no meio de feras daquele mundo.

Ferrou — Sarah concluiu.

Sarah andou pelo corredor principal seguindo a mulata, que usava uma roupa extremamente provocativa.

Entrou no grande salão, observando as pessoas no local. Luci acenou, sentada no colo de um homem pardo.

Gata, aquele é o seu palco — a mulata apontou. Sarah sentiu as mãos trêmulas.

Qual o seu nome? — Sarah perguntou.

Nice. — a mulata falou ao perceber o olhar desesperado de Sarah.

Eu não posso! Nunca fiz isso na minha vida.

Safári surgiu em meio à multidão, acenando para que elas seguissem para os seus palcos.

Escuta! — falou Nice — Você não vai sair daqui com vida se não subir naquele palco — ela mostrou novamente as marcas no pescoço

Você precisa dançar.

Não posso! Não consigo!

Sarah se sentiu horrorizada com a possibilidade de dançar para vários homens. Elas ouviram homens chamando pelo nome de Nice e pedindo para a novata começar a dançar. Safári apontou para o palco, irritado.

Você já se apaixonou? — perguntou Nice.

Meses se passaram como um flash em sua cabeça, levando-a a uma recordação enlouquecedora que fazia seu coração bater forte.

Sim.

Pensa nele quando estiver dançando, como se ele estivesse aqui. Você e ele, sozinhos!

Nice andou para o palco e Sarah andou em direção ao palco que Nice havia apontado, sentindo suas pernas fraquejarem. Ofegante, subiu no palco com a ajuda de um segurança muito ousado que bateu em seu traseiro.

Sarah não era uma garotinha inocente, mas não sabia o quê, exatamente, deveria fazer em um palco.

Um grupo de homens começou uivando, depois batendo nas mesas para chamar a atenção dos outros distraídos.

Sarah fechou os olhos, concluindo que a melhor opção seria imaginar exatamente o que Nice havia sugerido.

Apertou os olhos, imaginando-se sozinha em seu apartamento com ele. Ela deslizou as mãos na parede, descendo lentamente, como se estivesse tocando nele. Sarah tocou os cabelos, descendo as mãos pelo pescoço e seguindo para a cintura, enquanto se movia lentamente como se ele estivesse tocando-a intimamente, lembrando-se do sorriso

enlouquecedor dele. Parou, repentinamente, sentindo alguém se aproximar dela. Virou-se e se deparou com um homem que acenava para a plateia agitada.

Ela sentiu perder o equilíbrio quando o reconheceu. Nada do que havia passado havia sido mais atormentador do que deparar-se com Alec em uma situação como aquela.

Ele parou diante dela com um olhar malicioso e debochado.

Maldito médico! — ela praguejou.

Alec analisou o corpo dela naquela roupa sexy. Ele mostrou uma nota de cem reais.

Tocando-se desse jeito, eu entrego minha carteira!

Sarah não conteve a irritação ao ver aquele homem infernal na sua frente novamente. Mostrou o dedo do meio para ele.

Homens começaram a gargalhar e Safári surgiu na beira do palco, fazendo sinal para ela continuar dançando. Alec se aproximou, prendendo uma nota em sua saia. Sarah se virou, dançando na direção de um homem extremamente bêbado na beira do palco, no intuito de buscar uma saída para fugir de Alec Becker, mantendo o foco em outro homem, que mal conseguisse se movimentar.

Coisa louca! — Alec berrou.

Médico maldito! — ela praguejou novamente. Alec, sob a ovação dos homens, veio dançando até ela.

Está bêbado? — ela gritou com ele.

Eu adoro uma colegial! Excitante! — ele piscou.

Alec ficou olhando para as nádegas dela quando ela abaixou para o homem bêbado colocar uma nota. Em seguida, ele a puxou pelos braços, prendendo-a em seu corpo. Ela sentiu um calor queimá-la ao tocar o tórax rígido dele.

Você está me tirando do sério! — Sarah gritou, sentindo-se confusa com os sedutores olhos cor de mel dele — Solte-me!

Safári, que estava sentado ao lado do palco, olhou-a sorridente. Alec se afastou, desabotoando os botões da camisa, encenando um strip-tease para ela. As dançarinas gritavam animadas e os homens gargalhavam da exibição de Alec.

Seu louco! — Sarah sentiu seu coração acelerar.

Ela não estava apaixonada por Alec, mas sentia por ele uma forte atração, misturada com um desejo inexplicável de se entregar aos braços dele. Safári começou a gargalhar alto.

Mostra para ela quem manda cara! — berrou um homem cambaleante, com uma garrafa na mão.

Alec acenou para ele, piscando para Sarah.

Realmente gostei dessa roupa! — ele avisou.

Alec puxou Sarah com força para seus braços, fazendo-a bater contra seu tórax. Ela o tocou, sentindo seus músculos. Ela respirou ofegante, constrangida com a plateia que os assistia. Ele tomou seus lábios de forma brutal, tornando-se exigente em cada movimento que ela fazia tentando se afastar dele.

Não — ela murmurou afastando os lábios.

Quanto talento escondido, preciso explorar melhor — ele falou em seu ouvido.

O som da música parou e ela o empurrou. Correu pulando do palco aos tropeços, quase derrubando um homem embriagado. Seguiu a passos rápidos em direção ao camarim, sentindo que Alec vinha em seu encalço. Entrou e virou-se para fechar a porta, mas ele a impediu.

Ela se afastou da porta, encarando-o com raiva, e Alec entrou com um olhar depravado.

Quero conversar sobre essa roupa — ele falou.

Alec parecia animado com o desespero estampado no rosto dela.

Estou gostando dessa encenação de boa menina!

Vá embora! — ela gritou. Safári entrou a passos largos.

Meu amigo — o negro de quase dois metros de altura cruzou os braços — Cai fora! — ordenou.

As dançarinas correram para fora da cabine. Alec olhou para ele com uma expressão debochada encenando pavor.

Sarah seguiu para o canto da janela, procurando por uma saída de emergência.

Vamos entrar em um acordo — Alec fez uma pausa — Você se chama Safári, não é isso? — sorriu — Eu transo com ela e pago o valor justo pelo serviço.

Safári sorriu e começou a negociar.

E de quanto estamos falando?

Não! — ela berrou.

Safári fez sinal de silêncio para ela. Alec andou um pouco para próximo dela e fez sinal de silêncio.

Ele não é o tipo de cara que gosta de ser contrariado — alertou, divertindo-se com olhar apavorado dela.

Fechamos em dez — Safári sugeriu.

Alec olhou para Sarah e colocou a mão no queixo.

É uma decisão difícil. Colabore! Dê umas voltinhas Sarah — pediu sorrindo maliciosamente.

Sarah atirou um pote de creme, que estava sobre a penteadeira das dançarinas, contra Alec.

Idiota! — ela gritou. Ele franziu a testa, irritado.

Olhando bem, ela não é muito gostosa! Mesmo porque tenho uma de graça me esperando — concluiu.

Safári colocou a mão na porta, bloqueando sua saída.

Fui informado que você é médico — sorriu — Sabe, Dr. Becker, meu plano de saúde não é bom! Então vamos fechar em algumas consultas — ele bateu nas costas de Alec.

Cinco consultas, acompanhamento com direito a tratamento, caso seja necessário — Alec disse, aceitando a proposta.

Sarah olhou ao redor e se deparou com a janela aberta. Observou que havia apenas dois andares e que, pulando para fugir, no máximo sofreria alguns arranhões.

Sarah pegou a cadeira e colocou-a encostada na parede, subiu e ouviu a porta sendo fechada. Fechou os olhos, tomando coragem para saltar.

Sentiu-se sendo puxada pela cintura. Ela girou sem olhar para Alec, correndo em direção à porta, descobrindo, em seguida, que estava trancada.

Ele começou a tirar a blusa que estava desabotoada.

Por quê? — ela perguntou confusa.

Alec andou a passos rápidos, puxando-a para seus braços rígidos, colocando-a sentada em cima da penteadeira.

Sarah colocou as mãos no tórax dele forçando-o para longe dela, mas ele tomou seus lábios procurando explorar o detalhe do canto dos seus lábios. As mãos dele exploravam cada detalhe de suas curvas.

Alec afastou os lábios, ofegante.

Gostoso! Precisa apenas se exercitar mais — ele apalpava sua cintura com um sorriso malicioso.

Sarah se revoltou com o absurdo das observações dele sobre seu corpo, porque ela estava em seu peso ideal. Tentou acertar um soco no peito dele, sendo bloqueada nos pulsos pelas mãos dele.

Você quer brincar assim? — ele falou sorrindo — Vamos lá, manda ver boneca.

Ele se afastou um pouco para facilitar e fez sinal para que ela o acertasse. Sarah o estapeou com toda a força que podia, e começou a socar o tórax dele com ódio. Parou, repentinamente, sentindo-se ofegante.

Cretino! — ela bufou.

Acabou? — ele perguntou, puxando-a pelos braços — Agora é minha vez!

Não! — ela gritou.

Alec girou Sarah, debruçando-a contra a penteadeira. Ela reclamou quando sentiu as mãos dele despindo sua saia e fechou os olhos, sentindo-se tomada por ele com a intensidade do calor que crescia dentro dela.

É assim que você gosta? — ele perguntou, enroscando os cabelos dela nos dedos e os prendendo com força na nuca. Ela sentiu a onda de calor inundando-a com o desejo de uma paixão enlouquecedora. Ele puxou seu cabelo fazendo-a retribuir o beijo com paixão. Sarah arranhou o braço dele com raiva e ele a virou contra seu tórax.

Seu miserável! Por que não me deixa em paz? — ela gritou. Alec permaneceu, por alguns segundos, olhando os olhos dela.

Calma! — ele falou ofegante, segurando suas mãos — Você é uma gata de unha afiada. Deu-me trabalho explicar a última unhada.

Ele prendeu as mãos dela contra a penteadeira, levando Sarah à perda da razão. Ela se sentiu desfalecer nos braços dele, que se afastou e começou a se vestir rapidamente.

Sarah sentou-se na cadeira, confusa, olhando para ele, sem entender os atos daquele homem misterioso. Ele abriu a porta e saiu sem falar com ela. Sarah baixou a cabeça, sentindo-se uma verdadeira garota de programa. A frieza de Alec, ao sair sem falar nada, havia deixado claras suas intenções com ela.

Sarah se vestiu às pressas, seguindo com passos cambaleantes pelo corredor em direção à saída de emergência. Respirou fundo ao chegar à rua pela saída de emergência do galpão.

Safári estava parado ao lado do carro de Luci, com um sorriso fechado, e estendeu-lhe um envelope.

Não quero mais ver você por aqui — ele alertou.

Luci se aproximou e pegou o envelope das mãos de Safári. Abriu a porta para Sarah, que estava com um olhar traumatizado.

Luci, ao entrar no carro, observou as lágrimas escorrendo pelo rosto de Sarah. Ela olhou para o envelope colocado no colo dela.

Pelo menos o cara... — Luci tossiu — Ele é lindo! — Luci falou, tentando amenizar o sofrimento de Sarah — Seria maravilhoso para mim que um cara como ele fosse meu cliente um dia.

Sarah olhou para ela zangada, e Luci compreendeu que ela ansiava por se afastar daquele lugar o mais breve possível.

Sarah sabia que estava ficando apaixonada pelo médico debochado e arrogante.

Outro erro! Erro atrás de erro! — bufou. Luci olhou para ela e disse:

Somos humanos! Sarah se virou para a janela porque não conseguia encarar a mulher sem o desejo gritante de acusá-la, mas sabia que ela seria a única culpada no fim da discussão. Olhou novamente para Luci, observando novos cortes nos lábios.

O que aconteceu com você? — Sarah perguntou.

Clientes! — respondeu com o olhar distante — Safári sabe ser muito cruel quando estamos devendo dinheiro — concluiu.

Luci parou o carro ao lado da pousada. Sarah pegou o envelope do colo e o jogou no banco do carro ao sair.

Sem se despedir, seguiu com o carro em direção à rua principal, sabendo que Sarah não pretendia perdoá-la.

Sarah entrou no chuveiro e sentou-se no chão, sem forças para chorar ou reclamar do que havia acontecido. Simplesmente encostou a cabeça na parede, sentindo a água aquecer seu corpo que ainda ardia em desejo.

Por volta das quatro da madrugada, levantou-se da cama, sentindo sua cabeça latejar. Concluiu que precisava andar um pouco para espairecer.

Maldição! — berrou.

Passou pelo recepcionista sem o cumprimentar. Ouviu o celular vibrar na pequena bolsa, afastou-se a passos largos, e rediscou o número da chamada perdida. Olhou ao redor, observando que estava um pouco afastada da pousada.

Alô? Sarah? — perguntou a voz forte do outro lado.

Sim — respondeu.

Sarah observou duas jovens cambaleantes, seguindo em sua direção, totalmente bêbadas. Ela resolveu voltar para a pousada, sentindo o coração tremer.

Alô? — Sarah falou, não reconhecendo a voz — Kosnir? — perguntou.

Sarah Gadrel, Kosnir está morto! E você será a próxima...

Chiados cortaram a voz. Era impossível identificar se de um homem ou de uma mulher. Sarah deixou o celular cair no chão, assustada com a revelação da morte de Kosnir. Sentiu-se subitamente sendo

empurrada, e caiu de joelhos olhando ao redor e vendo as meninas correndo em direção a uma rua com pouca iluminação.

Sarah, procurando a bolsa e o celular no chão, concluiu que havia sido assaltada. Levantou e sentiu-se tonta. Chegando à pousada, entrou agitada, e relatou ao rapaz da recepção o que havia ocorrido.

Ele a olhou e entregou as chaves do carro dela e o endereço da Delegacia de Polícia com muita frieza, voltando sua atenção para a televisão. Sentindo-se furiosa, ela olhou para o recepcionista com vontade de esganá-lo.

Seu babaca! Acabo de ser assaltada!

O rapaz olhou para ela boquiaberto e começou a choramingar que não podia fazer nada por ela.

Ao sair da pousada, Sarah agradeceu o fato de a pousada manter as chaves dos carros na recepção. Dirigindo o carro em direção ao Centro, seus pensamentos vagavam em busca de respostas. Toda a informação de Kosnir e o contato com os outros haviam sido extraviados. E o carro, repentinamente, ameaçou enguiçar. Ela parou no acostamento para manter a calma e foi o suficiente para o carro não funcionar mais. Ela socou o painel com força, sentindo-se arrependida pela dor do ato impensado. Sarah saiu do carro e, desesperada, começou a murmurar palavrões porque não entendia de problemas mecânicos. Estourou em fúria, chutando a lateral do carro. Seu pé latejou com uma dor insuportável, que a fez gritar e tombar no chão. Sentindo as lágrimas deslizarem pelo rosto, olhou para o acostamento e observou movimentos no mato. Viu algo se movendo devagar.

Ela se arrastou, afastando-se do acostamento. Um homem, com olhos sangrando, surgiu parecendo apavorado.

Ela gritou, colocando as mãos no rosto. Em seguida, arrastou-se para a rua, olhando ao redor, e percebeu que estava novamente sozinha, estirada na estrada. Ouviu o som de uma buzina alertando-a para sair da estrada. Ela rolou em direção ao acostamento, parando em cima de uma poça de água suja.

Sarah ergueu a cabeça, ouvindo alguém bater a porta do carro que parou na frente do dela.

Como posso explicar o fato de estar estirada no chão? Provavelmente bêbada! — ela concluiu em pensamento.

Minha colegial! — exclamou Alec com olhar divertido.

Ao ouvi-lo repetir a frase, sentiu um bolo formar-se em seu estômago, misturado ao forte desejo de esganá-lo. Alec estava usando jeans e uma blusa branca com listras azul-marinho. Seu sorriso era provocador e debochado. Ela apertou os olhos, controlando o impulso de brigar com ele, que a suspendeu em seus braços.

Não me toque seu cretino! Solte-me agora! — Sarah gritou.

Alec fingiu que iria deixá-la cair de seus braços e ela choramingou com o movimento, de leve, no pé.

Você que ordenou! — brincou.

Ele abriu a porta do carona, colocando-a sentada no banco. Fechou a porta e andou até o carro dela, olhou rapidamente e voltou. Chamou-a batendo no vidro da janela.

Seu carro não aguenta chegar à cidade, vou ligar para o reboque e amanhã você poderá buscá-lo na oficina do Centro.

Alec franziu a testa e olhou para o mato, na direção que ela havia avistado o homem estranho.

Ela esticou as mãos pela janela segurando as mãos dele.

Saudades? — ele perguntou maliciosamente.

Sarah soltou as mãos dele e se encolheu no banco, sentindo-se assustada. Alec sorriu, balançando a cabeça negativamente, e seguiu para o canto. Sarah olhou para ele entrando no mato, pensou em avisá- lo, mas do jeito que ele era debochado, iria chamá-la de louca. Ela olhou para frente, desviando sua visão da direção que ele havia entrado.

O som da porta do motorista a fez gritar, colocando as mãos no rosto. Ao sentar-se no banco, Alec se virou para ela irritado com o grito.

Você é louca, sabia? — sorriu — Doida!

Ele acelerou o carro, seguindo pela avenida principal. Sarah fez um bico quando um solavanco a fez mover o pé com força. Ele não olhou para ela quando começou a choramingar seus problemas.

Mulheres! — ele falou sem desviar os olhos da direção.

Ele dirigia em alta velocidade, cortando sinais de trânsito e fazendo curvas de alto risco. Ela prendeu a respiração quando, ao se virar, ele fechou um carro de passeio. Ele se divertia com as expressões de pavor dela.

Ao entrar à direita, após uma praça, continuou em direção a uma rua em que, ao longe, percebia-se que havia casas de extremo luxo. Ele

acelerou novamente e seguiu para uma curva mais fechada. Parou em frente a um portão, que se abriu automaticamente, e um segurança muito forte, de expressão muito séria, acenou para ele. Alec buzinou seguindo com o carro.

Novamente Sarah voltou à realidade.

O que estou fazendo aqui? — ela ficou boquiaberta.

Alec olhou para ela, abriu a porta do carro e seguiu para falar com o segurança, que olhou para o carro e sorriu quando Alec bateu em seu ombro. Em seguida, Alec voltou bufando e abriu a porta.

Precisa fazer charme? — ele reclamou quando a pegou no colo.

Estou com dor! — ela reclamou.

Sei! — ele falou.

Sarah ficou fascinada ao entrar na sala muito ampla. Havia uma escada de madeira escura no canto, ao lado da porta principal.

Sentada no sofá, fechou os olhos por um segundo e abriu-os em seguida, observando um belo aquário que dividia a sala da cozinha americana.

Que lindo! — ela falou.

Eu sei que sou um gato! — Alec brincou.

Ele soltou uma maleta ao lado do sofá e sentou-se, analisando o rosto dela. Sarah se lembrou do estado de sua aparência e tentou prender os fios de cabelo atrás da orelha. Alec bagunçou seu cabelo novamente, com um sorriso sarcástico.

Não seja infantil! — reclamou, tirando a mão dele de sua cabeça. Alec apertou Sarah contra seu tórax, e ficou analisando a expressão que se formava no rosto dela.

Raiva, ódio e desprezo. É o que sinto por você nesse momento! Qual é o seu problema comigo? — perguntou, confusa com a aproximação do rosto dele.

É mesmo? — ele parecia curioso.

Sarah se sentiu envolvida pelos olhos cor de mel dele e pelo forte perfume masculino que ele estava usando. Seus lábios pousaram nos dela delicadamente.

Ela sentiu o perfume do pós-barba no rosto dele e pôs seus braços em volta do seu pescoço. Alec retribuiu com delicadeza, acariciando seus seios. Sarah abriu os botões da blusa, dele sentindo o tórax rígido. Os lábios dela percorreram seu pescoço, enquanto suas mãos exploravam seu corpo.

Ai! — ela reclamou.

O pé latejou quando ela se movimentou, apertando seu corpo contra o dele. Alec pegou a maleta ao lado, retirou de dentro uma faixa e começou a colocar no tornozelo dela. Ele andou até a cozinha e lhe entregou um comprimido e um copo-d’água quando retornou.

Ela se lembrou de que estava suja, porque havia rolado no chão e parado em cima de uma poça de água. Alec sorriu e disse:

Realmente você precisa de um banho!

Ele pegou Sarah nos braços, seguindo em direção ao corredor, e entrou em um quarto de mobílias simples. Alec sorriu maliciosamente,

pedindo para ela se despir. Sarah corou constrangida, porque não havia ficado nua diante dele ainda.

Eu consigo tomar banho sozinha.

Você acha que vai escapar de mim? Acredita nisso? — Alec falou desabotoando os botões de sua camisa que ainda estavam fechados. Sarah ficou paralisada, observando o corpo dele, e colocou as mãos no rosto.

Não precisa! — ela falou.

Eu insisto! — ele falou.

Percebendo que ele não iria mudar de ideia, ela começou a desabotoar a blusa com os dedos trêmulos. Ele ouviu o som do celular e se afastou, seguindo para a sala.

Sarah se despiu às pressas, envolvendo-se no lençol que estava embaixo do cobertor. Sentiu uma forte dor ao mover o pé no emaranhado que ela havia feito na cama.

Alec retornou com um sorriso.

Covardia!

Ele suspendeu Sarah pela cintura de forma que ela não tocasse no chão, seguindo para o banheiro. Sarah sentiu o coração bater forte. Ela apertou o tórax dele, sentando-se em cima da bancada da pia. Alec tocou o rosto dela, descendo até os seios ainda cobertos pelo lençol.

Me responde uma coisa? Como consegue ser boa atriz o tempo todo? — ele perguntou.

Ela ergueu o rosto um pouco, para encará-lo.

Não estou atuando! — ela falou gaguejando.

Ele puxou o lençol e Sarah cobriu o rosto envergonhado. Alec sorriu demonstrando admiração.

Mera coincidência ou não, de fato não está atuando! Você é linda, Sarah! — ele olhou para a porta do banheiro, como se tivesse escutado passos no quarto.

Sarah ergueu a cabeça encarando os olhos cor de mel.

Alec... — ela tentou falar.

Ele tomou seus lábios, carregando Sarah em seus braços em direção ao chuveiro.

Ela fechou os olhos, sentindo a água quente aliviar o corpo dolorido, apoiando um dos pés no chão e mantendo o outro suspenso, preso na cintura dele. Encostou-se à parede, sentindo os lábios sendo tomados pelos dele com delicadeza.

Alec demorou-se nos seios, enquanto sua mão explorava cada parte do corpo dela. Ansioso por satisfazer seu desejo, desligou o chuveiro e disse:

Chega de banho!

Alec deitou Sarah na cama, beijando seus lábios e descendo até o pescoço, fazendo-a perder o ar. Sarah apertou os olhos, sentindo-se tomada por Alec.

Quero sentir você chegar para mim — sussurrou no ouvido dela, levando-a ao êxtase.

Sarah enfiou as unhas na carne do pescoço dele.

Nada de unhas de gato hoje — Alec alertou com ar zangado, prendendo os pulsos dela na cama.

Sarah sentiu o ar fugir dos pulmões no momento em que desfaleceu nos braços dele. Alec olhou para o teto pensativo.

Você mora sozinho? — ela perguntou, ouvindo som de passos na sala.

Ele sorriu e disse:

Essa é a parte que espera que eu diga algo?

Você é um idiota! — ela se sentou.

Pegou a camisa dele que estava jogada ao lado da cama e vestiu-se. Ele colocou o braço atrás do travesseiro, estirando-se confortavelmente na cama com um sorriso malicioso.

E você é fácil demais! Basta eu beijá-la, que abre com facilidade suas pernas.

Sarah terminou de abotoar os botões da camisa.

O que faz você ser frio dessa maneira? — perguntou encarando-o, ainda constrangida com a atitude dele.

Alec desviou seu olhar, pegando o celular na cabeceira.

Becker. — ele atendeu. Sarah se sentiu revoltada.

Eu odeio você! Seu miserável!

Ela bateu nele com o travesseiro que ele segurou com força, respondendo ao telefone algo em uma língua que ela desconhecia. Ele se sentou irritado ao desligar o telefone.

Sarah bateu novamente com o travesseiro nele, que se virou puxando-a pelos braços, e, jogando-a no ombro, seguiu em direção à porta da sala.

Solte-me! — ela ordenou.

Sarah cobriu o rosto ao ver o segurança vindo em sua direção. Ele desviou o olhar dela. Alec deixou Sarah sentada no banco e bateu a porta do carro com força. Ele olhou para o segurança balançando a cabeça negativamente.

Quando ela retornou? − Alec perguntou.

Minutos atrás.

Continua em casa?

Não, saiu novamente.

Alec suspendeu o rosto, respirando fundo e apontou para Sarah dentro do carro.

Leve-a para onde ela quiser! — ordenou.

Sarah ficou boquiaberta ao ver a aliança de ouro no dedo de Alec. Alec se afastou e seguiu de volta para casa a passos largos e o segurança entrou no carro e olhou para ela pelo espelho.

Onde você mora? — ele perguntou. Sarah sentiu as lágrimas descendo.

Na pousada próxima à Ponte Sodré — respondeu.

Qual é o nome da rua? — o segurança perguntou.

Não me recordo agora — Sarah choramingou.

Tudo bem, acho que sei onde fica.

No trajeto para a pousada, Sarah manteve os pensamentos em coisas boas para não chorar na frente do segurança, que estava com o semblante pesado. O celular dele tocou, mas ele não atendeu porque

estava dirigindo. O segurança parou em frente da pousada e se despediu sem olhar para ela.

Sarah abaixou a blusa sabendo que estava indecente.

Obrigada! — agradeceu.

Saiu a passos rápidos em direção à pousada, entrou e parou na bancada da recepção. O jovem lhe entregou a chave do quarto e desviou o olhar, sentindo o rosto corar.

Sarah seguiu a passos largos para o quarto, entrou e fechou a porta, encostando-se nela.

Não posso acreditar que estou apaixonada novamente pela pessoa errada. Meu Deus! Até quando eu preciso me manter forte diante dos olhos das pessoas?

Acordou assustada de um sonho turbulento, do qual não conseguia se recordar. Levantou-se e andou de um lado para o outro, tentando encontrar uma solução. O plano de Kosnir havia falhado por culpa dela. Respirou firme, sabendo que não podia permanecer nem um dia a mais na pousada.

Ouviu uma batida na porta, abriu-a e deparou-se com o rapaz da recepção que lhe entregou a chave de seu carro.

Um homem alto, de cabelo escuro, deixou a chave do seu carro e perguntou se havia alguma pendência sua com a pousada. Respondi que não, e ele foi embora sem falar o nome — fez uma pausa — Você vai ficar mais um dia? — perguntou.

Sarah concluiu que devia ser outro segurança de Alec. Pela descrição feita pelo recepcionista, não era o mesmo que a havia deixado na frente da pousada.

Não, vou sair ao meio-dia e meia. — respondeu.

Sarah fechou a porta e começou a arrumar as malas. Separou a roupa que iria usar, despiu-se e entrou no chuveiro.

Lembrou-se satisfeita de ter guardado algumas cédulas nos fundos falsos das duas malas. Ouviu novamente uma batida na porta, saiu enrolada na toalha e seguiu a passos lentos para avisar que estava ocupada. Abriu uma pequena brecha, mas sentiu a porta ser empurrada. Alec entrou no quarto, usando óculos escuros e com as mãos no bolso da calça. Ele estava com o semblante fechado.

Ela se encostou à parede acuada por ele.

O que você quer Alec? — ela perguntou zangada.

Ela sentiu o rosto queimar quando ele se aproximou dela.

Alec Becker, você é uma porra de um médico maluco, sabia? Louco desvairado — falou, observando o canto dos lábios dele com um ferimento — Andou apanhando de sua mulher? — ela debochou dele, que sorriu maliciosamente e desceu as mãos pelo pescoço dela, apertando-o de leve e aproximou seu rosto do dela.

Quero que saia da cidade ainda hoje — ele avisou.

Quem você pensa que é para me dar ordem, seu médico idiota? — Sarah gritou com ele.

Não vai querer descobrir — falou em tom ameaçador — Não me faça tirar você do meu caminho.

Sarah sentiu as pernas fraquejarem quando ele apertou o pescoço dela um pouco mais forte.

Não!

Ele se afastou dela seguindo para a porta, parou ouvindo o celular e ergueu a cabeça como se estivesse controlando o impulso de fazer algo. Abriu a porta, batendo-a com força ao sair.

Na recepção, Sarah entregou a chave do quarto e agradeceu ao rapaz que parecia irritado com algo. Na frente da pousada, seu carro estava parado. Ela seguiu até ele e colocou as malas no bagageiro. Ao abrir a porta do motorista, sentiu um solavanco quando a porta foi empurrada. Alguém pressionou seu corpo contra ela. Ela fechou os olhos, virando- se para encarar os olhos cor de mel. O cheiro forte de álcool fê-la abrir os olhos.

Deparou-se com um homem desconhecido, de rosto pálido e cabelo escorrido.

Quem é você? — ela perguntou.

Vamos brincar gata, terminar nosso joguinho da semana passada — falou o homem.

Sarah reagiu quando o homem apertou seu traseiro, acertando o joelho na parte íntima dele. Ela entrou no carro às pressas e acelerou, seguindo pela ponte.

Ela sabia, desde o início, que não havia sido uma atitude muito inteligente de sua parte assumir um plano extremamente arriscado.

Suspirou, tentando manter a calma. Precisava chegar à Delegacia de Polícia o mais rápido possível antes de sair da cidade.

Idiota, babaca e estúpido! — ela grunhiu de raiva.

Ela buscou várias definições de um ser asqueroso que pudesse definir Alec Becker. O som forte de uma buzina chamou sua atenção. Ela observou pelo retrovisor um carro prata avançando rapidamente em sua direção, parecendo querer cortá-la. As lágrimas começaram a descer, mas ela precisava manter a calma.

Sarah acelerou e sua atenção foi desviada para o carro que se aproximava em alta velocidade pelo retrovisor, buzinando novamente. O carro estava emparelhado ao seu, e ela percebeu que era o homem do estacionamento da pousada.

Ele fazia sinal para ela parar, com o olhar raivoso. Sarah acelerou assustada. Ele bateu com a frente do carro em sua traseira. Sarah gritou, em pânico. Um som de disparos do carro da frente chamou sua atenção. Após alguns segundos, um veículo perdeu a direção e bateu em uma moto, e, com o impacto, a moto foi lançada para o acostamento, atingindo um caminhão da limpeza urbana, que estava no lado oposto ao deles nas imediações da ponte. Em seguida, sentiu o carro bater com força em sua traseira. Sarah perdeu a direção, bateu no carro parado na frente e capotou no momento em que fechou os olhos, ouvindo o estrondo do carro batendo nas águas do Canal Itajuru.

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