Estou na cozinha, cozinhar é minha terapia matutina.
— Bom dia! — cumprimenta o meu pai, com um sorriso no rosto. Ele parece feliz, o que é bom… até certo ponto. — Bom dia — respondo sem ânimo. Sophie entra ao lado do professor Dominic Keen, o antagonista de qualquer romance água-com-açúcar. — Bom dia! — Bom dia — desta vez, esforço-me para parecer animada. — O que estás a preparar, Sasha? — O bolo está no forno, agora estou a fazer algo salgado. — Precisas de ajuda? — Oh, não. Já terminei. Linda Juliana pode verificar o bolo e a lasanha. — Ainda chateada com o seu pai? — ela questiona, com os olhos fixos nele. — Juliana, sempre inconveniente… — Não é mentira, o seu pai sabe que os filhos odeiam segredos — Responde ela, desafiando com o olhar. — Juliana, já chega — O meu pai repreende, enquanto ela se ajeita. — Ainda não terminei, senhor — Continua Juliana, de forma petulante. Sophie intervém, tentando aliviar a tensão. — Vamos tomar o pequeno-almoço. Dominic está em silêncio, como é típico dele de manhã. Saio da cozinha e vou até à varanda, com os olhos no tablet. Hoje é o grande dia. — Ei! — ouço Dominic, mas ignoro-o, mantendo os olhos no céu. — Não suportas a minha presença? — Insiste ele. — Faz três meses que descobri o relacionamento sua mãe e o William D’Angelo. Pensei que ele contaria… mais dois anos? Não tem volta. Ele sabe. — Tenta conversar com ele — Dominic sugere. — Não há conversa que resolva o estrago que ele fez. Preciso de tempo para pensar em como resolver isto — mas ambos sabemos que não há solução. Dou um sorriso frio. — Selvagem e louca — murmura Dominic, sorrindo discretamente. — Desculpa, professor Dominic — digo com sarcasmo —, mas não temos intimidade suficiente para me chamares de ‘selvagem e louca’. Bom pequeno-almoço. Vou para o meu quarto, preciso desesperadamente de descansar. “Somos uma tempestade no deserto, impossíveis de acontecer.” Batidas na porta. — Sasha! — Ágata entra, sempre alegre. — O teu pai está estranho hoje, não percebo — comenta ela, sem dar tréguas. — Preciso de descansar, Ágata. — Tenho que contar-te. Tive um encontro com o Theo, um verdadeiro cavaleiro. — Vamos, Ágata — respondo, mudando o rumo da conversa. — Vem conhecer a Sophie, a tua nova tia. — Professor Dominic, o que faz aqui? — pergunta, surpresa. — Ele mora aqui, prima. Esta é a Sophie. — A Sophie é linda. Admira a beleza da mesma. — É sim, muito — concordo, lançando um olhar rápido para Dominic. — Pode falar com o professor Dominic Keen, ele é simpático e… muito amoroso. Dominic não parece gostar das minhas palavras, mas Ágata nunca tem medo de nada. — Professor Dominic Keen, conhece o Theo? — Ele é meu amigo — responde ele, sem hesitar. — Ah, Ágata, pode falar sobre corridas e o personatus. — Não conhecia esse teu lado de tentar vender-me ao teu irmão professor — provoca Ágata. — Tenham um bom dia… longe da minha presença — resmungo. — Como suportas o mau humor dela? — Dominic pergunta, sabendo que posso ouvir. — Ela não é sempre assim. Às vezes é pior — responde Ágata, traidora. Saio de casa quase dez da noite, a corrida começa às onze, na oficina, vejo o carro preto e cinza, lindo. — Sou incrível, admita uma vez na vida. Serei grato para sempre — diz Felipe, orgulhoso da sua obra. — Flor da meia-noite está de volta. Vamos tirar do caminho esse mascarado de uma vez. — As palavras de Felipe fazem sentido apenas para ele. Visto-me e entro no carro. — Flor da meia-noite, seja bem-vinda, sou Will, teu companheiro de viagem. — Ele vai guiar-te para fora de qualquer situação difícil. Fala Felipe entusiasmado. —Posso enviar a moto para sair de uma perseguição, se for preciso. — Não sabia que trabalhávamos com IA. — Ele pode guiar-te para casa ou para a oficina. — Certo. — Flor, tem cuidado. — Felipe, tu tens a parte mais fácil. O imagino revirar os olhos sem emoção, saio da oficina para o local da corrida. Tudo está pronto, fico na linha de partida, observo os outros carros. São quatro no total, e a tensão no ar é quase palpável, o barulho ao redor desaparece. Sinto o olhar de alguém sobre mim. Espera… aquela é Ágata? A nerd gosta de perigo? Que surpresa. Ela dá o sinal, e os carros arrancam… excepto eu e Personatus. Ambos ficamos parados por um momento. — Flor da meia-noite, isso não estava nos planos, grita Felipe. — Fica calmo, Felipe. Finalmente acelero, mas percebo que Personatus está atrás de mim. Ele b**e no meu carro. — Que loucura! Ele quer matar-me? — Flor da meia-noite, o piloto tem intenções obscuras — alerta Will. — Sair da rota, foi um erro fatal. Penso. — Não podes matá-lo, ele é só um fã obcecado. — Não é hora para piadas, Felipe. Ele b**e no meu carro outra vez. Eu travo bruscamente, Faço com que ele colida na frente, sinto uma raiva ardente acumular-se. — Os teus batimentos estão a subir, Flor, isso vai prejudicar o teu desempenho. Isto é novidade. — Vinte minutos para a moto chegar, cinco para a floresta. — Felipe estou fora do carro que vai direto para oficina. Ouço tiros. — Ele está armado Flor precisas sair da floresta o mais rápido. — Ele e muito rápido, Felipe, foi uma péssima ideia? Questiono sem duvidas. — Foi uma péssima ideia. — Não fuja de mim, flor da meia noite, a voz dele é arrepiante rouca, fico em silêncio. Para alguém que tem uma arma ele parece disposto a conversar e depois dar um fim na minha vida. Não deixo rastros e fico atrás de uma árvore. Vou tentar quebrar a costela dele sem dó.