Capitulo 03

Dessa vez foi Lucy quem chegou atrasada, assim que atravessou a porta o professor a fitou irritado. 

  - Algo errado com seu relógio senhorita Clapton?

    Lucy se apressou em sentar ao meu lado, conhecendo seu gênio forte sei que ela queria dar uma resposta que muito provavelmente a faria perder a aula, mas não o fez.

- O que deu em você para chegar no horário hoje? – Ela cochichou assim que o professor se virou para o quadro e voltou a explicar.

- Eu não estou sempre atrasada... – Respondi, mesmo sabendo que não era verdade.

- Aconteceu alguma coisa? Você parece irritada.

Pensei em contar sobre Daniel, contar sobre como ele me irritava e o quanto era arrogante, mas também não o fiz, não queria Lucy fazendo perguntas sobre isso... Era mais fácil assim.

- Você está estranha – ela continuou.

- Vocês duas querem ir conversar lá fora? – O professor perguntou apontando um dedo de acusação para ela.

    Lucy estava pronta para dar uma resposta que com certeza nos tiraria da sala, mas eu fui mais rápida.

 - Não vai mais acontecer professor, desculpe. - Lucy chutou minha perna por baixo da mesa, mas ficou em silêncio.

- Sei que não... - ele disse, e então retomou sua atenção para a aula.

Agradeci o professor em meus pensamentos, não queria Lucy fazendo perguntas, não queria pensar sobre isso.

                                           * * *

Ás seis da tarde voltei para casa, vasculhei o armário, a despensa e a geladeira, mas não havia nada que eu quisesse comer. Mamãe só chegaria ás nove e meia, tempo demais para esperar. Peguei meu celular e disquei o numero de Lucy. Ela atendeu no terceiro toque.

- Alô?

- A fim de tomar um sorvete?- perguntei – Preciso sair um pouco de casa.

- Analu... - ela disse pausadamente- Você sabe que eu te amo e que queria muito ir tomar sorvete com você, mas já havia marcado de ir a uma social com a Lucinda, se quiser ir comigo passo ai em meia hora para te pegar.

- Lucinda simplesmente surtaria se você cancelasse não é? – sorri, eu sabia o quão alterada Lucinda podia ser as vezes.

- Nem me fale... Mas e então? Passo e pego você?

- Nem pensar, tudo bem, vou fazer dever de casa.

- Você é uma chata! – Ela sorriu – Podemos tomar sorvete amanhã? Fiquei com vontade.

- Se você sobreviver a festa com os amigos da Lucinda, podemos sim.

 Ela sorriu e desligou, joguei o celular na cama e passei os olhos pelo quarto, estava sozinha novamente.

   Tomei um banho e fui para o sofá assistir alguma coisa, quando a campainha tocou.

 Abri e fechei a porta no mesmo momento, mas ele foi mais rápido colocando o pé entre ela, impedindo que eu terminasse de fechar.

- O que você quer agora?- Gritei – Vá embora.

- Me deixe falar com você um segundo – ele disse e forçou ainda mais a porta – É sério, não vou entrar, só quero falar com você.

 Daniel parecia estar em todos os lugares desde a primeira vez em que o vi, talvez por isso seu rosto era tão familiar, eu já havia o visto antes com certeza. 

- O que você quer?

- Quero refazer a imagem que você tem de mim.  

- Impossível. – murmurei e então abri a porta.

- Podemos sair, caminhar um pouco, conheço uma sorveteria bem perto daqui... O que acha? – Daniel deu uma piscadela e sorriu.

 Senti minha nuca arrepiar no momento em que ele completou a frase, na mosca outra vez... Como podia ser possível uma coincidência assim? Tentei fechar a porta outra vez, mas novamente ele foi mais rápido.

- Não vou tomar sorvete com você. - coloquei as mãos no batente da porta para parecer confiante.

- Tudo bem, podemos só caminhar então.

- Vá embora.

- Você é sempre teimosa assim?

- Só quando se trata de você.

- Ah... Isso faz de mim especial, não faz? – ele piscou e deu um passo a frente se aproximando de mim.

Estávamos agora bem próximos, mas eu não podia recuar ou a porta ficaria livre para que ele entrasse, então apenas fiquei ali encarando-o bem de perto.

- Eu não contaria com isso se fosse você... – respondi.

Mas Daniel não me ouviu, ele agora olhava para o fim da rua com o rosto fechado, com o olhar de um caçador.        

- Viu alguma coisa?

Ele fez que não, mas continuou atento a algo no fim da rua.

- Então... Vamos?- Ele disse.

- Você sabe o que significa a palavra “não”? – suspirei – E eu não poderia ir mesmo que quisesse, logo minha mãe estará aqui.

- Sua mãe chega ás nove e meia Analu, voltaremos bem antes disso...

- De qualquer forma tenho umas coisas pra... Espera, como sabe quando minha mãe volta?

- Você está paranóica demais.

Daniel sorriu e tocou meu rosto de leve, me afastei num pulo. 

- Tire as mãos de mim! – dessa vez estava gritando – Nunca mais venha a minha casa, nunca mais fale comigo!

- Tudo bem - ele cruzou os braços- Mas ainda vamos nos ver, e eu sei que você quer isso.

 Abri a boca para dizer que só nos sonhos dele, mas a voz não saiu, apenas gaguejei.

 Daniel sorriu convencido de que estava certo.

- Tranque a porta. - ele disse antes de se virar e seguir seu caminho.

Fechei a porta calmamente, pensei em não trancar, em abrir de novo, em correr atrás dele e lhe dar um soco... Mas não fiz nada disso, caminhei até o sofá, mas não me sentei, voltei até a porta e girei a chave.

  Queria gritar, como alguém podia ser tão babaca como ele? E por que ficava me perseguindo agora? Só queria que ele me deixasse em paz.

Quando me deitei na cama naquela noite, ainda estava pensando sobre isso, até me dar conta de que talvez estivesse tentando apenas me convencer. Aqueles olhos que pareciam ser capazes de enxergar através de mim não saiam da minha cabeça, a maneira como ele arqueava a sobrancelha antes de fazer um comentário pretensioso mexia comigo... Ao perceber isso, eu quis me matar, e mais do que nunca, eu quis matar Daniel.

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