CP-02 Coincidência ou destino?

Sigo a minha viagem, mas não consigo tirar Caio da minha cabeça. O homem era tão bonito, mas tão irritante. Meu alívio é saber que a cidade não é pequena o suficiente para eu esbarrar nele o tempo todo. Pelo menos é isso o que espero.

Quando chego à casa da minha mãe, posso ver que  havia conseguido fazer uma boa reforma com o dinheiro que lhe mandava. Mas isso também aperta o meu coração, pois sei que terei de arrumar um jeito de conseguir ajudá-la. Não quero ser um estorvo.

Fico uns cinco minutos em frente a casa só pensando. Saí daqui sete anos atrás com um propósito — a minha confeitaria —, mas perdi tudo por causa de um amor que no fim das contas só eu sentia. Me sinto a pessoa mais idiota do mundo por ter confiado tanto em Gustavo; todas aquelas juras de amor, os planos que fazíamos para o futuro... Tudo não passou de uma grande mentira. Limpo minhas lágrimas e respiro fundo. Ele pode ter tirado todo o meu dinheiro, mas ainda tenho o meu conhecimento e minha experiência, e isso ninguém pode tirar de mim. Pego minha bolsa, saio do carro e bato à porta, e não demora para a minha mãe estar na minha frente, toda sorridente.

— Que saudade, filha! – Vera me puxa para um abraço. Já fazia dois anos que não vinha visitá-la. — Entre, minha linda. Estava ansiosa pra vê-la.

Segurando minha mão, ela me leva para a cozinha. Em cima da mesa há um bolo de fubá com erva doce, e só de sentir aquele delicioso aroma me vêm várias lembranças de quando era criança. Minha mãe havia sido a minha inspiração para entrar nesse ramo; seus bolos e doces eram divinos, sempre que os comia sentia meu coração quentinho de tanto amor e era essa a sensação que queria que meus clientes sentissem.

— Vou cortar um pedaço pra você – ela diz rindo quando me vê babando no bolo. E, em resposta, sorrio e sento-me à mesa. – Eu sei que é seu favorito, então não deixei ninguém pegar um pedaço antes de você chegar.

— Verdade. Fui tentar pegar uma fatia e sua mãe quase arrancou minha mão. — Meu pai, José, entra na cozinha balançando a mão direita para enfatizar o que dissera.

— Que exagero. Foi só um tapinha — minha mãe fala e nós três rimos.

— Que saudade estava de você, minha filha — ele diz, finalmente, e eu me levanto para abraçá-lo.

— Também estava com muita saudade, me desculpe ter ficado tanto tempo longe — murmuro e volto a me sentar.

— Não precisa se desculpar. Fico feliz que esteja de volta, mas triste pelo motivo que a fez voltar.

Abaixo a cabeça e concordo, tentando esconder a tristeza.

— Não vamos falar de coisas tristes. Nossa filha vai conseguir conquistar tudo em dobro, tenho certeza. – Vera diz, colocando três pratos de porcelana e três pequenos garfos sobre a mesa. Ela se senta e nos serve.

Sempre admirei esse jeito dela de pensar positivo não importando a situação. Eu tento fazer o mesmo, mas é tão difícil.

— A preferida da casa chegou — minha irmã Viviane fala em um tom brincalhão, entrando na cozinha e já tomando o seu lugar à mesa.

— Também estava com saudade sua — digo, me inclinando para abraçá-la de lado.

— Você está muito linda —  Viviane me olha e arqueia as sobrancelhas.

— Obrigada. Você também não está nada mal.

 Ela joga o cabelo por cima do ombro com uma cara de desdém que me faz rir.

— Vocês duas são demais! — meu pai ri.

— Agora me deixe terminar meu bolo.

Ela vai até o armário, pega um prato e um garfo e retorna à cadeira.

Comemos aquele maravilhoso bolo enquanto conversamos sobre várias coisas diferentes. Eu estava com saudade de ter esses momentos em família.

— Vamos retirar suas coisas do carro, filha. Eu a ajudo enquanto sua mãe faz o jantar. — Meu pai fala já se levantando. — Você pode deixar tudo na garagem, por enquanto, e seu carro fica na frente do portão de casa. Aqui é tranquilo, ninguém vai mexer.

— Tudo bem, pai. E quem iria querer um carro tão velhinho?

E não é mentira; eu havia comprado aquele corsa de segunda mão. Ele já está bem gasto e por isso estava juntando dinheiro para comprar um melhor, mas essa economia também fora levada por Gustavo. A lembrança faz aquela dorzinha no peito voltar, mas a afasto com resignação. Não quero chorar na frente da minha família.

— Eu também quero ajudar.

Viviane nos segue para fora e colocamos todas as coisas da confeitaria na garagem, e minhas coisas pessoais levamos para o meu antigo quarto. Ele está do jeito que me lembrava; um pequeno guarda-roupa de madeira mogno com quatro portas e quatro gavetas, uma cama de solteira na mesma cor, as paredes pintadas na cor salmão e um pôster do Luan Santana — eu não tinha vergonha de confessar que ele era o meu crush na adolescência.

Meu pai deixa as caixas no quarto, me dá um beijo na testa e vai para a cozinha fazer companhia a minha mãe. Viviane fica comigo me ajudando. Ela dobra as roupas enquanto eu coloco cada uma em seu devido lugar.

— Sei que ainda está chateada com o que aconteceu, mas você foi até a delegacia registrar um boletim de ocorrência contra Gustavo? – ela pergunta, meio sem jeito.

— Sim, fiz isso no mesmo dia em que me dei conta de que minha conta bancária estava vazia — respondo, e tenho que, mais uma vez, segurar minhas lágrimas. Estou cansada de chorar.

— Você o amava, não é? — Faço que sim com a cabeça e ela bate com a palma da mão na cama, convidando-me a sentar ao seu lado. — Você não precisa fingir que está tudo bem pra mim. Eu a conheço muito bem, Manu.

Quando ela me abraça, permito que as lágrimas caiam, mas logo as enxugo e faço uma promessa a mim mesma: não vou mais derramar uma única lágrima por um homem que só me usou para roubar o meu dinheiro. Quando terminamos, vamos para a cozinha e jantamos em família. Ajudo a minha mãe a limpar tudo e vou tomar um banho. E assim que me deito na cama, o sono me alcança quase imediatamente.

No dia seguinte, me levanto cedo e vou até o banheiro escovar meus dentes e lavar meu rosto. Quando vou para a cozinha, encontro todos tomando café antes de irem trabalhar. Sinto-me mal por ser a única que não tem um emprego, mas não ficarei parada.

— Filha, eu tive uma ideia — meu pai diz, com um sorriso no rosto. — Vamos reformar a garagem e transformar em uma pequena lojinha pra você vender seus doces.

— Eu agradeço, pai, mas não tenho dinheiro pra arcar com a despesa de uma reforma.

Os três ignoram o meu desânimo e sorriem.

— Nós vamos pagar. Fizemos uma vaquinha e cada em deu um pouco, e não vamos aceitar não como resposta – Viviane avisa, cruzando os braços.

Estou tão surpresa que não consigo falar, apenas olho para eles como uma boba. E quando me recupero, as palavras certas escapam como um suspiro.

— Eu nem sei como agradecer. Vocês são... isso significa tanto para mim.

— Nós somos família, não precisa agradecer — minha mãe murmura, com uma gentileza que me desfaz.

Antes mesmo que eu possa dizer mais alguma coisa, ouço alguém batendo na porta e vejo o meu pai se levantando.

— Ele já chegou pra começar a reforma — diz.

— Quem chegou?

Viviane abre um grande sorriso para a minha pergunta.

— Nada mais nada menos que o homem mais irresistível da cidade. — Ela dá um longo suspiro.

Fico curiosa para saber quem é, e quando a porta é aberta, uma exclamação de surpresa soa pelo cômodo. Era o atrevido do Caio. Assim que nossos olhares se encontram, ele sorri  daquele jeito presunçoso que, mesmo não querendo, me obriga a revirar os olhos.

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Algo me diz que essa reforma ainda vai render.

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