Contrato limitado
Contrato limitado
Por: Ivi Santiago
Liz Albuquerque

— Tia... a febre não passa por nada... — minha voz saiu fraca, derrotada. Apoiei o queixo na mão e encarei Cassandra, que retribuiu meu olhar com pesar. Voltei os olhos para Alice, tão pequena naquela cama tão grande, suando em febre.

— Eu já não sei mais o que fazer... — murmurei, a garganta apertada. — Esse remédio não faz efeito, tia.

Ela suspirou, pesarosa, e acariciou meu ombro num gesto de consolo. Levantei do sofá onde havia passado a noite inteira, sem pregar os olhos, a noite inteira passou diante dos meus olhos como um borrão. Quando me virei, vi sua expressão preocupada e cansada.

— Eu estou com medo, tia... esse médico não me diz o que ela tem de verdade. Eu não posso continuar assim. — Minha voz embargou, mas me mantive firme.

— Liz... você sabe que se eu pudesse ajudar com dinheiro, ajudaria. Mas se não fosse por você, eu estaria na rua.

Segurei a mão dela com carinho, apertando com gratidão.

— Eu sei, tia. Não estou cobrando, é só... um desabafo. Pior é que não posso nem faltar ao trabalho. Estou há só dois meses lá, ainda em experiência. E a dona Ivone parece sentir prazer em me humilhar. Faz de tudo pra me fazer tropeçar.

— Você é forte, minha filha. — ela disse, embora seu olhar dissesse que temia tanto quanto eu. — Vá, eu fico com ela, você nem dormiu, minha querida, não pode perder este emprego, já não tem formação na área... — Minha tia me alertava, empurrando para fora do quarto.

— Sei que não tenho formação na área... mas só queria uma chance. É desesperador não ter a quem recorrer.

— Mamãe... — uma voz frágil me chamou. — Mamãe...

Virei-me num susto. Alice estava acordada, os olhos negros opacos, sem brilho.

— Alice! — corri até ela, sentando na beira da cama. — Meu amor, como você está? Está melhor?

Ela assentiu com a cabeça, devagar. Sorri, mesmo sentindo a testa dela ainda quente ao beijá-la.

— Não vai trabalhar hoje, mamãe?

Balancei a cabeça em silêncio, lutando contra a culpa.

— A mamãe tem que ir, meu amor... lembra da promessa? Quando assinarem minha carteira, eu te levo naquele parque. — Ela sorriu fraco. — Para isso, a mamãe precisa ir, não pode faltar...

Suspirei, me levantando. Ainda precisava me arrumar, enfrentar o ônibus. Beijei a testa dela e saí do quarto, o coração ficando para trás.

Depois de me vestir, entrei mais uma vez no quarto, dei um beijo rápido nela e em minha tia. O batom vinho deixou marca nas testas das duas. Sorri triste.

— Prometo trazer um doce quando voltar, querida. — Passei pela porta tentando não desabar. Meus olhos ardiam, mas também por causa da maquiagem. Ser recepcionista da Luxos era uma oportunidade. Após o período de experiência, o salário seria suficiente para equilibrar minhas contas — e talvez respirar.

Chegar ao ponto de ônibus foi um desafio. Já pensei mil vezes em ir de sandália e trocar de salto no ônibus, mas sempre está lotado. Entrei no coletivo, segurei firme na barra e deixei o vai e vem me levar. Era um dos piores horários.

Faltando dez minutos, cheguei à empresa. A porta de vidro se abriu automaticamente.

— Que Deus me livre e guarde de todo o mal — murmurei ao passar pela porta, fazendo o sinal de cruz.

Amanda me avaliou de cima a baixo.

— Deveria pedir um carro junto, porque essa roupa tá toda amassada, amiga. — Disse zombando. 

Olhei para mim, tentando alisar a blusa de seda com as mãos.

— Se fosse só a roupa... — ela comentou. — E a Alice? — Perguntou arrumando a recepção, alguns papéis por ali.

— Nada bem. A febre foi e voltou a noite inteira. Nem deitei. E você? Saiu com o Rodolfo? — Praticamente me apoiei a bancada. 

Ela sorriu como quem sabe que teve uma noite inesquecível.

Dei com uma mão. — Não precisa nem responder, pelo visto teve baladinha, motel e muito romance. — Mordeu o lábio inferior fazendo que sim, com as duas mãos dando legal. — Nossa, que animação! — Apenas sorriu vindo em minha direção.

Suspirei. Não tinha energia nem para invejar. Amanda veio em minha direção tentando ajeitar o que deveria ser uma maquiagem. 

— Vem, deixa que eu te ajudo com isso. — Tentava melhorar minha aparência quando ouvi uma voz masculina grave: — Bom dia! 

Olhei para baixo, disfarçando os fios de lã branca da minha saia.

— Bom dia, senhor Tyler. Como es... — Amanda travou. O presidente da empresa estava ali. Seu olhar percorreu nossos rostos, depois minha roupa, até que seus olhos verdes pararam na minha saia, e como quem engolia um bolo forçadamente, subiu os olhos. 

— Meu Deus! — exclamei, percebendo que a fenda aberta revelava demais. — Me desculpe, senhor Tyler tivemos... — Tentei explicar. 

Mas ele já seguia para o elevador. Amanda riu.

— Liz, sua safadinha, deixou o Tyler paralisado! — Disse a minha frente, enquanto eu ajustava a saia. 

— Amanda acha mesmo que eu lá tenho cabeça para pensar em homem depois de tudo que acabei de te dizer? — Negou rindo.

— Eu sei. Só queria te fazer rir um pouco. Tua cara tá de quem não dorme há dez noites. Toma um café, porque o inferno só está começando, e o presidente não tá com um bom humor hoje. Alías, ele nunca está não é? 

Suspirei. E, claro, ela chegou, fiquei pedindo internamente que a nossa superior simplesmente passasse direto.

— Senhora Ivone, tudo bem?

A mulher de cabelo chanel castanhos, analisou a recepção com um olhar cortante por trás dos óculos vinho. Amanda sorriu. Eu só consegui balbuciar: — Bom dia... — As minhas carnes tremia e uma sudorese ameaçava escorrer pela testa, ainda mais quando os seus olhos se voltaram para mim. 

— Você conhece as normas da empresa, novata?

Assenti.

— Perdeu a noite na balada? Tua cara está horrível! — Comentou, infeliz, com desprezo evidente. 

— Não, senhora — tentei me explicar, mas Amanda tomou a frente. 

— Fica quieta, Liz — Amanda sussurrou. — Hoje não é dia.

— Espero que sua aparência melhore até o fim do dia. Os convidados da Luxos não são obrigados a ver algo tão... desengonçado na recepção. — A senhora Ivone saiu, espalhando arrogância até na forma de passar a mão na bancada, como se limpasse a presença da nossa pobreza.

— Que alívio! — suspirei, sentando. — Achei que ia me demitir.

— Se prepara, Liz. Isso foi só o começo. Vou pegar café, você quer?

— Água, preciso de água. Café só me deixa mais nervosa.

— Você ainda pergunta por que tô pessimista? Não viu os sites de fofoca?

— Amanda... — Sussurei que tempo eu teria para fofocas?

— O nosso chefe, o bonitão que acabou de passar aqui, tá no centro de uma bomba. Foi visto saindo de uma cobertura pouco depois da senhorita Olga Sutam chegar. As famílias se odeiam, e isso às vésperas do casamento dela! Recaída?

— Talvez estavam visitando pessoas diferentes? — arrisquei.

Amanda bufou.

— Você sabe o que é uma cobertura, Liz?

— O topo de um prédio?

— Sim, mas essa é dos Luccas! E ela foi o primeiro amor dele! Coincidência? Não acho.

Ri com ela, mas parei ao ver uma mulher loira, alta, em um vestido rosa elegante, entrando com uma bolsa de grife e óculos escuros.

— Vem visitante... — avisei, mudando a postura. Amanda se apressou para o lado oposto. A Ruiva passou com o andar de quem pisa onde quiser.

Meu dia estava só começando — e prometia muito.

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