O encontro (quase) silencioso (II)

- E vez ou outra ainda poso para algumas marcas famosas, quando pagam um valor irrecusável ou até mesmo para alguns amigos que são donos das marcas. Quanto à garota do podcast, que fica disseminando coisas contra mim, saiba que já tomei as devidas providências.

- Quais?

- Os dias dela estão contados, vovó. Posso até não descobrir quem é a filha da puta, mas o podcast dela vai sair do ar. Estou movendo um processo contra ela. E apoiado pelo melhor advogado do país.

- O doutor Bonotto?

- Ele mesmo.

- Não acredito que você conseguiu um horário com Marco Bonotto! Está mesmo muito famoso, meu neto! Quanto orgulho de você! Mas pega leve com a garota do podcast! Acho que ela ama você.

- Ama? – eu ri – Ela tem me destruído, literalmente. Zomba de mim em todos os sentidos. Certamente eu fiz algo para ela... Só não sei o quê! Esta desgraçada me odeia. E mente!

Ouvi a risada dela de forma divertida do outro lado da linha, pouco se importando com a minha raiva. Acabei rindo também, lembrando de ela ter se referido ao meu pau como “pinto”. Vovó sempre usou aquele termo e eu achava engraçado.

- Ryan, eu fiz um testamento. E quero deixá-los a par do que tem nele.

- Eu não quero nada, vó.

- Mas você e Tayla são meus únicos netos.

- Vó, Tayla não é sua neta de sangue.

- Mas eu a considero como se fosse.

- Se quiser deixar tudo para ela, eu não me importo.

- Mas você não sabe o que estou deixando, Ryan.

- O Rancho Palmer? – Questionei.

Eu amava o Rancho Palmer, mas não queria ficar com nada que me trouxesse lembranças de Tayla Torres. Por mim ela podia ficar com tudo, vender, alugar ou fazer o que quisesse. Ou não! Lutamos tanto por aquele lugar. Não era justo não ficar com um de nós dois.

- Conversaremos sobre o testamento também. – Deixou claro.

Nada nunca mais foi igual desde que me separei de Tayla e deixei Solidão. Tayla Torres foi a pessoa que mais amei na vida. E também a que mais me fez sofrer. Depois dela eu decidi que nunca me envolveria afetivamente com ninguém na vida. E assim foi.

E por aquele motivo eu estava ali, com Ravena Ceballos, uma das angels da Victoria’s Secret, uma mulher extraordinária, que era boa de cama e também não queria um relacionamento sério. Eu não seria louco de ir para o Rancho Palmer sozinho enquanto assistia de camarote à vidinha feliz de Tayla com seu marido e filho.

Finalmente criei coragem e abri o portão, dirigindo em direção à casa grande. O carro parou diante dela. A varanda, onde eu e Tayla costumávamos sentar para conversar ou mesmo trocar beijos escondidos agora estava coberta de trepadeiras secas. E ali, entre as folhas mortas, havia uma figura que fez meu estômago embrulhar.

Desci do carro, procurando não bater a porta para que Ravena não acordasse. Ela não precisava ouvir aquela parte.

- Mãe?

Ela encostou-se na coluna, os dedos finos se enroscando uns nos outros, nervosamente.

- Chegou cedo – observou, num sorriso envergonhado – Tayla ainda não chegou. Mas a vi na cidade. Ela parou para pegar uma água para o garoto.

O nome caiu como uma faca no meu coração.

- O que você faz aqui? – Perguntei, ignorando sua fala sobre Tayla.

- A mesma razão que você: Nona convenceu todo mundo de que vai bater as botas em seis meses - riu, amarga. - A velha sempre foi boa em manipular você e Tayla.

Ignorei o comentário. Tinha perguntas mais urgentes:

- Quando você chegou?

- Ontem.

- E... A criança? Como é?

- Um menino ruivo. Relaxe, não é seu! O garoto tem o que... Quatro anos? Você não vê Tayla há seis.

Engoli em seco. Cinco anos, dez meses e catorze dias. Mas quem estava contando?

- E o marido dela?

- Ah, o milionário? - fez uma careta. – Não o vi no carro. Mas certamente virá. Não a deixaria sozinha com você por um verão inteiro, não é mesmo? Fico pensando: o que aquele homem bonitão viu nela?

Meu coração acelerou. Pelo visto a minha mãe ainda nutria uma raiva ainda maior por Tayla.

Entrei na casa e o cheiro de canela atingiu-me como um soco.

Nona estava na cozinha. Assim que parei no batente da porta, cruzando os braços enquanto a observava, não disfarçando um sorriso no rosto, ela virou-se na minha direção.

- Eu sabia que viria! – Andou até mim, vagarosamente, deixando a colher sobre a pia - Seu quarto está pronto. O mesmo de sempre.

Abracei-a com força e seu cheiro remeteu-me a um sentimento que há muito eu não lembrava: carinho, afeto, cuidado, segurança.

- Estou fazendo doce de leite. – Ela avisou – E seu quarto é do lado do que preparei para Tayla. – Piscou, voltando a pegar a colher e mexer a panela.

- Pare com isto, vó! Você não está morrendo, não é mesmo?

- Não? Então por que você veio?

Eu não respondi, porque ambos sabíamos. Se ela morresse, aquele encontro nunca mais aconteceria. E apesar de tudo, era preciso pôr um ponto final naquela história... Por mais que doesse revirar o passado

- Onde ela está? — minha voz soou mais áspera do que pretendia.

Nona sorriu, lenta, e apontou para a janela. Vi o carro parado ao longe, na entrada do velho portão, enquanto uma figura esguia, ruiva, o abria, com dificuldade. Senti meu coração acelerar e as pernas ficarem trêmulas. Ela veio! E não estava só. Eu sabia que trazia consigo o garoto, seu filho. E como eu precisava vê-lo! A vida inteira ela sonhou com aquela criança, seu Lewis, que não era Carrol. E Cheshire? Viria junto o gato com tantas vidas quanto na ficção? Será que o animal me reconheceria?

Vi Nona saindo e puxando minha mãe pelo braço. Depois rapidamente abriu a porta do carro e acordou Ravena sem nenhum tipo de cuidado, levando-a para um lugar que eu desconhecia... Porque simplesmente não conseguia prestar atenção.

Tudo que eu via era o carro descendo vagarosamente. E nele estava Taylice, voltando para a minha vida depois de tantos anos.

Fui para a varanda e escorei-me na parede, como se não fosse proposital, mexendo no meu celular. Por que a porra do meu coração batia tão forte, como se quisesse deixar meu peito?

Ouvi o som do motor morrendo. A porta se abriu. Virei-me e deparei-me com ela.

“Eu podia contar minhas aventuras a começar desta manhã – disse Alice, um pouco envergonhada – Não adiantaria falar sobre ontem, porque até então eu era uma pessoa diferente”.

Sim, o Ryan do passado estava morto. E partir de agora Tayla Torres conheceria o novo Ryan Palmer, que não mais a amava, que não mais fazia tudo por ela, que não mais se importava mais com ela do que consigo mesmo...

Os olhos verdes encontraram os meus, tão quentes quanto um sol no auge de uma tarde de verão. Ela tocou na região do colo e percebi que tentava esconder algo... O trevo! Ela ainda tinha a gargantilha de trevo no pescoço! Depois de malditos seis anos por que Taylice ainda mantinha aquela porra consigo?

Engoli em seco e disse, quebrando o gelo e o silêncio de cinco anos, dez meses e catorze dias:

- Você... Voltou!

- Voltar implica que algum dia fui bem-vinda! – Falou com a voz cortante, me atingindo feito um chicote.

Sigue leyendo este libro gratis
Escanea el código para descargar la APP
Explora y lee buenas novelas sin costo
Miles de novelas gratis en BueNovela. ¡Descarga y lee en cualquier momento!
Lee libros gratis en la app
Escanea el código para leer en la APP