Sabine saiu do corredor batendo as botas pesadamente no chão, cada passo carregado de frustração e raiva.O som ecoou pelo corredor vazio, mas eu permaneci ali, parada, absorvendo tudo o que tinha acabado de acontecer.Ao meu lado, Ceylan apenas riu, como se aquela situação fosse um espetáculo recorrente para ela."Você pode explicar essa história?" perguntei, cruzando os braços, minha voz saindo mais firme do que eu esperava.Ceylan deu de ombros, com um sorriso preguiçoso brincando nos lábios."Acho melhor você escutar isso direto do Iron, Elise," respondeu, como se dissesse que era algo grande demais para ela resumir.Assenti devagar, sentindo o estômago revirar com a resposta.Sabia que algo pesado tinha acontecido entre eles.Não era só um antigo caso mal resolvido — era mais profundo, mais grave.Eu podia sentir pela forma como Trent a afastou naquela noite da festa, como se a simples presença dela fosse um veneno.E conhecendo o homem que ele era... Um homem que já havia matado
Ele assentiu, a mão acariciando de leve minha cintura."Os Ceifadores já existiam, mas cresceram da nossa raiva, Amor. Mas também da nossa lealdade. Grave é meu irmão. Não precisa de sangue pra isso."Olhei para Grave, ainda sentado ali, tão rígido quanto uma pedra, tentando ignorar a presença de Sabine.Havia tanta história não dita naquela sala que era quase palpável."Algumas feridas demoram pra cicatrizar," Trent disse, sua voz agora mais baixa e carregada de uma compreensão silenciosa.Eu me aconcheguei mais ainda no colo dele, sentindo seu calor me envolver.Talvez um dia ele me contasse mais.Talvez algumas histórias fossem apenas deles — dele e de Grave — e tudo bem.Eu já tinha a certeza que importava: entre eles existia algo inquebrável.Enquanto eu ainda me acomodava no colo de Trent, tentando me misturar sem chamar atenção — tarefa difícil considerando que ele fazia questão de me exibir — senti Ceylan se aproximando, trazendo seu prato na mão.Ela se sentou na cadeira ao m
PONTO DE VISTA DE TRENTTive que sair no meio do maldito almoço. A primeira refeição da Elise como minha Senhora no clube... e lá estava eu, deixando ela sozinha naquela porra de salão cheio de olhares curiosos e de vadias ressabiadas. Mas não era qualquer ligação. Era o Doyle.Fechei a porta do meu escritório com um empurrão do ombro e atendi o telefone, jogando meu peso na cadeira de couro atrás da mesa."Fala."Do outro lado da linha, a voz de Doyle veio firme, como sempre."Iron, só pra te avisar que está tudo pronto pra gente dar entrada nos papéis da adoção da Mel."Fechei os olhos por um segundo, soltando o ar com força pelo nariz."Tem certeza que essa merda vai funcionar?""Tenho um contato no tribunal que me deve um favor. A assistente social já emitiu a ordem de busca, mas com os papéis certos e o timing que estamos armando, você vai ter a custódia antes que qualquer um apareça pra levar a menina.""Essa porra tem que dar certo, Doyle. Perder a Mel acabaria com a Elise. E i
Estávamos no meio da conversa quando ouvi três batidas na porta. Graves e certeiras.Sabia que era ela. Como se o destino fizesse questão de anunciar."Pode entrar, Amor." Falei alto o suficiente. Grave virou o rosto na mesma hora.Elise entrou com o queixo erguido, os olhos sérios e aquele olhar que atravessava qualquer um, até mesmo eu."Vou dar espaço pra vocês." Grave murmurou e saiu, passando por ela com um aceno leve. A porta se fechou atrás dele.Ela ficou ali parada por um segundo, os olhos me encarando. Depois ajeitou uma mecha do cabelo macio atrás da orelha e se aproximou."Você já deve ter conhecido a Sabine." Falei antes que ela precisasse perguntar."Oh, sim." Ela respondeu com um sorrisinho irônico. "É sobre isso que eu gostaria de falar com você."Me encostei na beirada da mesa, cruzando os braços."Pelo que escutei, há um passado entre você, Grave e ela." Ela continuou, direta. "Devo me preocupar com ela?"Soltei uma risada alta e rouca, balançando a cabeça."Foda-se
Não esperei por Trent.Sabia que ele não poderia estar fisicamente comigo naquela situação. Aquela parte do nosso plano eu teria que fazer sozinha.Peguei um táxi e segui o trajeto inteiro com o coração batendo alto no peito, como se tentasse me alertar de que algo estava prestes a dar muito errado. Do lado de fora, a cidade escurecia em tons acinzentados, e tudo o que eu conseguia pensar era: onde diabos minha mãe estava?Quando o táxi parou na frente do prédio, já era quase noite. O céu tingido de roxo profundo refletia exatamente como eu me sentia por dentro. Transtornada. Quase sem ar.Paguei a corrida e subi os degraus como se estivesse indo para uma sentença.Assim que entrei no saguão do prédio, meus olhos encontraram Mel.Ela estava sentada em uma cadeira, com a mochila nas costas, os pés balançando no ar e os olhos marejados. Ao lado dela, Samanta — a assistente social — segurava uma prancheta com alguns papéis. Tudo nela parecia frio, prático demais. O cabelo preso num coque
A fumaça do cigarro ainda dançava no ar quando bateram na porta do meu escritório. Dei uma última tragada antes de responder:"Entra."A porta se abriu, revelando Naja, meu braço direito, com a cara sempre séria e a postura de soldado."Chefe, o advogado tá aí. Disse que precisa falar com você. É importante."Assenti com a cabeça. "Manda entrar."Doyle apareceu segundos depois. Estava suado, a gravata torta, os olhos inquietos. Um rato bem alimentado, mas ainda assim... um rato."Fecha essa porta, senta aí... e pega uma bebida na estante antes que eu ache que você veio me encher o saco à toa."Ele obedeceu, derramando Whisky num copo com mãos um pouco trêmulas, antes de se acomodar na cadeira de frente pra mim."O que foi agora?" perguntei, acendendo outro cigarro com calma."Eu tenho notícias." Ele molhou os lábios com o álcool antes de continuar. "Iron me pediu pra preparar os papéis... Ele quer adotar a irmã de Elise. A menina. Mel."Soltei uma gargalhada alta e seca. O tipo de ris
PONTO DE VISTA DE TRENT Levei Elise pra dentro de casa.O lugar tava do jeito que eu deixei da última vez que estive ali — coberto de poeira, com aquele cheiro de madeira velha e memórias. Nada que ela merecesse. Então fui até a dispensa, achei um balde, pano, e comecei a dar um jeito na merda toda.Ela não disse nada, só me seguiu. Pegou um pano seco e foi tirando o pó dos móveis enquanto eu passava pano no chão. A gente não trocou uma palavra, mas o silêncio dizia tudo. O ar tava denso. Como se ela estivesse carregando o mundo nas costas.De vez em quando eu olhava pra ela. Os olhos perdidos, a expressão dura. Algo dentro dela tava gritando, e aquilo tava me matando devagar."O que tá errado, Amor?" perguntei, parando com o pano na mão.Ela me olhou, mas não respondeu de imediato. Caminhou até o sofá e se sentou com os ombros curvados, trazendo os joelhos pro peito como uma criança tentando se proteger do mundo."Estou preocupada com a minha mãe" sussurrou, a voz embargada. "Ela co
PONTO DE VISTA DE ELISETrent ainda estava lá fora, encostado em uma árvore, pensativo. A brisa mexia nos fios rebeldes do cabelo dele enquanto ele terminava de fumar, o olhar perdido em algum ponto além do rio. Sabia que aquela ligação tinha sido importante, que devia ter sido com Grave — dava pra ver no jeito como seus ombros carregavam um novo peso.Por dentro, meu peito ainda doía.Mas já era hora de parar.Prometi pra mim mesma, ali mesmo no sofá onde me deixei afundar antes: chega de chorar. Chega de me lamentar. Eu sempre fui uma chorona nos momentos difíceis. Mas agora… agora era diferente. Eu não podia mais ser só a garota assustada que se encolhe num canto esperando as coisas melhorarem. Não com ele ao meu lado. Se Trent era o rei dos Ceifadores, então eu precisava ser — e me comportar — como a rainha dele.E isso exigia mudanças.Levantei do sofá, fui até a cozinha, lavei os poucos pratos que restavam, finalizei a faxina com os panos de limpeza, organizei o que pude. A casa