Capítulo 13 Ezequiel Costa Júnior A porta fechou atrás de mim, mas a raiva... essa ainda estava escancarada no meu peito. Caminhei pelo corredor com o punho fechado, sentindo a pressão subir até meu maxilar. As palavras dela ecoavam na minha mente: "Eu mesma tirei a roupa... tentei negociar com o Don..." Eu nunca tinha sentido esse tipo de fúria. Não era só ódio, era um veneno queimando por dentro. Cada roxo no corpo da Mariana era uma lembrança maldita de que eu falhei em protegê-la, demorei para encontrá-la e passou por tudo isso. Quando a vi daquele jeito, naquele quarto, trêmula, tentando me oferecer o próprio corpo em troca de salvação... meu mundo ruiu. Não era só sobre Mariana. Era sobre todas as vezes que homens como aqueles acharam que podiam comprar, tocar, destruir. Mal consegui olhar pra ela quando entrei. Seu rosto angelical e ao mesmo tempo triste, amedrontado, me deixavam enlouquecido. Eu só queria ter certeza que foi naquela porra de cassino do v
Capítulo 14 Ezequiel Costa Júnior Amanheci no bar de casa, bebendo e pensando na vida. Tomei um banho e depois fui ver a Mariana. A minha cabeça não está nos melhores dias. Bati na porta do quarto, quem abriu foi a médica. Contratei para que fique na minha casa e cuide exclusivamente dela, já que parece ter confiado na doutora.. — Como está? — Melhor. — Porque fez aquilo? Eu não pedi nada — questionei a doutora Samira. — Uma mulher com androfobia, pensa que seu corpo é a única coisa que homens querem. Ela não consegue entender de outra forma sem acompanhamento. Elas tem medo absurdo de homem. Existe um transtorno chamado misandria que a mulher tem ódio de homem, são duas coisas diferentes. No transtorno androfobia, ver o homem, ouvir falar nele, pensar até mesmo fotos lhe causam um medo absurdo, irracional mesmo, alguns sintomas como náuseas, tontura, gagueira, tremores, o nível de ansiedade pode até lhe causar perda dos sentidos, dependendo do g
Capítulo 15 Ezequiel Costa Júnior Levei algum tempo apenas observando Mariana. Cada pequeno gesto dela parecia dizer mais do que as palavras. A forma como me olhava, o esforço que fazia para não se afastar... ela estava tentando. E isso me atingia num lugar que eu nem sabia que ainda estava vivo. Queria poder fazer mais por ela. Puxei o celular e fiz uma ligação. — Yulssef, preciso que traga algumas roupas novas para a Mariana. Algo leve, confortável. Ela vai sair comigo hoje. — Claro, Don. Passo na boutique e levo até aí em menos de uma hora. Mais alguma coisa? — Só isso mesmo. Obrigado. Desliguei e um tempo depois fui até a sala, onde Mariana agora mexia em uma flor do vaso sobre a mesa. Era uma imagem quase surreal, como se ela não pertencesse àquele mundo — meu mundo. Mas ao mesmo tempo, algo em mim dizia que ela já era parte disso tudo. — Gosta das plantas? — seus dedos encostavam suavemente no verde. — Eu quase não vi raridades como essa durante minha vida. — Ela virou
Capítulo 16 Mariana Bazzi Ajeitei os cotovelos na cama, já estavam doloridos de tanto me apoiar neles para olhar para aquele fruto. Eu o vi tantas vezes no interior do cassino, mas nunca provei. Nunca deixaram. — Querida? — me distraí e me ajeitei ao ouvir a doutora Samira entrar. Sua voz me trazia calma, como uma brisa leve numa tarde abafada. — Estou aqui — respondi, olhando para ela com um pequeno sorriso. — Vim trazer as roupas pra você. A Luciana estava ocupada também. — Obrigada — acho que a doutora não gostou da Luciana. Ela colocou uma pequena pilha de roupas em cima da poltrona ao lado da cama e se sentou devagar, como se respeitasse meu espaço. — Está ansiosa, não é? Assenti com a cabeça. — Sim. Vamos tirar a Soraya e a Iris de lá. Meus dedos começaram a brincar com a colcha de linho. Cada dobra, cada textura, parecia uma forma de me manter conectada à realidade, de não deixar que o medo tomasse conta. — Então vamos nos arrumar — ela diss
Capítulo 17 Mariana Bazzi Ezequiel segurava um homem pela gola da camisa, quase o erguendo do chão, encostando-o contra a parede. Um dos seguranças — magro, nervoso, claramente despreparado — tentava falar algo entre gaguejos. — E-eu não sei... senhor... juro por Deus... — Não jure por Deus, jure pela sua vida — Ezequiel rosnou, os olhos apertados de raiva. — Elas estavam aqui ontem. Onde estão agora? — R-Roberto saiu com elas, Don! Eu... eu não sei pra onde! Só sei que levou um carro, com dois caras... e... e disse que voltava em meia hora... Só levou as melhores dançarinas. — Isso foi há quanto tempo? — D-duas horas... Ezequiel o soltou com força, e o homem caiu no chão, tossindo e puxando o ar. O Don se virou. Havia algo nele agora — um fogo silencioso, frio, letal. Ele sacou o telefone do bolso do terno e falou firme: — Ativem o rastreamento. Quero saber onde esse filho da puta está. Se ele mexeu um dedo nelas, quero a cabeça dele numa bandeja. Hoje.
Capítulo 18 Ezequiel Costa Júnior Ainda parado na porta, sem saber ao certo o que fazer, fiquei olhando pro corredor por onde ela sumiu. Aquele abraço... foi real. Foi dela. Pela primeira vez ela me tocou sem medo, sem obrigação, sem ser empurrada pelas circunstâncias. Só... veio. E aquilo me desmontou por dentro. A Mariana que vi ali não era a menina assustada que se escondia atrás da doutora, nem a mulher teimosa que tentou fugir de mim. Era alguém que queria me alcançar, mesmo que ainda com medo. Fechei a porta devagar, como se o barulho pudesse quebrar aquele momento que ainda vibrava no meu peito. Ela aceitou almoçar comigo. Deitei, mas o sono não veio. Fiquei encarando o teto, revirando tudo na cabeça. Como um simples toque, uma simples aproximação, podia mexer tanto comigo? Eu, Ezequiel, Don de uma das famílias mais temidas, rendido por um gesto frágil de confiança. Sorri sozinho. Mal sabia ela que aquele toque valia mais que qualquer jura de lealdade que já receb
Capítulo 19 Ezequiel Costa Júnior Ela segurava a sacolinha como se fosse um tesouro. Seus olhos brilhavam com uma mistura de nostalgia e ternura, e eu já conseguia sentir o gosto da vitória. Aquilo tinha que ser o sinal. O sinal de que ela estava começando a me enxergar. De que podia, finalmente, me amar. — Você conhece quem me deu esse presente? — ela perguntou com a voz suave, quase infantil. — E se eu disser que sim? — provoquei, encostando o cotovelo na mesa, sorrindo. Ela riu, e aquilo foi como um raio de sol em meio a uma tempestade. — Nossa! Jura? Eu não acredito! Você conhece o Papai Noel? Sorri de canto, esperando mais, esperando que ela dissesse algo como “eu sabia que era você” ou “sempre desconfiei”. Mas não. Mariana respirou fundo e continuou: — Sabe, Ezequiel... aquele homem... aquele Papai Noel... ele olhava pra mim de um jeito diferente. Não era com malícia, nem com pena. Não sei explicar, mas aqueles olhos me davam paz. Uma paz que eu nunca tive
Capítulo 20 Mariana Bazzi A sacolinha estava no meu colo, como um amuleto. Eu a segurava com tanto cuidado que parecia feita de vidro, enquanto a caixa bonita deixei no chão. Dentro dela, um pedaço do que eu nunca tive direito de viver. Nunca usei o vestido, e na agenda haviam sonhos que talvez nunca conseguisse realizar. Ezequiel me olhava com seus olhos pacientes, protetores, e ao mesmo tempo... tão intensos. Era confuso. Era tudo muito confuso. Ele disse que conhecia o Papai Noel. Meu coração deu um salto. Parte de mim queria acreditar que era só uma coincidência — que o homem gentil de olhar calmo e abraço acolhedor existia mesmo. Que ele poderia aparecer diante de mim e me dar mais um presente. Um olhar. Um afeto. A figura de um pai. De um herói. O jeito como Ezequiel me tocava, como me olhava, como dizia meu nome... não era nada paterno. Era diferente. E por mais que meu corpo começasse a reconhecer isso — a desejar isso —, minha mente ainda gritava de medo.