5. O convite

Apesar dos pesares, em uma coisa a minha madrasta tinha razão: eu precisava trabalhar, precisava ter o meu próprio dinheiro, para não ter que recorrer mais ao meu pai sempre que precisasse de algo e também, eu queria comprar novas roupas, poder me cuidar.

A questão é que eu não tinha experiência com nada e as pessoas me olhavam atravessado por causa da minha aparência, por isso decidi que precisava mudar.

Os dias foram passando, e sempre que eu via o Henry, sentia o estômago se contorcer, e ele sempre fazia questão de me cumprimentar amigavelmente. Eu estava realmente iludida e acreditava que o meu conto de fadas era real, acreditava que o francês era capaz de me enxergar além dos trapos que eu vestia, além do óculos exagerado, mas não entendia porque nunca tomava uma atitude, até que o dia que tanto esperei, finalmente chegou.

Salut, doux Miel… — Ele me cumprimentou, me arrancando um sorriso. 

— Doce mel? 

— Você entendeu… — disse soltando uma risadinha. 

Salut, mon ami… — respondi, confiante. 

— Olha só, estou impressionado.

Sorri sem jeito e então ele parou, me olhando por um tempo, como se buscasse palavras para dizer algo. Seus amigos estavam um pouco mais distantes e notei que o olhavam fixamente, como se aguardassem por ele.

— Bom, amanhã é meu aniversário, vou fazer uma festinha no meu apartamento, se animar, está convidada. 

— Mesmo?

Ele sorriu, balançando a cabeça positivamente, e então ameaçou se virar para ir rumo aos amigos, mas o chamei.

— É… Henry… Como eu deveria me vestir? 

— Como você se sentir melhor… Será algo simples, não se preocupe.

Concordei, ainda sem saber como seria isso. Então decidi que pegaria uma pequena quantia da minha poupança, compraria algumas roupas e logo buscaria um emprego para repor. Afinal, era o aniversário do Henry.

A questão era que eu nunca tinha feito isso antes e não sabia exatamente que estilo o agradava, então resolvi pedir ajuda, abordando-o na hora da saída.

— Ei, Henry! — Corri acenando para ele, que parou me olhando confuso. 

— Oi, Melany… O que houve?

Ele estava com os amigos, e talvez por isso seu tom para comigo era diferente do habitual.

— Eu queria pedir uma ajuda. 

— Ajuda? Com o quê? 

— Bom… Eu… É… Você poderia sair comigo mais tarde?

Os rapazes que estavam com ele riram, e com uma expressão séria Henry segurou meu braço, me arrastando para longe.

— Sair para onde? Para quê? 

— Eu queria comprar uma roupa, para ir na sua festa, não queria ir vestida assim, mas eu nunca fiz isso antes, então queria sua ajuda para escolher…

Ele abriu o sorriso que eu amava e balançou a cabeça em negação.

— Tudo bem, que horas você quer ir? 

— Pode ser às 16h? 

— Pode. Onde te encontro? 

— Na entrada do shopping, te espero lá. 

— Combinado.

Sorri com gratidão e dei as costas para ele, seguindo meu caminho empolgada. Henry fez o mesmo e voltou para perto dos amigos. Olhei rapidamente e os vi rindo, dando tapinhas nas costas dele, e me senti mal, ciente de que estavam zombando dele por minha causa.

Cheguei em casa desanimada, ainda lembrando da expressão de vergonha dele enquanto os amigos o perturbavam. Lembrei que Henry era demais para mim e que eu estava alimentando um sentimento perigoso, e talvez se tivesse raciocinado melhor naquele momento, não teria ido ao shopping, sequer teria seguido com essa ideia absurda.

A casa estava vazia. Meu pai estava trabalhando como sempre, minha madrasta devia estar batendo perna e meu irmão, que não fazia nada de útil, provavelmente estava na rua. Obviamente não havia almoço pronto. Se eu não fizesse, ninguém ali comia e, agora que eu estava estudando pela manhã, todos comiam fora.

Preparei um macarrão rapidamente e comi, aguardando ansiosamente pela hora de sair. Aproveitei a ausência da minha madrasta e peguei um xampu e condicionador dela para lavar o meu cabelo. Eu não sabia me maquiar, então passei apenas um lápis de olho e o primeiro batom que achei. Também usei um de seus perfumes.

Revirei o meu guarda-roupa por um bom tempo, tentando encontrar algo menos estranho, mas era muito difícil. Optei por uma camiseta branca simples, uma legging e uma rasteirinha, que por sinal estava grande no meu pé.

Às 16h em ponto eu já estava na entrada do shopping. Deu 16h15, 16h30, 17h e nada do Henry aparecer. Em pé ali, de cabeça baixa, não consegui evitar as lágrimas, então me virei para entrar sozinha, quando o ouvi gritar:

Doux Miel, attends!

Ele chamava de longe, me pedindo para esperar. Esfreguei os olhos e o olhei surpresa.

— Perdão, chéri, eu… — Henry me olhou notando as lágrimas em meu rosto e então me abraçou. — Está chorando? Não fica assim, eu peguei no sono após o almoço e perdi a hora. 

— Está tudo bem… Não é isso… Eu só…

Abaixei a cabeça sem jeito e ele ergueu meu rosto, passando o polegar abaixo do meu olho.

— Sua maquiagem borrou aqui… — falou com um sorriso doce. — Você está… Diferente.

Sorri, encarando como um elogio. Afinal, no normal eu era muito feia e estranha, então estar diferente disso deveria ser algo bom.

— Vamos?

Concordei, abrindo um sorriso sem jeito, e o acompanhei em silêncio.

— Onde quer ir primeiro? 

— Não sei, nunca fiz isso antes.

Ele me olhou parecendo confuso, então expliquei:

— Lembra que te falei sobre a minha madrasta? Então, as roupas que uso é ela quem me dá, geralmente pega de doação ou compra em brechós. Ela também controla os gastos do meu pai comigo, por isso eu nunca pude escolher exatamente o que vestir. 

— Que mal amada…

Fui contando alguns fatos para ele, e então paramos na primeira loja.

— O que você gostaria de comprar? 

— Que tal um vestido? Não posso gastar muito, pois vou ter que tirar da minha poupança e preciso desse dinheiro para pagar a faculdade.

Henry suspirou e então entrou comigo na loja.

— Que tal esse? — falou me mostrando um modelo que batia acima do joelho. A cor era um rosa bem clarinho, com uma estampa floral singela, era realmente lindo. 

— Gostei, vou experimentar. 

— Espera, vamos ver alguns modelos, então você experimenta e vê qual fica melhor. Temos outras lojas para ir também.

Concordei e confiei no bom gosto dele, que ia olhando pessoalmente as roupas e colocando numa cesta. Entrei no provador com uns cinco modelos diferentes, e fiquei encantada ao vestir cada um deles. Se eu pudesse, levaria todos.

— Amei todos — falei ao sair. — Qual estampa você acha mais bonita? 

— Mas você nem me mostrou vestida… Como vou saber?

Sorri sem jeito.

— Não sou o tipo de mulher que sabe fazer desfiles. Gostei mais desse, o que acha?

Mostrei um vestido rosa, o primeiro que ele havia me entregado.

— Acho que é meigo como você. Posso te dar de presente? 

— Me… Me dar? 

— Sim, aí você pode escolher mais algum. O que acha? 

— Não precisa, eu… 

— Faço questão. Escolha outro.

Olhei para o modelo amarelo que possuía um cintinho dourado, era o que eu mais tinha gostado, mas era um pouco mais caro, então tinha desistido. 

— Obrigada, vou levar mais esse, então.

Henry sorriu, pegando os vestidos das minhas mãos, e se dirigiu ao caixa, pagando os dois.

— Por que pagou os dois? Posso te transferir?

Ele soltou uma risadinha e, ainda segurando a sacola, me conduziu até a próxima loja.

— Vou te dar os dois de presente. O que mais quer olhar?

Fiquei muito sem graça, então travei.

— Eu não te chamei para pagar nada, eu só queria ajuda. 

— Eu sei, estou fazendo de coração.

Sorri, observando-o por um tempo, e o meu coração queimou. Ele era um verdadeiro lobo em pele de cordeiro. Era impossível saber que, na verdade, não passava de um canalha.

Seguimos por mais algumas lojas e eu tinha o sonho de ter uma calça jeans que coubesse em mim de verdade. Henry me ajudou a escolher uma. Escolhi também algumas blusinhas mais simples e uma rasteirinha que realmente coubesse no meu pé.

Acabei me empolgando e peguei também algumas maquiagens, produtos de beleza, creme de pele, e Henry sempre dava um jeitinho de pagar alguma coisa ou outra, até que por fim me chamou para lanchar.

— Acho que eu nunca te vi tão feliz antes — ele comentou, acariciando a minha mão. 

— Você é muito gentil comigo, conseguiu me enxergar além da feiura. Obrigada. 

— Você não é feia, só sofre na mão daquela nojenta — falou desviando o olhar, então soube que estava mentindo. — Por que não vai no banheiro e coloca uma de suas roupas novas?

Concordei e, assim que finalizamos o lanche, entrei no banheiro e coloquei um dos vestidos. Vi uma moça retocando a maquiagem ao meu lado e pedi ajuda. A princípio ela me olhou, estranhando a situação, mas quando expliquei melhor, de pronto começou a me maquiar.

— É isso, não tem muito segredo, com o tempo você vai pegando prática — ela falou após o último retoque.

Então me olhei no espelho, surpresa.

— Nossa… — Sorri satisfeita. Eu parecia outra pessoa.

Passei uma água nos cabelos, arrumando o meu rabo de cavalo, e saí.

Henry estava me aguardando no corredor, exatamente em frente à porta do banheiro feminino e, assim que saí, não soube esconder o espanto, ou ao menos fingiu bem.

Uau… Doux Miel, comme vous êtes belle.

Sorri com o elogio. Ele disse que eu estava bonita e essa era a primeira vez que alguém me dizia isso, e não era qualquer alguém, era o homem por quem eu estava perdidamente apaixonada.

Assim que me aproximei, ele segurou a minha mão, me girando até que eu parasse de frente para ele. Então me olhou fixamente por um tempo, antes de puxar o laço que prendia o meu cabelo.

— Você deveria experimentar isso também — falou, ajeitando os últimos fios, após soltá-los. — Tu es magnifique

 Henry segurou meu rosto com uma das mãos e, para a minha surpresa, aproximou a face da minha. Fui pega de surpresa e paralisei. Eu nunca tinha beijado ninguém e não fazia ideia do que fazer, mas para a minha decepção total, o beijo foi na testa.

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