Capítulo 2 - O recomeço

Quando eu soube da gestação, eu quis desistir da vida. Pensava em suicídio 24 horas por dia, entrei numa depressão profunda a ponto de tomar três garrafas de café por dia, e pasmem, sou alérgica a cafeína.

Eu não tinha coragem de amarrar uma corda em pescoço e me enforcar, nem mesmo pular nas profundezas de um rio, morrer afogado deve ser agonizante. Eu pensava em me jogar na frente de um carro, mas se tudo desse errado e então eu não viesse a falecer, ficaria vegetando sob um colchão d'água.

Então eu tomava café, até onde eu podia, sei que logo me daria um choque anafilático, eu não correria para o hospital, e sabia que logo poderia ter um infarto do coração ou do cérebro, aí chegaria o fim de todo meu sofrimento.

Mas essa minha ideia não deu muito certo, pois minha avó percebeu e constatou meu pai, que contou que eu era alérgica a cafeína e fez com que jogasse até mesmo a garrafa fora.

Eu carregava um bebê dentro de mim, um bebê o qual eu nunca poderia amar, por ser fruto do pior dia da minha vida. Eu tampouco sabia quem era o pai.

O aborto nunca foi uma opção, pois ia contra todos meus ensinamentos dentro da casa do Senhor. Mas eu entregaria ele assim que nascesse, não queria essa criança, e não tinha estruturas psicológicas para criá-la. Minha avó me obrigava a fazer o pré-natal, e quando a barriga foi crescendo, tudo piorou.

A virgem que apareceu grávida sem nem saber quem é o pai, cômico, se não fosse trágico. Esse foi o assunto, logo após ter vazado o vídeo íntimo em que fui violentada, toda faculdade sabia, e os comentários não foram diferentes dos homens que abusaram de mim.

"Aquela carinha de santa, não enganava ninguém."

"A saia abaixo do joelho era pra esconder o fogo no rabo."

Entre outros comentários que me fizeram chegar no subsolo do fundo do poço que eu já me encontrava.

Eu não quis saber o sexo, só queria que a criança nascesse logo e eu pudesse sofrer sozinha novamente, e não com um bebê chorando 24 horas em meu ouvido.

Assinei toda uma papelada para a entrega da criança a um orfanato, o conselho tutelar estava presente no dia.

O parto foi normal, sofri por horas até o bebê nascer.

— É uma menina! — afirmou o médico. — Coloque-a no peito da mãe!

A enfermeira foi tão ágil, que não tive tempo de dizer que não queria nem olhar o rosto daquele bebê.

Colocou-a sob meu peito, enrolada em um pano azul celeste. Ela não chorava, piscava os olhinhos olhando nos fundos dos meus olhos, como se pudesse enxergar a podridão que estava minha alma.

Sua mão incrivelmente tocou meu rosto, e todos na sala de parto pararam para observar a cena. Senti uma paz espiritual tão grande, que era como se todas coisas ruins que tinha me acontecido nos últimos tempos, haviam sido apagadas com só um toque.

— Eu quero ficar com ela! — falei sem nem

pensar duas vezes — Por favor, eu mudei de ideia. Quero ficar com ela! — implorava encarando o olhar da conselheira presente, que me olhava confusa com a decisão repentina.

Naquele momento eu já sabia que não seria fácil voltar atrás de uma decisão judicial. Fiquei meses longe da minha filha, tive que fazer terapia e acompanhamento com psicólogos para saber se estava apta a ser mãe.

Uma luta incansável, quando ela voltou para meus braços, já estava com seus 4 meses. Ela nem me conhecia. As primeiras noites foram uma provação, era um choro constante até se adaptar ao seu novo lar.

Frida!

Foi o nome que escolhi para ela, pacifica, aquela que trás paz. Ela foi minha paz entre tantos caos.

Troquei de faculdade, nunca mais tive contato com minha mãe, meu pai que vez ou outra aparecia na casa da minha vó pra tentar fazer a média de que não tinha abandonado sua filha. Mas com a chegada de Frida, suas visitas começaram a ser constantes. Eu não me importava com sua presença, pois sabia que ele amava Frida tanto quanto eu. Minha vó sempre me ajudou com ela, olhava para eu ir a faculdade, e até mesmo ser caixa num mercado no pé do morro.

Essa era minha rotina, trabalho, faculdade e casa pra cuidar da minha filha. Cansativo, mas toda luta tem recompensas e a minha estava prestes a chegar.

Estou no final da faculdade, e me colocaram para advogar através de um estágio, em um caso muito complexo, eu só não sabia que se tratava do dono da comunidade em que eu morava. Pires, não sabia quem era ele, tampouco havia visto, mesmo morando aqui por anos, afinal, eu mal saía de casa, e tenho poucas amizades aqui.

Só algumas conhecidas que moram na rua de casa, com quem eu sentava na calçada no final de uma tarde de domingo junto a minha vó.

Minha vó é tudo pra mim, eu nunca contei diretamente a ela o que havia acontecido naquela noite, mas eu sei que ela desconfia do que aconteceu, mas é sensata ao ponto de nem sequer tocar no assunto, pois ela sabe o quanto aquilo me deixava desconfortável.

Sinto saudades do meu irmão, ele ainda é menor de idade e minha o proibiu de vir a casa da minha vó desde que soube que eu morava, também proibiu ele de usar as redes sociais para que eu não pudesse trocar qualquer palavra com ele. Faz 4 anos que não o vejo, mas ele está incluso em minhas orações, e que ele possa se livrar de uma mãe narcisista como a nossa.

Eu não odeio minha mãe, e eu também a perdoei pelo o que ela fez, mas perdoar uma pessoa não quer dizer que você precisa dela em sua vida novamente, mesmo tendo o mesmo sangue. Eu não preciso dela.

E assim é minha vida, nesse momento eu estou quase comendo os dedos de tanto nervosismo. Em poucos minutos estarei cara a cara com meu primeiro cliente, e eu terei que dar o meu melhor.

Vai dar certo, Isadora. Confie no seu potencial.

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