Victorio— Está demorando demais, Victorio. Essa criança vai nascer antes que possamos fazer qualquer coisa — disse Donatela, sentada na varanda de sua velha vila italiana, com um cigarro entre os dedos e o olhar perdido nas colinas cobertas de vinhedos.Do outro lado da linha, Victorio soltou um suspiro. Os ruídos da cidade americana formavam um pano de fundo constante — buzinas, passos apressados, o eco de uma realidade que contrastava com a quietude impregnada de rancor da Itália.— Eu não sou onipotente, Donatela. As coisas aqui seguem um ritmo próprio. Preciso manter a aparência, movimentar papéis, visitar galerias, lidar com colecionadores. — Sua pausa foi breve. — Ninguém desconfia de um homem que negocia arte.— Ninguém desconfia porque todos lhe devem favores. — Ela tragou lentamente, expirando a fumaça com desdém. — Você transita entre continentes como se estivesse num jogo de tabuleiro. Enquanto isso, eu permaneço aqui. Esquecida. Como sempre fui.Victorio soltou uma risada
Giulia e EnricoGiulia estava sentada à beira da piscina, as águas azuis refletindo o céu nublado. Giacomo brincava perto dela, seus risos suaves como música. Enrico, como sempre, aparecia nas horas mais inesperadas, trazendo consigo sua aura de poder. Desde o jantar que a marcou como sua noiva diante da máfia, Giulia sentira-se em um limbo. A gravidez, embora ainda nas fases iniciais, alterava seu corpo e sua percepção. Ela sabia que sua vida nunca mais seria a mesma. E, talvez, parte de sua mente se rebelasse contra essa nova realidade. Mas quando Enrico entrava em cena, toda a sua resistência desvanecia. Era inevitável.Ela olhou para ele, seus olhos encontrando os dele por um breve momento, antes que ele, com seu habitual passo firme, se aproximasse."Giulia," sua voz suave, mas autoritária, fez com que ela levantasse automaticamente. A gravidade de suas palavras pairava no ar, densa. "É hora de começarmos a agir de acordo com o que somos. Não estamos mais apenas esperando pelo be
Continuação...O mundo parecia girar em câmera lenta enquanto Valerie corria até o corpo caído de Giulia no asfalto. Seus gritos cortavam o ar frio da manhã, ecoando como punhais invisíveis na alma dos que testemunhavam a cena."Giulia! Não, minha filha, por favor!"Valerie se ajoelhou ao lado dela, as mãos trêmulas tentando tocá-la sem machucá-la ainda mais, lágrimas correndo descontroladamente por seu rosto. A multidão começava a se aglomerar, mas ninguém ousava se aproximar. Era como se o desespero de Valerie criasse uma barreira invisível.Seguranças surgiram quase imediatamente, reconhecíveis pelos olhares atentos e a postura ameaçadora. Eles tentaram, com todo o cuidado, afastar Valerie, mas a mulher se agarrava a Giulia como se pudesse trazê-la de volta à vida apenas com seu amor de mãe."Senhora, senhora, calma, já avisamos o Don... Ele está a caminho!" disse um dos homens, tentando conter o próprio nervosismo. Sabiam que, quando Enrico soubesse, o inferno se abriria sob seus
Gêmeos Calahan Caelan e Connor Calahan cresceram com uma única certeza: seu pai, Donovan Calahan, fora morto por Francesco Moretti, um homem de sangue italiano, mas nascido e criado em solo americano. Durante anos, essa verdade ficou soterrada pela autoridade de Maurrien, sua mãe, que, mesmo devastada, nunca permitira que os filhos buscassem vingança. Mas agora, a verdade finalmente viera à tona — Victorio, como uma serpente, sussurrara em seus ouvidos. E o que começaram como investigações discretas, rapidamente se tornaram um redemoinho de revelações. Nos arquivos escondidos da velha rede mafiosa de Boston, descobriram documentos antigos, relatos abafados... não apenas Francesco assassinara seu pai, mas a história toda era ainda mais suja. Donovan, anos atrás, tivera um caso com Valerie — a mãe de Giulia. Quando Maurreen descobriu a traição, não explodiu em fúria. Não. Ela arquitetou sua vingança. Ao invés de confrontá-lo, deixou-se envolver "aparentemente" por Francesco, a
DonatelaO hospital estava mergulhado em um silêncio pesado, como se até as paredes soubessem do risco que pairava no ar. O cheiro forte de desinfetante parecia grudar na pele, misturado à ansiedade que escorria pelos corredores.Donatela Bianchi entrou com a postura impecável de quem queria ser vista como parte da família preocupada, mas seu sorriso discreto escondia o veneno que lhe fervia sob a pele.Os saltos dos seus sapatos de couro fino estalaram no chão como pequenos tiros, chamando atenção apenas dos enfermeiros que a observaram de relance. Ela trajava um blazer claro, elegante, os cabelos loiros presos com perfeição — a encarnação da irmã solidária.Seu olhar percorreu rapidamente o corredor até encontrar a figura imponente de Enrico, parado à porta de um dos quartos, falando em voz baixa com um médico. O rosto dele estava fechado, os olhos injetados de tensão.Donatela fingiu ajeitar a bolsa no ombro, soltando um suspiro alto o suficiente para parecer emocionada.— Po
Giulia e EnricoDois dias se passaram. O hospital, que antes parecia um campo de batalha, agora respirava uma estranha calma. Mas a paz era apenas superficial — Giulia sabia disso. Ela estava deitada na cama, o corpo ainda fraco, sentindo a vida pulsar em si e em seu ventre, onde seu bebê crescia protegido. O soro gotejava lentamente ao lado, e o leve zumbido dos aparelhos preenchia o silêncio do quarto.Na poltrona próxima à janela, Enrico parecia um leão em cativeiro. Vestia uma camisa branca, com as mangas dobradas até os cotovelos, revelando os antebraços fortes cobertos de veias saltadas. O laptop descansava em suas pernas, os dedos digitando com uma rapidez quase agressiva. Dois celulares vibravam em uma mesa próxima, ao lado de uma xícara de café esquecida. Guilhermo, por vezes, entrava e saía do quarto sem anunciar-se, entregando papéis, falando baixo, repassando informações que Giulia mal conseguia entender. Nomes. Endereços. Gravações. Peças de um quebra-cabeça que Enrico mo
Tensão na mansão Giulia sentia seu corpo frágil, mas o calor da mão de Enrico sobre sua cintura a sustentava enquanto subiam os degraus da mansão. Finalmente, estavam em casa. Ou era o que deveria ser... mas a atmosfera pesada e abafada logo denunciou que algo estava errado. Enrico empurrou a porta da frente e, antes mesmo de adentrarem o salão, Giulia estacou. O coração dela quase parou. Ali, em pé no centro do saguão, como se fosse o legítimo dono da casa, estava Victorio. O sorriso distorcido nos lábios dele, misto de loucura e certeza, fez Giulia instintivamente se encolher contra Enrico. Ele não deveria estar ali. Não poderia estar ali. A segurança da mansão era reforçada, quase impenetrável. Como ele tinha conseguido entrar? — Victorio — a voz de Enrico saiu carregada de ódio, mais fria do que aço. — Como diabos você entrou? Victorio deu de ombros, zombeteiro. — Quem quer que ame de verdade, sempre encontra um caminho — respondeu ele, com um brilho insano nos olhos f
GiuliaO cheiro de pólvora ainda parecia pairar no ar da mansão. Aquela noite tinha sido um pesadelo: Victorio fugira, e um dos seguranças, leal a Enrico há anos, quase perdera a vida tentando impedir.Agora, a segurança estava reforçada, e os olhos atentos da equipe não descansavam um segundo sequer.Giulia, no entanto, mal tinha forças para se preocupar com o que acontecia ao seu redor. Ainda se recuperava do atropelamento brutal que quase custara sua vida — e a do bebê que carregava.No quarto amplo, repousava cercada por almofadas e cobertores, olhando o jardim pela janela aberta. O som dos passarinhos lá fora parecia tão distante... Tudo nela ainda doía — o corpo, a mente, o coração.Foi então que uma batida leve na porta chamou sua atenção.— Pode entrar — disse, a voz baixa.Uma das empregadas se aproximou, um pouco sem jeito.— Senhora Giulia... tem visita. A dona Donatela.Giulia piscou, surpresa.Donatela? A mulher com quem ela mal falava? Aquela que ela sabia —