- Está dizendo que foi uma coincidência?
- Estou dizendo que o senhor está me julgando sem saber de nada!- O silêncio que se segue é denso. O tipo de silêncio que queima por dentro. Ela respira com dificuldade, o peito subindo e descendo. Está nervosa, mas se recusa a abaixar a cabeça. E eu... Eu estou mais irritado com isso do que com o fato de ela estar aqui. Ela não tem medo de mim como os outros. Ou talvez tenha, mas luta contra isso. E, pela primeira vez, me sinto um idiota completo. - Por que está tão incomodado com a minha presença aqui? - ela pergunta, com uma coragem que não esperava. - É porque sou sua funcionária? Porque sou desajeitada demais pra estar num lugar como esse? Ou porque te incomoda o fato de eu não fazer parte do seu mundo perfeito? Eu me aproximo de novo, e ela não recua dessa vez. - Você não faz parte do meu mundo - respondo com frieza, encarando-a nos olhos. - Mas, de alguma forma... ele tem girado em torno de você nos últimos dias. E isso é um problema. Ela engole em seco. - Então me demita. O silêncio corta o ar. Meu maxilar trava. Meus punhos se fecham. Mas eu não consigo dizer as palavras. Porque a ideia de demiti-la... me corrói. - Não posso. - minha voz sai baixa, quase amarga. - E isso me irrita mais do que você imagina. - Então o problema não sou eu. O problema é senhor, senhor Damian. Que não sabe o que sente, nem o que fazer com isso. Essa foi a gota. Avanço mais um passo, colando nossos corpos sem tocá-la. Ela prende a respiração, mas não se move. - Eu sou o homem que manda nesse império - murmuro, encarando seus lábios e depois seus olhos. - O que dita regras, muda rotas e faz impérios se curvarem. Mas com você... nada faz sentido. E se isso for um jogo, Diana, você está brincando com fogo. - Não é um jogo - ela sussurra. - Mas se fosse... talvez eu já estivesse queimando. Por um segundo, a tensão quase se rompe em algo mais. Mas eu me afasto. Um passo. Dois. Preciso de ar. De distância. E voltar a calma. - Vá para casa. Agora. E amanhã... não chegue atrasada. Ela parece hesitar, como se esperasse algo mais. Mas apenas acena, em silêncio, e se retira com a mesma dignidade que trouxe com ela. E quando a porta se fecha atrás dela, eu sei: Essa garota não é só um contratempo. É o início de um caos que carrega o meu nome. Após mandar Diana embora, encerrei minha noite de maneira abrupta. De longe, observei enquanto ela deixava o prédio sozinha. Apenas esperei que entrasse em um táxi e sumisse na escuridão da rua. Depois disso, caminhei até o meu carro e fui para casa. Nada ali fazia mais sentido. Mesmo incomodado com tudo o que havia acontecido, tentei me convencer de que o melhor era esquecer. Chegando em casa, tomei um banho rápido e me joguei na cama, tentando afogar os pensamentos no travesseiro. Mas não adiantou. Acordei mais cedo que o habitual. Tive uma noite inquieta, mal dormida. Diana rondava meus pensamentos como uma sombra persistente, e por mais que eu tentasse expulsá-la da mente, ela continuava ali. Nos meus olhos. Na minha pele. No que restava da minha paz. Um péssimo sinal. Tomei meu café sem açúcar, amargo como a sensação que me consumia, e encarei o horizonte de Yarolensk da varanda da cobertura. Por impulso, desci até o subsolo da residência, um lugar onde guardo tudo que realmente importa. Segredos. Legados. A história da minha linhagem. E a promessa que fiz ao meu pai. O cofre se abriu com o reconhecimento biométrico. As luzes internas se acenderam suavemente, revelando pastas seladas, contratos antigos... e uma caixa de madeira escura, onde repousava a relíquia deixada por Barac: uma fotografia amarelada, guardada como se fosse um artefato sagrado. Sentei-me, respirei fundo antes de tocá-la. A imagem mostrava um bebê enrolado em panos brancos. O olhar era intenso, mesmo na inocência de poucos meses de vida. Mas o que mais chamava atenção estava ali, na lateral da clavícula esquerda: uma marca escura, de contorno irregular, como uma estrela incompleta. A marca. A mesma que meu pai descreveu antes de morrer. Você vai reconhecê-la... pela marca. Fechei os olhos, tentando afastar a ideia absurda que começava a tomar forma. Mas era inevitável. Uma tempestade à espreita. Não pode ser. Levantei-me, inquieto. Guardei a foto e os documentos, fechei o cofre e saí de casa como se o destino tivesse acabado de me empurrar para uma estrada sem volta. Cheguei à empresa com passos duros e rápidos. Falei pouco. Não olhei ninguém nos olhos. Subi direto para o meu andar. Mas ao entrar no corredor que levava à minha sala, parei. Ela estava ali. Diana. De costas, mexendo nos arquivos com a costumeira hesitação. A blusa caía sutilmente sobre o ombro esquerdo. E então eu vi. A marca. Exatamente onde estava na fotografia.