O “encontro” que André mencionou acabou sendo uma ida à roda-gigante.
Eu sempre amei roda-gigantes. Inúmeras vezes imaginei estar com ele lá em cima, observando do alto a cidade onde vivíamos, e nos beijando no ponto mais alto da volta.
Mas André tinha medo de altura. Eu mencionei isso uma vez e nunca insisti.
Só não esperava que, justo quando eu estava prestes a ir embora da vida dele, ele resolvesse realizar esse desejo antigo.
— Obrigada, André. — Agradeci de coração.
Mas, no instante seguinte, Selena surgiu correndo com um balde de pipoca nas mãos.
— Que coincidência! Estão em um encontro? Que sorte a de vocês, andam em parzinho. Já eu... só posso sair sozinha.
Falou com aquele ar abatido, olhando para André com olhos cheios de pena.
André hesitou, incomodado:
— Então... vem jogar com a gente.
Meu sorriso congelou no rosto. Selena lançou-me um olhar provocador e disse:
— Ai, que chato... interrompendo o encontro de vocês assim.
André me lançou um olhar hesitante, como se percebesse algo errado:
— Íris, se você não quiser, é só me dizer.
Engraçado… André agora aprendeu a pedir minha opinião. Pena que meu coração já tinha se partido há muito tempo.
Falei com calma:
— Não tem problema. Não me incomodo. Quanto mais gente, mais divertido.
Eu não ousaria dizer que não. Se dissesse, com certeza seria acusada de "maltratar uma órfã".
Dentro da cabine da roda-gigante.
André e Selena conversavam e riam. Falavam de pacientes, de fofocas de celebridades e até da melhor forma de preparar sopa de cogumelos.
Tentei sorrir.
Comparado a mim, eles dois pareciam um casal de verdade.
— Falando nisso, André, aquela sopa de cogumelos que você fez na minha casa... foi a melhor da minha vida. Inveja da Selena, que vai tomar pra sempre, né?
André ficou visivelmente tenso. Olhou pra mim, parecia pronto pra se explicar, com medo de eu interpretar mal. Mas eu nem olhei pra eles.
Eu estava focada na vista da cidade onde vivi nos últimos sete anos.
Selena se aproximou de mim:
— Linda essa vista, né? Eu adoro andar de roda-gigante. A última vez que vim foi quando meu cachorro morreu. Fiquei tão mal que queria morrer também. Aí o André me trouxe aqui pra me animar.
Tentei não ouvir. Não ver. Não pensar. Mas ela não parava de cutucar. E por mais que eu me segurasse, meu coração ainda sentia.
Eu pensei que André tinha subido na roda-gigante pra me agradar. Que tinha superado seu medo por mim. Mas não. Ele já tinha feito isso antes… por outra mulher.
Selena, ao contar aquilo, não conseguiu conter o riso:
— Você não faz ideia... Da última vez que ele andou na roda-gigante, as pernas dele tremiam tanto que acabou desabando em cima de mim. Nunca vi o André daquele jeito!
Abaixei os olhos. Engraçado, nem eu o tinha visto assim.
Fiquei em silêncio. André pareceu preocupado:
— Tá tudo bem? Tá com dor de estômago? Ou ficou com medo?
Balancei a cabeça:
— Só tô admirando a vista.
Falei por falar. E ele acreditou. Voltou a rir e conversar com Selena.
Ao sairmos da roda-gigante, Selena, que estava ótima até então, de repente se jogou em cima de André:
— André… tô meio tonta...
André hesitou, olhando na minha direção, e tentou se justificar:
— É que... a Selena tem mesmo pavor de altura. Da outra vez, a gente andou porque os dois queriam superar isso juntos...
— Não precisa se explicar. Leva ela pra casa primeiro.
— Me espera aqui então. Assim que eu deixar ela, volto te buscar.
Fiquei observando o carro sumir na distância. E então, sem hesitar, dei as costas e fui embora.
Eu já esperei por ele tempo demais. Desta vez, não esperaria.
No táxi rumo ao aeroporto, meu celular começou a apitar sem parar.
“Íris, vamos nos casar embaixo da roda-gigante, pode ser? Você sempre disse que queria trocar alianças no ponto mais alto, sob o olhar de Deus.”
Mensagens de voz, uma após a outra, tentando alcançar um coração que já estava fechado.
“Você organizou 66 casamentos pra nós. Me deixa organizar este. Quero te ver como a noiva mais feliz do mundo.”
Não respondi. Já me decepcionei vezes demais. Não tinha mais confiança nenhuma nele.
Antes do embarque, recebi a última mensagem de André:
“Selena tá bem mal com essa fobia. Vou precisar ficar com ela mais um pouco. Você consegue pegar um táxi pra casa sozinha?”
De novo e de novo.
Ele nunca escolhe a mim.
Ainda bem que ele já tinha me machucado tantas vezes... Agora, eu só conseguia ficar calma — e completamente sem esperanças.
Mandei minha última resposta:
“Entendi. Cuida bem da Selena. Se quiser, pode até levá-la para morar com você e cuidar dela em casa.”
“Nós devemos terminar. O 67º casamento, pode cancelar.”
Finalmente, pela primeira vez, era a minha vez de cancelar o casamento.
Daquele dia em diante, André e eu não precisaríamos nos ver nunca mais.