POV: AIRYS
— Meu pulso! — O homem baixo e repugnante resmungou, ainda preso no aperto do gigante à minha frente. Um estralo seco ecoou pelo salão, seguido por um grito de dor cortante.
— Aí! Por favor... Aí...
O cheiro de suor e medo emanava dele.
— Se-senhor, por favor... — O leiloeiro balbuciou, a voz trêmula. — A mercadoria já foi vendida. O martelo já foi batido.
O homem imponente que segurava o nojento torceu seu pulso mais uma vez, forçando outro gemido de agonia antes de soltá-lo bruscamente.
— Dois milhões de dólares. — Sua voz saiu baixa, profunda, cortante e afiada. — E seus membros intactos.
A ameaça era clara. Ou aceitavam, ou morreriam ali mesmo.
— O quê?! — A voz estridente de Eloy explodiu em um grito irritante, me fazendo cerrar os dentes. — Airys não vale tudo isso! Por que pagar tanto por ela?!
— A mercadoria leiloada é minha Luna renegada! — Malik interveio, tentando manter a compostura, mas falhando miseravelmente. O leve tremor em suas pernas não passou despercebido. — Eu aprovo a venda dela para o primeiro cavalheiro que a arrematou. Ela merece o destino que lhe foi selado.
Meus dedos se fecharam em punhos, o ódio me consumindo. Mentiroso!
— Malik, seu desgraçado! — Minha voz rasgou minha garganta, seca e ferida, mas não me calei. — Se alguém aqui deveria ser punido, esse alguém deveria ser você e Eloy!
Ele não ousou me encarar.
Mas o homem.
O homem que quebrou o outro como se fosse nada me encarou.
E foi como se o chão sumisse sob meus pés.
Seus olhos me prenderam no lugar. Densos, terrosos e ferozes. Ele me analisava sem pressa, percorrendo cada detalhe, aquecendo cada ponto que seus olhos pousavam, a pressão de seu poder era demasiado, eu conseguia sentir a vibração de sua áurea arrepiando meus pelos mesmo sem me tocar.
— Quais as acusações desta escrava? — A pergunta saiu carregada de puro desprezo.
Minha respiração falhou.
Aquele homem…
Exalava algo que ninguém ali possuía: autoridade absoluta.
Malik estufou o peito tentando se tornar mais ameaçador, se não fosse por meu corpo dolorido e minha situação lastimável, eu teria rido da sua tentativa ridícula de se impor.
Patético.
Eu era apenas uma humana, mas era capaz de sentir que aquele homem que interrompeu o leilão não era comum.
Ele era perigoso, letal.
Cada célula do meu corpo me alertava para correr.
Mas não havia para onde fugir.
Meu marido se virou para mim apontando o dedo em minha face, pressionando contra a minha bochecha com força, em condenação.
— Essa vadia aqui é uma pecadora. Uma infiel. — Malik cuspiu as palavras, torcendo o nariz para mim.
Ele me empurrou brutalmente para trás. Meu corpo colidiu contra o chão frio, e a dor atravessou minhas costas como agulhas afiadas.
— Uma traidora que se deita por luxúria. Não tem um lobo. É apenas uma humana desonrada que não merece atenção.
Minha garganta queimava. Minhas mãos tremiam.
— Isso não é verdade... — murmurei, o fôlego saindo fraco. Meus olhos ardiam, mas eu me recusei a chorar. — Vocês me drogaram. Armaram para mim. Por que estão fazendo isso comigo?
— Mentirosa! — Malik ergueu a perna para me chutar, protegi meu corpo me encolhendo, mas para minha surpresa, aquele homem segurou firme sua perna e Malik gemeu de dor. — Por que está defendendo essa prostituta? O lugar dela é...
— Não ouse danificar o que vim buscar. — Seu timbre se tornou mais profundo, bruto e primitivo, a atmosfera mudou, o chão vibrou apenas por sua presença hostil.
— Quem é você e por que a defende? — Malik se afastou ficando em posição de defesa, vários lobos se ergueram ao seu lado formando um círculo em nossa volta. — Está em desvantagem aqui.
Os lobos rosnavam, prontos para atacar.
Um grunhido próximo a um riso sombrio, escapou por entre suas presas em desprezo puro.
— Quantidade não é força. — Ele ergueu o queixo em pura dominação. — Um líder que precisa de seus lacaios para lutar suas próprias batalhas…
Nojo. Ele não precisou dizer. O desprezo estava estampado em seus olhos.
Levando a mão ao rosto arrancando a máscara jogando-a ao chão.
Uma cicatriz atravessava sua sobrancelha, outra marcava a bochecha. Cabelos escuros, levemente acobreados, desarrumados pelo vento.
Malik congelou.
— Não passa de um inseto com título de alfa!
O silêncio foi mortal.
Os lobos hesitaram.
— Su-supremo... — Malik gaguejou se ajoelhando apressadamente, seguido pelos demais. — Eu não quis ofender ou ameaçar, meu rei.
O Alfa Supremo.
O monstro que até os próprios alfas temiam estava aqui.
Eu ergui o olhar para ele, minha respiração descompassada.
Meu corpo inteiro estremeceu quando seus olhos cortantes deslizaram para mim de canto.
Abaixei a cabeça imediatamente.
— Patéticos. — A palavra foi cuspida com desgosto.
Seus caninos se alongaram, e ele passou a língua sobre a presa afiada, como se já saboreasse o sangue.
Antes que alguém pudesse reagir, a distância entre ele e Malik foi rompida em um borrão de velocidade. Em um único movimento brutal, a mão dele envolveu o pescoço do traidor e o ergueu como se não passasse de um saco vazio. As garras se afundaram na carne sem hesitação.
O ar escapou da garganta de Malik em um ruído sufocado. Seus olhos reviraram, os pés se debateram no ar.
Os lobos ao redor recuaram, abaixando as cabeças em submissão, o medo impregnando cada respiração naquele salão.
— Po-por favor... — Malik se engasgou, as mãos arranhando inutilmente o pulso que o segurava. — Não... não me mate...
A voz dele saiu trêmula, implorando.
— Malik, não! — Eloy soluçou, o pânico estampado em seu rosto. Ela me lançou um olhar suplicante antes de se virar para o Alfa. — Por favor, tenha piedade!
Ele a ignorou. Seus olhos brilharam em um vermelho profundo, sua expressão sombria, assassina.
O desespero de Eloy me atingiu. Meu peito se apertou.
Se Malik morresse ali, o que me esperava poderia ser ainda pior.
Engoli seco, minha boca seca. Eu não queria pedir nada a ele, mas não havia escolha.
— Não o mate! — Minha voz saiu baixa, hesitante.
Os olhos dele se moveram lentamente para mim.
O peso daquele olhar me esmagou.
— Por favor, Alfa Supremo... eu te imploro.
Falar aquelas palavras me fez querer vomitar. Eu estava implorando por Malik?
O maldito traidor deveria sofrer.
O Alfa franziu a testa, sua expressão mudando. Algo perigoso brilhou em seu olhar.
Ele me viu.
— Interessante. — Esboçou com curiosidade, suas pupilas dilataram predatoriamente. Em sua íris escarlate, pude ver a silhueta de sua fera feroz, próxima à superfície, me fitando, inquieta, observando como se desejasse emergir e me rasgar como sua presa. — Não é tão infiel quanto esse verme afirma.
Sem aviso, ele lançou Malik com brutalidade contra as cadeiras, o traidor caiu, gemendo de dor.
Caminhando lentamente em minha direção, a passos seguros, como um predador mortal que era, o alfa se agachou a minha frente, estendendo uma garra e tocando meu queixo, obrigando a o encarar.
— Por que o defende? — Sua pergunta foi direta, seu olhar era penetrante. Estremeci, sentindo meu coração pulsar mais alto, seus olhos percorreram meu corpo vagarosamente estudando cada detalhe antes de se voltar a altura do nosso contato. — Fraqueza!
O Alfa deslizou as garras afiadas por minha pele fazendo um filete de sangue que capturou na ponta e levou aos lábios sugando, ele ergueu a enorme mão e fechei os olhos em reflexo me encolhendo, esperando ser dilacerada por interromper seu confronto.
Mas, ao invés disso, sentir alivio no pescoço e nas mãos, abrir lentamente levando minha mão ao pescoço massageando, ele havia rompido a coleira e cordas.
Em um movimento ágil, me vi sendo erguida do chão e jogada sobre suas costas largas como se não pesasse nada.
— O-o que está fazendo? — Eu gaguejei surpresa, me debatendo tentando me soltar, lutar, fugir. — Me solta! Alguém me ajude.
Mas ninguém ajudava, ninguém olhava ou se importava.
Eloy caiu de joelhos ao lado de Malik, que segurava o pescoço, engolindo ar com dificuldade. Seus olhos estavam cheios de ódio, mas ele não tinha coragem de levantar a voz.
Ninguém tinha.
— Guarde suas forças, — O Alfa supremo me lançou um olhar frio sobre os ombros. — Você precisará delas Humana.
— Para onde está me levando? — Contestei nervosa, sendo carregada até um carro estacionado, onde ele abriu a porta e me jogou sobre o banco sem delicadeza. — Eu te fiz uma pergunta!
Bati a mão contra a janela, quando ele entrou do outro lado, fechando com força e se inclinando perigosamente para frente, perto demais.
Passando um braço na lateral da minha cabeça, me “prendendo” contra o banco, afundei para trás contra o estofado tentando fugir de seu domínio, seu aroma era terroso e selvagem.
— Para onde você pertence agora! — O Alfa rosnou sombrio, puxando o cinto e fechando em um click ao meu lado, dando partida no carro para longe da minha alcateia.